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Arranjo domiciliar de idosos e determinantes sociodemográficos e de saúde: um estudo longitudinal1 1 Artigo extraído da dissertação de mestrado "Arranjo domiciliar e a evolução da capacidade funcional de idosos: um estudo longitudinal", apresentada à Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, Minas Gerais, Brasil. Apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, processo nº 301704/2012-0, e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais FAPEMIG-MG, processo nº FAPEMIG - APQ-00866-12.

RESUMO

Objetivos:

descrever as características sociodemográficas e o número de morbidades de idosos, segundo a dinâmica do arranjo domiciliar; e verificar os determinantes sociodemográficos e de saúde do arranjo domiciliar.

Métodos:

trata-se de uma pesquisa domiciliar e longitudinal (2005-2012), conduzida com 623 idosos. Foi realizada análise estatística descritiva e regressão logística multinomial (p<0,05).

Resultados:

predominaram, idosos que moram sozinhos, acompanhados e com mudança do arranjo domiciliar, do sexo feminino, faixa etária 60├ 70 anos, 1├ 4 anos de estudo e com renda entre 1├┤ 3 salários mínimos. Durante o desenvolvimento dessa pesquisa, identificou-se uma elevação da distribuição de idosos com 1├┤3 salários mínimos. O número de morbidades aumentou nos três grupos ao longo do estudo, com maiores taxas entre os idosos que mudaram a dinâmica do arranjo domiciliar. Verificou-se que idosos do sexo masculino apresentaram menores chances de morar sozinhos (p=0,007) e mudar o arranjo domiciliar comparados às mulheres (p = 0,005). Ganhar menos de um salário mínimo diminuiu as chances de mudança do arranjo domiciliar em relação aos que ganham mais de três salários (p=0,034).

Conclusão:

os fatores determinantes do arranjo domiciliar foram o sexo e a renda, sendo que as variáveis capacidade funcional e número de morbidades não estiveram associadas ao desfecho analisado.

Descritores:
Idoso; Família; Envelhecimento

ABSTRACT

Objectives:

to describe the sociodemographic characteristics and the number of morbidities in the elderly, according to the dynamics of living arrangements and evaluate the sociodemographic and health determinants of the living arrangements.

Methods:

this is a household longitudinal survey (2005-2012), carried out with 623 elderly people. Descriptive statistical analysis and multinomial logistic regression were performed (p<0.05).

Results:

there was predominance of elderly living alone, accompanied and with change in the living arrangements, females, age range between 60├ 70 years, 1├ 4 years of study and with income between 1├┤ 3 minimum wages. During the development of this research, it was identified an increase in the incidence of elderly with 1├┤3 minimum wages. The number of morbidities increased in the three groups throughout the study, with the highest rates observed among the elderly with change in the dynamics of living arrangements. It was found that elderly men showed less chance of living alone (p=0.007) and having change in the living arrangements compared to women (p = 0.005). Incomes less than a minimum wage decreased the chances of change in the living arrangements compared to incomes above three salaries (p=0.034).

Conclusion:

the determining factors of the living arrangements were sex and income, and the variables functional capacity and number of morbidities were not associated with the outcome analyzed.

Descriptors:
Aged; Family; Aging

RESUMEN

Objetivos:

describir las características sociodemográficas y el número de enfermedades concomitantes de ancianos, según la dinámica de la acomodación domiciliaria; y verificar los determinantes sociodemográficos y de salud del espacio domiciliario.

Métodos:

se trata de una investigación domiciliaria y longitudinal (2005-2012), realiza con 623 ancianos. Fue realizado análisis estadístico descriptivo y regresión logística multinomial (p<0,05).

Resultados:

predominaron, ancianos que viven solos, acompañados y con cambio de acomodación domiciliaria, del sexo femenino, intervalo etario 60├ 70 años, 1├ 4 años de estudio y con ingreso mensual entre 1├┤3 sueldos mínimos. Durante el desarrollo de la investigación, se identificó una aumento en la distribución de ancianos de 1├┤3 sueldos mínimos. El número de enfermedades concomitantes aumentó en los tres grupos a lo largo del estudio, con mayores tasas entre los ancianos que cambiaron la dinámica de la acomodación domiciliaria. Se verificó que ancianos del sexo masculino presentaron menores probabilidades de vivir solos (p=0,007) y de cambiar la acomodación domiciliaria, comparados a las mujeres (p = 0,005). Ganar menos de un salario mínimo disminuye las probabilidades de cambiar la acomodación domiciliaria en relación a los que ganan más de tres sueldos (p=0,034).

Conclusión:

los factores determinantes de la acomodación domiciliaria fueron el sexo y la ingreso mensual, siendo que las variables capacidad funcional y número de enfermedades concomitantes, no estuvieron asociadas al resultado analizado.

Descriptores:
Anciano; Familia; Envejecimiento

Introdução

O envelhecimento populacional tem provocado modificações na estrutura das famílias11. Wang D, Zheng J, Kurosawa M, Inaba Y, Kato, N. Changes in activities of daily living (ADL) among elderly Chinese by marital status, living arrangement, and availability of healthcare over a 3-year period. Environ Health Prev Med. 2009;14:128-41.. Vários são os conceitos que caracterizam a família em virtude das diferentes abordagens adotadas nas áreas da ciência. A antropologia a define como o "grupo de pessoas ligadas por relações afetivas construídas sobre uma base de consanguinidade e aliança"22. Texeira SM. Família e as formas de proteção social primária aos idosos. Rev Kairós. 2008;11(2):59-80.; já os estudos sociológicos, demográficos e econômicos delimitam o conceito aos espaços físicos, ao considerarem família como o grupo de indivíduos residente em um mesmo domicílio33. Medeiros M, Osorio R. Mudança nas famílias brasileiras: a composição dos arranjos domiciliares no Brasil 1978 a 1998. Rev Bras Est População. 2000;17(1/2):67-85..

O domicílio pode ser entendido como "o local estruturalmente separado e independente que se destina a servir de habitação a uma ou mais pessoas, ou que esteja sendo utilizado como tal"44. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Resultados Preliminares do Universo Conceito e Definições - Tabelas Adicionais. Rio de Janeiro: IBGE; 2011.. Assim, a forma como o indivíduo - ou um grupo de indivíduos - se organiza nesse espaço físico constitui o arranjo domiciliar33. Medeiros M, Osorio R. Mudança nas famílias brasileiras: a composição dos arranjos domiciliares no Brasil 1978 a 1998. Rev Bras Est População. 2000;17(1/2):67-85. - conceito adotado nesta pesquisa.

Os arranjos domiciliares são complexos e apresentam composições diversificadas22. Texeira SM. Família e as formas de proteção social primária aos idosos. Rev Kairós. 2008;11(2):59-80.. A heterogeneidade desses arranjos pode ser o reflexo dos diferentes determinantes que influenciam a sua estrutura 55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.. De modo geral, destacam-se as características culturais, demográficas, socioeconômicas e de saúde55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.-66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51..

Apesar da relevância em compreender a configuração familiar para implementação de políticas sociais e de saúde mais assertivas às necessidades do idoso e sua família77. Rabelo DF, Neri AL. Tipos de configuração familiar e condições de saúde física e psicológica em idosos. Cad Saúde Pública. 2015;31(4):874-84., ainda são escassas as publicações referentes à temática. Até o momento, não foi encontrado estudo longitudinal que tenha verificado os determinantes do arranjo domiciliar de idosos brasileiros.

No Brasil, embora a corresidência permaneça elevada na população idosa, tem-se observado, ao longo dos anos, um aumento do número de indivíduos que residem em domicílios unipessoais55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.. Os domicílios unipessoais podem representar uma conquista do envelhecimento na medida em que esse grupo vivencia o decorrer da idade com mais privacidade e independência. Entretanto, esse tipo de arranjo domiciliar também pode abrigar idosos que necessitam de auxílio no cotidiano, em especial aqueles que apresentam problemas de saúde, familiares e precárias condições de vida55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.

6. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.
-77. Rabelo DF, Neri AL. Tipos de configuração familiar e condições de saúde física e psicológica em idosos. Cad Saúde Pública. 2015;31(4):874-84.. Assim, o conhecimento das características do arranjo domiciliar de idosos pode fornecer subsídios para a detecção de grupos vulneráveis e que precisam ser priorizados nos cuidados de saúde pelos profissionais da atenção primária, incluindo os enfermeiros.

Os objetivos deste estudo foram: descrever as características sociodemográficas e o número de morbidades dos idosos, segundo a dinâmica do arranjo domiciliar; e verificar os determinantes sociodemográficos e de saúde dessa composição.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa domiciliar, quantitativa e longitudinal realizada com idosos do município de Uberaba - MG, no período de 2005 a 2012.

A população do estudo foi constituída por idosos residentes no referido município. No ano de 2005, foi calculada uma amostra inicial (2892 idosos), considerando 95% de confiança, 80% de poder do teste, margem de erro de 4,0%, para as estimativas intervalares, e uma proporção estimada de π = 0,5, para as proporções de interesse.

Deste modo, foram obtidas informações de 2683 idosos, em decorrência das recusas. Posteriormente, nos anos de 2008 e 2012, os idosos localizados foram novamente entrevistados. No ano de 2008, foram feitas entrevistas com 1425 indivíduos e, em 2012, com 623. A diminuição do número de entrevistados, ao longo do seguimento, ocorreu por diversos motivos, tais como: o idoso estar hospitalizado; ter mudado de endereço; ter ido a óbito; ou não ser encontrado após três tentativas de visita do entrevistador, entre outros, conforme demonstrado na Figura 1.

Os critérios de inclusão foram: ter 60 anos de idade ou mais; não apresentar declínio cognitivo; morar na zona urbana do município de Uberaba - MG; ter sido entrevistado nos três momentos (2005, 2008 e 2012); e concordar em participar da pesquisa. Dessa forma, os participantes da presente investigação totalizaram 623 idosos.

Os idosos que integraram esse estudo foram divididos em três grupos, conforme a dinâmica do arranjo domiciliar no período de seguimento: grupo 1 (Sozinho) - idosos que permaneceram sozinhos durante todo o seguimento; grupo 2 (Acompanhado) - idosos que vivem acompanhados durante todo o seguimento; e, grupo 3 (Mudança do arranjo domiciliar) - idosos que alteraram o arranjo domiciliar no período de seguimento (Figura 1).

Figura 1
Algoritmo para a descrição da amostra final do estudo.

A coleta de dados foi realizada no domicílio do idoso, empregando para sua seleção a técnica de amostragem estratificada proporcional, considerando os diversos bairros como estratos.

Para avaliação cognitiva utilizou-se o Mini-exame do Estado Mental (MEEM). Nos anos de 2005 e 2008 utilizou-se o MEEM, versão reduzida validada pelos pesquisadores do Projeto Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (SABE)88. Icaza MC, Abala C. Projeto SABE: Minimental State Examination (MMSE) del estudio de dementia en Chile: análisis estatístico. OPAS; 1999. p. 1-18.. Nesta versão estabeleceu-se um ponto de corte de 12/13, sendo que a deterioração cognitiva foi indicada por uma pontuação igual ou inferior a 1288. Icaza MC, Abala C. Projeto SABE: Minimental State Examination (MMSE) del estudio de dementia en Chile: análisis estatístico. OPAS; 1999. p. 1-18.. Em 2012 foi utilizado o MEEM traduzido e validado no Brasil99. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O mini-exame do estado mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52:1-7., composto por questões referentes à orientação, à memória imediata e de evocação, à concentração, ao cálculo, à linguagem e ao domínio espacial. Nesse ano considerou-se que o escore poderia variar e o ponto de corte considerado de acordo com a escolaridade do idoso: 13 para analfabetos, 18 para 1 a 11 anos de estudo e 26 para mais de 11 anos de estudos99. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O mini-exame do estado mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52:1-7.. Esta mudança foi implementada devido ao fato de os pesquisadores julgarem o instrumento e a pontuação de corte validado99. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O mini-exame do estado mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52:1-7. mais adequados para o momento.

Para a caracterização dos dados sociodemográficos, das morbidades e da capacidade funcional, utilizou-se parte do questionário Older Americans Resources and Services (OARS), elaborado pela Duke University (1978) e adaptado no Brasil por Ramos (1987), com a nomenclatura de Questionário Brasileiro de Avaliação Funcional e Multidimensional (BOMFAQ)1010. Ramos L, Toniolo N, Cendoroglo M, Garcia JT, Najas MS, Perracini M, et al. Two-year follow-up study of elderly residents in S. Paulo, Brazil: methodology and preliminary results. Rev Saúde Pública. 1998;32(5):397-407..

No que se refere à avaliação das morbidades, o questionário contém 26 itens que investigam se o indivíduo apresenta a morbidade1010. Ramos L, Toniolo N, Cendoroglo M, Garcia JT, Najas MS, Perracini M, et al. Two-year follow-up study of elderly residents in S. Paulo, Brazil: methodology and preliminary results. Rev Saúde Pública. 1998;32(5):397-407.. Para análise dos dados, foi contabilizado o número de morbidades relatadas pelo idoso.

Em relação a avaliação da capacidade funcional, o questionário é composto de 12 atividades de vida diária, através do qual o idoso informa o grau de dificuldade para a realização de atividades de autocuidado (Não consegue, pouca dificuldade, muita dificuldade e sem dificuldade)1010. Ramos L, Toniolo N, Cendoroglo M, Garcia JT, Najas MS, Perracini M, et al. Two-year follow-up study of elderly residents in S. Paulo, Brazil: methodology and preliminary results. Rev Saúde Pública. 1998;32(5):397-407.. Para a análise estatística, calculou-se o escore de capacidade funcional que corresponde à soma da pontuação das atividades de vida diária: 1 (Não consegue), 2 (Com pouca dificuldade), 3 (Com muita dificuldade) e 4 (Sem dificuldades). Assim, o escore geral de capacidade funcional varia de 12 a 48, e os maiores escores estão associados à melhor capacidade funcional.

As variáveis investigadas foram: sexo (Masculino e feminino); faixa etária (60|-70, 70|-80 e 80 anos e mais); escolaridade, em anos de estudo (Sem escolaridade, 1├4 e > 5); arranjo domiciliar (Só e outros arranjos); renda individual mensal, em salários mínimos (< 1, 1|┤ 3 e > 4 ); número de morbidades autorreferidas; e escore de capacidade funcional.

Para análise dos dados, foram construídas planilhas eletrônicas, no programa Excel(r). Os dados coletados, em cada período, foram processados em microcomputador, em dupla entrada, para verificação da consistência entre as duas bases. Para análise dos dados, o banco de dados foi exportado para o software Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 17.0.

Realizou-se análise estatística descritiva, por meio de distribuição de frequências absolutas e percentuais. Para verificar os determinantes do arranjo domiciliar, recorreu-se à análise multivariada, através de regressão logística multinomial. Com relação às variáveis preditoras sexo, faixa etária e escolaridade, foram considerados os dados referentes ao ano de 2005; enquanto que para as variáveis renda, número de morbidades e escore de capacidade funcional foi calculada a média dos três períodos. No modelo multivariado, o α foi de 0,05, considerando associação significativa quando p < α.

Os projetos foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, sob os Protocolos no 553, em 2005, no 897, em 2008 e, em 2012, sob o no 265. Os idosos foram contatados no domicílio, momento em que apresentou-se os objetivos e às informações pertinentes. Após a anuência e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, pelo participante , conduziu-se a entrevista.

Resultados

A população do estudo foi composta por 623 idosos entrevistados durante o estudo , divididos em três grupos, conforme a dinâmica do arranjo domiciliar: 34 (5,5%) permaneceram sozinhos, 475 (76,2%) moravam acompanhados e 114 (18,3%) apresentaram mudança do arranjo domiciliar.

A maioria dos idosos, nos três grupos, era do sexo feminino, com maior percentual para as que moravam sozinhas (82,4%); ao contrário se observou entre os homens, os quais predominaram (35,2%) aqueles que residiam acompanhados (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição do sexo, faixa etária e nível de escolaridade entre idosos segundo a dinâmica do arranjo domiciliar na linha base do seguimento (2005). Uberaba, MG, Brasil, 2005.

Em 2005, a maioria da população tinha 60├ 70 anos de idade, e nessa faixa etária o maior percentual era de pessoas acompanhadas (61,3%). Entre os idosos com 70├ 80 anos predominaram os que mudaram o arranjo domiciliar (33,6%). Os idodos com 80 anos ou mais, foram os que apresentaram maior percentual para os que viviam sozinhos (9,1%) (Tabela 1).

Referente à escolaridade, verificou-se predomínio de idosos com 1├ 4 anos de estudo(s), seguido dos sem escolaridade, nos três grupos. Predominaram entre aqueles sem escolaridade, indivíduos que tiveram mudança do arranjo domiciliar (23,9%); naqueles com 1├ 4 anos de estudo, os que viviam sozinhos (67,6%); e entre os com mais de 5 anos de estudo, os que moravam acompanhados (23,2%) (Tabela 1). A distribuição da escolaridade não se alterou ao longo da pesquisa.

A Tabela 1 apresenta a distribuição do sexo, faixa etária e nível de escolaridade dos idosos de acordo com o arranjo domiciliar.

A maioria dos idosos que moravam sozinhos, acompanhados e com mudança do arranjo domiciliar possuía 1|┤ 3 salários mínimos em 2005, 2008 e 2012 - com aumento da distribuição de indivíduos nessa faixa de renda ao longo do seguimento. No decorrer dos períodos estudados, ocorreu uma elevação do percentual de participantes com 1|┤3 salários mínimos nos três grupos, sendo que os idosos que moravam sozinhos apresentaram o maior percentual em relação aos demais (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição da faixa de renda individual e número de morbidades, entre idosos segundo a dinâmica do arranjo domiciliar nos três períodos de seguimento, Uberaba, MG, Brasil, 2005, 2008 e 2012.

Concernente ao número de morbidades, em 2005, predominaram idosos com 1|-|2 doenças nos três grupos, com maiores percentuais entre os que mudaram o arranjo domiciliar (51,8%). Nos seguimentos posteriores, a maior parte dos indivíduos tinha mais de quatro morbidades, sendo que os idosos que mudaram o arranjo domiciliar também apresentaram percentuais mais elevados (71,7%) em 2008 e (64,0%) em 2012 (Tabela 2).

A Tabela 2, a seguir, mostra a distribuição da faixa etária e número de morbidades de idosos segundo a dinâmica do arranjo domiciliar.

Em relação aos determinantes do arranjo domiciliar, obteve-se que idosos do sexo masculino apresentaram aproximadamente 75% menos chances de morar sozinhos (p=0,007) e 51% menos chances de mudar o arranjo domiciliar em relação às mulheres (p=0,005) (Tabela 3).

Tabela 3
Modelo de regressão dos determinantes do arranjo domiciliar de idosos, Uberaba, MG, Brasil, 2005, 2008 e 2012

Outro determinante da mudança do arranjo domiciliar foi a faixa de renda. Ganhar menos de um salário mínimo diminui em 72%, aproximadamente, as chances de mudança no arranjo em relação aos indivíduos com mais de três salários mínimos (p = 0,034) (Tabela 3).

Ressalta-se que a capacidade funcional e o número de morbidades não estiveram associados a morar sozinho e a mudança do arranjo domiciliar (Tabela 3).

A seguir, na Tabela 3, elencam-se os fatores determinantes do arranjo domiciliar de idosos.

Discussão

Nesta investigação, a predominância de idosas que vivem sozinhas deve-se ao fato, provavelmente, da longevidade superior das mulheres55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30., o que aumenta as chances de enviuvarem1212. Ramos MP. As transições nos arranjos de vida e as trocas sociais entre idosos no Rio Grande do Sul. RBCEH. 2010;7(3):381-93.. Além disso, em situação de perda do cônjuge, os homens geralmente se casam de novo, ao contrário das mulheres1313. Ramos JLC, Menezes MR, Meire EC. Idosos que moram sozinhos: desafios e potencialidades do cotidiano. Rev Baiana Enferm. 2010;24(1):43-54.. Investigações conduzidas na China e no município de Ribeirão Preto - SP também verificaram maior percentual de idosas em domicílios unipessoais (67,2%)1414. Wang H, Chen K, Pan Y, Jing F, Liu H. Associations and Impact Factors between Living Arrangements and Functional Disability among Older Chinese Adults. PLoS ONE. 2013;8(1):1-7. (71,4%)1515. Pedrazzi EC, Motta TTD, Vendrúscolo TRP, Fabrício-Wehbe SCC, Cruz IR, Rodrigues RAP. Household arrangements of the elder elderly. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2010;18(1):18-25., respectivamente.

Em estudo realizado nos Estados Unidos, também foi observada a predominância de idosos mais jovens morarem acompanhados. , A maioria dos indivíduos com 65 a 69 anos de idade viviam com outra pessoa (73,0%)1616. Lau DT, Kirby JB. The relationship between living arrangement and preventive care use among community-dwelling elderly persons. American Journal of Public Health. 2009;99(7):1315-1321.. Contudo, resultados divergentes têm sido demonstrados em outros estudos internacionais1717. Sun X, Lucas H, Meng Q, Zhang Y. Associations between living arrangements and health-related quality of life of urban elderly people: a study from China. Qual Life Res. 2011;20:359-69.

18. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Aks...
-1919. Saito E, Ueki S, Yasuda N, Yamazaki S, Yasumura S. Risk factors of functional disability among community-dwelling elderly people by household in Japan: a prospective cohort study. BMC Geriatrics. 2014;14:1-9. As diferenças dos resultados desses estudos podem ser explicadas pela dupla relação da idade com o arranjo domiciliar. O decorrer da idade pode fazer com que os idosos fiquem sozinhos em virtude da perda do cônjuge, mas também aumenta as chances de os idosos coabitarem em decorrência da maior dependência física55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.-66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51..

Alguns autores sugerem que a dependência física no idoso é intensificada a partir dos 80 anos de idade1515. Pedrazzi EC, Motta TTD, Vendrúscolo TRP, Fabrício-Wehbe SCC, Cruz IR, Rodrigues RAP. Household arrangements of the elder elderly. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2010;18(1):18-25.. Deste modo, o fato de um maior percentual de indivíduos octogenários permanecerem sozinhos durante o seguimento demonstra, por um lado, um achado satisfatório, pois infere-se que eles estejam vivenciando o processo de envelhecimento bem-suscedido. Porém, de outro, é uma questão preocupante, uma vez que esses idosos podem encontrar alguns impasses na utilização dos serviços de saúde, da mesma maneira que dificuldades em enfrentar as tarefas cotidianas, agravadas pela ausência de um membro familiar.

No que se refere à escolaridade, os resultados deste estudo divergem de outra investigação realizada na China1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Aks...
. Tal investigação demonstrou que níveis superiores de educação aumentam a proporção de idosos que residem sozinhos1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Aks...
. Isto pode ocorrer em razão da escolha de um estilo de vida com mais privacidade e independência. Diferentemente, idosos com nível educacional menor apresentam famílias mais numerosas1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Aks...
, o que pode favorecer a corresidência. Assim, a escolaridade interfere tanto diretamente no arranjo domiciliar, ao influenciar na percepção do idoso sobre a melhor opção para se viver, como indiretamente, ao impactar outros aspectos, como, por exemplo, o número de filhos.

Em contrapartida, estudos verificaram que idosos com menor nível de escolaridade viviam sozinhos1414. Wang H, Chen K, Pan Y, Jing F, Liu H. Associations and Impact Factors between Living Arrangements and Functional Disability among Older Chinese Adults. PLoS ONE. 2013;8(1):1-7.,1616. Lau DT, Kirby JB. The relationship between living arrangement and preventive care use among community-dwelling elderly persons. American Journal of Public Health. 2009;99(7):1315-1321.. Acredita-se que existem divergências na relação entre a educação e o arranjo domiciliar de acordo as características culturais de cada região. Em alguns países da América Latina, como o Brasil, a proporção de idosos que residem acompanhados, especificamente com os filhos, aumenta em indivíduos que apresentam maiores níveis de escolaridade1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Aks...
, corroborando com a presente investigação.

Houve predominância de maior renda entre os idosos que moravam sozinhos, o que ratificou o estudo realizado no município de São Paulo66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.. Entretanto, uma pesquisa internacional demonstrou predomínio de idosos com menor renda residindo nesse tipo de configuração familiar1616. Lau DT, Kirby JB. The relationship between living arrangement and preventive care use among community-dwelling elderly persons. American Journal of Public Health. 2009;99(7):1315-1321.. Idosos com elevado rendimento tendem a residir sozinhos, como forma de preservar sua privacidade e independência66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.. Além disso, os recursos econômicos podem oferecer mais poder de compra, possibilitando facilidades para o acesso aos serviços de saúde, da mesma maneira que cobertura social mais adequada66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.,1212. Ramos MP. As transições nos arranjos de vida e as trocas sociais entre idosos no Rio Grande do Sul. RBCEH. 2010;7(3):381-93.,2020. Rodrigues NO, Neri AL. Vulnerabilidade social, individual e programática em idosos da comunidade: dados do estudo FIBRA, Campinas, SP, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(8):2129-39. - aspectos essenciais para permanecer sozinho. Em contrapartida, muitos idosos em melhores condições de renda residem com seus familiares em virtude da necessidade econômica dos descendentes, que usufruem de sua moradia e de seus recursos financeiros77. Rabelo DF, Neri AL. Tipos de configuração familiar e condições de saúde física e psicológica em idosos. Cad Saúde Pública. 2015;31(4):874-84..

A maior distribuição do número de doenças entre os idosos que mudaram o arranjo domiciliar corrobora com investigação realizada no município de Campinas, em que o número de morbidades esteve entre as variáveis determinantes do tipo de configuração familiar de idosos77. Rabelo DF, Neri AL. Tipos de configuração familiar e condições de saúde física e psicológica em idosos. Cad Saúde Pública. 2015;31(4):874-84.. Esse achado pode estar relacionado à necessidade de auxílio físico, fazendo com muitos carecem coabitar com suas famílias e não mais em domicílios unipessoais1515. Pedrazzi EC, Motta TTD, Vendrúscolo TRP, Fabrício-Wehbe SCC, Cruz IR, Rodrigues RAP. Household arrangements of the elder elderly. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2010;18(1):18-25..

Iminente considerar que a coabitação, por si só, não significa apoio em momentos de dificuldade. Várias teorias sobre o sistema familiar e os tipos de arranjo domiciliar, historicamente, enfatizam papel protetor da família sobre as condições de vida dos idosos, especialmente em sociedades cujas políticas de assistência a essa população ainda não estão consolidadas2121. Manfredini M, Breschi M. Living Arrangements and the Elderly: An Analysis of Old-Age Mortality by Household Structure in Casalguidi, 1819-1859. Demography. 2013;50:1593-1613.. Porém, os resultados de estudos internacionais recentes são contraditórios; alguns corroboram com essas hipóteses1616. Lau DT, Kirby JB. The relationship between living arrangement and preventive care use among community-dwelling elderly persons. American Journal of Public Health. 2009;99(7):1315-1321.-1717. Sun X, Lucas H, Meng Q, Zhang Y. Associations between living arrangements and health-related quality of life of urban elderly people: a study from China. Qual Life Res. 2011;20:359-69.,2222. Kikuchi H, Takamiya T, Odagiri Y, Ohya Y, Nakaya T, Shimomitsu T, Inoue S. Gender differences in association between psychological distress and detailed living arrangements among Japanese older adults, aged 65-74 years. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2014;49:823-30., enquanto outros sugerem perspectiva inversa11. Wang D, Zheng J, Kurosawa M, Inaba Y, Kato, N. Changes in activities of daily living (ADL) among elderly Chinese by marital status, living arrangement, and availability of healthcare over a 3-year period. Environ Health Prev Med. 2009;14:128-41.,1414. Wang H, Chen K, Pan Y, Jing F, Liu H. Associations and Impact Factors between Living Arrangements and Functional Disability among Older Chinese Adults. PLoS ONE. 2013;8(1):1-7.,2121. Manfredini M, Breschi M. Living Arrangements and the Elderly: An Analysis of Old-Age Mortality by Household Structure in Casalguidi, 1819-1859. Demography. 2013;50:1593-1613., o que denota a necessidade de aprofundamento da situação por meio de pesquisas.

Na análise dos determinantes do arranjo domiciliar, o sexo feminino associado a condição de morarem sozinhas diverge de estudo com idosos japoneses, que obteve maior proporção de homens residindo sozinhos em relação às mulheres (p = 0,049)2222. Kikuchi H, Takamiya T, Odagiri Y, Ohya Y, Nakaya T, Shimomitsu T, Inoue S. Gender differences in association between psychological distress and detailed living arrangements among Japanese older adults, aged 65-74 years. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2014;49:823-30.. Outra pesquisa, com idosos indianos, também verificou resultado divergente, considerando-se que o sexo não apresentou diferença significativa ao controlar o efeito das outras variáveis (p=0,959)1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
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. Por outro lado, achados das pesquisas internacionais corroboram com a presente investigação1414. Wang H, Chen K, Pan Y, Jing F, Liu H. Associations and Impact Factors between Living Arrangements and Functional Disability among Older Chinese Adults. PLoS ONE. 2013;8(1):1-7.,1717. Sun X, Lucas H, Meng Q, Zhang Y. Associations between living arrangements and health-related quality of life of urban elderly people: a study from China. Qual Life Res. 2011;20:359-69.,1919. Saito E, Ueki S, Yasuda N, Yamazaki S, Yasumura S. Risk factors of functional disability among community-dwelling elderly people by household in Japan: a prospective cohort study. BMC Geriatrics. 2014;14:1-9. Esses estudos verificaram maior proporção de mulheres idosas que viviam sozinhas, quando comparadas aos homens1414. Wang H, Chen K, Pan Y, Jing F, Liu H. Associations and Impact Factors between Living Arrangements and Functional Disability among Older Chinese Adults. PLoS ONE. 2013;8(1):1-7.,1717. Sun X, Lucas H, Meng Q, Zhang Y. Associations between living arrangements and health-related quality of life of urban elderly people: a study from China. Qual Life Res. 2011;20:359-69.,1919. Saito E, Ueki S, Yasuda N, Yamazaki S, Yasumura S. Risk factors of functional disability among community-dwelling elderly people by household in Japan: a prospective cohort study. BMC Geriatrics. 2014;14:1-9.

O sexo feminino também esteve associado às maiores chances de mudança do arranjo domiciliar em estudo realizado com idosos no Rio Grande do Sul1212. Ramos MP. As transições nos arranjos de vida e as trocas sociais entre idosos no Rio Grande do Sul. RBCEH. 2010;7(3):381-93.. Este resultado não surpreende, considerando-se que é sabido que as mulheres apresentam maior expectativa de vida e, consequentemente, chances mais elevadas de enviuvarem1212. Ramos MP. As transições nos arranjos de vida e as trocas sociais entre idosos no Rio Grande do Sul. RBCEH. 2010;7(3):381-93.. A maior expectativa de vida das mulheres tem sido uma das preocupações destacadas pela Organização Mundial de Saúde, pois as idosas em idades mais avançadas podem apresentar mais deficiências e outros múltiplos problemas de saúde2323. Organização Mundial de Saúde. Mulheres e saúde: evidência de hoje agenda de amanhã. Brasília: Organização Mundial de Saúde; 2009.. Somado a isso, as mulheres com o decorrer da idade ficam mais vulneráveis aos problemas de saúde, ao isolamento social e aos transtornos emocionais2424. Lima LCV, Bueno CMB. Envelhecimento e gênero: a vulnerabilidade de idosas no Brasil. Rev Saúde Pesqui. 2009;2(2):273-80.. Assim, as políticas sociais devem considerar a situação das mulheres idosas, especialmente entre os grupos mais vulneráveis, como as que residem em domicílios unipessoais1717. Sun X, Lucas H, Meng Q, Zhang Y. Associations between living arrangements and health-related quality of life of urban elderly people: a study from China. Qual Life Res. 2011;20:359-69..

Neste estudo, a renda foi outro fator determinante do arranjo domiciliar. O aumento da renda pode funcionar como facilitador do arranjo domiciliar independente, uma vez que contribui para a possibilidade de maior poder de compra de bens de consumo, assim como cobertura de saúde e social mais adequada66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.,1212. Ramos MP. As transições nos arranjos de vida e as trocas sociais entre idosos no Rio Grande do Sul. RBCEH. 2010;7(3):381-93.,2020. Rodrigues NO, Neri AL. Vulnerabilidade social, individual e programática em idosos da comunidade: dados do estudo FIBRA, Campinas, SP, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(8):2129-39., comprovando que os idosos que possuem elevado nível socioeconômico em geral preferem um estilo de vida mais independente66. Camargos MCS, Machado CJ, Rodrigues RN. A relação entre renda e morar sozinho para idosos paulistanos - 2000. Rev Bras Est Pop. 2007;24(1):37-51.. Esses aspectos possivelmente contribuem para a constituição de domicílios unipessoais na população idosa. De modo oposto a esses argumentos, a independência econômica tem sido considerada um aspecto que favorece a corresidência, pois os membros da família muitas vezes vão morar com os idosos na tentativa de se beneficiarem dos recursos financeiros disponíveis1818. Panigrahi AK. Determinants of Living Arrangements of Elderly in Orissa: an analysis. [Internet]. 2009. [Acesso 25 jan 2013] Disponível em: http://www.isec.ac.in/WP%20228%20-%20Akshaya%20Kumar%20Panigrahi.pdf
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. Apesar disso, investigação realizada em Ribeirão Preto - SP identificou que os recursos financeiros não estiveram entre os motivos que levaram a formação do arranjo domiciliar de idosos1515. Pedrazzi EC, Motta TTD, Vendrúscolo TRP, Fabrício-Wehbe SCC, Cruz IR, Rodrigues RAP. Household arrangements of the elder elderly. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2010;18(1):18-25..

É necessário considerar que os estudos sobre os determinantes do arranjo domiciliar geralmente avaliam o desfecho pontualmente - vive sozinho ou acompanhado -, não verificando a dinâmica do arranjo domiciliar em um seguimento. Este fato dificultou a discussão dos nossos achados, mas ao mesmo tempo suscita a necessidade de ampliar os conhecimentos sobre a temática. O entendimento dos determinantes do arranjo domiciliar de idosos pode auxiliar no planejamento de políticas públicas que contribuem para atender as necessidades de saúde desse público e seus familiares77. Rabelo DF, Neri AL. Tipos de configuração familiar e condições de saúde física e psicológica em idosos. Cad Saúde Pública. 2015;31(4):874-84..

Ressalta-se que os determinantes do arranjo domiciliar diferem de acordo com as diversidades cultural, socioeconômica e social entre os países55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30.. Desta forma, a investigação em questão permitiu aproximar o conhecimento desses aspectos para a realidade brasileira, considerando tratar-se de uma amostra populacional de idosos da comunidade de um município do interior de Minas Gerais. Entretanto, os arranjos domiciliares podem variar entre as diversas regiões de um mesmo país55. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Idoso, família e domicílio: uma revisão narrativa sobre a decisão de morar sozinho. Rev Bras Est Pop. 2011;28:217-30., o que denota a necessidade de outros estudos nacionais sobre a temática, com o objetivo de favorecer a concepção de estratégias de saúde mais específicas ao contexto brasileiro.

Este estudo apresenta como possível limitação à perda da amostra durante o seguimento. Apesar dessa perda, a possibilidade de ocorrência do vício de seleção está minimizada, considerando-se que foram entrevistados todos os idosos que atenderam os critérios de inclusão durante o período da investigação.

Outras invetigações em escala ampliada são sugeridas, , de preferência multicêntricas, com o objetivo de verificar os determinantes do arranjo domiciliar de idosos levando-se em conta as particularidades sociodemográfica, social e cultural de cada contexto.

Conclusão

A presente investigação identificou as características do arranjo domiciliar e seus determinantes sociodemográficos e de saúde. Verificou-se dentre os idosos do sexo feminino e com 80 anos ou mais que o maior percentual referiu-se àquelas que residem sozinhas, durante o seguimento. O número de morbidades aumentou nos três grupos ao longo do estudo, com maiores taxas no grupo de idosos que mudaram a dinâmica do arranjo domiciliar. O sexo e a renda foram determinantes do arranjo domiciliar, porém as variáveis de saúde não estiveram associadas ao desfecho analisado.

Acredita-se que os achados desta investigação podem contribuir para o planejamento e a gestão de políticas sociais e de saúde que objetivam assistir a população idosa nos diferentes contextos em termos de arranjo domiciliar. É premente considerar os idosos mais vulneráveis como aqueles que residem sozinhos, do sexo feminino, com idades mais avançadas, que apresentam menor renda e com condições crônicas de saúde.

No contexto da Estratégia Saúde da Família (ESF), o enfermeiro tem o espaço domiciliar como lócus privilegiado para verificar as necessidades de cuidado e a maneira pela qual o idoso e a sua família enfrentam as dificuldades na vida cotidiana. Para a identificação dos grupos mais vulneráveis e que precisam ser priorizados nas visitas domiciliares, o enfermeiro pode lançar mão dos recursos disponíveis no processo de trabalho das ESF, por exemplo, a avaliação do risco familiar. Outros instrumentos promissores para o planejamento e a execução do cuidado à saúde são o genograma e o ecomapa que possibilitam a visualização dos recursos formais e informais disponíveis ao idoso e sua família.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2015
  • Aceito
    19 Dez 2015
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