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Violência nas relações íntimas entre adolescentes de região de alta vulnerabilidade social* * Supported by Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Projeto Universal - Grant # 233534/2014-8, Brazil.

Resumos

Objetivo:

conhecer e analisar as percepções de adolescentes de alta vulnerabilidade social frente à construção de relações de intimidade violentas.

Método:

pesquisa qualitativa realizada junto a 19 adolescentes de um município central de São Paulo, Brasil. A coleta de dados se deu por meio de grupos focais e diário de campo, sendo os dados analisados tematicamente.

Resultados:

emergiram duas categorias “Uma nova postura feminina em um contexto de normas tradicionais de gênero” e “Violências nas relações íntimas: a (não) percepção dos adolescentes”. Normas tradicionais de gênero ainda ocupam um lugar significativo no delineamento de relações entre adolescentes. Tais condutas são mais visíveis em relações de namoro, quando o compromisso e a exclusividade são tidos como principais características, autorizando a posse e o controle. O ciúme emerge como principal disparador de violência e as tecnologias aparecem como recursos contemporâneos para reforçá-la.

Conclusão:

reitera-se a necessidade de intervenções precoces junto a adolescentes, com foco em ações promotoras de equidade de gênero.

Descritores:
Violência por Parceiro Íntimo; Adolescente; Violência de Gênero; Populações Vulneráveis; Vulnerabilidade Social; Pesquisa Qualitativa


Objective:

to know and analyze the perceptions of adolescents with high social vulnerability regarding the establishment of dating violence.

Method:

a qualitative research study carried out with 19 adolescents from a central municipality São Paulo, Brazil. Data collection took place by means of focus groups and field diaries, with the data being analyzed thematically.

Results:

two categories emerged: “A new female posture in a context of traditional gender norms” and “Violence in intimate relationships: the (non)perception of adolescents”. Traditional gender norms still occupy a significant place in the design of dating violence among adolescents. Such behaviors are more visible in these relationships, when commitment and exclusivity are seen as the main characteristics, authorizing possession and control. Jealousy emerges as the main trigger for violence and the technologies appear as contemporary resources to reinforce it.

Conclusion:

the need for early interventions with adolescents is reiterated, with a focus on actions that promote gender equality.

Descriptors:
Intimate Partner Violence; Adolescent; Gender-Based Violence; Vulnerable Populations; Social Vulnerability; Qualitative Research


Objetivo:

conocer y analizar las percepciones de adolescentes con alta vulnerabilidad social sobre la construcción de relaciones de pareja violentas.

Método:

investigación cualitativa realizada con 19 adolescentes de un municipio central de São Paulo, Brasil. La recolección de datos se llevó a cabo a través de grupos focales y un diario de campo, y los datos se analizaron temáticamente.

Resultados:

surgieron dos categorías: “Una nueva postura femenina en un contexto de normas tradicionales de género” y “Violencia en las relaciones íntimas: la (no) percepción de los adolescentes”. Las normas tradicionales de género todavía ocupan un lugar importante en la configuración de las relaciones entre los adolescentes. Tales comportamientos son más visibles en los noviazgos, cuando el compromiso y la exclusividad son las principales características, autorizando la posesión y el control. Los celos surgen como el principal detonante de la violencia y la tecnología aparece como recurso contemporáneo para reforzarla.

Conclusión:

se recalca que es necesario realizar intervenciones precoces con los adolescentes, centradas en acciones que promuevan la equidad de género.

Descriptores:
Violencia de Pareja; Adolescente; Violencia de Género; Poblaciones Vulnerables; Vulnerabilidad Social; Investigación Cualitativa


Introdução

Nos últimos anos, estudos têm denotado importância à violência nas relações de intimidade (VRI) entre os adolescentes(11 Flach RMD, Deslandes SF. Cyber dating abuse in affective and sexual relationships: a literature review. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2017 [cited 2021 Mar 05];33(7):e00138516. Available from: https://doi.org/10.1590/0102-311X00138516
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2 Moreira JO, Lima NL, Stengel M, Pena BF, Salomão CS. Cybernetic love exposure: should love be public or intimate?. Arq Bras Psicol. [Internet]. 2017 [cited 2021 Mar 05];69(1):5-18. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672017000100002
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3 Ouytsel JV, Ponnet K, Walrave M. Cyber Dating Abuse Victimization Among Secondary School Students From a Lifestyle-Routine Activities Theory Perspective. J Interpers Violence. 2018;33(17):2767-76. doi: https://doi.org/10.1177/0886260516629390
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-44 Stonard KE, Bowen E, Walker K, Price SA. “They’ll Always Find a Way to Get to You”: Technology Use in Adolescent Romantic Relationships and Its Role in Dating Violence and Abuse. J Interpers Violence. 2017;32(14). doi: https://doi.org/10.1177/0886260515590787
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). Tal relevância se faz por alguns fatores, entre eles o estabelecimento precoce de relações de intimidade não saudáveis na vida das pessoas(55 Centers for Disease Control - CDC. Experience Violence, Centers for Disease Control and Prevention National Center for HIV/AIDS, Viral Hepatitis, STD, and TB Prevention, Division of Adolescent and School Health. Youth Risk Behavior Survey - Data summary & trends report 2009-2019. [Internet]. Atlanta, GA: CDC; 2019 [cited 2021 Jul 01];86(8). Available from: https://www.cdc.gov/healthyyouth/data/yrbs/pdf/YRBSDataSummaryTrendsReport2019-508.pdf
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), bem como as construções sócio-culturais sobre as relações de gênero.

Vários termos têm sido usados na literatura para conceituar a VRI entre adolescentes, e internacionalmente tem-se utlizado o termo teen dating violence. É considerada como a violência física, sexual, psicológica ou emocional em uma relação de namoro, incluindo a perseguição. É importante evidenciar que esta violência pode ocorrer pessoalmente ou por meios eletrônicos, bem como entre parceiros íntimos eventuais ou formais(55 Centers for Disease Control - CDC. Experience Violence, Centers for Disease Control and Prevention National Center for HIV/AIDS, Viral Hepatitis, STD, and TB Prevention, Division of Adolescent and School Health. Youth Risk Behavior Survey - Data summary & trends report 2009-2019. [Internet]. Atlanta, GA: CDC; 2019 [cited 2021 Jul 01];86(8). Available from: https://www.cdc.gov/healthyyouth/data/yrbs/pdf/YRBSDataSummaryTrendsReport2019-508.pdf
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).

A VRI entre adolescentes é um fenômeno comum e transversal às diferentes culturas, raças e etnias. Estudo transversal descritivo teve como participantes 403 adolescentes, entre 14 e 19 anos, que relataram ter perpetrado algum tipo de violência nas relações afetivo-sexuais na adolescência (62,4% sexo feminino), de estudantes do ensino médio de escolas públicas (64,5%), privadas (18,2%) e profissionalizantes (17,3%), da Região Metropolitana de Porto Alegre, Brasil(66 Lessinger Borges J, Assumpção Heine J, Dell’Aglio DD. Variables personales y contextuales predictivas de perpetración de violencia en el noviazgo en la adolescencia. Acta Colomb Psicol. [Internet]. 2020 [cited 2021 Jul 1];23(2):438-69. Available from: https://actacolombianapsicologia.ucatolica.edu.co/article/view/2313
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). Metanálise com dados de 46 países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento indicou que mulheres jovens e vivendo em areas rurais eram mais expostas à violência por parceiros íntimos(77 Coll CVN, Ewerling F, García-Moreno C, Hellwig F, Barros AJD. Intimate partner violence in 46 low-income and middle-income countries: an appraisal of the most vulnerable groups of women using national health surveys. BMJ Glob Health. 2020 Jan 26;5(1):e002208. doi: http://doi.org/10.1136/bmjgh-2019-002208
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). Estudo com 930 adolescentes gestantes negras e latinas encontrou que 38% experienciaram VRI no último trimestre de gestação(88 Thomas JL, Lewis JB, Martinez I, Cunningham SD, Siddique M, Tobin JN, Ickovics JR. Associations between intimate partner violence profiles and mental health among low-income, urban pregnant adolescents. BMC Pregnancy Childbirth. 2019 Apr 26;19(1):120. doi: http://doi.org/10.1186/s12884-019-2256-0
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). Estudo conduzido em 27 países da África subsaariana encontrou que uma mediana de 25,2% de adolescentes e jovens mulheres reportaram VRI, chegando a 43,3% em alguns países(99 Wado YD, Mutua MK, Mohiddin A, Ijadunola MY, Faye C, Coll CVN, et al. Intimate partner violence against adolescents and young women in sub-Saharan Africa: who is most vulnerable? Reprod Health. 2021 Jun 17;18(Suppl 1):119. doi: http://doi.org/10.1186/s12978-021-01077-z
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).

A VRI traz consequências à saúde física e mental dos adolescentes, a curto e longo espaço de tempo. Revisão sistemática de literatura demonstrou que é associada com problemas como depressão, ansiedade, baixa autoestima, abuso de álcool e drogas e relações sexuais desprotegidas(1010 Taquette SR, Monteiro DLM. Causes and consequences of adolescent dating violence: a systematic review. J Inj Violence Res. 2019;11(2):137-47. doi: https://doi.org/10.5249/jivr.v11i2.1061
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). Além disso, os adolescentes envolvidos em abusos durante o namoro têm maior probabilidade de estarem envolvidos em relações violentas na fase adulta(1111 Ybarra ML, Langhinrichsen-Rohling J. Linkages between violence-associated attitudes and psychological, physical, and sexual dating abuse perpetration and victimization among male and female adolescents. Aggress Behav. 2019;45(6):622-34. doi: https://doi.org/10.1002/ab.21856
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).

A compreensão e consequente prevenção e enfrentamento à violência são tarefas desafiadoras e complexas, uma vez que traz raízes em fatores sociais, econômicos e culturais - como normas de gênero sexistas - e que, por sua vez, influenciam o cotidiano das comunidades, das famílias e o modo como essas relações são vivenciadas pelos adolescentes(1212 Meiksin R, Campbell R, Crichton J, Morgan GS, Williams P, Willmott M, et al. Implementing a whole-school relationships and sex education intervention to prevent dating and relationship violence: evidence from a pilot trial in English secondary schools. Sex Educ. 2020;20(6):1-17. doi: https://doi.org/10.1080/14681811.2020.1729718
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). Neste sentido, para a compreensão da violência, a Organização Mundial da Saúde (OMS) propõe um modelo ecológico, que está baseado na evidência de que nenhum fator singular pode explicar o maior risco e vulnerabilidade de algumas pessoas ou grupos à violência interpessoal, enquanto outros são mais protegidos dela. Assim, entende-se este fenômeno como resultado da interação de múltiplos fatores em quatro níveis - individual, relacional, comunitário e social(1313 Wang AY, Pannell M. Understanding and managing intimate partner violence in the pediatric primary care setting: a review. Curr Opin Pediatr. 2019;31(5):683-90. doi: https://doi.org/10.1097/MOP.0000000000000818
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).

Considerando o modelo ecológico, destaca-se o olhar para contextos de vulnerabilidade social, entendido ser aqueles com a ausência de elementos como renda, escolaridade, possibilidades de inserção no mercado de trabalho, acesso a bens e serviços(1414 Fundação Seade. Índice Paulista de Vulnerabilidade Social. [Internet]. São Paulo: Fundação Seade; 2010 [cited 2021 Mar 05]. Available from: http://ipvs.seade.gov.br/view/index.php
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). Ainda, podem ser incluídas neste conceito as fragilidades dos vínculos afetivo-relacionais. Considerar a vulnerabilidade e seus fatores determinantes, tanto em seus aspectos éticos, políticos e técnicos contornando a incidência de riscos nos territórios, é imprescindível para que os sujeitos, a partir das suas capacidades e empoderamento, possam enfrentar estas vulnerabilidades impostas no cotidiano(1515 Carmo ME, Guizardi FL. The concept of vulnerability and its meanings for public policies in health and social welfare. Cad Saúde Pública. 2018;34(3):e00101417. doi: http://doi.org/10.1590/0102-311X00101417
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).

Estar em contexto de vulnerabilidade social pode expor adolescentes a situações de violência e tem impactos em vários níveis. Recente revisão de literatura sobre causas e consequências da VRI trouxe que a pobreza é apontada como fator importante para a prevalência de VRI entre adolescentes(1010 Taquette SR, Monteiro DLM. Causes and consequences of adolescent dating violence: a systematic review. J Inj Violence Res. 2019;11(2):137-47. doi: https://doi.org/10.5249/jivr.v11i2.1061
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). Evidências ainda sugerem que o estresse financeiro e baixa renda também aumentam o risco para VRI(1616 Niolon PH, Kearns M, Dills J, Rambo K, Irving S, Armstead TL, et al. Preventing Intimate Partner Violence Across the Lifespan: A Technical Package of Programs, Policies and Practices. [Internet]. Atlanta, GA: Centers for Disease Control and Prevention; 2017 [cited 2021 Mar 05]. Available from: https://www.cdc.gov/violenceprevention/pdf/ipv-technicalpackages.pdf
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). Reduzir estas situações pode diminuir as possibilidades de conflitos relacionais(1717 Andrade TA, Sampaio MA, Donard V. Analysis of the scientific production on digital dating violence among adolescents: A systematic review. Psico [Internet]. 2020 Dec [cited 2021 Jul 1];51(4):e34318. Available from: https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/revistapsico/article/view/34318
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). Além deste aspecto, é importante citar que regiões de alta vulnerabilidade social são mais propensas a inequidades de gênero na educação, emprego e renda, sobretudo amparadas pela cultura patriarcal e a relação de poder entre homens e mulheres(1010 Taquette SR, Monteiro DLM. Causes and consequences of adolescent dating violence: a systematic review. J Inj Violence Res. 2019;11(2):137-47. doi: https://doi.org/10.5249/jivr.v11i2.1061
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).

Considerando a relevância e o impacto da VRI entre adolescentes, sobretudo aqueles inseridos em contextos de alta vulnerabilidade social, bem como a importância da compreensão deste fenômeno a partir do modelo ecológico, teve-se a seguinte questão de pesquisa: Quais as percepções de adolescentes de alta vulnerabilidade social frente às suas relações de intimidade, considerando aspectos saudáveis e violentos?

Portanto, este estudo teve como objetivo conhecer e analisar as percepções de adolescentes de alta vulnerabilidade social frente à construção de relações de intimidade violentas.

Método

Delineamento do estudo

Pesquisa de abordagem qualitativa(1818 Flick U. An introduction to qualitative research. 6th ed. Los Angeles, CA: Sage Publication; 2019.). Conforme já sinalizado, foi ancorada no modelo ecológico de compreensão da violência, proposto pela OMS. Este estudo seguiu as Diretrizes de Critérios Consolidados para Relatos de Pesquisa Qualitativa - COREQ(1919 Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. [Internet]. 2007 [cited 2020 Jun 26];19(6):349-57. Available from: https://academic.oup.com/intqhc/article/19/6/349/1791966/Consolidated-criteria-for-reporting-qualitative
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).

Local e participantes do estudo

O estudo foi realizado em um município da Região Central do estado de São Paulo, Brasil, que possui 221.950 habitantes de acordo com censo de 2010, com estimativa para 2018 de 249.415 habitantes.

Foi selecionada uma escola em bairro periférico, caracterizado como grupo exposto a alta vulnerabilidade social para um setor urbano, sendo classificada como categoria 5 (cinco) de acordo com o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS) de 2010(1414 Fundação Seade. Índice Paulista de Vulnerabilidade Social. [Internet]. São Paulo: Fundação Seade; 2010 [cited 2021 Mar 05]. Available from: http://ipvs.seade.gov.br/view/index.php
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).

Os participantes do estudo foram estudantes do 8° ano e 9º ano do ensino fundamental, regularmente matriculados e frequentando a escola selecionada. Participaram todos aqueles que aceitaram voluntariamente estar no estudo, assinando o Termo de Assentimento e Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo responsável. No caso do mesmo ser maior de 18 anos, assinava um TCLE. Justifica-se a escolha por este período por ser um momento de experimentação de relações de intimidade(2020 Carlos M, Campeiz AB, Silva LJ, Fernandes MID, Leitão MNC, Silva MAI, et al. School-based interventions for teen dating violence prevention: integrative literature review. Rev Enferm Ref. 2017;IV(14):133-46. doi: https://doi.org/10.12707/RIV17030
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). A escolha pela inclusão por período de ensino (8º e 9º ano) e não faixa etária foi coerente com o conceito ecológico de compreensão/atuação frente à violência proposto pela OMS.

No período do estudo, havia 140 estudantes matriculados; destes, 34 optaram por participar do estudo. Foram excluídos sete estudantes que não comparecerem durante a coleta de dados; dois que foram transferidos para outra escola; e seis que não trouxeram os termos assinados. Apesar de não participarem da pesquisa, estes estudantes foram ouvidos por meio da participação em projeto de extensão.

Procedimentos para coleta dos dados

Foram utilizados como instrumentos para coleta de dados os grupos focais e o diário de campo. Para caracterização dos participantes, foi utilizado um questionário de caracterização socioeconômica e de relações íntimas.

O grupo focal se coloca como estratégia importante para pesquisas que buscam a compreensão de experiências grupais e transformação da realidade(2121 Kinalski DDF, Paula CC, Padoin SMM, Neves ET, Kleinubing RE, Cortes LF. Focus group on qualitative research: experience report. Rev Bras Enferm. 2017;70(2):424-9. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0091
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). Os grupos focais tiveram a última autora como moderadora; a primeira autora como observadora e a segunda autora como relatora. Esclarece-se que o grupo de pesquisadores participa do convívio escolar por meio de um projeto de extensão universitária, facilitando a aproximação dos adolescentes.

Os estudantes foram convidados para esta participação voluntária; foram utilizadas as seguintes questões norteadoras: Como são as relações de intimidade entre adolescentes? Quais comportamentos são positivos e quais são prejudiciais nestas relações?

Dois grupos focais foram realizados nos dias 17/06/2019 e 19/06/2019 com 10 adolescentes do sexo biológico feminino, que foram convidadas nas turmas dos 8º e 9º anos; buscou-se manter uma quantidade equitativa entre as turmas. O primeiro grupo teve por objetivo uma ambientação ao estudo, com apresentação das participantes e discussão da primeira questão disparadora. O segundo grupo foi iniciado com uma análise do primeiro grupo para validação da compreensão pelas participantes; posteriormente a segunda questão foi disparada, com aprofundamento da presença de elementos relacionados à VRI. A realização do grupo ocorreu em sala privativa da escola, sendo organizada em roda com mesas e cadeiras. No começo foram feitas placas com os nomes de cada integrante, para que todas na roda se reconhecessem. A maioria das meninas se mostraram participativas durante os grupos, que tiveram a duração média de 1 hora, 7 minutos e 55 segundos.

Outros dois grupos focais foram realizados nos dias 25/10/2019 e 29/10/2019 com 09 adolescentes do sexo biológico masculino que foram convidados; buscou-se também manter uma quantidade equitativa entre as turmas. A operacionalização ocorreu da mesma maneira que os primeiros grupos, tendo a duração média de 52 minutos e 7 segundos. Os participantes foram identificados com a letra PF para participantes do sexo biológico feminino e PM para participantes do sexo biológico masculino; foram enumerados a partir da sequência em que suas falas apareceram no grupo.

Os grupos foram gravados em aplicativo para gravação de voz em dois celulares, dispostos ao longo da sala; posteriormente as gravações foram transcritas na íntegra para análise. Optou-se por realizar grupos separados a partir de sexos biológicos por indicação de literatura; é referido que adolescentes mais jovens podem se sentir constrangidos em trazer experiências frente a participantes de sexos diferentes do seu(2020 Carlos M, Campeiz AB, Silva LJ, Fernandes MID, Leitão MNC, Silva MAI, et al. School-based interventions for teen dating violence prevention: integrative literature review. Rev Enferm Ref. 2017;IV(14):133-46. doi: https://doi.org/10.12707/RIV17030
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). O diário de campo se constituiu como instrumento relevante para análise de dados e para o rigor metodológico. Nele foram descritos as experiências investigativas; apropriação metodológica; movimentos, dúvidas e inquietações; reações dos participantes. Neste sentido, os relatos presentes no diário de campo foram incorporados às transcrições dos grupos, constituindo o corpus para análise e apoiando as inferências realizadas.

Optou-se neste estudo por buscar a saturação de significado, que corresponde a uma discussão mais profunda, rica em detalhes e complexa com os dados para assegurar a compreensão de um fenômeno de interesse(2222 Hennink MM, Kaiser BN, Marconi VC. Code Saturation Versus Meaning Saturation: How Many Interviews Are Enough? Qual Health Res. 2017;27(4):591-608. doi: https://doi.org/10.1177/1049732316665344
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).

Análise dos dados

A caracterização dos participantes foi apresentada por meio de estatística descritiva. Os dados qualitativos foram analisados a partir da técnica de análise temática reflexiva(2323 Clarke V, Braun V. Reflecting on reflexive thematic analysis. Qual Res Sport Exerc Health. 2019;11(4):589-97. doi: http://doi.org/10.1080/2159676X.2019.162880623
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). A análise temática é essencialmente um método para identificar e analisar padrões de dados qualitativos. Foram seguidos os seguintes passos para análise: (I) familiarização com os dados; (II) codificação; (III) busca por temas; (IV) revisão de temas; (V) definição e nomeação dos temas; (VI) escrita final. As etapas III e IV são situadas na Figura 1.

Figura 1
Processo de busca e revisão de temas. 2020

Para garantir maior confiabilidade dos dados, foi realizada a devolutiva das transcrições dos grupos aos adolescentes participantes após uma semana da realização do grupo, para checagem, a fim de que indicassem se concordavam ou desejavam acrescentar algo à construção grupal. Foi realizada em relatório impresso individual, com espaço em branco para acréscimos ou aprofundamento de questões; nenhum adolescente trouxe adição aos relatos. A construção de códigos iniciais, intermediários e temas finais ocorreu entre dois pesquisadores independentes, sendo que um terceiro foi acionado para resolução de conflitos.

Aspectos éticos

O estudo seguiu as recomendações das Resoluções nº 466/2012 e 510/2016 sobre pesquisa envolvendo seres humanos, sendo iniciado apenas após a aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos. Os dirigentes da escola selecionada foram consultados previamente sobre a autorização da pesquisa.

Resultados

Os grupos focais foram realizados junto a 19 participantes, sendo 09 meninos e 10 meninas. Destes participantes, a média de idade foi de 14,27 anos, variando entre 13 e 15 anos; 63,1% se declararam evangélicos; 68,4% dos participantes moravam com a mãe e irmãos e 47,3% moravam também com o pai. Com relação à habitação, 52,6% moravam com 4 a 6 pessoas, e 63,1% residiam em casa com 4 a 6 cômodos. Com relação à escolaridade dos responsáveis, 63,1% referiram ensino médio completo.

Sobre as relações íntimas estabelecidas, 68,4% referiram já ter namorado ou ficado com pessoas de sexo biológico diferentes, sendo que cinco adolescentes referiram ficar ou namorar pessoas do mesmo sexo biológico. A maior parte dos adolescentes (47,3%) iniciou relações intimas entre 11 e 12 anos, e 47,3% já iniciaram relações sexuais com parceiros de sexo biológico diferente. Os adolescentes referiram discutir poucas vezes com a pessoa com quem se relacionam atualmente (47,3%); 21% se referiram vítima de violência, sendo um por violência física e três por psicológica; e 36,8% se referiram perpetradores de violência, sendo dois de violência física e cinco de violência psicológica.

Tema 1 - Uma nova postura feminina em um contexto de normas tradicionais de gênero

Nesta categoria foi discutida uma “nova postura feminina” conforme sinalizado pelos adolescentes, e os sentidos para cada identidade de gênero, bastante particulares e reveladores da manutenção de normas tradicionais de gênero junto a adolescentes em vulnerabilidade social. As adolescentes mostraram assumir uma postura socialmente validada como masculina que é de pegar, chegar, ter a iniciativa:

Os meninos chegam mais, mas eles têm mais medo e são mais frescurentos (PF4).

Não sempre, os meninos não têm muita postura e nem muita atitude, eu acho que as mulheres que chegam mais (PF7).

Homem tem que ser linchado, temos que viver só em mulher (PF7).

A aversão aos homens, expressa diretamente na última fala, emerge relacionada a esta nova postura. Desvela-se uma ruptura na relação agressor-vítima, numa sociedade em que frequentemente as mulheres são vítimas e os homens agressores:

Eu bato (PF9).

Bato não, espanco (PF3).

Pelo olhar dos adolescentes do sexo biológico masculino, essa outra postura feminina é trazida com um teor pejorativo e preconceituoso; mostram-se resistentes na aceitação de tomada de decisões ou iniciativa nas relações por parte de pessoas do sexo biológico feminino:

E tem umas que, vou falar a verdade, safada (PM3).

Ah, joga a bunda na cara (PM2).

Tem umas que nois nem precisa fazer nada, ela já faz por você (PM2).

Fica dançando na frente dos outros (PM3).

Ter atitude, ou seja, romper com a lógica passiva feminina causa espanto e estranhamento nos meninos, visto que não é um comportamento aceito socialmente sobre a postura feminina. Esta postura, em especial identificada em adolescentes que namoram, perpassa estas compreensões - de que meninas devem se colocar de maneira inferior e submissa:

Mas vou falar a verdade aqui nessa escola tem umas meninas que nem se põe no seu respeito (PM2).

Nós temos que ter a postura, e ela tem que ter a postura dela, se pôr no lugar dela, que ela namora (PM1).

Os adolescentes ainda trouxeram questões relacionadas às roupas usadas pelas adolescentes, muito articuladas ao julgamento destas; ainda colocam-nas no lugar de posse, que sempre precisam estar acompanhadas dos parceiros:

Ou ela sai com um shortinho assim, não sei o que, sem estar com você do lado (PM3).

Ah, quando eu ando com ela eu já ando logo atrás dela já, pra ninguém ficar olhando (PM3).

Percebe-se que os corpos femininos não podem dançar, não podem se mostrar, precisam se “por no lugar”. Existe um lugar que é para eles e outro para elas, marcando as diferenças. A mulher permanece no lugar privado, apenas encontrando saída pelas redes sociais; pontuaram o espaço dos meninos como público e exteriorizado, inclusive sinalizado por pais e/ou responsáveis:

Ah, é porque o menino sai mais pra jogar bola, a mina não, ela fica só aqui no celular (PM2).

Minha mãe fala... ah senta que nem moça... que jogar bola é para menino... a gente sente errada (PF4).

Tema 2 - Violências nas relações íntimas: a (não) percepção dos adolescentes

Nesta categoria, foi discutido como se estabelecem as relações íntimas entre adolescentes e os elementos presentes nelas que levam à construção de relações violentas. Os adolescentes trouxeram o termo crush para identificar situações de atração por outra pessoa, sem necessidade do estabelecimento de uma relação física próxima ou mesmo concreta:

Significa que ele é bonito, e que eu quero ficar com ele, é isso (PF3).

Tipo, pode ser você viu uma menina, e você acha ela bonita, só que você nunca trocou um papo com ela, nunca conversou, não sabe sobre as conversa dela, mas tipo você achou ela bonita, e achou ela um crush pra você, aí você começa a gostar dela (PM5).

A partir dessa definição pode ocorrer a efetividade da relação ou não. Em caso de efetividade da relação os adolescentes relatam o “ficar” como uma forma de relação rápida, caracterizada pela ausência de compromissos e acordos:

A gente fica com o menino, depois a gente vê ele na rua e na verdade finge que nem vê (PF7).

É, fica só aquele dia (PM3).

Com a progressão das relações, pode surgir o namoro, relação que se caracteriza por exclusividade e maior compromisso. Neste momento, emerge com transparência a existência de VRI, caracterizada pelo controle e necessidades de abandono de outras atividades que não sejam realizadas com o/a parceiro/a:

Ah, o namoro você vai ter sempre ela ali do seu lado (PM2).

É, vai ser fiel (PM3).

Sei lá, você não pode ir pro bailão (PM3).

Aí, já é cortar tudo também… Porque tem muitos homens também que não deixa né (PM3).

Quer dominar a mulher (PM1).

O compromisso permite o controle do que o outro faz e para onde vai, sendo que nas mulheres isso é mais forte - em especial pelo sentido de posse. Os acordos realizados no início das relações perpassam por questões não saudáveis, como a não privacidade, o afastamento ou não manutenção de amigos de sexos diferentes. Estas questões são exemplificadas a partir do mundo virtual:

Sim, quando eu comecei a namorar o acordo era, eu só aceito menino no meu face e ela só aceita menina no face dela, mais nada! Conversar, é só se for amigo assim, conhecido, esses negócio (PM1).

Eu confio, porque além de tudo eu tenho a senha das coisas dela (PM2).

Sim, quando começamos a namorar combinamos, você passa sua senha, e eu passo a minha (PM2).

Ela deixa o celular desbloqueado, eu vou lá e mexo (PM3).

Neste sentido, percebeu-se uma dificuldade que esses adolescentes possuem de discernir questões íntimas, privadas e públicas. Ocorre uma existência pautada na dependência do outro/a:

Eu fico o tempo todo no celular, quero saber o que ele faz sempre (PF9).

E também dona, tem gente que faz fake só pra vigiar o namorado né [O grupo concorda] (PF5).

Evidencia-se o controle do outro entendido como fruto desse relacionamento sério e relação de confiança, mas na verdade a relação é abusiva. O ciúme é presente nas relações e contribui para o aumento de ações violentas nos relacionamentos. Os adolescentes demonstraram que o ciúme faz parte das relações e algumas vezes é considerado como forma de afeto e carinho nos relacionamentos.

O ciúmes é normal gente… (PF9).

Não, não existe ciúmes sabe? É medo de perder a pessoa (PM7).

É porque sem o ciúme não dá pra levar (PM3).

É, ciúme é uma coisa maior diferente, você gosta daquela pessoa, aquela pessoa só quer você (PM2).

Briga começa a partir do ciúmes (PM1).

O ciúme emerge como um disparador de violências, só que não há percepção direta quanto a isso. As afirmações sobre ciúmes estão comumente ligadas às redes sociais. Estas situações aparecem novamente relacionadas ao sentimento de posse e controle do outro/a:

Uma vez eu quebrei o celular (PF 8).

E se uma menina comenta a foto do facebook então? (PF10).

Eu curto o comentário (PF7).

Eu já xingo a menina (PF9).

[Sobre vigilia constante do parceiro no Facebook] Você só ta deixando um aviso ué, que ele é seu! (PF3).

Ao longo dos encontros com os adolescentes, percebeu-se nas relações heterossexuais uma disputa entre as adolescentes. Quando se sentiam enciumadas, geralmente se voltavam contra a possível menina “traidora”. Ao discutir a importância da confiança para construção de relações saudáveis, os adolescentes desvelaram que esta deve ser testada e comprovada, mantendo um olhar que perpassa por questões não saudáveis:

Ah, confiança se constrói né dona! (PM1).

Tem que provar que é confíável (PM3).

Com sua postura né dona! (PM1).

É, e no começo você sempre tem que desconfiar mesmo (PM8).

Discussão

Os achados deste estudo permitiram acessar que os significados do ser homem e mulher têm implicação direta na construção de relações de intimidade violentas entre os adolescentes em vulnerabilidade social. Emergiu uma postura feminina que busca romper com estereótipos socialmente construídos, mesmo que por vias violentas e não saudáveis. Uma perspectiva ainda engessada, principalmente pelos meninos, diferencia as posturas de ser homem e mulher, inclusive com a delimitação de lugares diferentes a serem ocupados. A VRI aparece de forma mais transparente nas relações de namoro, em que o compromisso permite o controle e a posse. O ciúme é inerente às relações e à construção de confiança, sendo disparador de violências veladas pelos adolescentes; as redes sociais são transversais a estas relações. Neste aspecto, percebe-se a dialógica do ciúme como amor e briga, confiança e violência.

Considerando o exposto, é inevitável a discussão sobre gênero no âmbito da VRI; esta questão perpassa este estudo. As expectativas dos papéis do ser homem e ser mulher na sociedade brasileira, presentes no nível social, mas com consequências diretas nos demais, são reforçadas pelos adolescentes. Normas tradicionais de gênero endossam crenças de que homens devem estar em posição social dominante que lhes dão privilégios e poder sobre as mulheres(2424 Campeiz AB, Carlos DM, Campeiz AF, Silva JL, Freitas LA, Ferriani MGC. Violence in intimate relationships from the point of view of adolescents: perspectives of the Complexity Paradigm. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2020 Jul 13 [cited 2021 Jul 1];54:e03575. Available from: https://www.revistas.usp.br/reeusp/article/view/182249
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).

Uma discussão reconhecida pela literatura é a transmissão intergeracional destas normas. Estudos têm abordado tal discussão, sobre a reprodução de uma cultura que favorece a desigualdade entre gêneros e consequentemente situações de violência(66 Lessinger Borges J, Assumpção Heine J, Dell’Aglio DD. Variables personales y contextuales predictivas de perpetración de violencia en el noviazgo en la adolescencia. Acta Colomb Psicol. [Internet]. 2020 [cited 2021 Jul 1];23(2):438-69. Available from: https://actacolombianapsicologia.ucatolica.edu.co/article/view/2313
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,2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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). Um estudo examinou a influência intergeracional na qualidade das relações íntimas entre adolescentes a partir de experiências de suas mães. Nele, as adolescentes apreendem dinâmicas a partir da observação de suas mães, conduzindo à continuidade intergeracional de relações saudáveis ou violentas. Esta teoria postula a repetição de modelos de comportamentos que os adolescentes observaram nas relações de seus pais(2626 Goldberg RE, Tienda M, Eilers M, McLanahan SS. Adolescent Relationship Quality: Is There an Intergenerational Link?. J Marriage Fam. 2019;81(4):812-29. doi: https://doi.org/10.1111/jomf.12578
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). Olhares para as famílias destes adolescentes podem colaborar no avanço deste conhecimento e na compreensão de como as diferenças de gênero se constroem na dinâmica familiar.

Ressalta-se a diversidade aqui encontrada - adolescentes brasileiros que vivem em região urbana de alta vulnerabilidade. Estudos internacionais têm abordado estas diferenças de compreensão e enfrentamento que podem trazer avanços no conhecimento da VRI entre adolescentes(2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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,2727 Garthe RC, Gorman-Smith D, Gregory JR, Schoeny ME. Neighborhood Concentrated Disadvantage and Dating Violence among Urban Adolescents: The Mediating Role of Neighborhood Social Processes. Am J Community Psychol. 2018;61(3-4):310-20. doi: https://doi.org/10.1002/ajcp.12239
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); no Brasil, a discussão ainda é incipiente(2020 Carlos M, Campeiz AB, Silva LJ, Fernandes MID, Leitão MNC, Silva MAI, et al. School-based interventions for teen dating violence prevention: integrative literature review. Rev Enferm Ref. 2017;IV(14):133-46. doi: https://doi.org/10.12707/RIV17030
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). Revisão de literatura com metanálise identificou que maiores taxas de vitimização e perpetração de VRI física entre adolescentes foram encontradas em amostras de vizinhanças com menores recursos (vínculos sociais fragilizados, menor controle social, menores oportunidades econômicas) e com maior percentagem de minorias étnicas para as meninas(2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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).

Um estudo sobre a relação comunitária e os processos de experimentação de VRI entre adolescentes e jovens nos Estados Unidos(2727 Garthe RC, Gorman-Smith D, Gregory JR, Schoeny ME. Neighborhood Concentrated Disadvantage and Dating Violence among Urban Adolescents: The Mediating Role of Neighborhood Social Processes. Am J Community Psychol. 2018;61(3-4):310-20. doi: https://doi.org/10.1002/ajcp.12239
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) trouxe que adolescentes que residem em bairros cujos moradores intervêm ou desencorajam comportamentos violentos têm menores chances de experimentar a VRI. Já no sentido da coesão social, o estudo discutiu que bairros em condições desfavorecidas tendem a enfraquecer ou limitar laços sociais, reduzindo a possibilidade do indivíduo buscar ajuda ou utilizar recursos sociais para prevenção da violência. Áreas menos favorecidas podem estar mais expostas a fatores de risco da VRI, podendo ver a violência com uma resposta esperada, tolerada ou necessária(2727 Garthe RC, Gorman-Smith D, Gregory JR, Schoeny ME. Neighborhood Concentrated Disadvantage and Dating Violence among Urban Adolescents: The Mediating Role of Neighborhood Social Processes. Am J Community Psychol. 2018;61(3-4):310-20. doi: https://doi.org/10.1002/ajcp.12239
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).

As adolescentes trazem um movimento de liberdade e busca por superação dos estereótipos da feminilidade. Estes aspectos se dão, em sua maioria, por vias não saudáveis, seja na aversão e rejeição aos meninos, como pela violência contra os mesmos. A perspectiva desenvolvimental relacionada ao gênero e VRI tem sido pontada pela literatura. As relações íntimas geralmente se iniciam na adolescência, sendo que o conhecimento dos adolescentes para estas relações se deriva da mídia e da observação de amigos e familiares. Este processo é permeado pelo narcisismo, um apego a papéis específicos de gênero e a mistificação do amor romântico, deixando essa população especialmente vulnerável à VRI(2828 Dosil M, Jaureguizar J, Bernaras E, Sbicigo JB. Teen Dating Violence, Sexism, and Resilience: A Multivariate Analysis. Int J Environ Res Public Health. 2020 Apr 13;17(8):2652. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph17082652
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).

Esta perspectiva é utilizada em metanálise para determinar a prevalência de VRI física e sexual entre adolescentes, bem como seus fatores associados(2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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,2929 Connolly JA, McIsaac C. Romantic Relationships in Adolescence. In: Lerner RM, Steinberg M, editors. Handbook of Adolescent Psychology. [Internet]. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons; 2009 [cited 2021 Mar]. p. 104-51. Available from: https://doi.org/10.1002/9780470479193.adlpsy002005
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). Na emergência de relações de namoro heteroafetivas, as adolescentes costumam ser mais agressivas fisicamente em relação aos meninos, no início destas relações(2929 Connolly JA, McIsaac C. Romantic Relationships in Adolescence. In: Lerner RM, Steinberg M, editors. Handbook of Adolescent Psychology. [Internet]. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons; 2009 [cited 2021 Mar]. p. 104-51. Available from: https://doi.org/10.1002/9780470479193.adlpsy002005
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). Uma das explicações pode ser o legado da infância no que tange à resolução de problemas; as meninas tendem a ser mais agressivas e os meninos são treinados socialmente a inibir estes comportamentos. A agressão contra meninos por meninas também é menos socialmente questionada que a agressão de meninos contra meninas. Entretanto, conforme as adolescentes ganham competências nas interações íntimas e no progresso das relações, este quadro tende a ser alterado com reforço às normas sociais de gênero discutidas anteriormente(2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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). De qualquer modo, é importante sinalizar que a literatura tem apontado maiores consequências às meninas, inclusive com inversão desta relação ao longo do relacionamento(2929 Connolly JA, McIsaac C. Romantic Relationships in Adolescence. In: Lerner RM, Steinberg M, editors. Handbook of Adolescent Psychology. [Internet]. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons; 2009 [cited 2021 Mar]. p. 104-51. Available from: https://doi.org/10.1002/9780470479193.adlpsy002005
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). Outro ponto que merece destaque é a possibilidade de meninos subrelatarem situações de violência dado o estigma social de violência de meninos contra meninas, ou mesmo destes se aceitarem como vítimas de violência(2525 Wincentak K, Connolly J, Card N. Teen dating violence: A meta-analytic review of prevalence rates. Psychol Violence. 2017;7(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1037/a0040194
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).

Ademais, tal achado evidencia a importância de estudos que abordem adolescentes mais jovens e a construção de relações íntimas nesta população. Outros estudos têm abordado essencialmente adolescentes mais velhos, sendo que as relações e violência se constroem de formas diferentes. Nestes estudos, os adolescentes reportam maiores frequências de VRI e maior relevância da perpetração de violência por meninos(66 Lessinger Borges J, Assumpção Heine J, Dell’Aglio DD. Variables personales y contextuales predictivas de perpetración de violencia en el noviazgo en la adolescencia. Acta Colomb Psicol. [Internet]. 2020 [cited 2021 Jul 1];23(2):438-69. Available from: https://actacolombianapsicologia.ucatolica.edu.co/article/view/2313
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,3030 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents’ perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91. doi: https://doi.org/10.1080/07399330903066392
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).

A progressão da violência nas relações íntimas parece estar associada à progressão do compromisso nas relações. O termo crush é utilizado para uma relação ainda idealizada, que não se concretizou; o ficar mantém-se como aproximação física, que pode evoluir para a relação de namoro. Estes conceitos são reforçados por outro estudo; exceto o termo crush, que para adolescentes mais jovens emerge num lugar ainda idealizado da relação(3131 Ferriani MGC, Campeiz AB, Martins JE, Aragão AS, Roque EMST, Carlos DM. Understanding and contextualizing teen dating violence. Esc Anna Nery. 2019;23(3):1-9. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0349
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). É no momento do namoro que a violência ganha tons mais claros e invisibilizados pelos adolescentes. Nesta relação permite-se o domínio, a posse, a não privacidade, o afastamento de amigos; estes aspectos, apesar da grande influência de estereótipos de gênero, são presentes reciprocamente nas relações.

O ciúme é inerente às relações dos adolescentes, compreendido como prova de amor; ele se articula ao movimento de construção de confiança citado pelos adolescentes. Acaba por ser o grande propagador das violências. Nesse sentido de tolerância de comportamentos violentos nas relações entre adolescentes, nota-se que há uma naturalização da violência, principalmente considerando o ciúme como demonstração de amor. Possivelmente, essa aceitação se justifica em origens familiares, através de experiências agressivas entre os pais, ou mesmo na diferença entre os papéis de gênero ao pensarmos na dominação masculina nos relacionamentos, que é aceitável socialmente(3232 Bittar DB, Nakano AMS. Symbolic violence among adolescents in affective dating relationships. Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03298. doi: https://doi.org/10.1590/S1980-220X2017003003298
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). Estudo qualitativo brasileiro desenvolvido junto a adolescentes desvelou a ocorrência do ciúme relacionada a crenças socialmente partilhadas de relações idealizadas. O controle foi bastante associado a ele, bem como o sentimento de posse do outro(3333 Ferriani MGC, Carlos DM, Oliveira AJ, Esteves MR, Martins JE. Institutional links to cope with school violence: an exploratory study. Esc Anna Nery. 2017;21(4):1-8. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2016-0347
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). Trata-se de uma violência implícita que origina outras violências.

O ciúme e consequente VRI ganham novos contornos mediante o uso de tecnologias; este aspecto é relevante ao considerarmos o modelo ecológico em seu nível relacional, visto que as redes sociais digitais atravessam o modo de ser e se relacionar no mundo da adolescência contemporânea e suas relações. O controle e monitoramento constante são apoiados pelos recursos digitais; estudos têm denotado este papel das tecnologias no delineamento da VRI no Brasil(11 Flach RMD, Deslandes SF. Cyber dating abuse in affective and sexual relationships: a literature review. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2017 [cited 2021 Mar 05];33(7):e00138516. Available from: https://doi.org/10.1590/0102-311X00138516
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,3333 Ferriani MGC, Carlos DM, Oliveira AJ, Esteves MR, Martins JE. Institutional links to cope with school violence: an exploratory study. Esc Anna Nery. 2017;21(4):1-8. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2016-0347
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) e no mundo(44 Stonard KE, Bowen E, Walker K, Price SA. “They’ll Always Find a Way to Get to You”: Technology Use in Adolescent Romantic Relationships and Its Role in Dating Violence and Abuse. J Interpers Violence. 2017;32(14). doi: https://doi.org/10.1177/0886260515590787
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,3434 Reed LA, Tolman RM, Ward LM. Gender matters: Experiences and consequences of digital dating abuse victimization in adolescent dating relationships. J Adolesc. 2017;59:79-89. doi: https://doi.org/10.1016/j.adolescence.2017.05.015
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). Estudo qualitativo junto a adolescentes de 12 a 18 anos realizado no Reino Unido buscou explorar o papel do uso de tecnologias em suas relações de intimidade(44 Stonard KE, Bowen E, Walker K, Price SA. “They’ll Always Find a Way to Get to You”: Technology Use in Adolescent Romantic Relationships and Its Role in Dating Violence and Abuse. J Interpers Violence. 2017;32(14). doi: https://doi.org/10.1177/0886260515590787
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). Diferente dos nossos achados, este estudo encontrou que as meninas exercem mais o controle e monitoramento pelas redes sociais que os meninos. Para a compreensão deste movimento, os autores trouxeram a discussão das relações de apego e insegurança(3535 Hazan C, Shaver PR. Attachment as an Organizational Framework for Research on Close Relationships. Psychol Inquiry. 1994;5(1):1-22. doi: https://doi.org/10.1207/s15327965pli0501
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). Em relações íntimas, pode ocorrer uma necessidade de responsividade do/a parceiro/a e de total sentimento de segurança(44 Stonard KE, Bowen E, Walker K, Price SA. “They’ll Always Find a Way to Get to You”: Technology Use in Adolescent Romantic Relationships and Its Role in Dating Violence and Abuse. J Interpers Violence. 2017;32(14). doi: https://doi.org/10.1177/0886260515590787
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). Pelo processo de desenvolvimento adolescente, em especial no fato de experimentar relações e sua identidade com os pares, este fato adquire especial relevância. Ademais, aspectos relacionados à intimidade, publicidade e privacidade são emergentes nas discussões sobre relações íntimas com adolescentes, devendo ser parte de programas e ações que fomentem relações saudáveis e preventivas da violência(44 Stonard KE, Bowen E, Walker K, Price SA. “They’ll Always Find a Way to Get to You”: Technology Use in Adolescent Romantic Relationships and Its Role in Dating Violence and Abuse. J Interpers Violence. 2017;32(14). doi: https://doi.org/10.1177/0886260515590787
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,3333 Ferriani MGC, Carlos DM, Oliveira AJ, Esteves MR, Martins JE. Institutional links to cope with school violence: an exploratory study. Esc Anna Nery. 2017;21(4):1-8. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2016-0347
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).

Estudos internacionais vêm denotando a importância do desenvolvimento de ações e programas preventivos aos pares e expectadores no âmbito da VRI entre adolescentes. Estes programas têm reduzido significativamente a perpetração e vitimização por VRI(3636 Coker AL, Bush HM, Cook-Craig PG, DeGue SA, Clear ER, Brancato CJ, et al. RCT Testing Bystander Effectiveness to Reduce Violence. Am J Prev Med. 2017;52(5):566-78. doi: https://doi.org/10.1016/j.amepre.2017.01.020
https://doi.org/10.1016/j.amepre.2017.01...
-3737 Miller E. Prevention of and Interventions for Dating and Sexual Violence in Adolescence. Pediatric Clin North Am. 2017;64(2):423-34. doi: https://doi.org/10.1016/j.pcl.2016.11.010
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). No contexto brasileiro, pode ser interessante o desenvolvimento de ações que promovam a solidariedade entre meninas, pelos achados referidos neste trabalho. Estudo desenvolvido em escolas da Pensilvânia, Estados Unidos, encontrou que estudantes ficaram entusiasmados sobre discutir relações saudáveis e não saudáveis com enfermeiros escolares. Muitos adolescentes envoltos em VRI se reportaram a estes enfermeiros para relatarem experiências vivenciadas(3838 Reidy DE, Holland KM, Cortina K, Ball B, Rosenbluth B. Evaluation of the expect respect support group program: A violence prevention strategy for youth exposed to violence. Prev Med. 2017;100:235-42. doi: https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2017.05.003
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).

As limitações se relacionaram ao não aprofundamento da transmissão intergeracional de normas de gênero entre os adolescentes. Ademais, os grupos focais foram realizados a partir de divisão por sexos biológicos; apesar desta configuração permitir o aparecimento de alguns conteúdos, a interação entre meninos e meninas poderia trazer novos conhecimentos. O uso de entrevistas individuais também poderia complementar os dados.

Finalmente, apesar das limitações, o estudo traz implicações importantes à prática, formação e pesquisa em saúde de adolescentes, a saber: (1) o olhar a um público e temática ainda negligenciados em ações de saúde; (2) elementos que podem ser articulados a estratégias e programas de promoção de relações saudáveis e prevenção primária de VRI; (3) a necessidade de intervenções precoces junto a adolescentes pela presença de normas sociais percursoras de violências, com foco em ações promotoras de equidade de gênero.

O processo compreensivo-interpretativo dos dados permitiu agregar avanços científicos na área de saúde do adolescente na medida em apresenta achados para a compreensão do fenômeno da VRI, dando visibilidade a esta problemática e assim contribuindo para a prevenção da violência entre parceiros íntimos na vida adulta. Espera-se que, apesar da singularidade dos resultados, as categorias desenvolvidas possam, a partir dos elementos identificados, trazer conhecimentos aplicáveis em outros contextos, a fim de possibilitar a implementação de iniciativas na atenção e cuidado de enfermagem a esta população.

Conclusão

Retomando nosso objetivo inicial, este estudo permitiu acessar as percepções de adolescentes frente à VRI. Desvelou-se que normas tradicionais de gênero ainda ocupam um lugar significativo no delineamento de relações violentas entre adolescentes. Esta violência se faz mais visível em relações de namoro, quando o compromisso e a exclusividade são tidos como principais características, autorizando a posse e o controle. Estas violências são veladas e compreendidas como necessárias à construção de confiança. O ciúme emerge como principal disparador de violências e as tecnologias aparecem como recursos contemporâneos para reforçar a VRI entre adolescentes.

Reitera-se a originalidade e relevância deste estudo pela participação de adolescentes mais jovens que aqueles frequentemente participantes destas pesquisas, pertencentes a regiões de alta vulnerabilidade social e em país em desenvolvimento.

Novos estudos na temática são necessários para aprofundamento da compreensão de transmissão e enfrentamento de normas de gênero entre crianças e adolescentes. Para além, as percepções de famílias, escola e comunidade frente à VRI podem contribuir com novos elementos para o delineamento de ações ecológicas no enfrentamento ao fenômeno.

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Editado por

Editora Associada: Sueli Aparecida Frari Galera

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2021
  • Aceito
    27 Jul 2021
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