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Validação clínica do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente cerebrovascular

Resumos

OBJETIVO: o estudo teve por objeto a validação clínica do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente cerebrovascular. MÉTODO: estudo de coorte prospectivo, desenvolvido com 24 pacientes internados, para o tratamento do acidente cerebrovascular agudo. O instrumento utilizado para a coleta de dados continha os fatores de risco para a aspiração respiratória, validados por análise de conceito e por especialistas. RESULTADOS: os fatores de risco para aspiração respiratória mais presentes nos pacientes foram: disfagia (54,2%) e mobilidade corporal diminuída (41,7%). A prevalência do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" foi de 58,3% e a prevalência em 48 horas (tempo de acompanhamento) da aspiração respiratória foi de 37,5%. Os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída apresentaram associação estatisticamente significativa com a aspiração respiratória. CONCLUSÃO: os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída são bons preditores para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração". Este trabalho possibilitou contribuir para o aperfeiçoamento da Taxonomia da NANDA-I e, por conseguinte, da linguagem da sistematização da assistência de enfermagem.

Enfermagem; Diagnóstico de Enfermagem; Aspiração Respiratória; Acidente Vascular Cerebral


OBJECTIVE: the study's objective was the clinical validation of the nursing diagnosis Risk for Aspiration among patients who experienced cerebrovascular accidents (CVA). METHOD: a prospective cohort study was conducted with 24 patients hospitalized due to a CVA. The instrument used to collect the data addressed the risk factors for respiratory aspiration, validated by concept analysis and by experts. RESULTS: the most frequent risk factors for respiratory aspiration were: dysphagia (54.2%) and impaired physical mobility (41.7%). The prevalence of the nursing diagnosis Risk for Aspiration was 58.3% and the prevalence of respiratory aspiration over the span of 48 hours (monitoring period) was 37.5%. Risk factors for dysphagia and impaired physical mobility were significantly associated with respiratory aspiration. CONCLUSION: the risk factors dysphagia and impaired physical mobility are good predictors of the nursing diagnosis Risk for Aspiration. This study contributed to improving the NANDA-I Taxonomy and the systematization of the nursing process.

Nursing; Nursing Diagnosis; Respiratory Aspiration; Stroke


OBJETIVO: el estudio tiene como objetivo la validación clínica del diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración en pacientes con accidente cerebrovascular. MÉTODO: un estudio de cohorte prospectivo desarrollado con 24 pacientes hospitalizados para el tratamiento del ictus agudo. El instrumento utilizado para la recolección de datos contiene los factores de riesgo de aspiración respiratoria, validado en el análisis conceptual y por expertos. RESULTADOS: los factores de riesgo para aspiración respiratoria más presentes en los pacientes fueron: disfagia (54,2%) y disminución de la movilidad física (41,7%). La prevalencia del diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración fue del 58,3% y la prevalencia en 48 horas (el tiempo del seguimiento) de la aspiración respiratoria fue de 37,5%. Los factores de riesgo disfagia y la disminución de la movilidad física se asociaron significativamente con la aspiración respiratoria. CONCLUSIÓN: los factores de riesgo disminución de la movilidad física y disfagia son buenos predictores para el diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración. Este trabajo permitió contribuir a la mejora de la taxonomía NANDA-I y, por lo tanto, el lenguaje de la sistematización de la atención de enfermería.

Enfermería; Diagnóstico de Enfermería; Aspiración Respiratoria; Accidente Cerebrovascular


ARTIGO ORIGINAL

Validação clínica do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente cerebrovascular

Tahissa Frota CavalcanteI; Thelma Leite de AraújoII; Rafaella Pessoa MoreiraIII; Nirla Gomes GuedesIV; Marcos Venicios de Oliveira LopesII; Viviane Martins da SilvaV

IPhD, Professor Assistente, Curso de Enfermagem, Universidade Regional do Cariri, Brasil

IIPhD, Professor Associado, Curso de Enfermagem, Universidade Federal do Ceará, Brasil

IIIPhD, Professor, Universidade de Fortaleza, Brasil. Professor, Faculdade Católica Rainha do Sertão, Brasil

IVPhD, Professor, Curso de Enfermagem, Faculdade Integrada do Ceará, Brasil. Enfermeira, Prefeitura Municipal de Fortaleza, Brasil

VPhD, Professor Adjunto, Curso de Enfermagem, Universidade Federal do Ceará, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: o estudo teve por objeto a validação clínica do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente cerebrovascular.

MÉTODO: estudo de coorte prospectivo, desenvolvido com 24 pacientes internados, para o tratamento do acidente cerebrovascular agudo. O instrumento utilizado para a coleta de dados continha os fatores de risco para a aspiração respiratória, validados por análise de conceito e por especialistas.

RESULTADOS: os fatores de risco para aspiração respiratória mais presentes nos pacientes foram: disfagia (54,2%) e mobilidade corporal diminuída (41,7%). A prevalência do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" foi de 58,3% e a prevalência em 48 horas (tempo de acompanhamento) da aspiração respiratória foi de 37,5%. Os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída apresentaram associação estatisticamente significativa com a aspiração respiratória.

CONCLUSÃO: os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída são bons preditores para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração". Este trabalho possibilitou contribuir para o aperfeiçoamento da Taxonomia da NANDA-I e, por conseguinte, da linguagem da sistematização da assistência de enfermagem.

Descritores: Enfermagem; Diagnóstico de Enfermagem; Aspiração Respiratória; Acidente Vascular Cerebral.

RESUMEN

OBJETIVO: el estudio tiene como objetivo la validación clínica del diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración en pacientes con accidente cerebrovascular.

MÉTODO: un estudio de cohorte prospectivo desarrollado con 24 pacientes hospitalizados para el tratamiento del ictus agudo. El instrumento utilizado para la recolección de datos contiene los factores de riesgo de aspiración respiratoria, validado en el análisis conceptual y por expertos.

RESULTADOS: los factores de riesgo para aspiración respiratoria más presentes en los pacientes fueron: disfagia (54,2%) y disminución de la movilidad física (41,7%). La prevalencia del diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración fue del 58,3% y la prevalencia en 48 horas (el tiempo del seguimiento) de la aspiración respiratoria fue de 37,5%. Los factores de riesgo disfagia y la disminución de la movilidad física se asociaron significativamente con la aspiración respiratoria.

CONCLUSIÓN: los factores de riesgo disminución de la movilidad física y disfagia son buenos predictores para el diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración. Este trabajo permitió contribuir a la mejora de la taxonomía NANDA-I y, por lo tanto, el lenguaje de la sistematización de la atención de enfermería.

Descriptores: Enfermería; Diagnóstico de Enfermería; Aspiración Respiratoria; Accidente Cerebrovascular.

Introdução

A pesquisa teve por objeto a validação clínica do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente cerebral vascular. Estudo anterior(1) realizou análise de conceito e validou com especialistas os fatores de risco relacionados ao diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente vascular cerebral. Esse estudo apontou que os fatores de risco para aspiração respiratória são: disfagia, alteração do nível de consciência, reflexo de tosse prejudicado ou ausente, outras desordens neurológicas (trauma cerebral ou doença de Alzheimer), presbifagia, uso de tubos gastrintestinais, presença de refluxo gastroesofágico, mobilidade corporal diminuída, reflexo de vômito diminuído ou ausente, procedimentos invasivos como endoscopia digestiva alta e videofluoroscopia, uso de tubos endotraqueais/traqueostomia e cabeceira do leito baixa.

Mesmo sendo redundantes os fatores uso de tubos gastrintestinais e uso de tubos endotraqueais/traqueostomia, optou-se por mantê-los assim, porque a literatura diferencia cada um deles.

O conhecimento dos fatores de risco para aspiração respiratória em pacientes com acidente vascular cerebral é fundamental para o enfermeiro, pois o elemento-chave no tratamento dos pacientes com acidente vascular cerebral na fase aguda e subaguda está baseado na prevenção de complicações, redução do tempo de internação, mortalidade e custo hospitalar(2-3).

A literatura(4), entretanto, afirma que os preditores clínicos para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" não se encontram bem definidos e há escassez de estudos a respeito da validação clínica desse diagnóstico de enfermagem.

Diante desse contexto, torna-se relevante a realização de estudo com o objetivo de realizar validação clínica dos fatores de risco do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente vascular cerebral. Importa destacar que esse processo de validação tem como intuito primordial aumentar a validade desse diagnóstico na Taxonomia II da NANDA-I e fornecer ferramentas ao enfermeiro para a avaliação dos pacientes com acidente vascular cerebral, em situação de risco de aspiração.

Métodos

Trata-se de estudo observacional, realizado na unidade de acidente vascular cerebral, localizada em um hospital geral, público e de nível terciário, referência no tratamento de pessoas com essa patologia para a Região Nordeste, situado em Fortaleza, Ceará, Brasil.

A população foi composta por pacientes com diagnóstico médico de acidente vascular cerebral e que estivessem internados na unidade supracitada. Participaram do estudo 24 indivíduos. Os critérios para inclusão foram: a) ter idade acima de 18 anos; b) ter o diagnóstico médico de acidente vascular cerebral; c) estar na fase aguda do acidente vascular cerebral (até 72 horas do início dos primeiros sintomas) e d) apresentar o nível de consciência alerta e ser capaz de obedecer aos comandos. Aqueles que apresentaram, na primeira avaliação, a aspiração respiratória ou complicações decorrentes dessa, como pneumonia aspirativa, pneumonite, obstrução da via aérea e embolismo pulmonar, assim como aqueles que apresentaram, no momento da coleta de dados, alguma instabilidade clínica com risco de morte, foram excluídos. Ressalta-se que nenhum paciente foi excluído.

A amostra foi selecionada por conveniência. Os pacientes foram alocados no estudo mediante admissão na unidade de acidente vascular cerebral (avaliação inicial) e reavaliados, após 48 horas da primeira avaliação (segunda avaliação). Esse tempo de avaliação foi estabelecido de acordo com as recomendações de pesquisadores(2,5-6), os quais afirmam que a aspiração respiratória é uma condição clínica que ocorre em até cinco dias do início dos primeiros sinais e sintomas do acidente vascular cerebral, na internação.

Como critérios de descontinuidade estabeleceram-se: a) pacientes transferidos para outras instituições de saúde ou domicílio e b) pacientes que no momento da coleta de dados apresentaram instabilidade clínica com risco de morte. Ressalta-se que nenhum paciente foi excluído.

Os dados foram coletados no período de junho a agosto de 2011. O instrumento de coleta de dados foi construído considerando-se os fatores de risco identificados na literatura, já citados, e validado quanto à aparência e conteúdo, por especialistas. Tal instrumento contém variáveis sociodemográficas, clínicas, preditoras, as quais são os fatores de risco para aspiração respiratória em pacientes com acidente cerebrovascular.

Destaca-se que, pela impossibilidade de avaliar o desfecho da aspiração respiratória em pacientes com nível diminuído de consciência, não foram abordados neste estudo os fatores de risco alteração do nível de consciência e uso de tubos orotraqueais/traqueostomia, porque esses procedimentos envolvem sedação e, assim, alteração do nível de consciência. Ademais, ressalta-se que a avaliação da presença do fator de risco "desordens neurológicas" está relacionada à gravidade do acidente vascular cerebral (acidente vascular cerebral hemorrágico, bilateral e/ou localizado na ponte), associada ou não a doenças e condições anteriores como trauma cerebral ou doença de Alzheimer.

A variável de desfecho deste estudo foi a aspiração respiratória. O padrão-ouro para a avaliação da aspiração respiratória é a videofluoroscopia. Em virtude da ausência de pessoal especializado, bem como do equipamento necessário à realização do exame, o estudo adotou os sinais clínicos propostos em dois estudos(7-8) – disfonia, disartria, reflexo de vômito anormal, tosse voluntária anormal, tosse depois da deglutição e mudança de voz depois da deglutição. Ressalta-se que a presença de dois ou mais dos seis sinais clínicos indica que a condição de aspiração respiratória encontra-se presente. Tais estudos(7-8) que fundamentam esses sinais clínicos, apresentam especificidade de 89% para a detecção da aspiração respiratória, quando comparados ao padrão-ouro (videofluoroscopia).

Inicialmente, após a identificação do paciente, foram apresentados a ele e/ou ao acompanhante os objetivos da pesquisa. Após a concordância documentada pela assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, foi realizada uma avaliação preliminar da presença ou não da condição da aspiração respiratória ou das complicações decorrentes dessa (pneumonia aspirativa, pneumonite, obstrução da via aérea e embolismo pulmonar). Esses dados foram obtidos por meio de exame físico e consulta ao prontuário. O exame físico era voltado à avaliação do trato respiratório do paciente, em busca de sinais indicativos de complicações da aspiração respiratória. A consulta ao prontuário permitia ao investigador a leitura das avaliações médicas de acompanhamento do paciente em busca de diagnósticos médicos (pneumonia aspirativa, pneumonite e embolismo pulmonar), bem como a leitura de raio-X de tórax.

Depois dessa avaliação preliminar, aqueles que cumpriram todos os critérios de inclusão foram examinados quanto às variáveis sociodemográficas, clínicas e preditoras (fatores de risco), utilizando os métodos de entrevista, exame físico e consulta ao prontuário. Decorridas 48 horas da primeira avaliação, foi realizado um segundo contato com o paciente, tendo como objetivo a identificação da aspiração respiratória. Conforme referido, essa segunda avaliação foi realizada por meio do exame dos seis sinais clínicos(7-8) pela pesquisadora do trabalho.

A inferência quanto à presença do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" nos pacientes avaliados foi realizada por uma especialista, a qual atendeu os critérios do sistema de pontuação específicos(9), ou seja, com experiência acadêmica e profissional na área de diagnósticos de enfermagem e cuidados ao paciente com acidente vascular cerebral. Após a primeira avaliação, a especialista recebia um resumo do caso de cada paciente, explicitando os seus dados sociodemográficos, as suas variáveis clínicas e os fatores de risco para aspiração respiratória presentes A especialista não foi informada quanto à presença ou ausência do desfecho (aspiração respiratória). A finalidade da participação da especialista foi para que a inferência diagnóstica (diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração") não sofresse a influência da pesquisadora que coletou os dados, pois a mesma sabia quais pacientes tinham sofrido a aspiração respiratória na internação.

Para a construção das planilhas de dados, utilizou-se o software Excel 2007 e a análise estatística foi realizada pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). As variáveis numéricas foram apresentadas quanto às medidas de tendência central e de dispersão. Para a verificação da normalidade/simetria dos dados numéricos, usou-se o teste de Shapiro-Wilks.

Na análise de associação dos dados nominais, foi utilizado teste binomial. Para verificar a magnitude da associação, foi utilizada a Razão de Chance (RC). Na análise da acurácia dos fatores de risco para aspiração respiratória, frente ao diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", foram utilizados os testes de sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo, considerando-se p<0,05 como significância estatística.

Em atenção às recomendações da Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, referentes às pesquisas relacionadas a seres humanos(10), o estudo foi avaliado e aprovado para implementação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Comepe) da Universidade Federal do Ceará, sob Protocolo nº262/10.

Resultados

Foram acompanhados 24 pacientes com acidente vascular cerebral. A seguir, expõe-se o perfil sociodemográfico dos pacientes avaliados.

Conforme apresentado na Tabela 1, a maioria dos indivíduos com acidente vascular cerebral era do sexo masculino (58,3%), vivia com companheiro (75%), era procedente da capital do Estado do Ceará (62,5%) e aposentada (50%). Eles apresentaram média de idade de 63,17 anos (DP=13,34). Destaca-se que 25% da amostra tinham idade até 49 anos.

No tocante à escolaridade e à renda familiar, essas variáveis apresentaram distribuição assimétrica no grupo avaliado (p<0,05). Os indivíduos estudaram medianamente 4,50 anos e tinham renda familiar mediana de um salário-mínimo.

Em relação às características clínicas, a maior parte do grupo tinha o tipo isquêmico da doença (91,7%) e era o primeiro episódio (75%). Os pacientes foram avaliados, medianamente, com 72 horas do início dos primeiros sinais e sintomas.

A seguir observa-se a distribuição dos fatores de risco para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", fatores esses apresentados pelos pacientes acompanhados no estudo.

Destarte, exceto o fator de risco endoscopia e videofluoroscopia, todos os outros estiveram presentes na prática clínica, mais que 50% na amostra, exceto o 1º. Para aqueles que possuíam o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", os fatores de risco mais presentes foram a disfagia e mobilidade corporal diminuída.

A prevalência do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" nos indivíduos com acidente vascular cerebral foi de 58,3% e a prevalência em 48 horas (tempo de acompanhamento) da aspiração respiratória foi de 37,5%.

Adiante, na Tabela 3, evidenciam-se as estimativas de associação entre os fatores de risco para a aspiração respiratória e o desfecho clínico de aspiração respiratória.

Os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída, avaliados por meio dos Estágios da Recuperação Motora de Brunnstrom, apresentaram associação estatisticamente significativa com a aspiração respiratória (p=0,001 e p=0,007, respectivamente). Os pacientes que estavam expostos ao fator de risco disfagia tiveram 16 vezes mais chances de desenvolver a aspiração respiratória quando comparados aos que não apresentavam esse fator de risco. Os que possuíam o fator de risco mobilidade corporal diminuída apresentaram 14 vezes mais chances de desenvolver a aspiração respiratória.

A seguir, na Tabela 4 e na Figura 1, estão as medidas de acurácia dos fatores de risco avaliados para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração".


De forma geral, pela análise dos dados apresentados na Tabela 4, a maioria dos fatores de risco (reflexo de tosse prejudicado ou ausente, desordens neurológicas, presbifagia, uso de tubos gastrintestinais, reflexo de vômito diminuído ou ausente e cabeceira do leito baixa) obteve valores de sensibilidade elevados (acima de 80%); porém, em contrapartida, valores baixos de especificidade (menor que 60%). Tal fato pode ser justificado, em parte, pelo número reduzido de pacientes avaliados (n=24).

O fator de risco disfagia, apesar de apresentar valor médio de sensibilidade (66,6%), foi um fator de risco de alta especificidade para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" (88,8%) e com valor preditivo positivo de 90,9%. O fator de risco mobilidade corporal diminuída foi o único fator de risco para aspiração respiratória que apresentou valores de sensibilidade, especificidade e valores preditivos positivos e negativos elevados para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração".

Segundo os dados apresentados na Figura 1, observa-se que os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída, quando presentes, são preditivos do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" (área 1 da Figura). Os fatores de risco reflexo de tosse prejudicado ou ausente, uso de tubos gastrintestinais, cabeceira do leito baixa e desordens neurológicas (trauma cerebral, acidente vascular cerebral e doença de Alzheimer), quando ausentes, indicam que o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" está ausente também (área 2 da Figura).

Os fatores de risco presença de refluxo gastroesofágico e presbifagia foram considerados indicadores insatisfatórios para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", apresentados por pacientes com acidente vascular cerebral (área 4 da Figura).

Discussão

Segundo o Relatório sobre a Situação de Saúde no Estado do Ceará, publicado em 2011(11), ao analisar as três primeiras causas de mortalidade em 2009, observou-se que as doenças do aparelho circulatório foram a principal causa de óbito, responsável por 30,2% (13.333) do total de óbitos, concentrando-se na faixa de idosos (82% - 10.891), em ambos os sexos. O grupamento das doenças cerebrovasculares foi responsável pelo maior número de óbitos por doenças do aparelho circulatório, seguido por doenças isquêmicas do coração e doenças hipertensivas, em ambos os sexos.

Em relação à variável sexo, os homens estiveram mais presentes no estudo. Pesquisas(12-14) encontraram predominância discretamente maior do acidente vascular cerebral na população masculina.

No estudo ora desenvolvido, a média de idade dos indivíduos foi de 63,17 anos (DP=13,34). Resultado semelhante foi encontrado em outro estudo(15). Ressalta-se que embora o acidente vascular cerebral seja uma doença cerebrovascular passível de acontecer em qualquer faixa etária, sua incidência aumenta à medida que avança a idade e dobra aproximadamente a cada década de vida(16).

Entretanto, é oportuno considerar o aumento da prevalência da doença cerebrovascular na população jovem, o que vem acarretando grande impacto social e econômico. No Brasil, o aumento de internações por acidente vascular cerebral entre jovens de 15 e 34 anos foi de 64% em homens e de 41% em mulheres, entre 1998 e 2007. Dados do Ministério da Saúde mostram que em 2007 foram quase oito mil internações nessa faixa etária(17).

A mediana de anos de estudo foi 4,50 anos. Pertinente à renda familiar, a mediana de salários-mínimos foi 1,0 salário. A maior parte dos pacientes era aposentada. Consoante mostram os dados, os participantes desta investigação possuíam condições socioeconômicas desfavoráveis. Outro estudo desenvolvido(12) evidenciou que a escolaridade predominante foi a de analfabetos (39,1%) e de nível elementar com até três anos de estudo (20%). Para diversos pesquisadores(18), o aumento da incidência do acidente vascular cerebral está relacionado ao decréscimo do nível socioeconômico. Como causas para essa realidade, os autores apontam: maior frequência dos fatores de risco para as doenças cerebrovasculares, fatores psicossociais desfavoráveis e acesso limitado aos serviços de saúde.

Em relação à prevalência dos subtipos do acidente vascular cerebral, resultados diferentes foram encontrados em outro estudo(15), pois houve equivalência na proporção entre o tipo isquêmico (42,9%) e o hemorrágico (38,5%).

A frequência do acidente vascular cerebral do tipo isquêmico na população brasileira, segundo diferentes estatísticas, oscila entre 53 e 85% dos casos(16). Todavia, importa destacar que a prevalência exacerbada do tipo isquêmico frente ao tipo hemorrágico, encontrada no estudo realizado, possa ser explicada, em parte, pelos critérios de inclusão estabelecidos pela pesquisa (estar alerta e ser capaz de obedecer aos comandos), pois os pacientes com acidente vascular cerebral hemorrágico são mais graves e geralmente possuem nível de consciência diminuído.

Especificamente em relação à prevalência de disfagia, essa foi condizente com os dados de várias pesquisas(6,8,19-20). A incidência do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" foi semelhante à encontrada em outra investigação(15). Concernente à aspiração respiratória, a sua incidência em pacientes com acidente vascular cerebral é em torno de 50% e, aproximadamente, metade desses pacientes sofre a aspiração silenciosa(5).

Ressalta-se que, como o estudo desenvolvido não avaliou a presença da aspiração silenciosa, a prevalência de aspiração respiratória apresentada nos pacientes avaliados com acidente vascular cerebral pode estar subestimada. Isso gera um alerta para a equipe de saúde, especialmente, a equipe de enfermagem, a qual necessita atuar de forma precoce e eficiente na prevenção dessa condição clínica.

O fator de risco mobilidade corporal diminuída, verificado por meio da Escala de Estágios da Recuperação Motora de Brunnstrom, apesar de não ser considerado na Taxonomia da NANDA-I(21) como um fator de risco para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", foi encontrado em quase 45% dos pacientes avaliados e mostrou associação estatisticamente significativa com a aspiração respiratória.

Em relação à acurácia dos indicadores clínicos para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente vascular cerebral, o conhecimento da probabilidade condicional da presença ou ausência do diagnóstico de enfermagem, a partir dos indicadores clínicos, auxiliará os enfermeiros na inferência e acurácia diagnóstica. Nesse contexto, o estudo da sensibilidade e especificidade dos fatores de risco do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" permitiu a avaliação da importância de cada fator de risco para a predição desse diagnóstico específico apresentado pelos pacientes com acidente vascular cerebral.

Em suma, neste estudo, os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída foram bons preditores positivos para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", bem como apresentaram valores consideravelmente elevados de especificidade para o diagnóstico estudado. Em contrapartida, os fatores de risco presença de refluxo gastroesofágico, presbifagia e procedimentos invasivos como endoscopia digestiva alta e videofluoroscopia foram apontados como fatores de risco pouco importantes para predizer a ocorrência ou não do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente vascular cerebral.

Conclusão

Os resultados apontados na validação clínica demonstraram que os fatores de risco disfagia e mobilidade corporal diminuída são bons indicadores preditivos da ocorrência do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pacientes com acidente vascular cerebral. Os fatores de risco presbifagia, presença de refluxo gastroesofágico e procedimentos invasivos como endoscopia digestiva alta e videofluoroscopia não foram específicos e preditivos do diagnóstico em estudo, necessitando de mais estudos, com populações maiores e em outros contextos para confirmar tal fato.

Os fatores de risco para o diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração", apresentados pelos pacientes com acidente vascular cerebral, são: disfagia, reflexo de tosse prejudicado ou ausente, desordens neurológicas, uso de tubos gastrintestinais, mobilidade corporal diminuída, reflexo de vômito diminuído ou ausente e cabeceira do leito baixa.

Durante o desenvolvimento deste trabalho, deparou-se com limitações como: a coleta de dados para a realização da validação clínica foi realizada por um único pesquisador, sendo que a preconização é de que essa coleta seja realizada por um par; a impossibilidade de avaliação de dois fatores de risco: nível diminuído de consciência e presença de tubo endotraqueal/traqueostomia, pois a avaliação dos seis sinais clínicos da aspiração respiratória exige que o paciente esteja com o nível de consciência alerta e, por fim, o número reduzido de pacientes que participaram da pesquisa (n=24).

Este trabalho contribui para o refinamento do diagnóstico de enfermagem "risco de aspiração" em pessoas com acidente vascular cerebral, apresentado na Taxonomia da NANDA-I. A proposição da validação desse diagnóstico de enfermagem pode possibilitar melhor execução das fases de histórico de enfermagem, diagnóstico de enfermagem e planejamento das intervenções, de forma específica e acurada para o levantamento e análise do risco de aspiração em pacientes com acidente vascular cerebral. Nessa esfera, o enfermeiro, em posse do conhecimento de todos os fatores de risco para aspiração respiratória, pode elaborar protocolos clínicos de prevenção da aspiração respiratória, bem como intervir de forma mais eficiente com o paciente, seja de forma independente ou em colaboração com a equipe multidisciplinar.

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    Validación clínica del diagnóstico de enfermería riesgo de aspiración en pacientes con accidente cerebrovascular
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      30 Abr 2012
    • Aceito
      14 Nov 2012
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