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Gasto financeiro ocasionado pelos atestados médicos de profissionais da saúde em hospitais públicos no Estado de Rondônia, Brasil

Resumos

O objetivo deste estudo foi investigar o gasto adicional na folha de pagamento, causado pelo absenteísmo doença de profissionais de enfermagem e médicos, em dois hospitais públicos da cidade de Cacoal, Rondônia, Brasil. Foram verificadas ausências não programadas de até 15 dias nas unidades hospitalares, no período de 2004 a 2007, observadas no banco de dados do setor de recursos humanos das instituições. Constatou-se 1.704 ausências não programadas, das quais 1.486 são justificadas por atestados médicos. Verificou-se que o absenteísmo por motivo de doença foi responsável por 87,2% das ausências não programadas. Se for descrito por categoria de profissional, o absenteísmo doença dos profissionais de enfermagem atingiu índice de 83,3% e dos médicos 16,7%. O índice do absenteísmo geral dos profissionais de enfermagem e médicos foi de 0,85%, enquanto que o gasto adicional na folha de pagamento no período atingiu 5,2% nos vencimentos dos profissionais de enfermagem e 7,4% dos médicos.

Absenteísmo; Hospitais Públicos; Enfermeiros; Médicos


The study investigates the additional payroll expense caused by absenteeism due to illness among nursing professionals and physicians at two public hospitals at Cacoal, Rondonia, Brazil. Non-programmed absences of up to 15 days which occurred at the hospital units between 2004 to 2007 were verified in the database of the institutions’ human resource sector. From 1,704 non-programmed absences, 1,486 were justified by medical declarations. It was verified that absenteeism caused by illness was responsible for 87.2% of all non-programmed absences. When these data are grouped by professional categories, it was observed that the nurse absenteeism due to illness reached 83.3%, when compared with 16.7% for physicians. The general absenteeism index, adding up nurses and physicians, corresponded to 0.85%, resulting in an additional payroll expense of 5.2% and 7.4% in the salaries of nursing professionals and physicians, respectively.

Absenteeism; Hospitals, Public; Nurses, Male; Physicians


El objetivo de este estudio fue investigar el gasto adicional en la planilla de pago, causado por el absentismo enfermedad de profesionales de enfermería y médicos, en dos hospitales públicos de la ciudad de Cacoal, en Rondonia, Brasil. Fueron verificadas ausencias no programadas de hasta 15 días en las unidades hospitalarias, en el período de 2004 a 2007, constatadas en el banco de datos del sector de recursos humanos de las instituciones. Se constató 1.704 ausencias no programadas, de las cuales 1.486 son justificadas con certificados médicos. Se verificó que el absentismo por motivo de enfermedad fue responsable por 87,2% de las ausencias no programadas. Si fuese descrito por categoría profesional, el absentismo enfermedad de los profesionales de enfermería alcanzaría el índice de 83,3% y el de los médicos 16,7%. El índice de absentismo general de los profesionales de enfermería y médicos fue de 0,85%, en cuanto que el gasto adicional en la planilla de pago en el período alcanzó 5,2% en los salarios de los profesionales de enfermería y 7,4% de los médicos.

Absentismo; Hospitales Públicos; Enfermeros; Médicos


ARTIGO ORIGINAL

Gasto financeiro ocasionado pelos atestados médicos de profissionais da saúde em hospitais públicos no Estado de Rondônia, Brasil

Maria Bernadete JunkesI; Valdir Filgueiras PessoaII

IDoutoranda em Ciências da Saúde, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasilia, DF, Brasil. Professor, Fundação Universidade Federal de Rondônia, AC, Brasil. E-mail: mbjunkes@yahoo.com.br

IIMédico, Pós-Doutor em Neurofisiologia, Professor Adjunto, Universidade de Brasília, DF, Brasil. E-mail: vpessoa@unb.br

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria Bernadete Junkes Fundação Universidade Federal de Rondônia. Campus Cacoal Rua da Universidade, 920 Bairro: Brizon CEP: 78975-155 Cacoal, RO, Brasil E-mail: bernadetejunkes@unir.br e bernadetejunkes@gmail.com

RESUMO

O objetivo deste estudo foi investigar o gasto adicional na folha de pagamento, causado pelo absenteísmo doença de profissionais de enfermagem e médicos, em dois hospitais públicos da cidade de Cacoal, Rondônia, Brasil. Foram verificadas ausências não programadas de até 15 dias nas unidades hospitalares, no período de 2004 a 2007, observadas no banco de dados do setor de recursos humanos das instituições. Constatou-se 1.704 ausências não programadas, das quais 1.486 são justificadas por atestados médicos. Verificou-se que o absenteísmo por motivo de doença foi responsável por 87,2% das ausências não programadas. Se for descrito por categoria de profissional, o absenteísmo doença dos profissionais de enfermagem atingiu índice de 83,3% e dos médicos 16,7%. O índice do absenteísmo geral dos profissionais de enfermagem e médicos foi de 0,85%, enquanto que o gasto adicional na folha de pagamento no período atingiu 5,2% nos vencimentos dos profissionais de enfermagem e 7,4% dos médicos.

Descritores: Absenteísmo; Hospitais Públicos; Enfermeiros; Médicos.

Introdução

As causas do absenteísmo em hospitais, tais como doenças, ausências não programadas ou justificadas, problemas com locomoção, razões familiares, desmotivação, políticas inadequadas, supervisão precária dos gestores, acidentes de trabalho e outros podem indicar, por parte dos profissionais, rejeição ao trabalho, pelo fato de essas ausências, na maioria dos casos, serem de pequena duração. Porém, fatores como insuficiência de profissionais, aliados à falta de medicamentos e carência em equipamentos, demonstram que os hospitais públicos encontram dificuldades em relação à situação econômica e financeira(1).

Nessa parte financeira, o controle de gastos é instrumento de trabalho fundamental para a otimização das operações dos hospitais. Entende-se que custo refere-se a gastos relativos a bens ou serviços utilizados na produção de outros bens e serviços. Portanto, todo pagamento feito aos profissionais de saúde nos hospitais é classificado como gastos com mão de obra(2).

O absenteísmo constitui-se na ausência ao trabalho por faltas programadas (férias, licença maternidade, licença congresso e outras) e não programadas (licença saúde, faltas não justificadas, suspensão), sendo um problema crucial para as organizações públicas e seus gestores. Nesse sentido, ocasiona não só custos diretos, mas também indiretos, representados pela redução da produtividade, da qualidade do atendimento e problemas administrativos(3).

Num país como o Brasil, cujo padrão salarial não permite perdas, algumas causas do absenteísmo estão maquiadas sob a forma de absenteísmo doença. Isso estimula formas indiscriminadas de justificativas das faltas por intermédio de atestados médicos. O gasto do absenteísmo por motivo de doença é maior do que o salário pago ao trabalhador doente, que deixa de comparecer ao local de trabalho, com impacto sobre a produtividade(3).

Nesse contexto, o município de Cacoal, localizado na região centro-sul do Estado de Rondônia, com população aproximada de 78 mil habitantes, embora conte com seis hospitais, dos quais dois são públicos e detêm a maior demanda, também encontra dificuldades para lidar com seus profissionais de saúde. O absenteísmo desses hospitais públicos, resultante de ausências não programadas, em especial de curta duração, e justificados por atestados médicos de até 15 dias, normalmente não são questionados pelos gestores e ocorrem com frequência significativa.

Vale lembrar que os hospitais públicos são financiados pelas próprias ações e serviços executados, posto que precisam apresentar relatórios de produtividade que evidenciem os procedimentos realizados e isso implica na adoção de mecanismos de registro e controle com base em planilhas fornecidas pelo Ministério da Saúde. Portanto, ausência de colaboradores pode significar queda de produtividade e menos recursos a serem aplicados.

Os hospitais, em geral, estão longe de ser organizações modelares por expor seus colaboradores a situações de excesso de trabalho, a doenças crônicas e letais, deficiências de infraestrutura e a lesões por esforço repetitivo e distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (LER/DORT)(4), contribuindo, dessa forma, para o fortalecimento de ausências não programadas, e esses fatos se confirmam conforme abordagens a seguir.

No Reino Unido, em 2005, pôde-se verificar, por exemplo, em um hospital de olhos, que 26% dos problemas pós-operatórios foram devido ao absenteísmo de profissionais de enfermagem que justificaram suas ausências pela baixa remuneração(5).

Nos EUA, em dois asilos na Pennsylvania, nos anos 2003 e 2004, os profissionais de saúde praticaram o absenteísmo devido aos salários que recebiam e às condições precárias de trabalho. Já em outro estudo, em Minnesota, no ano 1996, predominou o absenteísmo por lesão física no local de trabalho, gerando gastos aos cofres públicos de US$ 11.417 por indivíduo no ano, na categoria enfermeiros, e de US$ 6.822 na categoria médicos(6-7).

Na Índia, a ausência de profissionais do quadro de saúde chegou, em alguns estados do país, a atingir 67% entre 1991-2001, devido à redução de investimentos na área da saúde. Já na Venezuela, em 2001, registrou-se índice de absenteísmo doença em torno de 13% para médicos residentes e 7% para enfermeiros. Esses fatos levaram o Banco Mundial, em 2003, a divulgar índices de ausências na área da saúde em países subdesenvolvidos como Bangladesh (com 42% de índice), Honduras (27%), Índia (43%), Peru (26%) e Uganda (35%)(8-9).

No Brasil, verificou-se que as pesquisas de absenteísmo entre profissionais da saúde concentram-se mais nas Regiões Sul e Sudeste. A exemplo da situação, no Complexo Hospitalar Santa Casa, verificou-se que, em 12 meses (2003-2004), por problemas de saúde ou de consulta médica, 68% dos indivíduos se afastaram pelos seguintes períodos: 33,3%, até nove dias, 21,8% entre 10 e 24 dias, 10,3% de 25 a 99 dias e 2,6% declararam que estiveram afastados mais de 100 dias. Em hospital universitário, no Estado do Paraná, das 494 licenças-saúde (de julho 1997 a junho 1998) as faltas representaram 1.491 dias não trabalhados(4,10).

Em um hospital do Estado de São Paulo, na cidade de São José do Rio Preto, foram constatadas 75,4% de ausências ao trabalho, ocasionado por agravos à saúde. Em Ribeirão Preto, no Hospital das Clínicas, em 1998, o absenteísmo causado por enxaqueca, apresentado por 91% dos funcionários, resultou em perda de produtividade de 56,9% e, no número médio de dias perdidos no mês, de 6,5 dias. O total do custo estimado no ano foi de US$ 815.622,54, o que contabilizaria US$ 199,42 por empregado no ano(11-12).

Na Região Norte, em um centro psiquiátrico de Manaus, AM, constatou-se, no período de 2004-2005, registro de 298 ausências não programadas, das quais 57,05% justificadas por atestado médico, que resultaram em 464 dias de afastamento. Nesse sentido, o índice de absenteísmo médio dos profissionais de enfermagem foi de 2,9%(13).

Com base nos dados descritos, bem como em publicações que abordam o tema absenteísmo, verificou-se que a maioria dos resultados de pesquisas apresenta os fatores que causam o absenteísmo dos profissionais da área de saúde, bem como os referidos índices de ausências, sem apresentar comparação com o gasto gerado financeiramente. Por isso, faz-se necessário retomar discussões que mensurem índices de cunho econômico/financeiro em regiões pouco investigadas, que possam contribuir nas análises de novas pesquisas que apontam deficiências na alocação e distribuição dos recursos financeiros, inseridos nos orçamentos dos hospitais públicos da esfera municipal.

Diante do exposto, o objetivo desse estudo foi demonstrar o cenário dos gastos implícitos na folha de pagamento, ocasionado por ausências não programadas e justificadas com atestados médicos, de até 15 dias, sem considerar a descrição de patologia dos profissionais de enfermagem e médicos.

Considera-se a relevância desse estudo, com os profissionais de enfermagem e médicos, por serem eles os responsáveis por quase 90% de toda a produtividade nas instituições hospitalares.

Métodos

A pesquisa foi realizada em dois hospitais públicos do município de Cacoal, distantes 485km da capital Porto Velho, no Estado de Rondônia, no período de janeiro a abril de 2008. A investigação procedeu-se com abordagem de variáveis qualitativas e quantitativas, de forma retrospectiva e analítica, mediante levantamento de informações no banco de dados do setor de recursos humanos das instituições.

O instrumento utilizado para coleta das informações foi adaptado(1), tendo como variáveis: motivo de licença, categoria funcional, tempo de afastamento, gênero e tempo de serviço. A aprovação da pesquisa, de acordo com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde/MS, foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal - FACIMED, em março de 2007.

Fizeram parte da amostragem da pesquisa todos os profissionais de enfermagem e médicos que atuaram nesses hospitais no período de 2004 a 2007, sendo detectadas, em planilhas de frequência, as ausências não programadas por período de até 15 dias. Os valores descritos para subsidiar o gasto adicional da folha de pagamento correspondem ao salário base inicial de cada categoria no ano 2007, juntamente com o valor básico do salário bruto recebido e discriminado com gratificações e emolumentos adicionais.

Para facilitar a descrição dos resultados, optou-se por denominar os hospitais em H1 e H2. Nesse sentido, o H1 é uma unidade hospitalar que conta com 47 leitos ativos e 204 colaboradores dos quais 28 são médicos, 7 enfermeiros, 6 técnicos em enfermagem e 56 auxiliares de enfermagem. Destina-se ao atendimento de crianças e gestantes, incluindo também aquelas de alto risco.

Por sua vez, o H2 caracteriza-se como unidade hospitalar que dispõe de 45 leitos ativos e 228 colaboradores, dos quais 38 são médicos, 3 enfermeiros, 1 técnico em enfermagem e 33 auxiliares de enfermagem; é uma unidade de atendimento às urgências e emergências, realizando procedimentos de média complexidade.

As anotações nas planilhas de frequência subsidiaram encontrar os índices de absenteísmo por ausências não programadas e os percentuais relativos aos valores adicionais pagos, decorrentes das substituições desses profissionais nos respectivos dias de trabalho.

Observou-se que existe diversificação significativa de salários contratuais, dependendo do período em que o profissional foi contratado, como inclusão de horas extras, gratificações por especialização e incentivo por decreto-lei. Sendo assim, além do salário básico que é aquele registrado na carteira, algumas vantagens e gratificações são acrescidas no contracheque, oportunizando ao profissional ter aumento de renda no final do período, considerado atrativo, sendo, em alguns casos, superior a 500%. Por isso, optou-se utilizar o salário básico inicial e o salário total inicial com os acréscimos.

Para o cálculo do valor adicional da folha de pagamento, multiplicou-se, no caso dos profissionais de enfermagem, a quantidade de dias pelas horas trabalhadas no dia que, nesse caso, são oito horas, e novamente multiplicada pelo valor pago da hora extra. Quanto aos médicos, esses recebem um valor fixo de R$ 700,08 (setecentos reais e oito centavos) por plantões de vinte e quatro horas. O valor pago aos profissionais de enfermagem e aos médicos foi fornecido pelo setor de recursos humanos dos hospitais.

O índice de absenteísmo foi encontrado com base na fórmula apresentada(3), e calculado pelo programa Microsoft Office Excel 2007. Nesse caso, aplica-se a divisão do total de dias das ausências, não previstas ao trabalho, pelo número de dias úteis trabalhados no período, descontados os dias relativos às férias, feriados e aos finais de semana que, nesse caso, somam 272 dias ao ano, multiplicado pelo número de profissionais da categoria que se está pesquisando. Esse resultado é multiplicado por cem para apresentar o índice em porcentagem.

Figura 1


Resultados

Foram constatadas 1.704 ausências não programadas dos profissionais de enfermagem e médicos no período de 2004 a 2007, nos dois hospitais, sendo que 1.486 ausências são justificadas por atestados médicos e somente 218 ausências sem justificativas ou, simplesmente, descritas como faltas. Vale lembrar que o número de dias úteis no período de quatro anos foi de 1.088 (um mil e oitenta e oito), o que, multiplicado pelo número dos profissionais que foram objeto do estudo, resultou em 176.256 (cento e setenta e seis mil duzentos e cinquenta e seis) dias, atingindo índice de absenteísmo de 0,85%. Quanto ao absenteísmo por atestado médico em específico, esse foi responsável por 87,2% de todas as ausências não programadas. Se descrito por categoria de profissional, observou-se que, dos profissionais de enfermagem, atingiu índice de 83,3% e dos médicos 16,7%.

O número de atestados médicos emitidos nesses quatro anos foi de 290 (duzentos e noventa), do qual 63% são emitidos com até três dias, 12,8% até seis dias, 6% até nove dias, somente 2% são de até 12 dias e o restante 16,2% até 15 dias de afastamento das atividades laborais. Com base nos dados da quantidade de atestados emitidos, pode-se considerar que, durante o período de quatro anos, os dias úteis trabalhados foram de 1.088 dias, sendo, no H1, 904 ausências não programadas com atestado e, no H2, 582.

Com as informações coletadas simulou-se o gasto adicional na folha de pagamento no período de 2004-2007, destinado aos colaboradores dos hospitais objeto de estudo. Vale ressaltar que, quando há a necessidade de substituição pelas ausências, somente os colaboradores do município é que fazem as devidas substituições. Dessa feita, considerou-se, para cálculos, os vencimentos dos servidores públicos municipais envolvidos, conforme estabelecido em contrato e especificados na Tabela 1.

Os valores pagos nos quatro anos é o resultado da soma das faltas dos profissionais, multiplicado pelo valor pago de horas extras. No caso dos médicos, por exemplo, foram somados todos os dias de ausências, e multiplicou-se por um único valor, devido ao fato de a categoria receber plantões (30+22+196=248 * 700,08=R$173.620,00). Em seguida, somou-se o salário normal ao qual teve direito, o que resultou no valor de R$ 179.554,00 (cento e setenta e nove mil, quinhentos e cinquenta e quatro reais). Quanto aos demais profissionais de enfermagem, somou-se o total de dias ausentes e multiplicou-se por oito horas, pelo fato de o recebimento ser estipulado em horas e não em dias como os médicos (e.g. Aux.Enfer.=509+174+537=1.220 * 8 =9.760 * R$ 3,50=R$ 34.160,00). Para chegar ao valor adicional na folha de pagamento, também se somou o valor normal que não foi descontado no período de ausências justificadas.

O índice sobre o valor adicional foi encontrado com base na remuneração efetuada pelo salário base inicial dos profissionais do município no período sob análise, conforme demonstrado na Tabela 2. A Tabela 2 também apresenta a quantidade de salários que deixa de ser paga para cobrir o absenteísmo dos atestados médicos considerados, tanto sobre o salário base inicial da categoria como sobre a quantidade do salário médio recebido de cada categoria, no ano 2007. Verificou-se que, em relação aos médicos, o índice foi maior 7,4% de toda a remuneração paga para a categoria, ou seja, deixou-se de pagar 198 salários básicos ou, ainda, 34 salários acrescidos de gratificações e adicionais. Em seguida, vêm os auxiliares de enfermagem, com 5,2% de adicional na folha de pagamento, o que resultou em 88 salários básicos ou, ainda, em 34 salários acrescidos de gratificações e adicionais.

Apesar das limitações de anotações nos prontuários dos profissionais de enfermagem e médicos, a coleta de dados permitiu verificar, em alguns atestados médicos, os agravos ocupacionais que geraram essas ausências, pela identificação do CID - Classificação Internacional de Doenças. Esses dados apontam que 48% do absenteísmo doença estavam relacionados a doenças osteomusculares, conhecidas como LER/DORT. Ademais, 12% apresentaram quadro de inflamação leve (amigdalite) e 15% dos afastamentos foram por depressão, sendo, nesse caso, período de afastamento superior a 10 dias. Constatou-se, ainda, que dengue foi responsável por 5% das ausências e cefaleia pelos outros 20% restantes.

Não se verificou, nos dois hospitais estudados, predominância de absenteísmo após feriados, mas sim nos finais de semana, quando o profissional estaria escalado para fazer plantão. Em adição, constatou-se que alguns profissionais acarretam anotações frequentes no período investigado, ou seja, na maioria dos meses aparecem registros de ausências.

Na análise dos dados coletados, constata-se que Cacoal registrou, em quatro anos, produtividade média de 300 mil procedimentos nos dois hospitais. Mais especificamente no ano 2007, considerando-se a população residente, implicou em custo por habitante de R$ 214,33 (duzentos e quatorze reais e trinta e três centavos). Dentre os fatores envolvidos nesses resultados, merece atenção a questão dos colaboradores, uma vez que contribuíram para a formação desses gastos, durante o período que envolveu a pesquisa, no patamar de 61%.

Discussão

Os índices encontrados no estudo são altos, quando comparados aos de outros países da América do Sul, como Venezuela que apresentou 13% para médicos residentes e 7% para enfermeiros(9), ou até mesmo na Índia (67% para profissionais da saúde)(8), onde ocorreu diminuição de investimento na área da saúde na década 1991-2001. Contudo, os índices de absenteísmo nos hospitais de Cacoal que foram estudados são comparáveis àqueles relatados por alguns hospitais da rede no Sul-Sudeste: 79,2% em Porto Alegre(4), 75,4% em São José do Rio Preto(11). Os percentuais de atestados também são altos, quando comparados ao levantamento no Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre, em 2003-2004(10), e Manaus, com 2,9%(13).

Embora a causa da ausência não programada não tenha sido objetivo fundamental nesta pesquisa, os dados referentes à origem do absenteísmo vão de encontro a estudos realizados no Hospital Universitário no Estado de São Paulo, no ano de 2000, onde, dos 1988 atestados médicos emitidos, 84,2% referia-se às doenças do aparelho digestivo, bem como do Hospital Escola de Uberaba, MG, no ano 2002, em que os atestados médicos indicaram 21,57% de dor lombar, 13,73% de cefaleia, 8,82% de rinite e afecções respiratórias, 5,9% de hipertensão e dor em membro e o restante de acidentes de trabalho por riscos biológicos(14-15).

Enquanto o índice do absenteísmo doença encontrado foi de 0,85%, quando apontado em dias não trabalhados, o gasto adicional na folha de pagamento teve variação considerável. Observou-se que os auxiliares de enfermagem atingiram índice de 5,2%, o que, relacionado c ao índice do absenteísmo, é seis vezes maior. Já o dos profissionais médicos representou 8,5 vezes a mais.

Essa diferença entre o índice do absenteísmo doença com o índice de gasto adicional na folha de pagamento, na maioria dos casos, não é evidenciada. Outro fato que se destaca é o absenteísmo doença de grau maior concentrar-se nos profissionais que já estão trabalhando há mais de cinco anos nessas instituições, por terem, talvez, em mente, a estabilidade do emprego. Essa observação ocorre pelas conversas informais com os pesquisadores e percebido em algumas planilhas de frequência, tendo, inclusive, alguns profissionais com mais de dois anos de afastamento por motivo doença.

O absenteísmo poderia ser minimizado nos hospitais do município, com implantação e adequação de políticas que possibilitem um ambiente melhor de trabalho, práticas de incentivo pelos gestores, culturas que privilegiam a participação, bem como intervenções na promoção da saúde do trabalhador e no adequado dimensionamento dos profissionais de saúde, conforme estratégias já sugeridas em estudos anteriores na Região Norte(13).

Um exemplo de mudança na política de trabalho foi feita no Hospital Confidencial de Hollywood, na Austrália Ocidental, que reduziu para 2,24% o índice de absenteísmo com a utilização EEO - Equal Employment Opportunity (Lei Federal da Oportunidade Igual de Emprego) - que implantou o programa família-amiga, no qual os parentes dos pacientes ajudam os funcionários do hospital(16).

Considerações finais

O estudo possibilitou apontar os gastos que incidem sobre a folha de pagamento, ocasionados por faltas não programadas e justificadas por atestados médicos, relativos ao período de até 15 dias, sem acarretar perda nos vencimentos. Também poderá contribuir para as estatísticas dos levantamentos sobre os gastos gerados pelo absenteísmo nas instituições hospitalares no Brasil, que vêm se destacando nas últimas duas décadas, e congregam dados de suma importância para subsidiar os gestores no planejamento de estratégias, para implantações das políticas necessárias à canalização adequada dos recursos financeiros voltados para a área da saúde.

Partindo do pressuposto de que é por meio do trabalho desenvolvido com assiduidade e responsabilidade que se alcançam os resultados propostos pelas instituições que, nesse caso, é atender as necessidades de saúde da população, entende-se que o absenteísmo é essencialmente um problema de gestão. Em investigação recente, sobre o afastamento do trabalho na enfermagem, autores argumentam que os dados obtidos nesse tipo de pesquisa podem subsidiar intervenções para a melhoria das condições de trabalho vigentes, diminuindo os custos econômicos e sociais nesse contexto. Também se espera que o presente estudo possa contribuir, de alguma maneira, para que os gestores dos hospitais de Cacoal revertam os gastos demonstrados, em estratégias que motivem seus colaboradores como plano de carreira, redução de gastos com medicação e premiações por assiduidade, entre outros.

Referências

Recebido: 1.5.2009

Aceito: 20.12.2009

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Ago 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Recebido
      01 Maio 2009
    • Aceito
      20 Dez 2009
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