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Arranjo domiciliar dos idosos mais velhos

Resumos

O contexto do envelhecimento dos idosos mais velhos necessita ser considerado em decorrência da redefinição da família como instituição social. Este é estudo epidemiológico, transversal, que caracterizou o arranjo domiciliar de 147 idosos mais velhos residentes na comunidade de Ribeirão Preto, SP, através de entrevistas domiciliares. Predominou a faixa etária de 80 a 84 anos. A maioria recebe aposentadoria, possui de um a três salários mínimos, mora em casa própria. Possui 4,08 filhos e reside com 2,8 pessoas, em média. Os homens vivem, na maioria, com o cônjuge, enquanto as mulheres, sozinhas, e os domicílios são chefiados pelo idoso. Os arranjos mais continentes foram os bi e trigeracionais. Quanto à formação do arranjo domiciliar, houve equivalência nos resultados entre aqueles que afirmaram ter ido morar com o idoso e aqueles em que o idoso foi morar no domicílio da família, o que reforça a família como protetora e cuidadora dos idosos.

idoso; família; gerontologia


The aging context of the elder elderly needs to be taken into account, due to the redefinition of family as a social institution. This is an epidemiological, cross-sectional study that characterized the household arrangements of 147 elder elderly living in Ribeirão Preto, SP, through home interviews. The age range between 80 and 84 years predominated. The majority receives a retirement benefit ranging from one to three minimum wages, and owns their house. On the average, they have 4.08 children and live with 2.8 people. Most men live with their partners, while women live by themselves. The elderly head a large part of households. The most frequent arrangements are families with two and three generations. Regarding the household arrangement, there was equivalence in the results between the ones that moved into the house of the elderly and cases when the elderly moved into the family’s house, reinforcing the family as a protector and caregiver of the elderly.

aged; family; gerontology


El contexto del envejecimiento de ancianos con edad avanzada necesita ser considerado como una consecuencia de la redefinición de la familia como institución social. Este es un estudio epidemiológico, transversal, que caracterizó el arreglo domiciliar de 147 ancianos con edad avanzada residentes en la comunidad de Ribeirao Preto, Sao Paulo, Brasil, a través de entrevistas domiciliares. Predominó el intervalo de edad de 80 a 84 años. La mayoría era jubilado, recibía de un a tres salarios mínimos y habitaba en casa propia. Tenían 4,08 hijos y vivían con 2,8 personas, en promedio. Los hombres vivían, en su mayoría, con el conyugue, en cuanto las mujeres, lo hacían solas, y los domicilios eran dirigidos por el anciano. Los arreglos más convenientes fueron los realizados con la segunda y tercera generaciones. En cuanto a la formación del arreglo domiciliar, hubo equivalencia en los resultados, entre aquellos que afirmaron haber ido a vivir con el anciano y aquellos en que el anciano fue a vivir en el domicilio de la familia, lo que refuerza la familia como protectora y cuidadora de los ancianos.

anciano; família; gerontología


ARTIGO ORIGINAL

Arranjo domiciliar dos idosos mais velhos

Elizandra Cristina PedrazziI; Talita Tavares Della MottaII; Thaís Ramos Pereira VendrúscoloIII; Suzele Cristina Coelho Fabrício-WehbeIV; Idiane Rosset CruzIV; Rosalina Aparecida Partezani RodriguesV

Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil:

IEnfermeira, Mestre em Enfermagem, e-mail: elizandra_p@yahoo.com.br

IIAluna do curso de graduação em enfermagem, e-mail: tata.dellamotta@hotmail.com

IIIEnfermeira, Bolsista de apoio técnico CNPq, e-mail: thaisvendruscolo@yahoo.com.br

VEnfermeira, Professor Titular, e-mail: rosalina@eerp.usp.br

Escola de Enfermagem e Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo:

IVEnfermeira, Doutoranda em enfermagem, e-mail: suzelecris@ig.com.br, rossetidi@hotmail.com

Endereço para correspondência

RESUMO

O contexto do envelhecimento dos idosos mais velhos necessita ser considerado em decorrência da redefinição da família como instituição social. Este é estudo epidemiológico, transversal, que caracterizou o arranjo domiciliar de 147 idosos mais velhos residentes na comunidade de Ribeirão Preto, SP, através de entrevistas domiciliares. Predominou a faixa etária de 80 a 84 anos. A maioria recebe aposentadoria, possui de um a três salários mínimos, mora em casa própria. Possui 4,08 filhos e reside com 2,8 pessoas, em média. Os homens vivem, na maioria, com o cônjuge, enquanto as mulheres, sozinhas, e os domicílios são chefiados pelo idoso. Os arranjos mais continentes foram os bi e trigeracionais. Quanto à formação do arranjo domiciliar, houve equivalência nos resultados entre aqueles que afirmaram ter ido morar com o idoso e aqueles em que o idoso foi morar no domicílio da família, o que reforça a família como protetora e cuidadora dos idosos.

Descritores: Idoso; Família; Gerontologia.

Introdução

O envelhecimento populacional é, hoje, fenômeno mundial. Isso significa crescimento mais elevado da população idosa, maior de 60 anos, com relação aos demais grupos etários. Além disso, a proporção da população de idosos com 80 anos ou mais também está aumentando, isto é, a população considerada idosa também está envelhecendo(1).

O número de idosos na cidade de Ribeirão Preto, em 2008, era de 67.965 habitantes, dos quais 54% possuíam de 60 a 69 anos, 31,3% de 70 a 79 anos e 14,5% tinham mais de 80. Para 2009, a população estimada foi de 70.677 idosos, desses, 14,7% seriam de idosos com 80 anos ou mais(2). Paralelamente a esse aumento na expectativa de vida, tem sido observado, a partir da década de 60, do século XX, declínio acentuado da fecundidade. Segundo estudo demográfico do IBGE(3), as famílias estão tendo cada vez menos filhos: em 1960, a média era de seis filhos por mulher, enquanto que, em 2000, foi de 2,39 filhos e estimativas indicam que a fecundidade limite brasileira será de 1,5 filhos por mulher por volta de 2028.

O envelhecimento populacional traz implicações importantes quanto à proteção social do idoso. O número crescente de divórcios, múltiplos casamentos, a migração dos mais jovens em busca de mercados mais promissores, a inserção da mulher no mercado de trabalho e sua condição de chefia do domicílio precisam ser considerados quando se avalia o arranjo domiciliar e o suporte informal aos idosos na sociedade brasileira(1). Além disso, modificações socioeconômicas nos países latino-americanos têm levado muitos filhos a residirem novamente na casa de seus pais, além do fato de permanecerem por mais tempo dependentes economicamente(4).

Estudo que avaliou a rede social e a saúde de idosos em três diferentes sociedades, uma latino-americana (Costa Rica), uma latino-europeia (Espanha) e outra anglo-saxã (Reino Unido) mostrou modelos distintos de redes familiares nesses países(5). A Costa Rica caracterizou-se pela corresidência intergeracional, enquanto que o modelo de redes familiares britânico reflete grande independência dos idosos e o apoio social é transmitido por redes não familiares. Já a sociedade espanhola mostra modelo intermediário de redes familiares, baseados na corresidência, porém, se encontra num momento de transição. A Costa Rica apresentou redes de apoio familiares mais fortes do que nas sociedades europeias. Naquela sociedade, menos de 10% dos idosos vivem sozinhos, comparados com 33% dos britânicos e 23% dos espanhóis(5).

A corresidência com idosos ocorre principalmente quando a necessidade desses é maior, como no caso da piora do estado de saúde ou do falecimento do cônjuge. Na China, as mudanças entre os arranjos domiciliares de idosos mais velhos ocorrem frequentemente e estão mais relacionadas com limitações funcionais do que com outros indicadores de saúde(6).

Foram escassos, no entanto, os estudos encontrados, tanto na literatura nacional quanto na internacional, que se direcionassem à avaliação da rede de apoio familiar aos idosos residentes na comunidade, especialmente àqueles mais velhos.

De posse desses dados, será possível elaborar propostas de planejamento que visem atender às necessidades de cuidado dessa parcela da população de idosos que tem apresentado importante crescimento na sociedade brasileira. Sob essa perspectiva, o domicílio é local único a oferecer à enfermeira a oportunidade de observar o modo como as pessoas enfrentam a situação de saúde/doença em seu seio familiar, bem como os recursos disponíveis. No entanto, para que se possa, de fato, apoiar, proporcionar e sustentar um sistema de cuidados é necessário que se compreenda as inter-relações pertinentes ao domicílio e aos familiares.

Objetivo

Caracterizar os idosos mais velhos, segundo características socioeconômicas e demográficas, e descrever o arranjo domiciliar de idosos mais velhos, de acordo com o tipo de arranjo, a chefia do domicílio, sua formação e as razões de moradia.

Metodologia

Este trabalho foi realizado na zona urbana do município de Ribeirão Preto, SP, através de entrevistas domiciliares com idosos mais velhos residentes na comunidade. Trata-se de estudo epidemiológico, do tipo transversal, com base populacional de uma amostra representativa de 147 idosos, com 80 anos ou mais de idade, calculada sobre a estimativa populacional para o ano 2004. O presente estudo está inserido numa ampla pesquisa intitulada Condições de vida e saúde de idosos de Ribeirão Preto, SP, o qual engloba amostra probabilística de idosos com 65 anos ou mais. O mesmo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP.

O processo de amostragem foi probabilístico, por conglomerados, de duplo estágio. No primeiro estágio foram sorteados 30 setores censitários, entre os 600 setores do município. O segundo estágio foi constituído por sorteio com cota fixa de domicílios, resultando, assim, em amostra autoponderada.

O termo de consentimento livre e esclarecido foi elaborado pelo pesquisador responsável, sendo um entregue ao idoso, obedecendo às exigências das normatizações nacionais. Para a coleta dos dados, foi utilizado questionário no qual constava a identificação dos sujeitos, a caracterização sociodemográfica e o perfil social. As variáveis para a investigação do arranjo domiciliar do idoso foram selecionadas com base no questionário de coleta de dados do estudo SABE – Saúde, Bem-estar e Envelhecimento na América Latina e Caribe(7).

Os arranjos familiares foram subdivididos entre os seguintes grupos: o idoso vive sozinho, vive somente com o cônjuge, vive com o cônjuge e os filhos, vive com o cônjuge, os filhos, o genro ou a nora, mora somente com os filhos, arranjos trigeracionais, vive com os filhos e netos, somente com os netos (sem os filhos) e o idoso mora com não familiares(7). O banco de dados foi digitado no programa Excel, e realizado o VALIDATEdas informações. Utilizou-se o SPSS (Statistical Package for Social Science) for Windows para análises estatísticas. Realizou-se descrição das variáveis com medidas de frequência, média, mediana, desvio padrão e variáveis consideradas independentes (sociais e demográficas). Medidas de associação foram analisadas empregando-se os testes não-paramétricos de Mann-Whitney e coeficiente de Spearman, considerando o nível de significância α 0,05.

Resultados

Obteve-se o total de 147 entrevistas domiciliares com idosos de 80 anos ou mais.

A Tabela 1 mostra os dados referentes às características socioeconômicas e demográficas dos idosos. A idade média foi de 84,1 anos, a mediana de 83, e o desvio padrão de 4. Comparando-se a idade entre sexo masculino e feminino, o teste de Mann-Whitney indicou que as diferenças não são estatisticamente significativas (p=0,650). A idade dos idosos do sexo masculino variou entre 80 e 93 anos e das idosas entre 80 e 103 anos. Na distribuição por sexo, a porcentagem de idosas é superior à dos idosos em todas as faixas etárias.

Quanto ao estado civil, há predominância de viúvos entre as mulheres, no entanto, entre os casados, a maioria é de homens. Os anos de estudo variaram de zero a dezoito, com média de 3,6 anos e concentração dos idosos na faixa entre um e quatro anos de estudo. Segundo o teste de Mann-Whitney, as diferenças não foram estatisticamente significativas (p=0,195) na análise entre sexo e escolaridade. Ainda assim, prevaleceu entre as mulheres maior frequência de analfabetismo. A grande maioria dos idosos era de cor branca, residente em casa própria, recebendo aposentadoria, com predomínio de homens. A segunda fonte de rendimento foi referente à pensão, com destaque para as mulheres.

Quanto aos valores dos rendimentos, a maior parte recebe entre um e três salários mínimos (SM), e pequena porcentagem recebe mais de três salários mínimos, como mostra a Tabela 1. A média dos rendimentos dos idosos foi de R$ 955,70, com mediana de R$ 440,00 e desvio padrão de R$ 1341,80. O valor médio dos rendimentos dos idosos do sexo feminino foi de R$ 722,60 e dos masculinos foi de R$ 1421,80. Comparando-se a renda do idoso entre sexo, o teste de Mann-Whitney indicou que as diferenças são estatisticamente significativas (p=0,002). A renda familiar dos idosos concentra-se entre um e três salários mínimos (36,7%) e mais de três SM (37,4%). Apenas dez idosos referiram renda familiar de um salário.

Quanto ao número de filhos, 42,9% dos idosos têm entre três e cinco filhos, seguidos daqueles que têm entre um e dois (29,3%) e seis filhos ou mais (19,7%), com média de 4,08 filhos. A porcentagem de idosos que declarou não ter filhos foi de 8,2%. O número de pessoas que moram na casa variou entre uma e doze, com média de 2,8 pessoas.

Dos idosos que afirmaram possuir renda familiar de um SM, a maioria (60%) reside com duas pessoas. Conforme aumentam os rendimentos familiares, aumenta o número de indivíduos que vivem na residência. Daqueles que possuem mais de um a três SM, 40,7% residem com duas pessoas, 35,2% com três a cinco pessoas e 9,3% com mais de seis indivíduos. Quando a renda familiar é de mais de três SM, a situação é equivalente, porém, a maioria reside com três a cinco pessoas.

A Tabela 2 evidencia as informações sobre os arranjos domiciliares dos idosos mais velhos de Ribeirão Preto, e que a maioria mora com o cônjuge. Grande parte ainda reside sozinha e com os filhos. Há predomínio de mulheres vivendo sozinhas e de homens vivendo com o cônjuge. A maioria das mulheres reside somente com o filho. Mais da metade dos idosos é responsável pela chefia do domicílio, com equivalência entre mulheres e homens.

Quanto à formação do arranjo domiciliar, também houve equivalência nos resultados entre aqueles que afirmaram ter ido morar com o idoso e aqueles que afirmaram ter sido o idoso quem foi morar no domicílio da família. Observou-se grande número de respostas na alternativa “outros”, podendo ser explicada pelo grande número de casais, filhos que sempre moraram com seus pais e ainda permanecem na casa, além de idosos que residem sozinhos. Em relação aos motivos para residir no domicílio, a maioria referiu ser devido à união conjugal, seguido daqueles que apontaram o falecimento do esposo ou companheiro para configuração do arranjo atual. A necessidade de cuidados ou situação financeira dos idosos ou familiares não foi motivo mencionado.

Explorando os dados do estudo, foi possível estabelecer, ainda, algumas relações entre as variáveis. Na relação entre o arranjo domiciliar e o estado conjugal, observou-se que os solteiros vivem mais em arranjos intrageracionais (44,4%). Os divorciados vivem sozinhos (40%) e em arranjos trigeracionais (40%) e os viúvos vivem na maioria com os filhos (26,3%), sozinhos (23,8%) e em outros arranjos (22,5%). Analisando o arranjo domiciliar com o sexo e idade, a maioria (32,3%) dos idosos masculinos (57,6%) com idade entre 80 e 84 anos reside com o cônjuge, 16,1% residem sozinhos, a maioria mulheres (18,3%), 11,8% com filhos e 10,8% com filhos e netos. Entre aqueles com 85 a 89 anos, é bastante reduzido o número de idosos que vive sozinho (10%) e com o cônjuge (20%) e a relação entre os sexos é a mesma citada acima. Os que moram com filhos representam 17,5%. Os arranjos predominantes na faixa etária acima dos 90 anos foram daqueles que vivem com os filhos, e com os filhos e netos (21,4%). A relação estabelecida entre chefia do domicílio, sexo e estado conjugal mostrou que os idosos do sexo feminino predominam como chefes do domicílio quando são viúvas (90%) e os masculinos, quando casados (81,8%).

Quanto à formação do arranjo, relacionada aos motivos dos idosos que foram morar com outras pessoas, 25% moram somente com os filhos ou em arranjos trigeracionais para estarem perto dos filhos, 15,4% referiram a viuvez, 50% devido à separação conjugal. Essa razão também foi responsável por 50% dos arranjos intrageracionais. Para a metade dos idosos que recebeu não familiares em sua residência, a justificativa foi para estar perto de familiares ou amigos. Um motivo citado para quem foi morar com o idoso, configurando o arranjo trigeracional, foi o falecimento do esposo ou companheiro (75%). A união conjugal apresentou-se como razão referida para a formação do arranjo “cônjuge, filho, genro ou nora” por 33,3% dos entrevistados. A separação conjugal levou filhos a morar com os pais (11,1%), ou com um dos pais (22,2%) e em arranjos trigeracionais (33,3%). A necessidade de cuidado levou pessoas a residir com o idoso nos arranjos “cônjuge, filhos, genro ou nora”, arranjos intrageracionais (20%) e não familiares (40%).

Discussão

A feminilização do envelhecimento é situação atual em que o número absoluto de idosas, quando confrontado com o de homens de 65 anos e mais, tem sido superior. Esse fato é decorrente de situação de mortalidade diferencial por sexo que prevalece desde 1950, somando seis anos a mais de vida para as mulheres(8). Estudos com idosos brasileiros de 80 anos ou mais têm verificado alta prevalência de viúvos, com predomínio das mulheres e maior número de casados entre os homens(9-10). Em São Paulo foi verificada prevalência de viúvos de cerca de 45%(9), e no meio rural do Rio Grande do Sul, 62%(10). Esses dados indicam a importância de readaptação para um novo arranjo familiar dessa faixa etária.

Sobre a quantidade de anos que frequentou a escola, estudos relatam que o analfabetismo dentre a população idosa é muito frequente, sendo que, entre 1950 e 1993, 40% dos homens e 48% das mulheres idosas se declararam analfabetos(8), além disso, 58,8% dos idosos mais velhos da zona rural do Rio Grande do Sul eram analfabetos e aqueles do sexo masculino tiveram os melhores índices de escolaridade, corroborando dados deste estudo(10). Outro estudo com octagenários, no interior do Estado de São Paulo, mostrou resultados muito semelhantes aos desta pesquisa em relação à frequência da idade, escolaridade, renda familiar e estado civil dos idosos mais velhos(9).

Quanto às condições econômicas, 77% das mulheres idosas brasileiras, em 2000, estavam recebendo algum benefício da seguridade social, o que favoreceu 94% das viúvas(11), fato que possibilita maior independência financeira para morar sozinha, segundo estudo nos Estados Unidos(12). Ter renda favorece o envelhecimento ativo, pois contribui para o orçamento familiar, propicia autonomia financeira para atender as necessidades dos idosos e tem peso considerável na renda das famílias com idosos(1). Um estudo chama a atenção para a proporção de famílias pobres com membros idosos que mostrou ser menor quando comparada a famílias sem idosos(1). Entre os idosos, muitos ainda residem sozinhos. Estudo realizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) analisou os arranjos domiciliares dos idosos, apresentando dados comparativos de 130 países e concluiu que, aproximadamente, uma em cada sete pessoas idosas (90 milhões) vive sozinha, sendo que cerca de 2/3 dessas são mulheres; existe tendência a favor de modalidades de vida independente (sozinho ou sozinho com o cônjuge) mais consolidada em países desenvolvidos; há menor proporção de mulheres idosas casadas, comparativamente aos homens (cerca de 45% contra 80%); embora nos países desenvolvidos o arranjo mais comum seja morar separado dos filhos, naqueles em desenvolvimento a maioria dos idosos vive com seus filhos(13). No Brasil, a proporção de idosos, em velhice avançada, que residem sozinhos, corresponde a 21,3%(7). A universalização da seguridade social, as melhorias nas condições de saúde e avanços nos meios de comunicação, no transporte e serviços podem sugerir que viver só, para os idosos, represente forma inovadora e bem-sucedida de envelhecimento, e não abandono e solidão(4).

Estudo sobre os arranjos domiciliares na América Latina e Caribe trouxe como arranjo prevalente os bigeracionais e, em segundo lugar, o mais prevalente foi o de casais. Esse tipo de arranjo chama a atenção pelo fato de que os casais têm idades próximas, sugerindo que podem ser cuidadores de outros idosos. Nos arranjos trigeracionais, conta-se com maior número de corresidentes e maior potencial de auxílio(7), corroborando os resultados do estudo.

A corresidência beneficia tanto os idosos quanto as gerações mais jovens(4). A necessidade de auxílio, seja físico, afetivo ou financeiro, faz com que muitos idosos deixem de viver de forma independente para irem morar com suas famílias.

Nem todos os idosos, necessariamente, querem viver com seus familiares. Em estudo com idosas mexicanas, chefes de domicílio, as autoras verificaram que mais de dois terços delas prefeririam continuar vivendo em suas próprias casas na velhice e, dessas, 11% escolheriam viver sozinhas. Quando questionadas sobre a preferência por morarem sozinhas, as idosas se mostraram preocupadas com a sua privacidade e a dos familiares(14).

A família, cuja mulher é o chefe, devido à ausência do marido/companheiro, denota maiores dificuldades em função da menor renda e de mais problemas de saúde(15). Discutindo dados do IBGE, de 1983 a 2003, sobre a chefia do domicílio, chama a atenção que a maioria dos idosos do sexo masculino chefia suas famílias (90%) e que essa condição não se alterou ao longo dos anos. Por outro lado, entre as idosas predominavam aquelas que eram casadas(11).

Referente ainda aos dados, os arranjos chefiados por filhos e por outros familiares foram citados em sua maioria pelos idosos do sexo feminino. Merece atenção a condição de dependência do idoso sobre as famílias mensuradas a partir da relação com o chefe do domicílio na condição de “parente” ou “agregado”, os quais seriam pais ou sogros que, na falta de renda ou autonomia física ou mental, vão morar com filhos ou outros parentes(4). Na análise com dados do projeto SABE, para os municípios de São Paulo, Buenos Aires, Montevidéu e Cidade do México, o autor observou que a probabilidade de receber auxílio funcional entre os idosos que moram sozinhos é 63% menor do que para aqueles que corresidem com uma pessoa. Ademais, a coabitação tende a aumentar significativamente o fluxo de ajuda financeira(7).

Em relação ao fluxo que levou à formação do arranjo domiciliar, só a partir dos 80 anos há aumento do início da dependência física, econômica ou psicológica, havendo necessidade da família morar com o idoso ou vice-versa, favorecendo as gerações mais novas e mais velhas. Nesse momento, o conceito de família deve ser ampliado para abarcar as demandas do idoso, incluindo vizinhos e pessoal dos serviços de saúde ao qual o idoso está adstrito(15).

Considerações Finais

Em Ribeirão Preto, ainda é preciso investimentos em programas governamentais e não-governamentais, considerando o aumento da longevidade, a diminuição do número de membros da família e de grande parcela de idosos viver sozinha. Há necessidade de projetos articulados entre as áreas social e de saúde para o apoio aos idosos mais velhos e suas famílias, considerando a necessidade de cuidado à saúde. A implementação desses projetos deve ter participação tanto dos órgãos de saúde e de educação do município de Ribeirão Preto, enquanto responsável pelos seus habitantes, quanto pelas famílias e sociedade em geral. É imprescindível a especialização dos profissionais de saúde em gerontologia e geriatria, além do envolvimento do enfermeiro em equipes multiprofissionais. Além disso, observa-se, na atualidade, que a área de saúde está atendendo políticas de atenção à família, reconhecendo nessa necessidade a oportunidade para o desenvolvimento do trabalho da enfermagem direcionado à nova e crescente parcela da população, considerada fragilizada.

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  • Corresponding Author:
    Rosalina Aparecida Partezani Rodrigues
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Fev 2010

    Histórico

    • Recebido
      10 Out 2008
    • Aceito
      03 Set 2009
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