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Entre o bem-estar espiritual e a angústia espiritual: possíveis fatores relacionados a idosos com cancro

Resumos

OBJETIVOS:

este artigo descreve a avaliação do bem-estar espiritual de idosos com cancro, submetidos à quimioterapia, e de possíveis fatores preditivos do diagnóstico angústia espiritual.

MÉTODO:

trata-se de estudo metodológico, de validação clínica de diagnósticos de enfermagem, com entrevista para o preenchimento de formulário.

RESULTADOS:

foram participantes 45 idosos, católicos, maioritariamente do sexo feminino, com cancro da mama, média de idade de 70,3 anos. A prevalência de angústia espiritual foi de 42%, e 24,4% dos idosos estavam medicados com antidepressivos. Observou-se associação significativa entre a presença de angústia espiritual, medicação antidepressiva e escolaridade; verificou-se aumento da referida angústia (diferença não significativa) no início do tratamento.

CONCLUSÃO:

esses resultados enfatizam a necessidade de clarificar esse diagnóstico e a responsabilidade dos enfermeiros na assistência espiritual aos pacientes. As intervenções deverão ser adequadas sempre que identificado um diagnóstico de enfermagem que constitui uma resposta complexa e que não se reduz ao tratamento farmacológico.

Enfermagem; Espiritualidade; Diagnóstico de Enfermagem; Idoso; Neoplasias


OBJECTIVE:

this article describes the assessment of the spiritual wellbeing of elderly patients with cancer submitted to chemotherapy and possible predictive factors of the spiritual distress diagnosis.

METHODOLOGY:

this is a methodological study for clinical validation of a nursing diagnosis, using interviews to assist in completing the form.

RESULTS:

45 elderly patients participated in this study, Catholics, mostly female, diagnosed with breast cancer, average age of 70.3 years. The prevalence of spiritual distress was of 42%; 24.4% of the elderly patients were under anti-depressant medication. A significant association was noted between spiritual distress, anti-depressant medication and level of education; an increase (not significant) was acknowledged at the start of the treatment.

CONCLUSION:

these results emphasize the relevance of clarifying this diagnosis and the responsibility of nurses to provide spiritual care to patients. Interventions should be planned appropriately every time a nursing diagnosis is identified as a complex answer and for which pharmacological treatment is not sufficient.

Nursing; Spirituality; Nursing Diagnosis; Aged; Neoplasms


OBJETIVOS:

este artículo describe la evaluación del bienestar espiritual de ancianos con cáncer sometidos a quimioterapia y de posibles factores predictivos del diagnóstico sufrimiento espiritual.

MÉTODO:

se trata de un estudio metodológico, de validación clínica de diagnósticos enfermeros, con entrevista para el relleno de formulario.

RESULTADOS:

participaron 45 ancianos, católicos, mayoritariamente del sexo femenino, con cáncer de mama, edad promedia de 70,3 años. La prevalencia de sufrimiento espiritual correspondió al 42%; y 24,4% de los ancianos estaban medicados con antidepresivos. Se observó asociación significativa entre la presencia de sufrimiento espiritual, medicación antidepresiva y escolaridad; se verificó aumento (diferencia no significativa) en el inicio del tratamiento.

CONCLUSIÓN:

estos resultados enfatizan la necesidad de clarificar este diagnóstico y la responsabilidad de los enfermeros en la atención espiritual a los pacientes. Las intervenciones deberán ser adecuadas siempre que identificado un diagnóstico enfermero que constituye una respuesta compleja y que no se reduce al tratamiento farmacológico.

Enfermería; Espiritualidad; Diagnóstico de Enfermería; Anciano; Neoplasias


Introdução

No contexto de saúde, é cada vez mais desejável uma assistência holística aos pacientes, traduzida no dever dos enfermeiros de atender todas as necessidades das pessoas, quer sejam as que são mais relacionadas à dimensão biopsicossocial quer sejam as necessidades de natureza espiritual. A inclusão e a importância da espiritualidade em enfermagem têm sido enfatizadas pela sua relevância na qualidade dos cuidados e no bem-estar dos pacientes, em particular dos idosos, dos pacientes com cancro e em fase terminal( 11. Monod S, Rochat E, Bula C,Jobin G, MartinE, Spencer B. The spiritual distress assessment tool: an instrument to access spiritual distress in hospitalized elderly persons". BMC Geriatrics. [Internet] . 2010. [acesso 22 jan 2011]; 10(1):88. Disponível em http://www.biomedcentral.com/1471-2318/10/88
Disponível em http://www.biomedcentral.c...

2. Lamb M, Buchanan D, Godfrey C,Harrison M, OakleyP. The psychosocial spiritual experience of elderly individuals recovering from stroke: a systematic review. Int J Evid Based Healthcare. 2008;6(2):173-205.

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- 44. Morita T, Tsunoda J, Inoue S,Chihara S. An exploratory factor analysis of existential suffering in Japanese terminally ill cancer patients.Psychooncology. 2000;9(2):164-8. ). A espiritualidade deriva do termo spiritus que significa sopro de vida. Está relacionada com as questões maiores da vida, porque permite às pessoas questionar, procurar e encontrar o sentido da sua vida( 55. NarayanasamyA, Clissett P, Parumal L, Thompson D, Annasamy S,Edge R. Responses to the spiritual needs of older people. J Adv Nurs. 2004;48(1):6-16. - 66. Pesut B, Fowler M, Taylor E,Sawatsky R. Conceptualizing spirituality and religion for health care. J Clin Nurs. 2008;17(21):2803-10. ). Cada pessoa encontra o sentido da sua vida de diferentes modos, conferindo à espiritualidade um caráter individual, dinâmico e subjetivo. Além do sentido da vida, a espiritualidade está intimamente relacionada com as crenças, valores e transcendência( 77. Chaves E, Carvalho E, Hass V. Validação do diagnóstico de enfermagem angústia espiritual: análise por especialistas. Acta Paul Enferm. 2010;23(2):264-70. ). Por essa razão, todas as pessoas são seres espirituais e o enfermeiro deve atender essas necessidades dos pacientes religiosos e mesmo dos que se consideram ateus ou agnósticos. As situações mais críticas da vida e que suscitam a possibilidade de morte, confrontando as pessoas com a sua finitude, são aquelas que mais se revestem de uma natureza espiritual( 88. Puchalski C, Ferrell B, Virani R,Otis-Green S, BairdP, Bull J, Chochinov H, et al. Improving the quality of spiritual care as a dimension of palliative care: the report of the consensus conference. J Palliat Med.2009;12(10):885-904. ). A doença é exemplo dessa situação e os enfermeiros são profissionais de saúde presentes nesses momentos e que têm oportunidade de diagnosticar, intervir e promover resultados positivos sensíveis à sua intervenção. Do mesmo modo, os idosos, por se aproximarem do fim de vida, adotam uma prática religiosa ou espiritual mais regular, retomando o conforto da fé ou uma doutrina de vida que lhes permita encontrar sentido e paz( 33. Puchalski C. Spirituality in the cancer trajectory.Ann Oncol. 2012;23(3):49-5. , 99. Fowler J. Stages of Faith -The Psychology of Human Development and the Quest for Meaning. New York: HarperCollins Publishers; 1981. 332p. ). O cancro constitui uma doença temível por estar muito associada à chegada da morte mais prematura e ao sofrimento causado, também, pelos tratamentos adjacentes. A prevalência é mais alta nessa faixa etária.

A NANDA-I define o diagnóstico de enfermagem angústia espiritual como "capacidade prejudicada de experienciar e integrar significado e objetivo à vida por meio de uma conexão consigo mesmo, com os outros, arte, música, literatura, natureza e/ou um ser maior"( 1010. NANDA Internacional. Diagnósticos de enfermagem: definições e classificação, 2009-2011.Porto Alegre (RS): Artmed; 2010. 452 p. ). O diagnóstico integra a NANDA-I desde 1978, porém, os estudos de validação realizados não contemplavam a opinião do paciente, mas apenas a dos peritos, por meio do modelo de validação de conteúdo de Richard Fehring. É necessária a sua validação clínica, com uma abordagem aos pacientes, de modo a desenvolver linguagem classificada relacionada à espiritualidade( 1111. Cavendish R, Luise BK, Horne K,Bauer M, MedefindtJ, Gallo MA, et al. Opportunities for enhanced spirituality relevant to well adults. Nurs Diagn. 2000;11(4):151-63. ). Os estudos de validação dos diagnósticos contribuem para a acurácia e facilitação da identificação pelos enfermeiros durante a sua prática clínica( 1212. Creason N. Clinical validation of nursing diagnoses. Int J Nurs Terminol Class. 2004;15(4):123-32. ).

A subjetividade do conceito de espiritualidade e a falta de preparação dos enfermeiros são dois fatores que justificam a integração insuficiente das intervenções espirituais na prestação de cuidados( 55. NarayanasamyA, Clissett P, Parumal L, Thompson D, Annasamy S,Edge R. Responses to the spiritual needs of older people. J Adv Nurs. 2004;48(1):6-16. , 1313. McSherry W, Smith J. Spiritual Care - principles, values and skills. In: McSherry W, McSherry R,Watson R. Care in nursing.Oxford: Oxford University Press;2012. p. 117-31. - 1414. Villagomeza LR. Spiritual distress in adult cancer patients - toward conceptual clarity. Holist Nurs Pract. 2005;19(6):285-94. ). O cuidado espiritual inclui a avaliação do bem-estar espiritual, a formalização de diagnósticos de natureza espiritual, que precedem a definição das intervenções e a avaliação dos resultados, completando, assim, o método científico de trabalho do enfermeiro que é o processo de enfermagem.

A identificação do diagnóstico de enfermagem angústia espiritual em idosos, submetidos a tratamento de quimioterapia, permite aos enfermeiros a prestação de cuidados holísticos que incluam intervenções autônomas e interdependentes, de acordo com as necessidades específicas de cada paciente, promovendo o bem-estar espiritual, ou seja, o encontro de sentido na vida por meio da conexão consigo mesmo, com os outros, com o mundo e com um ser maior.

Neste artigo, tem-se como objetivo descrever a avaliação do bem-estar espiritual de idosos com cancro, submetidos à quimioterapia, e identificar possíveis fatores relacionados à angústia espiritual.

Métodos

Procedeu-se a um estudo de validação de diagnóstico angústia espiritual (00066) da NANDA-I, utilizando o modelo de validação clínica de Richard Fehring( 1515. Fehring RJ. The Fehring Model. In: Carrol-Johnson RM,Paquette CJ , editors. Classification of nursing diagnoses: proceedings of the tenth conference of North American Nursing Diagnosis Association. Philadelphia: Lippincott; 1994. p. 55-62. ). Este estudo teve duas etapas metodológicas anteriores: uma que constituiu a revisão integrativa de literatura e outra que constituiu a validação por peritos. Visto que o diagnóstico em validação é de natureza subjetiva, optou-se, na fase de validação clínica, por realizar entrevistas com os pacientes, preenchendo-se um formulário constituído por 5 partes: na primeira parte, constavam os dados de identificação; na segunda parte, constavam os indicadores clínicos de angústia espiritual, com a respectiva definição operacional; a terceira parte constituía o diagnóstico da presença ou ausência de angústia espiritual realizado pelo investigador; o questionário de bem-estar espiritual constituía a quarta parte, que é um questionário cujo escore foi considerado critério para identificação do diagnóstico. Por fim, na quinta parte, constava uma questão que permitia ao paciente confirmar ou negar estar em angústia espiritual.

O Questionário de Bem-Estar Espiritual (QBEE) é um instrumento que permite avaliar o bem-estar espiritual por intermédio de cinco níveis de resposta em 20 afirmações, divididas em quatro dimensões: pessoal, comunitária, ambiental e transcendental( 1616. Gomez R, Fisher J. Domains of spiritual well-being and development and validation of the spiritual well-being questionnaire. Pers Indiv Diff. 2003;35(8):1975-91. ). Esse questionário foi previamente validado para o português( 1717. Gouveia M, Marques M, Pais Ribeiro J. Versão portuguesa do questionário de bem-estar espiritual (SWBQ): análise confirmatória da sua estrutura factorial. Psicol Saúde Doenças. 2009;10(2):285-93. ).

Definiu-se que a concordância dos três critérios seguintes seria determinante para identificar os pacientes em angústia espiritual: diagnóstico pelo investigador, escore do questionário de bem-estar espiritual igual ou inferior a três e confirmação do paciente de estar em angústia espiritual.

A amostra foi selecionada de um estudo maior em que foram incluídos 170 pacientes com idade superior a 18 anos, orientados e com condições para participar, submetidos à quimioterapia endovenosa ou oral, assistidos no centro selecionado para a investigação. Este artigo considera 45 participantes com idade superior a 65 anos.

Por respeito aos princípios éticos e à vulnerabilidade dos pacientes no momento da recolha dos dados, foram excluídos pacientes na primeira sessão de quimioterapia ou com relação de proximidade com o investigador. O estudo foi autorizado pela instituição hospitalar, com parecer positivo da Comissão de Ética (S.1116122/5, de 11/11/2011). Foram providenciados aos participantes o anonimato e confidencialidade dos dados, bem como o esclarecimento e condições ambientais com privacidade para a participação. Ainda, aos pacientes que manifestaram necessidades que implicassem intervenção durante a entrevista, foi-lhes solicitado consentimento para partilha da informação necessária com a equipe de saúde, de modo a assegurar uma resposta efetiva.

A análise estatística foi realizada com o uso do programa SPSS, versão 17.0.

Resultados

Obteve-se uma amostra de 45 idosos, com idade compreendida entre 65 e 83 anos, com média de 70,3 anos. Essa amostra é maioritariamente feminina (n=27, 60%), estado civil casado (n=31, 68,9%). Todos os participantes são católicos. A maioria (n=42, 93,3%) estava submetida à quimioterapia por via endovenosa, não apresentavam metástases (n=39, 86,7%), não havia pessoas dependentes em aspectos financeiros, educativos ou de cuidados (n=33, 73,3%). Muitos idosos eram acompanhados ao hospital para as sessões de tratamento por pessoas significativas ou familiares (n=32, 71,1%). O tipo de cancro mais frequente nas mulheres localiza-se na mama e o dos homens no intestino.

Com base nos critérios definidos para identificação dos pacientes com o diagnóstico, obteve-se uma prevalência de angústia espiritual de 42,2% (Tabela 1).

Tabela 1
Critérios de identificação de angústia espiritual e a prevalência do diagnóstico

A duração média da entrevista com os idosos foi de 41,5 minutos; porém, o tempo médio da entrevista com os idosos que se encontravam em angústia espiritual foi de 48,3 e de 36,6 minutos entre os idosos sem angústia espiritual. Com resultados de p-valor inferiores a 0,05, pode-se concluir que a presença de angústia espiritual tem efeito na duração da entrevista, no sentido de ser mais longa (Tabela 2).

Tabela 2
Comparação da duração da entrevista entre os idosos em angústia espiritual e sem angústia espiritual

Procurou-se, ainda, estabelecer associação entre as variáveis de caracterização dos idosos e a presença de angústia espiritual e, por meio de um modelo de regressão logística, identificou-se que as variáveis "toma antidepressivos" e "habilitações literárias" têm efeitos significativos na presença de angústia espiritual. No entanto, o ajustamento desse modelo revelou-se fraco, pelo que foi feita a análise das variáveis dois-a-dois (Tabela 3). Relativamente à administração da quimioterapia, dos 19 idosos que estavam em angústia espiritual, todos estavam medicados por via endovenosa. O fato de tomarem antidepressivos estava associado à presença/ausência de angústia espiritual, pois o valor de prova obtido foi 0,033 que é inferior a 0,05 pelo que se rejeitou a hipótese de independência entre essas variáveis. Relativamente aos idosos em angústia espiritual, 42,1% tomavam antidepressivos comparativamente àqueles sem angústia espiritual, em que essa percentagem foi de 11,5%. Esses resultados permitem estimar entre 1,23 e 4,12 o aumento do risco de ter angústia espiritual entre idosos que tomam antidepressivos (OR=2,248). A angústia espiritual surge em 42,2% dos idosos, porém, quando se avalia a probabilidade condicionada ao fato de não tomarem antidepressivos, essa percentagem reduz para 32,4%; e, entre os idosos que tomavam antidepressivos, essa percentagem aumentou para 72,7%. Embora não se tenha aplicado nenhum instrumento de medida relacionado à depressão, tem-se ciência de que essa medicação poderá ser utilizada para outros fins terapêuticos. Por essa razão, neste estudo, apenas se considerou a informação referente a estar medicado com antidepressivos como variável de caracterização dos participantes.

Tabela 3
Caracterização dos idosos segundo a presença/ausência de angústia espiritual

Nos idosos que tinham cursado o ensino primário ou ensino universitário foi mais frequente identificar o diagnóstico angústia espiritual, pois o valor de prova observado no teste foi de 0,043. Os idosos em angústia espiritual tinham o ensino primário incompleto, que foi também o nível acadêmico mais frequente desta amostra.

Nesta amostra, os valores de prova foram superiores a 0,05 pelo que não há evidência estatística para afirmar que o tempo de diagnóstico ou o tempo do primeiro tratamento ou, ainda, o tempo do tratamento atual apresentasse diferenças significativas entre idosos em angústia espiritual e os idosos sem esse diagnóstico. No entanto, na Tabela 4, é possível verificar que os idosos em angústia espiritual eram aqueles que souberam que tinham cancro há menos tempo (18,2 meses), os idosos cuja primeira sessão de quimioterapia decorreu há menos tempo (9,5 meses) e aqueles que estavam há menos tempo submetidos a tratamentos de quimioterapia (5,9 meses).

Tabela 4
Comparação dos tempos de tratamento e do diagnóstico entre os idosos em angústia espiritual e sem angústia espiritual

Discussão

Os dados permitiram identificar pacientes em angústia espiritual à semelhança de outro estudo de validação clínica desse diagnóstico com pacientes portadores de insuficiência renal( 1818. Chaves E, Carvalho E, Terra F,Souza L. Clinical validation of impaired spirituality in patient with chronic renal disease. Rev. Latino-Am. Enfermagem. mai-jun 2010;18(3):309-16. ). A prevalência do diagnóstico acrescenta evidência científica necessária para essa área da disciplina de enfermagem, considerada mais subjetiva. Esse dado repercute na necessidade de encontrar estratégias que facilitem não só a identificação da angústia espiritual pelos enfermeiros, mas, também, o conhecimento necessário para o planeamento de intervenções adequadas. Uma dessas estratégias, e que tem sido apontada de modo regular na publicação científica, é a formação dos estudantes de enfermagem e a inclusão da espiritualidade nos currículos de enfermagem( 1919. Baldacchino D. Teaching on the spiritual dimension in care: the perceived impact on undergraduate nursing students. Nurs Educ Today. 2008;28(5):501-12. - 2020. Caldeira S, Narayanasamy A. Nursing educational programs about spirituality: a systematic review. Cuid'Arte Enferm. 2011;5(2):123-8. ). Apesar da concepção holística na abordagem aos pacientes presente nos currículos, os conteúdos programáticos relacionados com a espiritualidade são insuficientes comparativamente a outros conteúdos necessários para a prestação de cuidados e para a aquisição de competências necessárias para os cuidados espirituais( 2121. Baldacchino D. Nursing competencies for spiritual care. J Clin Nurs. 2006;15(7):885-96. ). Porém, outras questões têm envolvido essa discussão, baseada em argumentos éticos relacionados ao dever de prestar cuidados espirituais ou com a incompatibilidade de valores e crenças entre enfermeiros e pacientes. Outros argumentos pedagógicos relacionam-se com o ensino do cuidado espiritual e as condições necessárias para que seja efetivo, tais como a preparação dos professores e o timming no percurso formativo. Essas questões são essenciais para a disciplina de enfermagem, considerando-se a resposta humana angústia espiritual.

As entrevistas dos pacientes com o diagnóstico de angústia espiritual foram mais longas. As competências relacionadas com a relação interpessoal e com a comunicação são consideradas centrais nos cuidados espirituais(21). Os pacientes em angústia espiritual estão em sofrimento e a partilha e escuta ativa pelos enfermeiros são intervenções desejáveis e terapêuticas. Muitas vezes, a relação enfermeiro/paciente desequilibrado não permite essa atenção personalizada, e o profissional dá prioridade a outros aspectos dos cuidados que não requerem igual disponibilidade de tempo para estar com o paciente. Embora não fosse objetivo principal da investigação, verificou-se que, após as entrevistas, os pacientes confirmaram o caráter terapêutico da mesma, agradecendo a escuta e a partilha dos seus sentimentos. A avaliação da espiritualidade e a identificação dos pacientes em angústia espiritual poderão contribuir para que os enfermeiros gestores possam planejar o trabalho da equipe de modo a que o tempo seja um recurso útil na prestação de cuidados.

A maioria dos pacientes em angústia espiritual estava medicada com antidepressivos. Não foi confirmado o diagnóstico de depressão, mas apenas foi tomado em consideração estar medicado com antidepressivos. Alguns indicadores de angústia espiritual assemelham-se aos sinais e sintomas da depressão, porém, a depressão é uma experiência profundamente espiritual, porque afeta a pessoa em todo o seu ser e em toda a sua existência( 2222. Swinton J. Spirituality and mental health care. London: Jessica Kingsley Publishers; 2003.221 p. ). Apesar da semelhança entre algumas características definidoras de angústia espiritual e os sintomas e sinais de depressão, ambas também têm sido definidas como situações distintas( 2323. Grant E, Murray S, Kendall M,Boyd K, TillerS, Ryan D. Spiritual issues and needs: perspectives from patients with advanced cancer and nonmalignant disease: A qualitative study.Pal Sup Care. 2004;2(4):371-8.

24. Brown A, Whitney S, Duffy J. The physician's role in the assessment and treatment of spiritual distress at the end of life. Pal Sup Care. 2006;4(1):81-6.
- 2525. Breitbart W, Rosenfeld B, Pessin H,Kaim M, Funesti-EschJ, Galietta M, et al. Depression, hopelessness, and desire for hastened death in terminally ill patients with cancer. JAMA.2000;13(22):2907-11. ).

Os sintomas de depressão estão mais relacionados à dimensão pessoal do bem-estar espiritual, conferindo à depressão alteração do estado emocional, que, numa perspectiva holística, é sempre vivenciado pela pessoa na sua totalidade. As características definidoras de angústia espiritual são mais específicas e relacionadas com a vivência espiritual, enquanto os sinais de depressão são mais genéricos( 2323. Grant E, Murray S, Kendall M,Boyd K, TillerS, Ryan D. Spiritual issues and needs: perspectives from patients with advanced cancer and nonmalignant disease: A qualitative study.Pal Sup Care. 2004;2(4):371-8.

24. Brown A, Whitney S, Duffy J. The physician's role in the assessment and treatment of spiritual distress at the end of life. Pal Sup Care. 2006;4(1):81-6.
- 2525. Breitbart W, Rosenfeld B, Pessin H,Kaim M, Funesti-EschJ, Galietta M, et al. Depression, hopelessness, and desire for hastened death in terminally ill patients with cancer. JAMA.2000;13(22):2907-11. ). O pensamento recorrente de morte e tentativa de suicídio são recorrentes na depressão, mas não foram identificados nas entrevistas a esses pacientes, para os quais a quimioterapia constituía precisamente uma oportunidade de melhorar a sua condição de saúde, para maior bem-estar ou mesmo para a cura. No entanto, o desejo de uma morte rápida foi identificado em pacientes com cancro em fase terminal de vida, quando apresentavam depressão, desesperança e diminuição do bem-estar espiritual( 2525. Breitbart W, Rosenfeld B, Pessin H,Kaim M, Funesti-EschJ, Galietta M, et al. Depression, hopelessness, and desire for hastened death in terminally ill patients with cancer. JAMA.2000;13(22):2907-11. ). As intervenções dos enfermeiros são distintas face a um paciente em angústia espiritual e a um paciente com o diagnóstico médico depressão. Por isso, os enfermeiros devem estar capacitados para avaliar e diagnosticar fenômenos relacionados com a espiritualidade, de modo a incluir as intervenções espirituais na sua prática clínica e promover ganhos em saúde sensíveis a essa intervenção.

Embora sem prova estatística significativa, o tempo de doença e de tratamento é um dado que deve alertar os enfermeiros na avaliação do bem-estar espiritual dos pacientes, visto que os que contam menos tempo de diagnóstico e de tratamento são aqueles que foram identificados com o diagnóstico de angústia espiritual.

Conclusão

A avaliação do bem-estar espiritual dos idosos com cancro deve integrar a avaliação global dos pacientes, realizada pelos enfermeiros, pois a angústia espiritual constitui um diagnóstico de enfermagem identificado em 42% da amostra. Tal prevalência apela à preparação dos enfermeiros para atender esses pacientes, incluindo a integração desses aspectos nos currículos e a organização do trabalho pelos gestores, de modo a facultar recursos para que os enfermeiros possam intervir de modo eficiente. Um desses recursos pode ser o tempo para estar com o paciente e escutá-lo. Embora medicados com antidepressivos, os pacientes podem estar em angústia espiritual e esse estado de sofrimento não deve ser considerado resolvido por aquela intervenção farmacológica, exigindo atenção mais global dos enfermeiros, em particular aos idosos cujo diagnóstico e tratamento são mais recentes. As provas estatísticas que este estudo permitiu que se obtivesse, numa área considerada subjetiva, contribuem para a evidência científica necessária para incluir a espiritualidade na prestação de cuidados de enfermagem.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2014

Histórico

  • Recebido
    20 Dez 2012
  • Aceito
    03 Set 2013
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