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Papel do enfermeiro e envolvimento do cliente no processo de tomada de decisão clínica

Resumos

O presente trabalho é de revisão de literatura, baseada em artigos de investigação da área da enfermagem, abordando o tema: decisão clínica partilhada. Os objetivos estão direcionados para o analisar do papel do enfermeiro e do paciente no processo de tomada de decisão em contextos da prática clínica. Para fundamentar essas temáticas, fez-se revisão de literatura recente que revelou os seguintes resultados: os pacientes preferem partilhar a tomada de decisão com os profissionais e os profissionais devem apoiar e dar informação aos clientes de forma a diluir as barreiras que dificultam o seu envolvimento no processo de decisão. Ficou clara a necessidade de mais estudos que evidenciem problemáticas no processo de decisão em contexto clínico, no sentido de contribuir para a evolução dos cuidados.

enfermagem; autonomia pessoal; informação; tomada de decisões


This paper is a literature review based on articles in the nursing field about shared clinical decision. The objectives are to examine the role of nurses and patients in the decision-making process in the context of clinical practice. To support these themes, a review of recent literature was conducted with the following results: patients prefer shared decision-making with professionals who should support and provide information to patients in order to overcome the barriers hampering patients' involvement in decision-making. There is a clear need for more research studies that address the problems in the clinical decision-making process so as to contribute to healthcare improvement.

nursing; personal autonomy; information; decision making


El presente trabajo es de revisión de literatura, está basado en artículos de investigación del área de enfermería, abordando el tema: decisión clínica compartida. Los objetivos fueron dirigidos a analizar el papel del enfermero y del paciente en el proceso de la toma de decisiones en contextos de la práctica clínica. Para fundamentar esas temáticas, se hizo una revisión de la literatura reciente, la que reveló los siguientes resultados: los pacientes prefieren compartir la toma de decisiones con los profesionales y los profesionales deben apoyar y dar información a los clientes de forma a diluir las barreras que dificultan su participación en el proceso de decisión. Quedó clara la necesidad de realizar más estudios que presenten evidencias problemáticas en el proceso de decisión en el contexto clínico, con la finalidad de contribuir para la evolución de los cuidados.

enfermería; autonomía personal; información; toma de decisiones


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ARTIGO DE REVISÃO

Papel do enfermeiro e envolvimento do cliente no processo de tomada de decisão clínica

Diana Catarina Ferreira de CamposI; João Manuel Garcia do Nascimento GravetoII

IEscola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal: Aluna do curso de Licenciatura em Enfermagem, e-mail: dicatarinafcampos@hotmail.com

IIEscola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal: Professor Adjunto, Doutor em Desenvolvimento e Intervenção Psicológica, e-mail: jgraveto@esenfc.pt

RESUMO

O presente trabalho é de revisão de literatura, baseada em artigos de investigação da área da enfermagem, abordando o tema: decisão clínica partilhada. Os objetivos estão direcionados para o analisar do papel do enfermeiro e do paciente no processo de tomada de decisão em contextos da prática clínica. Para fundamentar essas temáticas, fez-se revisão de literatura recente que revelou os seguintes resultados: os pacientes preferem partilhar a tomada de decisão com os profissionais e os profissionais devem apoiar e dar informação aos clientes de forma a diluir as barreiras que dificultam o seu envolvimento no processo de decisão. Ficou clara a necessidade de mais estudos que evidenciem problemáticas no processo de decisão em contexto clínico, no sentido de contribuir para a evolução dos cuidados.

Descritores: enfermagem; autonomia pessoal; informação; tomada de decisões

INTRODUÇÃO

Os profissionais de Enfermagem são confrontados, ao longo da prática clínica, com uma série de situações diferentes que envolvem doentes com problemas e cuidados de saúde distintos e muito próprios. Assim, o processo de tomada de decisão clínica é componente vital da prática de enfermagem.

A decisão clínica é processo que compreende tanto o diagnóstico como a avaliação clínica e a deliberação daquilo que vai ser executado(1). Complementarmente, o processo de tomada de decisão na prática clínica de enfermagem é entendido como uma série de decisões tomadas pelos enfermeiros, em interação com o cliente: (a) em relação ao tipo de observações a serem feitas referentes à sua condição, (b) a avaliação dos dados observados e consequente derivação de significados (diagnóstico) e (c) conjunto de ações de enfermagem que devem ser tomadas com ou em nome do cliente. Essa definição desnuda as fases do Processo de Enfermagem, sublinhando a importância da interação/partilha com o cliente(2). É de salientar que o termo decisão clínica tem sido descrito como uma escolha entre alternativas, em que o âmago da questão se centra na eleição de determinado curso de ação(3).

A crescente autonomia, a informação e o envolvimento dos clientes estão no coração de uma política de saúde centrada neles mesmos(4). Desse modo, a participação do doente torna-se capital na efetiva qualidade dos cuidados de Enfermagem.

A questão norteadora do artigo é: que contribuições da investigação existem para uma visão sustentada sobre a enfermagem em processos de tomada de decisão partilhada na prática clínica? Os objetivos delineados são os seguintes: analisar o papel do enfermeiro e do cliente no processo de tomada de decisão em contextos da prática clínica. Este artigo é sustentado em pesquisa e revisão de literatura recente e internacional. Os autores dos estudos de investigação apresentados(4-6) procuraram refletir sobre os conhecimentos na área da decisão clínica, focando, peculiarmente, a sua atenção para o papel que os enfermeiros devem assumir e, ainda, para o envolvimento do cliente. Outra literatura de referência será usada para contextualizar e fundamentar o processo de partilha na tomada de decisão em contexto clínico.

METODOLOGIA

A pesquisa foi efetuada recorrendo-se a descritores em inglês - decision-making; shared decision-making; autonomy; patient; nursing. As bases de dados usadas para pesquisa de literatura foram: PubMed, MEDLINE, Cumulated Index of Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), ProQuest e SciELO.

Os resultados da pesquisa mostraram cinquenta artigos originais e de revisão. Esses artigos foram, inicialmente, selecionados para determinar a sua relação com o processo de tomada de decisão na prática clínica e partilha com o cliente e, numa fase posterior, se eram produto de investigação, de revisão sistemática de literatura ou de metanálise. Foram novamente revisados com o intuito de obter artigos recentes e com os seguintes critérios de inclusão: artigos de revisão que usassem bibliografia recente e estudos de investigação publicados e devidamente referenciados. Constituiu, ainda, critério a pertença a diferentes populações para que se pudesse ter visão global da temática.

Após apreciação crítica foram, então, selecionados três artigos(4-6) internacionais e de referência, que constituem a base de discussão do tema e que retratam estudos de investigação cientificamente relevantes para trazer contributos à temática. Foram destacados aspectos relacionados à partilha da tomada de decisão nos artigos selecionados e realizada interpretação de dados, fundamentando-se em literatura pertinente sobre o tema(1-3,7-19).

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS ACHADOS

Saúde, autonomia e decisão clínica partilhada

A Organização Mundial de Saúde define saúde como estado de bem-estar total: físico, mental e social, e não apenas à ausência de doença ou enfermidade(7). Há forte tendência para sobrevalorizar a dimensão física, provavelmente, porque é a mais fácil de avaliar e objetivar, no entanto, isso pode levar, irremediavelmente, à exclusão da participação do cliente nos cuidados(6).

O termo autonomia tem sido utilizado com diversos significados, porém, na filosofia moral contemporânea, existem duas condições que são necessárias para a sua expressão: a condição de liberdade - independência em relação a terceiros - e capacidade do indivíduo agir intencionalmente - ou seja, sem qualquer tipo de coação. Isso não encerra a ideia de que uma ação autónoma é aquela em que o indivíduo age livre de influências externas, porque a própria condição de doente acarreta limites ao exercício pleno da vontade autónoma, mas nem por isso deixa de ser autónomo, já que continua podendo recusar ou aceitar demandas de terceiros(8).

O princípio da autonomia é aquele que mais tem colocado desafios aos preceitos éticos da tradição hipocrática(8), já que, por vezes, na relação com o cliente, surgem conflitos importantes quando ele tenta exprimir o seu direito à autonomia e o clínico quer fazer valer a prática do paternalismo, baseado no princípio da beneficência. Está-se na era da responsabilização pelas próprias escolhas e, como consequência direta, há a aproximação ao consentimento informado, isto é, cada vez mais os pacientes vão assumindo responsabilidades relacionadas com a sua saúde, em vez de delegá-las aos clínicos(4). A posição do paciente está a mudar para uma posição de cliente, com evidente aumento do grau de direitos e escolhas pessoais, cuidados de excelência e o direito à autodeterminação(7).

O processo de decisão clínica deve ser partilhado entre os profissionais de saúde, os doentes e, provavelmente, a sua família. A investigação(4) destaca os dois últimos, sustentando que devem receber informação, apoio e cuidados especializados de forma a conseguir gerir a situação de doença. Essa ideia é reforçada pelo postulado de que se deve falar em exercício de autonomia quando há partilha de conhecimentos e informação entre as equipas de saúde e os clientes, oferecendo dados importantes, em linguagem acessível, para que qualquer decisão possa ser tomada conscientemente(9).

Comunicação e tomada de decisão

A comunicação é o processo de transmissão de mensagens e interpretação do seu significado. As relações humanas e a comunicação com os doentes são a alma e o coração do trabalho em Enfermagem(7). Teoricamente, uma boa comunicação confere poderes aos outros e permite conhecimento mais aprofundado das pessoas e das suas respectivas escolhas(7).

Para uma decisão clínica efetiva, a informação é fundamental: ela dá poder de controle ao cliente e é confortante, pois o cliente sabe o que esperar(4).

Autores internacionais(4) corroboram a importância de comunicação eficaz, dizendo que, se os profissionais de saúde não derem especial atenção ao modo como se comunicam, podem limitar as escolhas do doente e a confusão instala-se. Quando se fala, por exemplo, a um doente com cancro sobre o tratamento do protocolo hospitalar, rapidamente pode-se arrepender, porque ele, obviamente, não consegue compreender a complexidade dos conceitos. Face a isso, é crucial que os enfermeiros estejam despertos e consigam contornar e adaptar a linguagem a cada doente, lembrando que a pessoa é parte do processo de decisão clínica(4).

Tomar uma decisão clínica é um critério, competência que distingue um enfermeiro relativamente a outros profissionais não diplomados(7). Essa competência para decidir em contexto de clínica tem sido um atributo chave cada vez mais requerido dos enfermeiros de hoje(7,10). As decisões sobre os cuidados podem ser enquadradas, em Enfermagem, em dois cenários antagónicos: a tomada de decisão pode estar centrada nos objetivos do enfermeiro, sendo tomada por terceiros, pela e para a pessoa e sua circunstância ou a decisão é tomada com e para o cliente, através da negociação de estratégias e estabelecimento de resultados em conjunto(11).

Essa autora sustenta que se deve fazer uma cisão com os métodos de trabalho redutores da decisão do enfermeiro, pois eles têm orientado limitadamente as suas práticas para o ponto de vista orgânico do utente. Propõe, então, que se deva utilizar um processo de cuidados que "( ) permite criar e experimentar soluções do âmbito da enfermagem que correspondem às expectativas dos beneficiários"(11).

Papel do enfermeiro e envolvimento do cliente na tomada de decisão

A decisão clínica subjacente aos cuidados é essencial para o resultado de excelência e qualidade dos cuidados de enfermagem. Os profissionais de saúde têm conhecimento profundo sobre as doenças enquanto que o doente é o perito nas suas crenças, valores e preferências. Daqui resulta que a identificação desses aspectos é cada vez mais relevante, já que a estadia nos hospitais e/ou serviços de saúde é curta e as exigências de cuidados de excelência são cada vez maiores(6).

Dada a pertinência da temática, investigadores internacionais procuraram aprofundar qual o papel do enfermeiro e o envolvimento do cliente no processo de decisão clínica(4-6). Desse modo, achou-se pertinente reunir três investigações atuais, de forma a explicitar melhor a importância da partilha da tomada de decisão. Assim, um primeiro estudo(4), desenvolvido no Reino Unido, reuniu 35 profissionais de saúde em atividade clínica (enfermeiros, médicos e outros profissionais de saúde ligados aos cuidados primários e secundários). O objetivo principal da investigação foi explorar as diferentes visões referentes à participação dos clientes no processo de decisão, descritas por profissionais da área da saúde. Um outro estudo(5), realizado em Ontário (Canadá), procurou perceber que tipo de papel preferem os clientes assumir no processo de decisão clínica. Para tal, a amostra foi constituída por um conjunto de pessoas que apresentam diversas patologias - umas crónicas, outras agudas - e, como grupo de controle, foram selecionados estudantes de enfermagem. Por último, um outro autor(6) desenvolveu investigação em que explorou o processo de decisão clínica na área de enfermagem, com especial foco na qualidade dos diagnósticos, participação do cliente e concordância entre as suas percepções e as dos enfermeiros, no que concerne às necessidades e papel (do cliente) preferido no processo decisório. Essa investigação contou com a participação de clientes e enfermeiros de vários hospitais da Suécia (selecionados, aleatoriamente, durante o tempo em que o estudo decorreu - entre 1999 e 2006). Os principais achados das diferentes pesquisas estão explanados no presente artigo.

Como tema palpitante da atualidade, a decisão clínica partilhada tem valor ímpar, tanto para os doentes, que se sentem mais confiantes, como para os enfermeiros, que veem a sua profissão ser dignificada. Contudo, é reconhecido que, enquanto alguns pacientes escolhem entrar numa política de harmonia entre os interesses dos profissionais de saúde e os seus próprios, enquanto pessoa, outros preferem assegurar as rédeas, escolhendo qual o curso de ação que querem seguir e outros, ainda, optam por tomar atitude mais passiva. Ou seja, o autor defende que os pacientes foram caracterizados como passivos nas suas preferências para participar em decisões relativas a cuidados nos níveis físico e psicológico(4). Porém, reforça que os enfermeiros perceberam que os doentes poderiam assumir papel mais ativo, decidindo, por exemplo, a sua própria dieta, coadunada com as indicações terapêuticas(4).

De acordo com o autor anterior(4), há quatro modelos antagónicos referentes ao tipo de interação entre enfermeiro e cliente: um modelo paternalista em que os profissionais de saúde tomam as decisões pelo doente; um modelo informativo em que os profissionais fornecem informação ao cliente que lhe permita fazer a escolha desejada; um modelo interpretativo em que enfermeiros e clientes interagem para identificar as preferências dos últimos e os profissionais apoiam a tomada de decisão e um modelo deliberativo que está muito próximo do anterior, mas que acrescenta dimensão moral que enfatiza a discussão de alternativas entre parceiros(12).

O modelo deliberativo é explorado por um investigador, corroborando o intercâmbio bilateral de informações entre o cliente e o profissional de saúde, de forma que as preferências do cliente sejam tidas em consideração para se chegar a um acordo sobre a escolha a fazer(6).

O autor supracitado(6) refere que a participação dos doentes está relacionada aos conceitos de poder e capacitação (empowerment). Assim, o poder é visto como algo extrínseco à pessoa, indicando que o aumento do poder de alguém deve ser equilibrado com a diminuição do poder de terceiros. Os pré-requisitos para o envolvimento do cliente no processo de tomada de decisão são as oportunidades e a informação disponível. A capacitação é defendida com processo que ajuda as pessoas a ganharem controle sobre as suas próprias vidas. No âmago desse conceito está a ideia de que é desejável e possível que as pessoas ganhem controle sobre as suas vidas e sejam capacitadas para colaborar nos processos de mudança(13). Dois investigadores norte-americanos(14) realizaram estudo sobre a relação entre empowerment e tratamento do diabetes e concluíram que os clientes que têm poder de intervenção sobre sua própria doença conseguem ganhos mais significativos em saúde. Portanto, é de enfatizar que o cliente deve ser ativo na sua capacitação, já que os enfermeiros têm resultados impotentes e infrutíferos quando tentam capacitar o doente; o papel primordial dos enfermeiros é facilitar e suportar a capacitação(6). Uma autora portuguesa(15) reforça a concepção anterior, proferindo que um enfermeiro deve ser alguém que fornece a informação necessária criando ambiente positivo e educador; conselheiro, ajudando na exploração de sentimentos e pensamentos e deve incentivar a identificação e análise de problemas do passado.

Outro estudo(4) aponta distinção entre doentes que esperam informação e são guiados em direção ao tratamento certo e aqueles que preferem assumir a responsabilidade de escolher entre as alternativas possíveis. Ainda que haja essa assimetria de primazias, os autores do ensaio concluem que proporcionar espaço e oportunidade ao doente para escolher quem tem a palavra final é componente essencial do processo de decisão, havendo, em qualquer dos casos, algum nível de participação e de controle sobre a situação.

Os autores anteriores(4) pretendem esclarecer que tanto o diagnóstico como o tratamento são traumáticos para os clientes. Embora a compreensão da informação tenha sido afirmada como pré-requisito para a efetividade da tomada da decisão clínica, os participantes do estudo(4) reportaram que os clientes não deveriam ser pressionados a assimilar um conjunto de informação tão vasto, num momento tão estressante, já que, por exemplo, se é diagnosticado um cancro no cólon de um doente, ele só vai querer que seja retirado e opta, provavelmente, pelo tratamento mais radical, quando a solução poderia passar por técnicas mais conservadoras. Porém, os resultados do mesmo estudo revelam que informação apropriada e oportuna, ajustada às necessidades individuais de cada cliente, é essencial para facilitar o seu envolvimento no processo decisório e reduzir a ansiedade(4).

Outro estudo foi conduzido por investigadores(5) que entrevistaram um conjunto de pessoas (que procuraram os serviços de saúde dos hospitais da região de Ontário, Canadá) e dividiram-nas em dois grandes grupos: aquelas que procuraram os serviços de saúde porque sentiram uma dor no peito (que os autores denominam vignette chest pain) e aquelas que os procuraram devido ao estado de saúde do momento (que os autores denominam vignette current health). De acordo com os resultados do estudo realizado, somente 1% dos participantes da vignette current health e 0,6% da vignette chest pain escolheram ser totalmente autónomos na tomada de decisão. Contudo, os autores referem que a maior parte respondeu que também não escolheria um papel passivo. Assim, o estudo apresenta forte preferência, ao longo de toda a amostra, pela partilha do processo decisório em contexto clínico. Essa preferência se mostra mais elevada em clientes da vignette current health (78,1%) do que nos clientes da vignette chest pain (65,2%). Baseado nesses resultados, o autor sugere que a adaptação e a familiarização com o estado de saúde possibilita ao cliente participar e partilhar o processo de tomada de decisão(5).

Diante desses resultados, os autores(5) concluíram que há forte preferência por partilhar a decisão clínica - os clientes querem estar envolvidos no processo de escolha, que afetará, sem margem de dúvida, a sua qualidade de vida. Mas, prosseguem os autores, os clientes não querem assumir o total comando da decisão, muito pelo contrário, eles estão dispostos a deixar grande parte da responsabilidade por tarefas que requerem conhecimentos específicos para os profissionais de saúde.

À semelhança do autor supracitado, é defendido e corroborado que a principal responsabilidade para integrar os doentes como parceiros ativos no processo de decisão em enfermagem é, inevitavelmente, dos enfermeiros, uma vez que o doente se encontra numa posição dependente e não se pode esperar que assuma a liderança. Os resultados de estudo desenvolvido na Suécia revelam que 9% dos pacientes preferem ser ativos na tomada de decisão, 30% desejam participar em conjunto com o enfermeiro na decisão e 64% delegam aos profissionais a tomada de decisão - esses autores afirmam que a escolha do cliente por um papel passivo na decisão clínica é uma ação deliberada, o que indica que não é, de todo, uma atitude passiva, mas, sim, opção efetiva por escolher um papel sem intervenção direta(6).

Já, em 1996, uma autora(16), utilizando estudo de caso como ilustração, demonstrou que a participação ativa dos clientes na assistência de saúde é essencial para estimulá-los ao autocuidado. Propôs, então, inter-relação que promova a autonomia do paciente e do enfermeiro, no sentido de que ambos participem ativamente do processo de enfermagem.

A ideia principal de implementar o processo de enfermagem como modelo de resolução dos problemas dos pacientes é visto de forma a que se possa adequar as intervenções a eles. No entanto, para ser possível executar isso, os enfermeiros precisam conhecer as necessidades dos pacientes. A chave desse tema é, então, a interação entre o enfermeiro e o paciente, em que a informação era partilhada e a comunicação feita em ambas as direções(7).

CONCLUSÃO

O presente artigo traz nova visão do processo de tomada de decisão na prática clínica, possibilitando aos profissionais refletirem as suas práticas de decisão na prática clínica. Autores(17) discutem a aplicação de princípios da prática baseada em evidência às decisões diagnósticas no cuidado de enfermagem, no entanto, pela revisão de literatura efetuada é notório que os enfermeiros, algumas vezes, subestimam a importância das necessidades dos clientes(4-6), fazendo uma análise do processo de decisão clínica tendo em vista somente os objetivos da equipa profissional. A discussão centra-se em diagramas de decisão e a multiplicidade do paciente e o seu contexto social são esquecidos. Para o enfermeiro cuidar do outro, primeiramente tem que demonstrar que reconhece os limites da sua prática e que necessita respeitar o outro como alguém diferente de si próprio(18). Numa reflexão estruturada sobre bioética clínica(19), é defendido que a decisão será mais qualificada quanto melhor for a informação clínica disponível, no entanto, as políticas de atuação não devem indicar um curso único para o cuidado de saúde - deve-se buscar variações que possam ser mais adequadas às circunstâncias individuais. Para além disso, não deve nunca deixar de se envolver os familiares nessa decisão.

Considera-se, aqui, que as decisões em contexto clínico devem incluir a avaliação dos recursos disponíveis, dos desejos do paciente, dos conhecimentos cognitivos que os enfermeiros possuem da sua prática e, ainda, do conhecimento gerado pela investigação. A melhor análise à tomada de decisão, guideline clínica ou política de atuação, preencherá somente algumas falhas do processo de tomada de decisão. A revisão de literatura efetuada complementa a avaliação de enfermagem e políticas de decisões discutidas por alguns autores(17), mas não poderá substituí-las.

Seria de maior interesse estudar a variabilidade da prática dos profissionais de enfermagem em relação à coerência com as percepções dos clientes e preferências para participar na tomada de decisão na prática clínica. Para concluir, ideia-se as seguintes questões que poderão servir de base a novas investigações: será que o enfermeiro mantém o mesmo grau de concordância com os clientes, independentemente do tipo de atendimento ou necessidades ao longo do tempo? Quais os fatores que poderão influenciar a precisão da avaliação das percepções dos clientes?

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jan 2010
  • Data do Fascículo
    Dez 2009

Histórico

  • Recebido
    17 Jul 2008
  • Aceito
    03 Set 2009
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