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Qual a percepção do risco biológico tem os estudantes da Licenciatura em Enfermagem?

Resumo

Objectivo:

analisar a percepção do risco biológico nos estudantes da Licenciatura de Enfermagem e a sua ligação com a formação prática previa.

Método:

estudo descritivo transversal realizado na Escola de Enfermagem da Universidade de Barcelona, em estudantes da Licenciatura de Enfermagem matriculados em disciplinas práticas do curso académico 2013-2014 (N=78). Variáveis: sociodemográficas, laborais, de formação, clinicas e referidas na avaliação do risco biológico percebido. Foi utilizado um instrumento de elaboração própria e a escala EDRP-T. Analise estatístico: descritivo e univariante para detectar se existiam diferenças entre a percepção do risco biológico dos itens da escala EDRP-T e as variáveis sociodemográficas.

Resultado:

os estudantes sem formação prática previa tiveram menos percepção do conhecimento e menor percepção dos danos derivados do risco biológico em comparação com os estudantes com previa formação prática (p=0.0.5 e p=0.04 respectivamente). Detectou-se menor percepção do risco biológico em estudantes com experiencia laboral previa.

Conclusão:

a formação práticas e experiencia laboral influenciam na percepção do risco biológico em estudantes de Enfermagem. Faltam estudos que relacionem a percepção do risco com o uso das medidas de prevenção durante a formação pratica e os acidentes do tipo biológicos ocorridos.

Descritores:
Percepção; Fatores de Risco; Estudantes de Enfermagem

Abstract

Objective:

to analyze undergraduate nursing students' perception of biological risk and its relationship with their prior practical training.

Method:

a descriptive cross-sectional study was conducted among undergraduate nursing students enrolled in clinical practice courses in the academic year 2013-2014 at the School of Nursing at the University of Barcelona. Variables: sociodemographic variables, employment, training, clinical experience and other variables related to the assessment of perceived biological risk were collected. Both a newly developed tool and the Dimensional Assessment of Risk Perception at the worker level scale (Escala de Evaluación Dimensional del Riesgo Percibido por el Trabajador, EDRP-T) were used. Statistical analysis: descriptive and univariate analysis were used to identify differences between the perception of biological risk of the EDRP-T scale items and sociodemographic variables.

Results:

students without prior practical training had weaker perceptions of biological risk compared to students with prior practical training (p=0.05 and p=0.04, respectively). Weaker perceptions of biological risk were found among students with prior work experience.

Conclusion:

practical training and work experience influence the perception of biological risk among nursing students.

Descriptors:
Perception; Risk Factors; Students, Nursing

Resumen

Objetivo:

analizar la percepción del riesgo biológico en los estudiantes de Grado de Enfermería y su relación con la formación práctica previa.

Método:

estudio descriptivo transversal realizado en la Escuela de Enfermería de la Universidad de Barcelona en estudiantes de Grado de Enfermería matriculados en asignaturas prácticas del curso académico 2013-2014. Variables: sociodemográficas, laborales, de formación, clínicas y referidas a la evaluación del riesgo biológico percibido. Se utilizó un instrumento de elaboración propia y la escala Evaluación dimensional del Riesgo Percibido (EDRP-T). Análisis estadístico: descriptivo y univariante para detectar si habían diferencias entre la percepción de riesgo biológico de los ítems de la escala EDRP-T y las variables sociodemográficas.

Resultados:

los estudiantes sin formación práctica previa tenían menor percepción de conocimiento y menor percepción de daño derivado del riesgo biológico con respecto a los estudiantes con formación práctica previa (p=0.05 y p=0.04 respectivamente). Se detectó menor percepción del riesgo biológico en los estudiantes con experiencia laboral previa.

Conclusión:

la formación práctica y la experiencia laboral influyen en la percepción del riesgo biológico de los estudiantes de enfermería.

Descriptores:
Percepción; Factores de Riesgo; Estudiantes de Enfermería

Introdução

Um dos objectivos principais da formação universitária é a preparação dos estudantes na integração no mundo laboral, Capacitando-os para desenvolver as competências profissionais definidas em cada uma das disciplinas. No âmbito específico das Ciências da Saúde, a formação inclui intervenções direccionadas na aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para ser um profissional sanitário competente. Neste contexto, deveriam existir competências transversais dirigidas a difundir e garantir a segurança tanto dos estudantes como dos pacientes.

Os Profissionais que desenvolvem o seu trabalho no ramo sanitário estão expostos a numerosos riscos11. Ortiz S. Riesgos biológicos de los estudiantes de enfermería. Enferm Clín. 2003;13(5):285-9.) mas um dos mais importantes devido à sua frequência, gravidade e tendência é o risco biológico22. Tarantola A, Abiteboul D, Rachline A. Infection risks following accidental exposure to blood or body fluids in health care workers: a review of pathogens transmitted in published cases. Am J Infect Control. 2006;34(6):367-75.-33. Arribas Llorente JL, Campins Martí M, Hernández Navarrete MJ. Estudio y seguimiento del riesgo biológico en el personal sanitario. Proyecto EPINETAC 1996-2002: Grupo de Trabajo EPITENAC. Madrid: SEMPSPH; 2005.. Este risco representa uma diferença em relação ao resto pela sua repercussão ao nível da Saúde Pública pois, apesar de que as infecções pelos vírus da Hepatite B,C e o vírus de Imunodeficiência Humana (VIH) são as mais conhecidas, existem outras doenças emergentes que se adquirem por outras vias de exposição biológica, como seriam o caso das adquiridas por via aérea ou por contacto (como por exemplo o Ébola).

Neste contexto, os estudantes da Licenciatura de Enfermagem durante os seus primeiros anos de formação entram em contacto com um entorno clinico complexo ao qual não estão habituados e no qual se expõe a numerosos riscos44. Bettancourt L, Muñoz LA, Barbosa MA, Fernández M. El docente de enfermería en los campos de práctica clínica: un enfoque fenomenológico. Rev Enferm. 2011;19(5):1197-204., com o agravante de serem pessoas inexperientes11. Ortiz S. Riesgos biológicos de los estudiantes de enfermería. Enferm Clín. 2003;13(5):285-9. e estão submetidos a um determinado nível de stress55. Antolín R, Puialto MJ, Moure ML. Situaciones de las prácticas clínicas que provocan estrés en los estudiantes de enfermería. Enferm Global. 2007;10:1-12.

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-1010. López IM, Sánchez V. Percepción del estrés en estudiantes de enfermería en las prácticas clínicas. Enferm Clín. 2005;15(6):307-13., associado a situações de mudança e a toda a incerteza que os rodeia.

Numerosos estudos sobre os acidentes sofridos pelos estudantes de enfermagem durante a realização de estágios tem evidenciado que as taxas continuam a ser muito elevadas em relação à exposição aos riscos biológicos (picadas, salpicaduras oculares e cortes)1111. Kursun S, Arslan S. Needlestick and Sharp Injuries among Nursing and Midwifery Students. Int J Caring Sci. 2014;7(2):661-9.

12. Eljedi A. Prevalence and response to Occupational Hazards among Nursing Students in Gaza Strip, Palestine: The role of Personal Protective Equipment and Safety Regulations. Public Health Res. 2015;5(1):32-8.

13. Petrucci C, Alvaro R, Cicolini G, Cerone MP, Lancia L. Percutaneous and mucocutaneous exposures in nursing students: an Italian observational study. J Nurs Scholarsh. 2009;41:337-43.

14. de Souza-Borges F, Ribeiro L, Oliveira LC. Occupational exposures to body fluids and behaviors regarding their prevention and post-exposure among medical and nursing students at a Brazilian Public University. Rev Inst Med Trop. 2014;56(2):157-63.
-1515. Gir E, Caffer J, Elaine S, Silva SR, Hayashida M, Artioli A. Accidents with biological material and immunization against hepatitis B among students from the health area. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2008;16(3):401-6..

No projecto EPINETAC33. Arribas Llorente JL, Campins Martí M, Hernández Navarrete MJ. Estudio y seguimiento del riesgo biológico en el personal sanitario. Proyecto EPINETAC 1996-2002: Grupo de Trabajo EPITENAC. Madrid: SEMPSPH; 2005.) confirmou-se que uma proporção não desejável dos acidentes percutâneos desencadeiam-se por procedimentos inadequados que estão proibidos nas recomendações standard, como o reencapuchado das agulhas. Este acontecimento demonstrou deficiências significativas nas medidas de segurança adaptadas, direccionando para uma baixa eficácia da formação teórica e pratica relativas a prevenção de riscos biológicos em estudantes universitários.

Por outro lado, a opinião dos profissionais de Enfermagem sobre o ensino prático que recebem os estudantes aponta para a falta de conhecimentos por parte dos estudantes sobre os protocolos e medidas preventivas, e atitudes de pouca iniciativa e insegurança1313. Petrucci C, Alvaro R, Cicolini G, Cerone MP, Lancia L. Percutaneous and mucocutaneous exposures in nursing students: an Italian observational study. J Nurs Scholarsh. 2009;41:337-43.-1414. de Souza-Borges F, Ribeiro L, Oliveira LC. Occupational exposures to body fluids and behaviors regarding their prevention and post-exposure among medical and nursing students at a Brazilian Public University. Rev Inst Med Trop. 2014;56(2):157-63.,1616. Castillo S, Vessoni RD. La relación tutor-estudiante en las prácticas clínicas y su influencia en el proceso formativo del estudiante de Enfermería. Educare 21. 2007;(38):1-7., questão a considerar no momento de planificar as actividades formativas a partir da Universidade.

Um estudo multicêntrico1717. López C, Limón E, Castillo E, López T, Gudiol C, Isla P, et al. Precauciones estándar ¿se conocen? ¿se aplican? Rev Rol Enferm. 2006;29(1):16-20.) sobre a utilização das precauções standard na presença de agentes biológicos evidenciou, que nos participantes de diversos colectivos sanitários um alto grau de confusão conceptual e desconhecimento destas medidas preventivas, detectando hábitos de risco em relação à protecção. Outro estudo1818. López C, Limón E, Oto I, Carratala J, Espasa JE, Lozano V, et al. Actitudes y creencias en los estudiantes del campus de Bellvitge sobre las medidas higiénicas y las precauciones estándar. Cultura Cuidados. 2009;25:81-7. determinou que a formação em relação às medidas de higiene e de prevenção standard, não se realizavam de forma transversal nos cursos leccionados existindo algumas vezes divergências entre a formação teórica e a prática.

Ao revisar a normativa legal respectiva à prevenção de riscos vigente na Espanha (Ley 31/1995 de 8 de Noviembre de Prevención de Riesgos Laborales) observa-se que as instituições sanitárias apostam em fomentar uma cultura preventiva nos trabalhadores, mas são raras as normativas que incluem os estudantes em estágio. Só foi encontrada a normativa RD 783/2001, em que é contemplada a protecção das pessoas em formação perante as radiações ionizantes.

Outro aspecto importante relacionado com a prevenção é a percepção do risco por parte da pessoa. Alguns autores afirmam que a percepção condiciona a atitude diante do risco e o comportamento no trabalho1919. Alcántara-Luque R, Rodríguez-Borrego MA, González-Galán C, Calpés-Roldán C. Percepción de riesgo en alumnos de Enfermería. Enferm Global. 2013;29:341-51.

20. Wojciechowski MC, Zepka L, Riegert M, Silva CF. Percepción de los estudiantes de enfermería acerca de su protección ante patologías inmunoprevisibles. Enferm Global. 2012:25;161-71.
-2121. Velázquez Y, Medellín J. La percepción de riesgos como factor causal de accidentes laborales. Seguridad Salud Trabajo. 2013;71:20-5.. Estudo2222. Cordeiro R. Suggestion of an inverse relationship between perception of occupational risks and work-related injuries. Cad Saúde Pública. 2002;18(1):45-54. analisou a relação entre a percepção do risco e a probabilidade de ocorrência de um acidente laboral, concluindo que as pessoas acidentadas eram as que tinham menor percepção aos riscos que estavam expostos.

Apesar da importância que tem o risco biológico dentro do coletivo sanitário, são escassos os trabalhos que analisam a variável percepção do risco, tanto nos profissionais de saúde como nos estudantes da Licenciatura de Enfermagem. Nesta linha de investigação surge o objetivo deste estudo que é analisar a percepção do risco biológico em estudantes da Licenciatura de Enfermagem e a sua relação com a sua formação prática prévia.

Método

Trata-se de um estudo descritivo transversal, que se realizou na Escola Universitária de Enfermagem (EUE) da Universidade de Barcelona (UB), durante o período de Setembro a Dezembro de 2013.

A população em estudo foi constituída pelos alunos da Licenciatura em Enfermagem da UB matriculados nas disciplinas práticas do curso letivo de 2013-2014. A amostra foi constituída por dois grupos de estudantes. Grupo 1, sem formação prévia ao nível prático (início do segundo ano letivo da Licenciatura em que os alunos não tenham realizado nenhum período de formação prática). Grupo 2, com formação prévia a nível prático (início do terceiro ano acadêmico da Licenciatura, em que os alunos já realizaram previamente um período de estágios externos ao nível académico).

Em ambos os grupos os critérios de inclusão foram: ter sido aprovado em todas as disciplinas de formação básica e obrigatória do primeiro ano da Licenciatura em Enfermagem e estar regularmente matriculados nas disciplinas práticas do segundo ano (Grupo 1) ou de terceiro ano da Licenciatura em Enfermagem (Grupo 2). Foram excluídos todos os estudantes que renunciaram voluntariamente à sua participação no estudo. Finalmente, a amostra foi composta por 78 alunos (37 sem formação prática prévia e 41 com formação prática prévia).

Variáveis de estudo

-Variáveis relativas à características sociodemográficas, laborais, de formação relativa à prevenção de riscos biológicos e clínicos respectivamente ao estado de vacinação dos estudantes: Idade: Sexo; Formação prática previa; Via de acesso à Licenciatura de Enfermagem; Experiencia laboral prévia no âmbito sanitário; Experiencia laboral atual; Realização de cursos externos sobre a prevenção de riscos biológicos; Vacinação contra hepatite B; Vacinação contra a hepatite A; Vacinação contra o tétano; Realização de teste tuberculínico.

-Variáveis referentes à avaliação dimensional do risco biológico percebido: o Conhecimento que o aluno considera que tem; Resposta emocional de medo; Vulnerabilidade; Percepção da gravidade das consequências. Percepção de controle/fatalidade (visão que o aluno tem da sua capacidade para realizar ações preventivas, como realizar ações protetoras); Grau de controle percebido; Potencial catastrófico que se atribui ao fator de risco; Percepção da demora das consequências; Amplitude do risco percebido. Todas estas variáveis são medidas através da escala de Avaliação Dimensional do Risco Percebido. (EDRP-T)2323. Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales (ES). Instituo Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo. NTP 578: Riesgo percibido: un procedimiento de evaluación. Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el trabajo. Madrid; 2001..

Instrumento

Foi feito um formulário para obtenção de dados com duas seções diferenciadas.

-Seção A: formulário que recolhia as variáveis referentes às características sociodemográficas, laborais, educativas sobre a prevenção de riscos biológicos antes de iniciar os estudos da Licenciatura, à formação sobre as práticas clínicas realizadas durante sua formação e às variáveis clínicas sobre o estado de vacinação da amostra.

-Seção B: incluiu a escala EDRP-T, formada por 10 perguntas dirigidas para realizar a avaliação dimensional do risco biológico percebido pelos alunos. Esta escala de avaliação faz parte da Nota Técnica de Prevenção (NTP) 578 publicada pelo Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo (INSHT) de Espanha no ano 20012323. Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales (ES). Instituo Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo. NTP 578: Riesgo percibido: un procedimiento de evaluación. Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el trabajo. Madrid; 2001.. É um instrumento de avaliação flexível e adaptável aos diferentes tipos de risco, ao qual foram acrescidas as orientações pautadas pelas autoras para adaptá-lo à avaliação dimensional do risco biológico percebido pelos estudantes. As 9 primeiras perguntas são avaliadas com uma escala ordinal que vai de 1 a 7 pontos, em que 1 é "o nível mais baixo" e 7 é "o nível mais alto". A pergunta 10, que valoriza a dimensão global do risco biológico é avaliada com uma escala quantitativa discreta que vai de 0 a 100, em que 0 representa "um risco muito baixo" e "100 um risco muito alto".

As duas primeiras perguntas desta seção (B1 e B2) exploram o fator conhecimento, tanto do estudante como dos profissionais enfermeiros responsáveis por esses estudantes. A pergunta B3 explora a resposta emocional de medo, considerado pelas autoras como a mais preditiva do risco global percebido. A pergunta B4 avalia o constructo "vulnerabilidade" ou "suscetibilidade" e a B5 explora a percepção da gravidade das consequências. As perguntas B6 e B7 estão relacionadas com a percepção de controle/fatalidade do dano, explorando tanto a capacidade que têm os estudantes de realizar acções preventivas como protectoras.

Os autores relacionam a pergunta B7 com a B4 já que a percepção do controle pode provocar um sentimento de invulnerabilidade. A questão B8 explora o potencial catastrófico que se atribui ao fator de risco biológico, aspecto relacionado com o risco total percebido (B10). A B9 é uma pergunta sobre a percepção do atraso das consequências e a B10 é uma pergunta dirigida a obter uma estimativa global da amplitude do risco biológico percebido.

Procedimento

A coleta de dados iniciou-se após informar-se os professores responsáveis pelas disciplinas práticas e os alunos matriculados nas mesmas. Os investigadores providenciaram o questionário à amostra de estudo para ser preenchido em cada grupo em um determinado período. O primeiro questionário, foi aplicado durante o mês de Outubro e referia-se ao Grupo 1 (alunos sem formação prática prévia). O segundo foi aplicado durante o mês de Novembro e pertencia ao Grupo 2 (alunos com formação prática prévia). Em ambos os casos, a coleta de dados foi realizada uma semana antes do início dos Estágios práticos nos respectivos centros durante a sessão informativa.

Análise estatística

Em primeiro lugar, realizou-se a análise descritiva de todas as variáveis incluídas no estudo. Foram calculadas as frequências e percentagens para cada uma das variáveis qualitativas e a média e o desvio padrão para cada uma das variáveis quantitativas. Para analisar se existiam diferenças entre os alunos com formação prática prévia ou não, aplicou-se o teste de qui-quadrado ou o Teste exato de Fisher para as variáveis qualitativas e T-student ou teste U de Mann-Whitney para as variáveis quantitativas.

Também foi feita uma análise para verificar se haviam diferenças entre a percepção de risco biológico de cada um dos itens da escala EDRP-T e as variáveis sociodemográficas, utilizando o teste U de Mann-Whitney ou teste de Kruskall-Wallis. Considerou-se estatisticamente significativo um p bilateral de 0,05. Utilizou-se o programa PASW Statistics v.20.

Aspectos éticos

Foram obtidas as autorizações da Comissão de Bioética da UB e da direção da EUE. Os estudantes receberam a informação verbal e escrita sobre o estudo, garantindo-lhes o anonimato e a confidencialidade dos dados.

Resultados

Quanto a aplicação do questionário, foram encontrados em sala de aula 40 estudantes do Grupo 1 (sem prévia formação prática) e 49 estudantes do Grupo 2 (com prévia formação prática), dos quais cumpriam os critérios de inclusão 38 e 45 alunos, respectivamente. Finalmente, do primeiro grupo responderam ao questionário 37 estudantes e do segundo grupo, 41, formando uma amostra total de 78 estudantes.

Características sociodemográficas, laborais, de formação em relação à Prevenção de Risco Laboral (PLR) e clínicas a respeito do estado de vacinação dos estudantes

Dos alunos, 61.5% dos alunos tinham idade menor de 25 anos e 80.7% eram mulheres; 56.4% entraram na Licenciatura de Enfermagem por meio do ensino secundário. Em relação à experiência de trabalho na área de saúde, 69.2% dos alunos não tinham qualquer experiência prévia e apenas 11.5% trabalhavam no momento da participação no estudo; 23.1% tinham tido formação sobre a prevenção de riscos laborais, prévio ao início do curso. Com relação ao estado de vacinação, a maioria dos estudantes referiru-se estar adequadamente vacinado contra a hepatite A (93.6%), contra a hepatite B (97,4%), contra o tétano (94,9%), mas apenas 76.9% dos estudantes referiram ter realizado a prova tuberculínica. Ao comparar os grupos com formação prática prévia e sem formação, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas para qualquer um dos dados obtidos. As características sociodemográficas, de trabalho, de formação de PRL e o estado de vacinação são representadas na Tabela 1.

Tabela 1
Características sociodemográficas, laborais, educativas sobre a prevenção de riscos laborais e estado de vacinação dos estudantes da Licenciatura de Enfermagem. Barcelona, Espanha, 2013

Avaliação do risco biológico percebido pelos alunos da licenciatura de enfermagem

Foi analisada a relação entre a percepção do risco biológico da contaminação e a formação prática prévia dos alunos (com e sem formação). Foram encontradas diferenças estatisticamente significantes em itens de conhecimento do risco biológico (B1) e na possibilidade de dano derivado do agente biológico (B4), no sentido de que alunos sem formação prática prévia anterior tinham menor percepção de conhecimento e menor percepção do dano derivado do risco biológico em relação aos alunos que tiveram formação prévia (p = 0,05 e p = 0,04, respectivamente).

No que diz respeito aos itens B8 (dano a um grande número de pessoas) e B10 (amplitude global do risco percebido) também foram encontradas diferenças estatisticamente significantes, embora neste caso os alunos sem formação prática prévia tinham uma maior percepção do potencial catastrófico atribuído ao agente biológico e uma maior percepção geral de risco biológico que os alunos com formação prática prévia sendo o p = 0,05 em ambos os casos. A relação entre a percepção de risco biológico no grau de estudantes de enfermagem com e sem formação prática previa é descrita na Tabela 2.

Tabela 2
Relação da percepção do risco biológico em estudantes da Licenciatura de Enfermagem com e sem formação prática prévia. Barcelona, Espanha, 2013

Ao relacionar a percepção do risco biológico e das características sociodemográficas, laborais e formativas dos estudantes foram encontradas diferenças significativas entre a experiencia laboral prévia dos estudantes, o item B10 (percepção global do risco) e o item B7 (Grau no qual pode causar danos a um elevado numero de pessoas). Detectou-se uma menor percepção do risco biológico em estudantes que tinham trabalhado em comparação aos que aos que não e uma maior percepção de controle para evitar ou minimizar os danos resultantes deste risco nestes estudantes.

Também foram encontradas diferenças estatisticamente significantes ao se analisar sexo e itens B1 (conhecimento do risco biológico do estudante) e B5 (gravidade dos danos que podem causar o agente biológico), detectando que os homens tinham uma maior percepção do conhecimento do risco, em comparação às mulheres e uma menor percepção da gravidade das consequências. A análise dos demais itens relacionados com a percepção de risco biológico e as características sociodemográficas, laborais e formativa dos estudantes é descrita na Tabela 3.

Tabela 3
Relação da percepção do risco biológico com as características sociodemográficas, laborais e formativas dos estudantes da licenciatura de Enfermagem. Barcelona, Espanha,2013.

Discussão

É óbvio que a redução do risco é um dos objetivos comuns que teriam que ter todos os profissionais que estão em contatos com os estudantes de Enfermagem. Neste contexto, são vários os autores que concordam que continua a existir uma elevada prevalência de acidentes por exposição ao risco biológico e um nível de conhecimentos baixo nestes estudantes1111. Kursun S, Arslan S. Needlestick and Sharp Injuries among Nursing and Midwifery Students. Int J Caring Sci. 2014;7(2):661-9.

12. Eljedi A. Prevalence and response to Occupational Hazards among Nursing Students in Gaza Strip, Palestine: The role of Personal Protective Equipment and Safety Regulations. Public Health Res. 2015;5(1):32-8.

13. Petrucci C, Alvaro R, Cicolini G, Cerone MP, Lancia L. Percutaneous and mucocutaneous exposures in nursing students: an Italian observational study. J Nurs Scholarsh. 2009;41:337-43.

14. de Souza-Borges F, Ribeiro L, Oliveira LC. Occupational exposures to body fluids and behaviors regarding their prevention and post-exposure among medical and nursing students at a Brazilian Public University. Rev Inst Med Trop. 2014;56(2):157-63.
-1515. Gir E, Caffer J, Elaine S, Silva SR, Hayashida M, Artioli A. Accidents with biological material and immunization against hepatitis B among students from the health area. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2008;16(3):401-6.. Além disso este fato complica-se quando não existe a percepção comum do conceito de "risco", isto é, quando não se entende por igual aquilo que se quer reduzir2323. Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales (ES). Instituo Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo. NTP 578: Riesgo percibido: un procedimiento de evaluación. Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el trabajo. Madrid; 2001.. Este fato está relacionado com o conceito de percepção do risco, descrito como uma expressão subjetiva condicionada por diferentes factores como os conhecimentos, os valores, crenças pessoais2424. Fiandra U, Raciti I, Mosso R, Calipari G, Rapellino M. The perception of health care risk patients, health care staff and society. Blood Transfus. 2008;6(2):93-100.. Há autores que concordam com o fato de existir uma relação entre a percepção do risco dos profissionais e a atitude no trabalho dos mesmos1919. Alcántara-Luque R, Rodríguez-Borrego MA, González-Galán C, Calpés-Roldán C. Percepción de riesgo en alumnos de Enfermería. Enferm Global. 2013;29:341-51.

20. Wojciechowski MC, Zepka L, Riegert M, Silva CF. Percepción de los estudiantes de enfermería acerca de su protección ante patologías inmunoprevisibles. Enferm Global. 2012:25;161-71.
-2121. Velázquez Y, Medellín J. La percepción de riesgos como factor causal de accidentes laborales. Seguridad Salud Trabajo. 2013;71:20-5.. Contudo são poucos os estudos que fazem referencia à percepção dos riscos dos profissionais de enfermagem e estes limitam-se a descrever os principais riscos percebidos, nos quais se encontram os acidentes percutâneos2424. Fiandra U, Raciti I, Mosso R, Calipari G, Rapellino M. The perception of health care risk patients, health care staff and society. Blood Transfus. 2008;6(2):93-100.-2525. Cezar Vaz MR, Soares JFS, Figueiredo PP, Azambuja EP, Sant'Anna CF, Costa VZ. Risk perception in family health work: study with workers in Southern Brazil. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(6):961-7.. Também estes estudos relacionam a percepção do risco com outras variáveis que podem influenciar a atitude dos estudantes perante o risco biológico como são as laborais, as sociodemográficas, as de formação teórica ou prática prévia, no seguimento das medidas preventivas e na incidência dos acidentes. Neste estudo foi detectado que os estudantes sem formação prática previa tinham menor percepção do conhecimento e do dano causado, aspecto que poderia estar relacionado ao nível de conhecimento dos estudantes. Também apresentaram uma maior percepção global do risco biológico assim como do potencial catastrófico, possivelmente associado ao entorno clínico complexo e desconhecido, o qual vão enfrentar. Por outro lado, os estudantes que tinham trabalhado previamente no setor da saúde, tinham uma maior percepção do risco biológico e uma maior percepção do controle para evitar ou reduzir o dano derivado deste risco, aspecto importante já que poderia provocar um sentimento de invulnerabilidade perante os acidentes. Por último, menciona-se que nos homens encontrou-se uma maior percepção do conhecimento do risco que nas mulheres, ponto que também poderá estar relacionado com a menor percepção da gravidade das consequências encontradas.

Umas das possíveis limitações do estudo e que a população estudada pertence a uma única universidade e pode ser que os resultados não sejam extrapoláveis a todo o coletivo de estudantes de Enfermagem. No entanto, acreditamos que esta limitação não afeta substancialmente os resultados, já que as características sociodemográficas dos estudantes são semelhantes a de outros estudantes de outras universidades. Outra possível limitação é o fato de não se ter obtido dados do nível de conhecimentos sobre o risco biológico, já que estes podem influenciar a percepção do risco.

Conclusão

No contexto da amostra estudada, os resultados mostram que existem variáveis sociodemográficas, laborais e formativas dos estudantes da Licenciatura de Enfermagem que estão relacionados com a percepção do risco biológico. Os estudantes com formação prática prévia apresentam uma maior percepção do risco biológico que os estudantes sem formação. Seria necessário realizar outros estudos que relacionem a percepção deste risco com outros aspectos importantes na formação universitária como o nível de conhecimentos dos estudantes relativos aos riscos, o uso de medidas de prevenção que realizam durante a sua formação prática e os acidentes de tipo biológico ocorridos. Desta forma poder-se-ia orientar intervenções específicas com o objetivo de conseguir uma cultura de segurança na universidade, representando uma maior valorização na formação universitária que vai mais além da formação académica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2015
  • Aceito
    13 Nov 2015
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