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Adaptação e validação de uma medida de adesão à terapia de anticoagulação oral

Resumos

Este é um estudo metodológico que teve como objetivos adaptar e analisar as propriedades psicométricas do instrumento medida de adesão aos tratamentos (MAT) como medida de adesão à terapêutica de anticoagulação oral (ACO). A versão final foi testada em 178 sujeitos. As médias das respostas aos itens do MAT variaram de 4,6 a 5,8, sendo que 97,2% foram considerados aderentes. Correlações moderadas foram obtidas entre a medida de adesão e os domínios saúde mental e vitalidade, do SF-36. O alfa de Cronbach obtido foi 0,60 e constatou-se a presença de efeito máximo nas respostas de todos os itens. Esses resultados indicam fracas evidências da validade, confiabilidade e responsividade da versão adaptada do MAT para usuários de anticoagulantes orais.

Estudos de Validação; Psicometria; Anticoagulantes; Questionários; Adesão ao Medicamento


This methodological study adapted and analyzed the psychometric properties of the Measurement of Treatment Adherence (MTA) instrument for Brazilian users of oral anticoagulation therapy. Its final version was tested with 178 individuals. The average of answers for all questions ranged from 4.6 to 5.8 and 97.2% of the individuals were considered adherent. Moderate correlations were obtained between the adherence measure and the Mental health and Vitality domains of the SF-36. Cronbach’s alpha was 0.60 and the ceiling effect occurred in answers to all items. These results indicate weak evidence of the validity, reliability and responsiveness of the MTA-adapted version for users of oral anticoagulant therapy.

Validation Studies; Psychometrics; Anticoagulants; Questionnaires; Medication Adherence


Este es un estudio metodológico que tuvo como objetivos adaptar y analizar las propiedades psicométricas del instrumento medida de adhesión a los tratamientos (MAT) como medida de adhesión a la terapéutica de anticoagulante oral (ACO). La versión final fue probada en 178 sujetos. Los promedios de las respuestas a los ítems del MAT variaron de 4,6 la 5,8, siendo que 97,2% fueron considerados adherentes. Correlaciones moderadas fueron obtenidas entre la medida de adhesión y los dominios salud mental y vitalidad, del SF-36. El alfa de Cronbach obtenido fue 0,60 y se constató la presencia de efecto máximo en las respuestas de todos los ítems. Eses resultados indican débiles evidencias de la validad, confiabilidad y responsividad de la versión adaptada del MAT para usuarios de anticoagulantes orales.

Estudios de Validación; Psicometría; Anticoagulantes; Cuestionario; Adhesión al Tratamiento


ARTIGO ORIGINAL

Adaptação e validação de uma medida de adesão à terapia de anticoagulação oral

Ariana Rodrigues da Silva CarvalhoI; Rosana Aparecida Spadoti DantasII; Flávia Martinelli PelegrinoIII; Inaiara Scalçone Almeida CorbiIV

IEnfermeira. Doutoranda em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. Professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), Campus Cascavel, PR, Brasil. E-mail: mauroari2@hotmail.com

IIEnfermeira, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: rsdantas@eerp.usp.br

IIIEnfermeira, Mestre em Enfermagem. E-mail: flavia-martinelli@bol.com.br

IVEnfermeira, Mestre em Enfermagem. Professor da Universidade Paulista (UNIP), Campus Araraquara, SP, Brasil. E-mail: inaenf@yahoo.com.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este é um estudo metodológico que teve como objetivos adaptar e analisar as propriedades psicométricas do instrumento medida de adesão aos tratamentos (MAT) como medida de adesão à terapêutica de anticoagulação oral (ACO). A versão final foi testada em 178 sujeitos. As médias das respostas aos itens do MAT variaram de 4,6 a 5,8, sendo que 97,2% foram considerados aderentes. Correlações moderadas foram obtidas entre a medida de adesão e os domínios saúde mental e vitalidade, do SF-36. O alfa de Cronbach obtido foi 0,60 e constatou-se a presença de efeito máximo nas respostas de todos os itens. Esses resultados indicam fracas evidências da validade, confiabilidade e responsividade da versão adaptada do MAT para usuários de anticoagulantes orais.

Descritores: Estudos de Validação; Psicometria; Anticoagulantes; Questionários; Adesão ao Medicamento.

Introdução

Adesão pode ser definida como o grau de concordância entre as recomendações do prestador de cuidados de saúde e o comportamento do indivíduo frente ao regime terapêutico(1). Vários são os fatores para a não adesão ao tratamento farmacológico como: fatores relacionados à pessoa sob tratamento, à doença, ao tratamento, aos serviços de saúde e ao apoio social(2). No Brasil, a investigação da temática da adesão ao medicamento é mais comum entre os indivíduos que usam antirretrovirais, anti-hipertensivos e antidiabéticos (hipoglicemiantes), todavia, a investigação da adesão ao uso de anticoagulantes orais ainda é incipiente. A adesão ao uso de anticoagulação oral (ACO) é um dos fatores importantes para atingir nível ótimo de anticoagulação, evitando complicações hemorrágicas e tromboembólicas entre seus usuários. Além do mais, o mal uso do medicamento, ou seja, as doses ingeridas erroneamente (sub ou superdosagem), por esquecimento ou por falha humana, também podem gerar riscos à saúde, aumentando as chances de eventos hemorrágicos ou tromboembólicos, haja vista que os objetivos da terapêutica não estão sendo atingidos(3). Investigações envolvendo o gerenciamento do ACO têm indicado fatores que podem afetar o controle dessa terapia, dentre eles: fatores clínicos (exemplo: doença aguda, interações medicamentosas, mudanças na dieta), fatores genéticos e fatores psicossociais (exemplos: depressão, disfunção cognitiva e estado de saúde percebido)(3). Para que o sujeito consiga resultados apropriados para o sucesso da terapêutica com ACO há exigências práticas e psicológicas que podem gerar efeitos positivos e/ou negativos na percepção de saúde e na qualidade de vida do indivíduo(4).

Apesar de se conhecer os potenciais efeitos de um regime de adesão inadequado ao uso do ACO, os fatores de risco que influenciam a adesão ao tratamento, entre pacientes em uso desses medicamentos, não têm sido bem elucidados, assim como os melhores métodos para essa avaliação(3).

Uma das dificuldades encontradas pelos pesquisadores, para avaliar adesão aos medicamentos, é a falta de instrumentos válidos, confiáveis, de fácil utilização e de baixo custo, tanto para uso nacional quanto internacional, o que impossibilita a comparação dos resultados da adesão a diferentes terapêuticas e entre serviços de saúde distintos.

O instrumento mais conhecido e usado para avaliar a adesão aos medicamentos é o teste de Moriski e Green(5-6). Outra medida de adesão proposta foi a medida de adesão aos tratamentos(1), elaborada e testada entre indivíduos diabéticos e hipertensos, em Portugal(1). Esse instrumento já foi avaliado no Brasil em uma população de diabéticos, obtendo resultados satisfatórios(7). O presente estudo teve como objetivos adaptar e analisar as propriedades psicométricas do instrumento medida de adesão aos tratamentos (MAT) para brasileiros em uso de ACO, no que se refere à sua validade (face, conteúdo e constructo), à confiabilidade (consistência interna) e à responsividade para detectar mudanças.

Casuística e Método

Delineamento, casuística e aspectos éticos

É estudo metodológico de adaptação e validação do instrumento MAT(1), em uma amostra de indivíduos anticoagulados, no Brasil. Teve início após a concordância dos autores da versão original. Para adaptação e validação, o instrumento original foi submetido à validação de face e conteúdo por comitê de especialistas e à análise semântica por indivíduos em uso de ACO. A versão adaptada foi testada em 178 sujeitos, abordados de maneira aleatória, em um único momento, enquanto aguardavam pelo atendimento no ambulatório de anticoagulação oral de um hospital de ensino no interior do Estado de São Paulo. Os critérios de elegibilidade foram: ter 18 anos ou mais; estar em seguimento ambulatorial devido ao uso do ACO, independente do tempo de uso, e demonstrar capacidade cognitiva para responder às questões dos instrumentos. O projeto foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa dessa instituição, com permissão para acesso ao serviço de arquivos dos prontuários. Todos os sujeitos que concordaram em participar do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Coleta dos dados

Os participantes responderam os instrumentos de medida de adesão(1), em sua versão adaptada para indivíduos brasileiros em uso em ACO e de estado de saúde percebido (SF-36) (Medical Outcomes Study 36 - Item Short-Form Health Survey)(8), em sua versão adaptada para o português(9). Informações sobre a caracterização sociodemográfica e clínica dos sujeitos também foram coletadas por entrevistas individuais e consulta aos prontuários dos participantes.

Instrumentos: medida de adesão aos tratamentos (MAT)

É instrumento composto por sete itens que avaliam o comportamento do indivíduo em relação ao uso diário dos medicamentos(1), sendo que alguns itens foram adaptados de outros autores (itens 1, 2, 3 e 4(5), item 6(10) e item 7(11)). As respostas são obtidas por meio de escala ordinal de seis pontos que varia de sempre (1) a nunca (6). Os valores obtidos com as respostas aos sete itens são somados e divididos pelo número de itens, ou seja, variam de 1 a 6. Posteriormente, os valores 5 e 6 são computados como um (o que na escala original corresponde a aderente) e os demais são computados como zero (não aderentes na escala original), finalizando em uma escala dicotômica sim/não (aderente/não aderente).

SF-36

É questionário multidimensional que avalia o estado de saúde percebido pelos indivíduos, composto por 36 itens, que abrangem oito componentes ou domínios: capacidade funcional (10 itens), aspectos físicos (quatro), dor (dois), estado geral de saúde (cinco), vitalidade (quatro), aspectos sociais (dois), aspectos emocionais (três), saúde mental (cinco) e mais uma questão de avaliação comparativa entre a avaliação da condição de saúde atual com aquela de um ano atrás. Os valores de cada um dos domínios são normatizados em uma escala de zero a 100, com baixos valores numéricos indicando pior estado de saúde percebido(8). O SF-36 avalia as percepções da doença e/ou tratamento em vários aspectos da vida do indivíduo e tem sido usado na investigação de indivíduos em tratamento de anticoagulação oral(3-4).

Processo de adaptação e validação do MAT

A versão original foi submetida à validação de face e conteúdo por um comitê de especialistas e à análise semântica, avaliada por sete indivíduos em uso de ACO. Aos especialistas (quatro enfermeiros e um médico, todos com especialidade na área da cardiologia) foi solicitada a avaliação da pertinência e da clareza de cada item, com a intenção de que cada um pudesse responder aos objetivos do estudo. Os juízes fizeram adaptações semânticas do português de Portugal para o português do Brasil, permitindo a adequação do uso no Brasil. Essa versão foi submetida à análise semântica, permitindo aos autores observarem que os pacientes respondiam referindo-se aos medicamentos usados, de forma geral, sem enfocar especificamente o ACO. Ao indagar os pacientes sobre isso, eles confirmaram que as questões do MAT não os levavam a enfocar apenas o uso de ACO, mas todos os medicamentos em uso. Assim, os pesquisadores modificaram a redação das questões do instrumento, adaptando-as ao usuário do anticoagulante oral, substituindo a palavra medicamento por anticoagulante oral e acrescentando algumas informações inerentes à terapia de ACO, como ocorrido nas questões 4, 6 e 7, com o intuito de explicitar ao sujeito as possíveis complicações relacionadas ao uso do ACO (por exemplo: aumento do fluxo menstrual, manchas roxas, presença de sangue na urina ou fezes, sangramento na gengiva) e também relacionados a motivos que pudessem levá-lo a não tomar esse medicamento (falta do medicamento em casa ou outro local, por falta de dinheiro, por ter acabado o remédio ou por não poder comprar o remédio ou o remédio estar em falta na farmácia ou na unidade básica de saúde). Essas alterações visaram a melhor compreensão dos itens do MAT para pacientes em uso de ACO. Não houve alteração na escala de respostas, uma vez que ela foi considerada adequada, tanto pelos juízes como pelos participantes, sendo mantida como na versão original(1).

Análise dos dados

Para análise da validade de constructo convergente hipotetizou-se que haveria correlações positivas e de moderada e forte intensidades, entre as medidas de adesão (MAT) e do estado de saúde (SF-36). O teste de correlação de Spearman foi realizado e os resultados foram analisados segundo a seguinte classificação: valores abaixo de 0,30 são de pouca aplicabilidade clínica, mesmo quando estatisticamente significantes, entre 0,30 e 0,50 são de moderada magnitude e acima de 0,5 de forte magnitude(12). O nível de significância adotado foi de 0,05. A confiabilidade do instrumento avaliada pela consistência interna dos itens do MAT foi verificada pelo alfa de Cronbach, considerando valores adequados entre 0,70 e 0,90(13). Vale ressaltar que alguns resultados altos para o alfa podem ser usualmente encontrados nas escalas com muitos itens, devido ao fato de o alfa depender do número de itens da escala. A mesma dependência pode acontecer com instrumentos com poucos itens, como o MAT. Nesse caso, um valor de alfa em torno de 0,50 pode ser aceitável(14). A responsividade do instrumento foi verificada com a presença de efeito máximo (ceiling) e mínimo (floor) na amostra estudada. A responsividade relata a capacidade para detectar mudanças quando o indivíduo melhora ou piora(15), ou seja, é a capacidade do instrumento para detectar mudanças importantes, clinicamente, com o passar do tempo(16). São considerados os efeitos mínimo e máximo quando os respondentes escolhem os escores mais baixos ou mais altos, respectivamente, na escala de respostas. Dessa forma, se esses efeitos estiverem presentes, é provável que respostas estejam no início ou no final da escala, indicando validade de conteúdo limitada. Como consequência disso, indivíduos com escores mais baixos ou mais altos não podem ser distinguidos entre si, e a responsividade do instrumento está reduzida. O efeito mínimo (baixa adesão) foi considerado quando mais de 15% dos respondentes optaram pela resposta de número 1 e o efeito máximo quando mais de 15% optaram pela resposta de valor 6(16).

Resultados

Dentre os 178 participantes, 116 (65,3%) eram mulheres. A idade média foi de 55,6 anos (intervalo de 24,8 a 86,1), 60% deles com menos de 60 anos. A maioria referiu primeiro grau incompleto (126 - 70,8%), renda familiar média de 896 reais (intervalo de 300 a 4500 reais), casados/união consensual (118 - 65,2%), brancos (115 - 63,9%), aposentados (65 - 36,7%) e procedentes de Ribeirão Preto e de outras cidades do Estado de São Paulo (148 - 83,2%). Quanto à indicação para o uso do ACO, as principais indicações foram: uso de prótese cardíaca metálica (50,6%) e fibrilação atrial (33,1%), seguidas de presença de trombo no ventrículo (8,4%), tromboembolismo pulmonar (2,2%), acidente vascular encefálico (2,2%), infarto agudo do miocárdio (1,1%), uso de marca-passo (1,1%) e trombose venosa profunda (0,6%). Os participantes faziam uso de outros medicamentos, tais como: anti-hipertensivos (116 - 65,2%), diuréticos (99 - 55,6%), betabloqueadores (74 - 43,7%), seguidos de outros grupos de medicamentos (127 - 71,3%). Com relação ao número de medicamentos, 85 (49,4%) dos indivíduos utilizavam de três a cinco medicamentos, 43 (25%) até dois medicamentos e 44 (25,6%) participantes utilizavam seis ou mais, variando de um a 12, com média de quatro medicamentos por indivíduo. Essa informação não estava disponível no prontuário de seis participantes.

Com relação à análise descritiva da versão adaptada do MAT, total da escala e cada um dos itens, obteve-se valor médio de 5,5 (dp=0,45) para a medida total e valores médios entre 4,6 e 5,9 para os itens. Observa-se que seis dos sete itens apresentaram a mediana de valor 6 (o que corresponde ao valor da resposta “Nunca”), embora os intervalos de valores também abranjam os valores inferiores da escala de resposta, ou seja, os valores um e dois (Tabela 1). As respostas obtidas foram somadas e os valores divididos pelo número de itens do instrumento (intervalo possível de 1 a 6). Posteriormente, os valores 5 e 6 foram computados com o valor um (o que na escala original corresponde a aderente) e os demais foram computados com o valor zero (não aderentes na escala original). Após essa categorização, 173 (97,2%) sujeitos foram classificados como aderentes e apenas 5 (2,8%) como não aderentes.

A análise descritiva dos itens permitiu, ainda, avaliar a responsividade da versão adaptada do MAT entre sujeitos que utilizam ACO, verificada pela presença de efeito máximo e mínimo na amostra estudada. Como já havia sido sinalizado pelos valores das medianas das respostas dos participantes (Tabela 1), observa-se na Tabela 2 que as frequências das respostas para cada questão do instrumento estão acima de 15% para a resposta “Nunca” (de valor 6), o que corresponde à melhor avaliação para a adesão (efeito máximo). A maior frequência dessa resposta encontra-se na questão Quantas vezes deixou de tomar o ACO por se sentir melhor? (92,7%) e, a menor, na questão Quantas vezes tomou o ACO fora do horário? (37,6%).

A avaliação da validade de constructo convergente foi verificada pela correlação da medida de adesão com as medidas dos domínios do SF-36. Ambas as escalas são ordenadas de maneira que maiores valores indicam, respectivamente, maior adesão e melhor avaliação do estado de saúde percebido. Os coeficientes de correlação de Spearman entre as medidas estão apresentados na Tabela 3. Constataram-se correlações moderadas e estatisticamente significativas apenas entre a medida de adesão e os domínios saúde mental (r=0,318; p<0,001) e vitalidade (r=0,305; p<0,001). Embora estatisticamente significantes, as correlações da adesão com os domínios dor, estado geral de saúde e aspectos sociais foram menores do que 0,30, ou seja, sem importância clínica.

Quanto à confiabilidade da versão adaptada do MAT, avaliou-se o alfa de Cronbach e o valor obtido para o total do instrumento foi de 0,60. Esse valor sofre variações para baixo quando se retira cada um dos itens do instrumento, alternadamente variando de a=0,47 (ao se deletar a primeira questão) a a=0,59 (para as questões 2 e 4). As correlações de cada item com o total da escala (sem o item correlacionado) foram de moderada magnitude para as questões do MAT, exceto para a questão 4, cujo valor foi 0,11 (Tabela 4).

Discussão

Este estudo teve como objetivos adaptar e testar a validade (face, conteúdo e constructo), a confiabilidade e a responsividade da versão do instrumento de medida de adesão aos tratamentos (MAT), em sua versão adaptada para o tratamento com anticoagulantes orais. Assim como no estudo original(1) e no estudo de adaptação do MAT para o Brasil(7), os pacientes que participaram da validação do instrumento neste estudo foram predominantemente adultos, do sexo feminino, com baixa escolaridade e em uso de múltiplas drogas para tratamento de condições crônicas.

Considerando a validade de face e conteúdo do instrumento adaptado, segundo os juízes, os itens que compõem o MAT foram considerados pertinentes para a avaliação da adesão ao tratamento com ACO. Esse julgamento reforça a proposta dos autores(1) de ampliarem a medida original de quatro itens(5), com a inclusão de questões que abordem comportamentos de não adesão devido ao excesso de prescrição (item 5), situações que possam levar à interrupção do medicamento por motivos econômicos ou de outra natureza (item 6) e sobre outros motivos que levam à interrupção do tratamento, que não seja por indicação médica (item 7).

Com relação aos resultados do instrumento adaptado para adesão em uso de ACO, constatou-se média de 5,5 (dp=0,4) para o total dos 7 itens do MAT, com intervalo de 3,4 a 6. Tais resultados foram semelhantes aos obtidos com a versão original(1). A avaliação da validade de constructo convergente da versão adaptada do MAT, entre sujeitos em uso de ACO, foi verificada pela correlação da medida de adesão com as medidas dos domínios do SF-36, e apresentou correlações moderadas e estatisticamente significantes apenas entre a medida de adesão e os domínios saúde mental e vitalidade. Não foram encontrados outros autores que avaliaram a validade de constructo do MAT usando essa medida de estado de saúde percebido. A validade de critério concorrente tem sido utilizada associando a medida de adesão avaliada pela escala tipo Likert para os sete itens do MAT, com a contagem de medicamento(1). Essa validade não foi investigada no presente estudo em decorrência das dificuldades de se operacionalizar a contagem do medicamento entre os pacientes atendidos no ambulatório, não sendo possível agendar retornos em tempo hábil para que eles trouxessem seus medicamentos para serem contados pelas pesquisadoras.

A consistência interna mensurada pelo alfa de Cronbach do instrumento foi de 0,6, valor que pode ser considerado adequado em se tratando de instrumento com poucos itens(14). Esse valor se assemelha aos alfas encontrados nos estudos que utilizaram a medida de adesão com quatro itens(5) e na forma dicotômica(17), os quais obtiveram valores de alfa de 0,61 e 0,54, respectivamente. Observa-se que a inclusão de mais um item, ainda na forma dicotômica, elevou o valor de alfa para 0,71 em outro estudo(11), o que não ocorreu ao testarem os sete itens do MAT com respostas dicotômicas (alfa de 0,54)(1). Assim, considerou-se, aqui, que o valor de 0,60 obtido pela versão de sete itens não atingiu o resultado obtido na versão original do MAT usando a escala tipo Likert (alfa de 0,74), mas foi um pouco maior do que o obtido com a escala de resposta tipo dicotômica. Ao se testar o valor do alfa com a retirada de cada um dos itens do MAT, no estudo original(1), obteve-se amplitude de 0,69 a 0,73, todavia, no presente estudo, a amplitude foi de 0,47 a 0,59. Os valores das correlações item-total do teste também diferem nos dois estudos: 0,11 a 0,48 para os indivíduos em uso de ACO e de 0,37 a 0,56 nos participantes portugueses(1).

A responsividade do instrumento foi testada pela presença de efeitos máximo e mínimo e constatou-se que, em todas as questões, se obteve porcentagem de resposta maior do que 15% para a alternativa “Nunca”, a qual corresponde ao valor maior da escala e maior adesão. Isso posto, evidenciou-se a presença de efeito máximo, sugerindo que o instrumento não permite detectar mudanças nos indivíduos, no que tange à adesão ao ACO(16). Não foram encontrados estudos que também avaliaram a responsividade por meio da presença desses efeitos. Segundo o instrumento, 97,2% dos sujeitos foram classificados como aderentes ao uso do ACO. A porcentagem de adesão foi superior aos resultados descritos no estudo português(1) e por aqueles que testaram o instrumento no Brasil(7), respectivamente, 61,6% e 78,3%. Algumas hipóteses foram levantadas para explicar essa alta porcentagem, tais como a inexistência de efeitos colaterais como aqueles provocados por anti-hipertensivos e hipoglicemiantes orais, justificando a diferença nos resultados obtidos nos outros estudos(1,7). A pequena porcentagem de indivíduos não aderentes (2,8%) impossibilitou que fossem realizadas avaliações comparativas entre os dois grupos para teste da confirmação da sensibilidade da versão adaptada, no intuito de perceber as diferenças entre os grupos.

Os resultados deste estudo trouxeram evidências fracas para a confirmação das propriedades psicométricas do MAT, quando adaptado para indivíduos em uso de ACO. Entretanto, diante dos resultados obtidos pela versão original do MAT em outros estudos(1,7), sugere-se que novas investigações sejam feitas para avaliar a validade de constructo, de critério, a confiabilidade e a responsividade da versão adaptada para indivíduos em uso de ACO, que apresentem outro perfil sociodemográfico como, por exemplo, maiores níveis de escolaridade e renda.

Conclusões e Considerações Finais

Trata-se de estudo inicial, com intenção de adaptar o instrumento medida de adesão aos tratamentos, proposto como medida geral de adesão farmacológica, para uso exclusivo em anticoagulação oral. Os resultados obtidos, até o momento, foram insuficientes para confirmar a validade e a confiabilidade da versão adaptada, quando usada nessa terapêutica. Sugere-se a realização de novas investigações com diversificação das características sociodemográficas e clínicas dos pacientes em uso de anticoagulação oral, bem como o uso concomitante de outras medidas de adesão, tais como a contagem dos medicamentos, a monitorização eletrônica e outros instrumentos de autorrelato.

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  • Corresponding Author:
    Rosana Aparecida Spadoti Dantas
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Ago 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      16 Nov 2009
    • Recebido
      03 Jun 2009
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