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Contextualizando a violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes: a implicação dos territórios de cuidado1 1 Artigo extraído da tese de doutorado "O cuidado a famílias envolvidas na violência doméstica contra crianças e adolescentes: o olhar da Atenção Básica à Saúde", apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil. Apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Brasil, processo nº 2014/23620-7.

RESUMO

Objetivo:

compreender o contexto de cuidado direcionado às famílias envolvidas na violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes (VICCA), produzido a partir da Atenção Primária à Saúde (APS), sob a ótica de profissionais de um município do interior do estado de São Paulo.

Método:

pesquisa qualitativa, do tipo social estratégica, fundamentada pelo Paradigma da Complexidade. Participaram do estudo 41 profissionais de saúde de cinco unidades do município estudado, cada qual pertencente a um de seus cinco Distritos Sanitários. A coleta de dados foi realizada por meio de 5 grupos focais e 10 entrevistas semiestruturadas, no período de 24/04/13 a 17/12/13. As noções de compreensão e contextualização, e os princípios dialógicos, recursivo e hologramático direcionaram a análise dos dados.

Resultados:

identificou-se duas questões cruciais para o cuidado desenvolvido pela equipe de saúde às famílias: o contexto onde essa violência ocorre (O espaço doméstico), e as relações de poder existentes na emergência desse cuidado no território. Os agentes comunitários merecem especial atenção por viverem a dialógica do morar-trabalhar em uma mesma área.

Conclusão:

o olhar para o território, considerando a complexidade de contextos e dimensões, se apresenta como inerente para o delineamento do cuidado às famílias envolvidas na VICCA no âmbito da APS.

Descritores:
Família; Criança; Adolescente; Violência Doméstica; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

Objective:

to understand the context of care addressed to the families involved in family violence against children and adolescents (IVCA), as produced in the context of the Primary Health Care (PHC), from the vantage point of the practitioners of a municipality in the State of Sao Paulo.

Methods:

qualitative research of the social-strategic type, based on the Complexity Paradigm. The participants were 41 health practitioners in five health units of the municipality under study, pertaining to the five districts of the municipality. Data collection was done through 5 focus groups and 10 semi-structured interviews from April 24th 2013 to December 12th 2013. Data analysis was oriented by the comprehension and contextualization mindset and based on the dialogic, recursive and hologramatic principles.

Results:

two main issues regarding the care provided by the Health of the Family team were identified: the context of this violence (the domestic space) and the power relations that prevail in the territory where this violence surfaces. The community health workers are the targets of specific attention because they experience the live/work dialogic in this same area.

Conclusion:

paying attention to the territory, and considering the complexity of contexts and dimensions is inherently linked to the design of care to families involved in IVCA in the PHC environment.

Descriptors:
Family; Child; Adolescent; Domestic Violence; Primary Health Care

RESUMEN

Objetivo:

comprender el contexto de cuidado dirigido hacia las familias involucradas en violencia familiar contra niños y adolescentes (VICNA) que resulta de la Atención Primaria de la Salud (PHC) desde la óptica de los profesionales de un municipio del interior de Sao Paulo.

Método:

investigación cualitativa del tipo social-estratégica, fundamentada en el Paradigma de la Complejidad. Participaron en el estudio 41 profesionales de salud de cinco unidades del municipio en estudio, cada una perteneciente a uno de los cinco Distritos Sanitarios. La recolección de datos se realizó por medio de cinco grupos focales y 10 entrevistas semi-estructuradas en el período entre 24/04/2013 y 17/12/2013. Las nociones de comprensión y contextualización y los principios dialógicos, recursivo y hologramático guiaron el análisis de los datos.

Resultados:

se identificaron dos cuestiones cruciales para el cuidado desarrollado por el equipo de salud de las familias: el contexto en ocurre esta violencia (El espacio doméstico) y las relaciones de poder que existen en la emergencia de ese cuidado en el territorio. Los trabajadores comunitarios merecen una atención especial ya que viven la dialógica de trabajar/habitar en la misma área.

Conclusión:

la mirada sobre el territorio, considerando la complejidad de contextos y dimensiones, se presenta como inherente al diseño del cuidado de las familias involucradas en la VICNA en el ámbito de la APS.

Descriptores:
Familia; Niño; Adolescente; Violencia Doméstica; Atención Básica a la Salud

Introdução

A violência é responsável por mais de 1 milhão de óbitos por ano, totalizando 2,5% da mortalidade mundial. Entretanto, estas estatísticas representam apenas o ápice da pirâmide, que é a melhor configuração para compreender a magnitude do problema. Milhares de pessoas no mundo são vitimas de violências não fatais, diariamente, representando a base desta pirâmide. Crianças e adolescentes estão entre as principais populações que sofrem essa violência em silêncio11. Word Health Organization. Global status report on violence prevention. Geneva: World Health Organization; 2014. 292 p.. Este fenômeno torna-se ainda mais complexo, uma vez que o seu contexto de maior ocorrência, - o espaço intrafamiliar - da mesma maneira que a repetição com que é praticado, dificulta o cuidado por parte dos profissionais envolvidos na assistência a essas famílias22. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Metodologias para o cuidado de crianças, adolescentes e famílias em situação de violências. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011. 86 p.-33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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.

O Ministério da Saúde propõe a integração dos recursos e serviços disponíveis à atenção a famílias envolvidas na violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes (VICCA), em uma rede de cuidados, dentro de uma lógica interinstitucional e intersetorial, orientada pela Atenção Primária à Saúde (APS)22. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Metodologias para o cuidado de crianças, adolescentes e famílias em situação de violências. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011. 86 p.-33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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. A APS se constitui como primeiro nível de atenção do sistema de saúde, sendo a porta de entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS). Entende-se que, pela proximidade geográfica da população, possui espaço privilegiado para identificação, acolhimento e construção de projetos terapêuticos voltados a famílias envolvidas na VICCA junto aos demais serviços da rede de cuidados22. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Metodologias para o cuidado de crianças, adolescentes e famílias em situação de violências. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011. 86 p..

Estudos mais recentes, que abordam a violência vivenciada por crianças e adolescentes, destacam a importância do fator contexto destes atores para o enfrentamento das violências sofridas, citando como essenciais a família, os pares e a comunidade; denotando a desapropriação dos setores de proteção à infância e adolescência, entre eles a saúde, para a construção de olhares e ações intersetoriais, que tenham a integralidade como ferramenta de trabalho44. Fry DA, Messinger AM, Rickert VI, O'Connor MK, Palmetto N, Lessel H, et al. Adolescent relationship violence: help-seeking and help-giving behaviors among peers. J Urban Health. 2013;91(2):320-34. doi: 10.1007/s11524-013-9826-7.
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5. Mikton C, MacMillan H, Dua T, Betancourt TS. Integration of prevention of violence against children and early child development. Lancet Glob Health. 2014;2(8):442-3. doi: 10.1016/S2214-109X(14)70233-5.
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6. Foshee VA, Benefield TS, Reyes HL, Ennett ST, Faris R, Chang LY, et al. The peer context and the development of the perpetration of adolescent dating violence. J Youth Adolesc. 2013;42(4):471-86. doi: 10.1007/s10964-013-9915-7.
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-77. Karriker-Jaffe KJ, Foshee VA, Ennett ST. Examining how neighborhood disadvantage influences trajectories of adolescent violence: a look at social bonding and psychological distress. J Sch Health. 2011;81(12):764-73. doi: 10.1111/j.1746-1561.2011.00656.x.
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. Desta forma, buscando superar os desafios encontrados na área da saúde, e em especial na enfermagem, no que tange ao cuidado à VICCA, são apresentadas as questões norteadoras: Compreendendo a APS como norteadora da rede de cuidados à VICCA, em qual contexto se despreende este cuidado? Quais os fatores dificultadores e potencializadores para o cuidado neste contexto de vida das famílias e de trabalho dos profissionais?

Considerando tais questões, o objeto deste estudo foi o contexto de cuidado a famílias envolvidas na VICCA, produzido a partir da APS. O Paradigma da Complexidade, tomando como referência Edgar Morin, um de seus principais autores, foi utilizado como subsídio para compreender tal objeto. O pensamento complexo é proposto para abordagem daquilo que é "tecido junto", o que implica considerar as partes distintas, e às vezes contraditórias, que se articulam na composição do fenômeno, inseridas num contexto e não isoladas dele, em perspectiva dialógica. Para isto, torna-se necessária uma visão poliocular do fenômeno, de modo a perceber e inter-relacionar o local, o global e as múltiplas relações entre partes-todo-contexto, possibilitando a abordagem multidimensional, contextual, dinâmica e transdisciplinar da realidade, além de considerar as contradições88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p. O olhar para a VICCA de forma multidimensional, e a compreensão do cuidado no contexto onde o mesmo ocorre, poderão nortear as potencialidades e dificuldades para a atuação dos profissionais da APS frente a esse fenômeno.

Desta maneira, o objetivo deste estudo foi compreender o contexto de cuidado direcionado às famílias envolvidas na VICCA, produzido a partir da APS, sob a ótica de profissionais das Unidades Básicas de Saúde (UBS) de um município do interior do estado de São Paulo.

Metodologia

Estudo com abordagem qualitativa, do tipo pesquisa social estratégica, ancorada pelo Paradigma da Complexidade, conforme definido. O percurso metodológico foi guiado pelas noções de compreensão e contextualização, presentes no Paradigma da Complexidade. O contextualizar consiste em estratégias que buscam a compreensão de determinado fenômeno em conexão , e não mais isolado dele. A compreensão busca apreender o significado de um objeto ou acontecimento e suas relações com outros objetos ou acontecimentos99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007..

Além destas noções, recorreu-se aos princípios da complexidade, a saber: dialógico, recursivo e hologramático. O primeiro requer a conjugação e associação de fatores contraditórios na análise de um determinado fenômeno. O segundo princípio diz respeito à recursão organizacional, remetendo à imagem do redemoinho, ressaltando que o "processo recursivo é um processo em que os produtos e os efeitos são, ao mesmo tempo, causas e produtores daquilo que os produziu"88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p. O terceiro princípio busca a imagem do holograma, na qual cada ponto contém a quase totalidade da informação sobre o objeto representado, de maneira que não apenas a parte está num todo, mas o todo está inscrito, de certa maneira, na parte88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p-99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007..

O campo de estudo foi um município de grande porte do interior do estado de São Paulo. A complexidade do sistema de saúde do município levou à distritalização sanitária, que se configura em um processo progressivo de descentralização do planejamento e gestão da saúde, para áreas com cerca de 200.000 habitantes. Assim, o município encontra-se geograficamente dividido em cinco Distritos Sanitários: Norte, Sul, Leste, Noroeste, e Sudoeste.

O município estudado possui 62 UBS que encontram-se organizadas por meio da ESF. Existe aproximadamente uma unidade básica para cada 20.000 habitantes, com equipes multiprofissionais envolvendo médicos nas especialidades básicas (Clínicos, pediatras, ginecologistas-obstetras), enfermeiros, dentistas, auxiliares de enfermagem e auxiliares de consultório dentário. Algumas UBS possuem, ainda, profissionais de apoio em saúde mental (Médicos psiquiatras, psicólogos e terapeutas ocupacionais).

Os participantes deste estudo foram os trabalhadores das UBS, sendo considerados como critérios de inclusão: (i) incluir uma unidade de cada distrito de saúde, de acordo com a disponibilidade e autorização da coordenação distrital e local; (ii) considerar apenas os profissionais que trabalhavam há pelo menos 1 (Um) ano na unidade estudada, e que exerciam ações junto a famílias envolvidas na VICCA; (iii) considerar tais participantes em número suficiente para que pudesse ter reincidência e saturação teórica das informações. O critério de saturação da amostra foi direcionado pelas respostas ao objetivo da pesquisa, e com maior ênfase ao aprofundamento das questões norteadoras para compreensão e contextualização da temática.

Desta forma, a partir da disponibilidade, organização distrital e local das unidades, foram definidas as cinco UBS participantes, ao passo que os seus profissionais foram selecionados por decisão da equipe de cada espaço , com variação no número de participantes e categorias profissionais em cada unidade. Foram selecionados 41 profissionais, sendo 17 agentes comunitários de saúde (ACS); 4 auxiliares de enfermagem; 4 enfermeiros; 1 terapeuta ocupacional (TO); 4 médicos pediatras; 2 psicólogos; 1 médico psiquiatra; 2 médicos clínicos; 1 auxiliar de saúde bucal (ASB); 5 residentes em saúde multiprofissionais. Dentre os participantes, seis eram do sexo masculino e o restante do sexo feminino, com a maioria enquadrada na faixa etária de 31 a 40 anos.

O contato com os Distritos de Saúde do município estudado teve início em 14 de janeiro de 2013, com o objetivo de discutir e selecionar as UBS participantes. Após a definição, tomada pela disponibilidade e organização da equipe local, foram agendadas reuniões para a coleta. As unidades (UBS) participantes foram designadas pelos números 1, 2, 3, 4 e 5, conforme a sequência de realização da coleta de dados, com a finalidade de manter a sua identidade sob sigilo. A coleta foi realizada no período de 24/04/13 a 17/12/13.

A coleta ocorreu através de grupos focais e entrevistas semiestruturadas. Os grupos focais foram realizados a partir da seguinte questão norteadora: Como se dá o cuidado às famílias envolvidas na VICCA? A partir desta questão disparadora, iniciaram-se os debates objetivando a compreensão e contextualização da temática. Ocorreram dois encontros em cada unidade, com duração aproximada de 90 minutos, em sala com boa acústica e luminosidade, livre de interrupções. Conforme indicação da literatura, os grupos contaram com a participação de uma relatora, uma observadora e uma moderadora. e identificados como Gp1, Gp2, Gp3, Gp4 e Gp5, conforme a sequência em que os mesmos foram realizados.

Posteriormente, foram realizadas as entrevistas, com os mesmos participantes dos grupos focais, porém em dias diferentes. A seleção dos profissionais convidados a participar dos grupos foi pautada na heterogeneidade dos núcleos profissionais.. O roteiro definido para o presente estudo possuía três questões abertas e norteadoras, que permitiram um olhar singular do pesquisado sobre o objeto do estudo, além de reduzir a interferência do entrevistador, a saber: Diante de um caso suspeito ou confirmado de VICCA, como se dá a atuação da equipe de saúde? Quais as principais dificuldades encontradas para atuação frente a estas situações? E as facilidades?

As entrevistas tiveram duração aproximada de 20 minutos e identificadas com a letra E, numeradas de acordo com a sequência em que foram realizadas: E1, E2, E3, e assim sucessivamente. A categoria profissional dos profissionais entrevistados não foi destacada, sendo este dado identificado somente no caso de existirem informações específicas, em que a diferenciação de categoria traria implicações para o diagnóstico . Através de uma análise processual dos dados, os pesquisadores perceberam que a saturação se deu após a 10ª entrevista, momento em que foi decidido pela não inclusão de novos informantes no estudo.. Os relatos dos grupos e entrevistas, após consentimento dos participantes, foram gravadas através do programa Easy Voicer, em aparelho com tecnologia MP5, posteriormentetransferidas para computador e transcritas na íntegra.

A análise dos dados foi orientada pelas seguintes etapas1010. Pádua EMM. Complexidade e Pesquisa Qualitativa: aproximações. Série Acadêmica, PUC-Campinas. 2015;32(2):39-48.: classificação e organização das informações coletadas, realizada por meio de uma leitura atenta do material, e identificação dos principais pontos das entrevistas e debates dos grupos, observando a pertinência e relevância para o objeto de estudo; organização de quadros referenciais com os principais pontos das respostas dos profissionais, de forma a se ter uma visão do conjunto das informações que possibilitasse categorizá-las; e estabelecimento de relações entre os dados, por meio da organização em categorias, que se constituíram pelo agrupamento de elementos, ideias e/ou expressões em torno de conceitos capazes de abranger todos estes aspectos. Posteriormente, buscou-se estabelecer as relações entre os dados e o paradigma da complexidade (Em especial, as noções de compreensão e contextualização e os princípios dialógico, recursivo e hologramático), dispositivos legais e a literatura que versa sobre o cuidado em redes a famílias envolvidas na VICCA. A emergência do contexto em que este cuidado é produzido pela APS - o território de vida destas famílias, se constituiu como a categoria que conduziu o presente estudo.

O estudo foi submetido à análise pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, em cumprimento à Resolução nº 196/96 proposta pelo Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, e aprovado em 14 de novembro de 2012, pelo protocolo CAAE 01726512.0.00005393, ofício 217/2012. Ainda, conforme a referida Resolução, foi solicitado aos participantes, o consentimento espontâneo, através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O estudo foi aprovado pela Secretaria Municipal de Saúde do município em questão em 18 de maio de 2012. Para a realização do estudo, além da aprovação municipal, também foi solicitada a autorização distrital e local das unidades.

Resultados e Discussão

O fenômeno da VICCA é complexo e interfere intensamente nas relações humanas. Em função desta complexidade, e do contexto em que o presente estudo buscou construir ações e cuidados frente a esse fenômeno (A APS), é possível compreender a implicação dos territórios (De ação, de cuidado, de vida, de convivência) e das relações neles estabelecidas, em especial de poder, como intrínsecas e inerentes a este estudo.

A unidade de saúde se torna mais que uma referência ao cuidado à saúde da população, pois a comunidade se apropriou dela, sentindo-a inerente ao seu território de vida. Esta unidade, muitas vezes, emerge como único espaço de escuta às famílias: Porque eu vejo essa unidade de saúde não apenas como uma unidade de saúde não, é um lugar onde as pessoas da comunidade acaba se encontrando pra contar os seus problemas, todos os tipos de problemas (...) É o lugar mais próximo... (Gp 1). A literatura sobre violência contra crianças e adolescentes, em especial nos últimos três anos, mostra que a integração entre os serviços de proteção social a esta população e suas famílias ainda é um desafio. A proposta de considerar os determinantes e condicionantes da saúde na produção e reprodução da violência, requer a construção de um olhar interdisciplinar e intersetorial para seu enfrentamento33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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. Porém, como se reflete na fala do grupo, a unidade de saúde ainda se apresenta/coloca de forma isolada. Estudos reforçam, ainda, que iniciativas de promoção do desenvolvimento infantil e adolescente devem estar integradas a estratégias de prevenção à violência envolvendo estes atores, na perspectiva da integralidade, e que órgãos internacionais tornem mais ágil a disseminação do conhecimento baseado em evidencias, estimulando práticas inovadoras de cuidado à VICCA55. Mikton C, MacMillan H, Dua T, Betancourt TS. Integration of prevention of violence against children and early child development. Lancet Glob Health. 2014;2(8):442-3. doi: 10.1016/S2214-109X(14)70233-5.
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6. Foshee VA, Benefield TS, Reyes HL, Ennett ST, Faris R, Chang LY, et al. The peer context and the development of the perpetration of adolescent dating violence. J Youth Adolesc. 2013;42(4):471-86. doi: 10.1007/s10964-013-9915-7.
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7. Karriker-Jaffe KJ, Foshee VA, Ennett ST. Examining how neighborhood disadvantage influences trajectories of adolescent violence: a look at social bonding and psychological distress. J Sch Health. 2011;81(12):764-73. doi: 10.1111/j.1746-1561.2011.00656.x.
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8. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p

9. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007.

10. Pádua EMM. Complexidade e Pesquisa Qualitativa: aproximações. Série Acadêmica, PUC-Campinas. 2015;32(2):39-48.
-1111. Monteiro EM, Neto WB, Lima LS, Aquino JM, Gontijo DT, Pereira BO. Culture Circles in adolescent empowerment for the prevention of violence. Int J Adolesc Youth. 2015;20(2):167-84. doi:10.1080/02673843.2014.992028.
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No contexto de cuidado à VICCA, os ACS merecem especial atenção. Estes profissionais são os elos entre a população e a equipe de saúde, e vivem uma relação dialógica88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p pois, ao mesmo tempo que são as pessoas que ofertam diretamente o cuidado à comunidade, também fazem parte desta comunidade: Esse nosso lado da gente fazer parte da população da onde a gente trabalha, né... Tem esse lado. (E 5).

A legislação pontua certos requisitos para o trabalho do ACS, e entre eles está a prerrogativa de que resida na mesma área de atuação. Estudo sobre o cuidado às adolescentes grávidas sob a perspectiva e atuação dos ACS desvelou que, pelo fato de residir na mesma comunidade, uma relação de confiança e intimidade foi estabelecida entre estes profissionais e as adolescentes, possibilitando maior vinculação à unidade de saúde1212. Oliveira M, Cruz N, Moura L, Moura J, Coelho R, Melo M. Care to pregnant adolescents: perspectives and performance of community health agents. Rev Enferm UERJ. 2015;23(1):76-81. doi: 10.12957/reuerj.2015.15580.
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. Entende-se que residir no território é importante para um melhor conhecimento deste contexto, e maior possibilidade do planejamento de ações que impactem e melhorem a qualidade de vida da população. Entretanto, apresenta certos contrastes, em especial no manejo de situações que envolvam a violência. A literatura apresenta críticas ao critério de que o ACS deve obrigatoriamente residir na mesma área de trabalho, associando diretamente esta questão ao sofrimento físico e psíquico destes atores. A ausência de educação permanente destes profissionais, que não possuem formação profissional em saúde a priori, não é realizada ou se estabelece por meio de abordagens incipientes1212. Oliveira M, Cruz N, Moura L, Moura J, Coelho R, Melo M. Care to pregnant adolescents: perspectives and performance of community health agents. Rev Enferm UERJ. 2015;23(1):76-81. doi: 10.12957/reuerj.2015.15580.
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-1313. Lopes DMQ, Beck CLC, Prestes FC, Weiller TH, Colomé JS, Silva GM. Community Health Agents and their experiences of pleasure and distress at work: a qualitative study. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(3):633-40. doi: 10.1590/S0080-62342012000300015.
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A temática aqui discutida deve ser ampliada para além do entendimento do território como recorte geográfico, de caráter político-administrativo, que delimita a área de atuação de determinado serviço de saúde. Nas Ciências Sociais, o conceito de território envolve três pressupostos. O primeiro se relaciona à diferenciação entre espaço geográfico e território. O segundo se refere à construção histórica do território, colocando-o como social, a partir das relações de poder. E o terceiro pressuposto, que mais interessa ao presente estudo, traz o território em sua dimensão mais subjetiva, de identificação e dominação de um espaço, e em sua dimensão objetiva, relacionada à ação político-econômica. De acordo com essa vertente, o território é definido pelo poder exercido naquele espaço, não apenas o político, como também o de apropriação simbólica1414. Haesbaert R. Del mito de la desterritorialización a la multiterritorialidad. Cultura y representaciones sociales. 2013;8:7-42.-1515. Moraes DE, Canôas SS. O Conceito de "Território" e seu significado no campo da Atenção Primária à Saúde. Rev Desenvol Soc. 2013;1(9):49-57..

O fenômeno da violência age sobre este território e o (trans)forma, através de uma relação recíproca. Este estudo deteve-se na discussão sobre a implicação do(s) território(s) no cuidado a famílias envolvidas na VICCA. Foram identificadas duas questões cruciais para este cuidado desenvolvido pela equipe de saúde da família, em especial pelos ACS: o contexto onde essa violência ocorre e as relações de poder existentes na emergência desse cuidado no território.

O contexto doméstico se apresentou como símbolo do sagrado, revestido de sigilos. Neste âmbito singular, entende-se que estão as contradições e consequências de dimensões sociais mais amplas, que acentuam desigualdades e faltas, traduzidas em ausência de recursos para lidar com situações cotidianas, estresse, opressão e condições precárias e desfavoráveis a relações familiares saudáveis33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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. Adentrar estas relações foi entendido por alguns profissionais como uma invasão: Existe um limite(...) eu não posso interromper a decisão da mãe, por exemplo. Até onde a gente pode ir? (...) Que a gente não pode simplesmente ir lá e falar que ela não pode mais bater.... (E 10). Apesar da unidade pertencer ao território da comunidade, foi sinalizado pelos profissionais que a violência existe, mas não chega (Gp 2) até eles. As unidades de Pronto-Atendimento e Pronto-Socorros atendem às situações de violência contra crianças e adolescentes com maior frequência e, geralmente, às que possuem maior gravidade. Os profissionais associaram esta questão ao fato da distância do território e a "impessoalidade".

A visita domiciliar é pressuposta pela APS como tecnologia do cuidado; apresenta-se como importante instrumento das equipes de saúde para a inserção e o conhecimento do contexto real de vida da população, favorecendo a vinculação e a compreensão de aspectos das dinâmicas familiares1616. Albuquerque ABB, Bosi M.M. Visita domiciliar no âmbito da Estratégia Saúde da Família: percepções de usuários no Município de Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saúde Pública. 2009;25(5):1103-12.-1717. Cunha MS, Sá MC. A visita domiciliar na estratégia de saúde da família: os desafios de se mover no território. Interface. (Botucatu) 2013;17(44):61-73. doi:10.1590/S1414-32832013000100006.
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. Estudo reforça que práticas emancipatórias, como a visita domiciliar, permitem a apreensão das condições de saúde como resultado das relações sociais, potencializando outros dispositivos terapêuticos, como o trabalho em equipe e a participação comunitária1818. Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017.
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. Apesar de ser um cuidado passível de ser realizado por todos os profissionais, as visitas domiciliares são realizadas principalmente pelos ACS: A investigação é só dos agentes... Acho que se eu ganhasse, eu já tava parecendo o CSI assim... (Gp 1). Além dos aspectos expostos sobre a atuação dos ACS, o estudo corroborou para certo isolamento destes profissionais no cuidado à população, propondo mecanismo de integração às equipes para superar esta tendência1919. Onocko-Campos RT, Campos GWS, Ferrer AL, Corrêa CRS, Madureira PR, Gama CAP, et al. Evaluation of innovative strategies in the organization of Primary Health Care. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):43-50. doi:10.1590/S0034-89102011005000083.
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Retomando a última fala citada, as visitas domiciliares na rede de cuidados às famílias envolvidas na VICCA ocuparam o lugar de "investigação", controle e vigilância, no sentido policialesco. Dialogicamente, a temática se apresenta como essencial na abordagem da VICCA, pois possibilita o encontro de situações que dificilmente seriam evidenciadas em atendimentos na unidade, além da percepção de dinâmicas familiares violentas. Esta abordagem se apresentou como difícil e ameaçadora, em especial para os ACS: Existe muito medo da denúncia, e até quando a gente tem uma denúncia, existe um medo de se mexer no que está muito velado, existe muito medo, até as agentes de saúde tem medo, eu moro aqui e posso sofrer ameaças. (E 4).

No contexto familiar, o poder é direcionado ao responsável por aquele domicílio, e a entrada ou intervenção de um profissional de saúde, ou aquele que dialogicamente é seu vizinho, pode fazer emergir uma relação assimétrica. Esta questão remete à discussão sobre a multiplicidade e a pluralidade de territórios em que a unidade atua. Entende-se por multiplicidade as relações implicadas neste cuidado, enquanto a pluralidade pode ser entendida como o conjunto de contextos que necessitam ser assumidos como inerentes a este cuidado1414. Haesbaert R. Del mito de la desterritorialización a la multiterritorialidad. Cultura y representaciones sociales. 2013;8:7-42.-1515. Moraes DE, Canôas SS. O Conceito de "Território" e seu significado no campo da Atenção Primária à Saúde. Rev Desenvol Soc. 2013;1(9):49-57.. Os profissionais de saúde precisam se aproximar deste debate e desenvolver suas práticas em torno desses conceitos, construindo um olhar multidimensional. Estudo realizado em uma capital brasileira reforça a atuação de profissionais da APS junto a populações envolvidas em situações violentas com olhares pouco abrangentes e integradores33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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. A literatura também reforça a necessidade de mudança de paradigma para o enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes, sugerindo a avaliação das dinâmicas familiares de apego ou violentas em uma ótica relacional, nesse contexto e nas relações deste com os demais contextos dos quais esta família participa2020. Frewen P, Brown M, DePierro J, D'Andrea W, Schore A. Assessing the family dynamics of childhood maltreatment history with the Childhood Attachment and Relational Trauma Screen (CARTS). Eur. J. Psychotraumatol. 2015;3(6):27792. doi: 10.3402/ejpt.v6.27792.
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Na(s) localidade(s) deste estudo, o tráfico de drogas emergiu como uma força mobilizadora da comunidade, em especial na sua relação com a VICCA, no lugar de "cuidado" às vítimas e detentor do poder legitimado e simbólico no território da unidade: Infelizmente quem protegia, segurava naquele momento a violência, dentro daquela família, com as crianças, é o tráfico... Nem a polícia... (...) Chegou e falou assim - se você meter a mão nesse menino de novo, você tá morto! (Gp 5). A literatura se mostra incipiente na abordagem desta temática, mostrando que a discussão sobre o tráfico de drogas e sua relação com a comunidade ainda necessita de aprofundamento. Compreende-se que o tráfico emerge, no sentido atribuído ao relato do grupo, na ineficiência ou insuficiência do Estado em suprir as diversas demandas apresentadas pela população. Em muitas comunidades, as drogas, as armas e a violência representam a maior parte da infraestrutura econômica e política2121. Ward E, Ashley D. The New Imperative: Reducing Adolescent-Related Violence by Building Resilient Adolescents. J Adolesc Health. 2013;52:43-5. doi: 10.1016/j.jadohealth.2012.06.009.
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. Trata-se de importante apropriação e dominação do(s) território(s), implicando em uma relação de poder legitimada pela comunidade, apesar de informal1414. Haesbaert R. Del mito de la desterritorialización a la multiterritorialidad. Cultura y representaciones sociales. 2013;8:7-42.

15. Moraes DE, Canôas SS. O Conceito de "Território" e seu significado no campo da Atenção Primária à Saúde. Rev Desenvol Soc. 2013;1(9):49-57.

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18. Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017.
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19. Onocko-Campos RT, Campos GWS, Ferrer AL, Corrêa CRS, Madureira PR, Gama CAP, et al. Evaluation of innovative strategies in the organization of Primary Health Care. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):43-50. doi:10.1590/S0034-89102011005000083.
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20. Frewen P, Brown M, DePierro J, D'Andrea W, Schore A. Assessing the family dynamics of childhood maltreatment history with the Childhood Attachment and Relational Trauma Screen (CARTS). Eur. J. Psychotraumatol. 2015;3(6):27792. doi: 10.3402/ejpt.v6.27792.
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21. Ward E, Ashley D. The New Imperative: Reducing Adolescent-Related Violence by Building Resilient Adolescents. J Adolesc Health. 2013;52:43-5. doi: 10.1016/j.jadohealth.2012.06.009.
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-2222. Lobato GR, Moraes CL, Nascimento MC. Desafios da atenção à violência doméstica contra crianças e adolescentes no Programa Saúde da Família em cidade de médio porte do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saúde Pública. 2012; 28(9):1749-58. doi: 10.1590/S0102-311X2012000900013.
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Além destas ponderações, os profissionais entrevistados se referiram às dificuldades em conviver com este poder do tráfico no(s) território(s) de cuidado à comunidade, desvelando as contradições desta relação: Não tenho a segurança, trabalhar com a relação do poder, entendeu? A gente fica com essas dificuldades e com medo de tratar esta relação, não é: ah é simples, simplesmente notificar, fazer e tal... até pra você poder fazer esse acolhimento desta mãe, desta criança, desse adolescente, é complicado.. inclusive tá aqui uma quadra, o maior tráfico aqui, entendeu? (Gp 2). Os profissionais esclarecem que muitas crianças e adolescentes envolvem-se precocemente com o tráfico de drogas, geralmente em situações associadas à violência intrafamiliar, como "rota de fuga". A literatura acentua que a exposição à violência por adolescentes, em especial comunitária e familiar, pode elevar o risco para um futuro uso de álcool e maconha2323. Wright EM, Fagan AA, Pinchevsky GM. The Effects of Exposure to Violence and Victimization across Life Domains on Adolescent Substance Use. Child Abuse Negl. 2013;37(11):899-909. doi:10.1016/j.chiabu.2013.04.010.
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. Estudo realizado nos Estados Unidos da América alertou para o considerável aumento do risco à depressão, ao envolvimento em gangues e à infecção por doenças sexualmente transmissíveis, por adolescentes em conflito com a lei que vivem em contextos sociais pobres (Por exemplo, rede social fragilizada, condições precárias de moradia, exposição a comunidades violentas, oportunidades educacionais limitadas)2424. Voisin DR, Sales JM, Hong JS, Jackson JM, Rose ES, DiClemente RJ. Social Context and Problem Factors among Youth with Juvenile Justice Involvement Histories. Behav Med. 2015;5(0). ahead of print Epub 05 Aug 2015..

As relações com o tráfico de drogas, em todas as instâncias pelas quais perpassam, apresentaram-se como uma dialógica, com movimento dinâmico de ordem e desordem, cercado de antagonismos e contradições. A recursividade deste fenômeno evidencia a complexidade que o envolve, ou seja, não se percebe uma lógica de causa-efeito, mas se apresentam simultaneamente como produtos e produtores da violência que os produziu inicialmente, e retroagem sobre ela88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p-99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007.. Programas e ações integradoras e intersetoriais, focados na prevenção, como discutido anteriormente, são imperativos para produzir "incubadoras" para o crescimento e conhecimento em cidades no mundo industrializado e em desenvolvimento, em detrimento à atual produção de ciclos de violência e miséria2121. Ward E, Ashley D. The New Imperative: Reducing Adolescent-Related Violence by Building Resilient Adolescents. J Adolesc Health. 2013;52:43-5. doi: 10.1016/j.jadohealth.2012.06.009.
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A comunidade se apresentou como parceira e com vínculos significativos junto às UBS, principalmente na legitimidade do cuidado a famílias envolvidas na VICCA: Por equipe né, as pessoas tão bem vinculadas né... (Gp3) Porque a família procura muito, eu acho que a gente é uma boa referência pra família, tem um vínculo de confiança né... Pra tudo né... (Gp5). As UBS apresentam o Conselho Local de Saúde como significativo representante da comunidade, para o cuidado direcionado às famílias envolvidas na VICCA: O conselho local nosso é participativo nesses casos, tudo eles trazem aqui. Então a gente fica por dentro da situação (Gp3).

Os valores cultivados no mundo contemporâneo têm exacerbado o individualismo racionalista, contribuindo para a desintegração do sentimento de pertencimento a uma comunidade e a inibição de potencialidades solidárias88. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p. Os relatos dos profissionais desvelaram a existência de práticas comunitárias, que agem como importantes fatores de proteção às famílias envolvidas na VICCA e têm implicações diretas nos cuidados prestados por eles : Por que vive ali, naquele mundinho de ficar um na casa do outro, de ajudar... Solidariedade... Entre os mais humildes... (Gp 5). Em recente revisão de literatura, referenciando o modelo ecológico para o olhar à violência interpessoal proposto pela Organização Mundial da Saúde11. Word Health Organization. Global status report on violence prevention. Geneva: World Health Organization; 2014. 292 p., experiências em países como Uganda, Índia e Nicarágua denotaram a relevância e a eficiência de estratégias pautadas na comunidade para enfrentamento da violência contra mulheres e adolescentes. Tais estratégias propõem mudanças nas concepções de poder e gênero, para, a partir daí provocar mudanças nas relações individuais e sociais2525. Michau L, Horn J, Bank A, Dutt M, Zimmerman C. Prevention of violence against women and girls: lessons from practice. Lancet. 2015;385:1672-84. doi: 10.1016/S0140-6736(14)61797-9.04/12/2014
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O pensamento complexo busca religar as dimensões indivíduo/espécie/sociedade, que fundamentam a ética da solidariedade. Esta questão é crucial para o debate sobre a promoção da saúde na esfera coletiva, onde se busca melhorar a interação entre os indivíduos da comunidade, proporcionando a emergência de vivências e relações saudáveis33. Apostólico MR, Nóbrega CR, Guedes RN, Fonseca RMGS, Egry EY. Characteristics of violence against children in a Brazilian Capital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(2):266-73. doi: 10.1590/S0104-11692012000200008.
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4. Fry DA, Messinger AM, Rickert VI, O'Connor MK, Palmetto N, Lessel H, et al. Adolescent relationship violence: help-seeking and help-giving behaviors among peers. J Urban Health. 2013;91(2):320-34. doi: 10.1007/s11524-013-9826-7.
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5. Mikton C, MacMillan H, Dua T, Betancourt TS. Integration of prevention of violence against children and early child development. Lancet Glob Health. 2014;2(8):442-3. doi: 10.1016/S2214-109X(14)70233-5.
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6. Foshee VA, Benefield TS, Reyes HL, Ennett ST, Faris R, Chang LY, et al. The peer context and the development of the perpetration of adolescent dating violence. J Youth Adolesc. 2013;42(4):471-86. doi: 10.1007/s10964-013-9915-7.
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7. Karriker-Jaffe KJ, Foshee VA, Ennett ST. Examining how neighborhood disadvantage influences trajectories of adolescent violence: a look at social bonding and psychological distress. J Sch Health. 2011;81(12):764-73. doi: 10.1111/j.1746-1561.2011.00656.x.
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8. Morin E. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 350p
-99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007.. Tais aspectos são reforçados pela literatura, que demonstra a importância do empoderamento comunitário por meio de programas com foco na prevenção de agravos e da maior participação da população, em especial adolescentes, na formulação de políticas públicas específicas55. Mikton C, MacMillan H, Dua T, Betancourt TS. Integration of prevention of violence against children and early child development. Lancet Glob Health. 2014;2(8):442-3. doi: 10.1016/S2214-109X(14)70233-5.
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6. Foshee VA, Benefield TS, Reyes HL, Ennett ST, Faris R, Chang LY, et al. The peer context and the development of the perpetration of adolescent dating violence. J Youth Adolesc. 2013;42(4):471-86. doi: 10.1007/s10964-013-9915-7.
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7. Karriker-Jaffe KJ, Foshee VA, Ennett ST. Examining how neighborhood disadvantage influences trajectories of adolescent violence: a look at social bonding and psychological distress. J Sch Health. 2011;81(12):764-73. doi: 10.1111/j.1746-1561.2011.00656.x.
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Conclusão

De acordo com o desenvolvimento deste estudo, compreendeu-se a necessidade da construção do olhar para o território além de um recorte geográfico específico, para adscrição da clientela aos serviços. Imprimiu-se uma discussão sobre a multiplicidade e pluralidade de territórios que foram colocados para o delineamento do cuidado à VICCA pela APS. Neste âmbito, os ACS foram os elementos essenciais da discussão; embora se configurassem como o ente mais significativo para a APS, a dialógica vivida por esses profissionais ainda precisa ser melhor compreendida. A proximidade e a vinculação significativas com as famílias envolvidas na VICCA tornam possíveis as ações de promoção à saúde e prevenção de agravos, com atuação que favoreça o desenvolvimento da autonomia e o fortalecimento de laços comunitários, levando ao empoderamento individual e coletivo.

A principal limitação do presente estudo esteve relacionada à dificuldade em aprofundar a investigação em um território tão diferenciado e específico como o município estudado. Observou-se a necessidade de complementaridade de informações, como o olhar das famílias frente aos achados. Destarte, recomenda-se a construção de novos estudos que analisem os olhares das crianças, adolescentes, famílias e comunidades sobre/frente a VICCA, buscando contribuições novas, que coloquem os procedimentos atuais sob novo prisma e permitam a multidimensionalidade do fenômeno.

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    Artigo extraído da tese de doutorado "O cuidado a famílias envolvidas na violência doméstica contra crianças e adolescentes: o olhar da Atenção Básica à Saúde", apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil. Apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Brasil, processo nº 2014/23620-7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    04 Dez 2014
  • Aceito
    20 Set 2015
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