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Qualidade de vida de pessoas com doença renal crônica em tratamento hemodialítico

Calidad de vida del paciente renal crónico en tratamiento hemodialítico

Quality of life in chronic kidney failure patients receiving hemodialysis treatment

Resumos

Este estudo descritivo objetiva avaliar a qualidade de vida de pessoas em tratamento de hemodiálise (HD) e identificar as atividades cotidianas que podem comprometer sua qualidade de vida. Foram pesquisadas 125 pessoas com insuficiência renal crônica (IRC) em tratamento de hemodiálise, mediante o Questionário Genérico de Qualidade de Vida SF-36 e as atividades cotidianas por uma entrevista semi-estruturada. Os dados foram submetidos à análise estatística, com nível de significância de 5%. Os resultados evidenciaram prejuízo na qualidade de vida, demonstrando menores escores nos domínios dos aspectos físicos, emocionais e vitalidade. Verificou-se correlação negativa entre tempo de HD e componente físico (r = - 0,75). As atividades corporais e recreativas foram as mais comprometidas tanto na amostra global quanto na estratificada por sexo. Observou-se correlação negativa entre tempo de HD e as atividades cotidianas: trabalho, atividades domésticas e atividades práticas.

qualidade de vida; insuficiência renal crônica; atividades cotidianas; diálise renal


Estudio descriptivo que objetiva analizar las variables de la calidad de vida del enfermo renal crónico en tratamiento hemodialítico (HD) y conocer las actividades cotidianas y las implicaciones en la calidad de vida. Se investigó a 125 enfermos renales crónicos en tratamiento hemodialítico mediante el Cuestionario Genérico de la Calidad de Vida SF-36, y las actividades cotidianas a través de entrevista semiestructurada. Los datos fueron sometidos al análisis estadístico con nivel de significancia de 5%. Los resultados revelaron empeoramiento de la calidad de vida en aspectos físicos, emocionales y vitalidad. Se encontró correlación negativa entre tiempo de HD y las variables da calidad de vida en el componente físico (r = - 0.75). Las actividades corporales y de recreación fueron las más perjudicadas en la muestra global y la muestra estratificada en género. El tiempo de HD también tiene correlación negativa con las actividades cotidianas de trabajo, actividades caseras y prácticas.

calidad de vida; insuficiencia renal crónica; actividades cotidianas; diálisis renal


This descriptive study aims to evaluate the quality of life in patients receiving hemodialysis (HD) treatment and to identify the daily activities that may impair their quality of life. We investigated 125 chronic kidney failure patients under hemodialysis treatment by means of the Medical Outcome Survey-Short-Form 36 (SF-36), and their daily activities, by means of semi-structured interviews. For statistical data analysis, a significance level of 5% was used. The results evidenced that these individuals' quality of life is impaired, with lower scores for physical, emotion and vitality aspects. There was a negative correlation between time spent on HD and the physical component (r= - 0.75) and between hemodialysis time and daily activities such as work, housework and practical activities. Physical and leisure activities were the most affected in the general sample as well as in the one stratified by gender.

quality of life; kidney failure, chronic; activities of daily living; renal dialysis


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade de vida de pessoas com doença renal crônica em tratamento hemodialítico

Quality of life in chronic kidney failure patients receiving hemodialysis treatment

Calidad de vida del paciente renal crónico en tratamiento hemodialítico

Marielza R. Ismael MartinsI; Claudia Bernardi CesarinoII

ITerapeuta Ocupacional, Mestre em Ciências da Saúde, e-mail: marielzamartins@bol.com.br

IIEnfermeira, Doutor em Ciências da Saúde, Professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, e-mail: claudiacesarino@famerp.br

RESUMO

Este estudo descritivo objetiva avaliar a qualidade de vida de pessoas em tratamento de hemodiálise (HD) e identificar as atividades cotidianas que podem comprometer sua qualidade de vida. Foram pesquisadas 125 pessoas com insuficiência renal crônica (IRC) em tratamento de hemodiálise, mediante o Questionário Genérico de Qualidade de Vida SF-36 e as atividades cotidianas por uma entrevista semi-estruturada. Os dados foram submetidos à análise estatística, com nível de significância de 5%. Os resultados evidenciaram prejuízo na qualidade de vida, demonstrando menores escores nos domínios dos aspectos físicos, emocionais e vitalidade. Verificou-se correlação negativa entre tempo de HD e componente físico (r = - 0,75). As atividades corporais e recreativas foram as mais comprometidas tanto na amostra global quanto na estratificada por sexo. Observou-se correlação negativa entre tempo de HD e as atividades cotidianas: trabalho, atividades domésticas e atividades práticas.

Descritores: qualidade de vida; insuficiência renal crônica; atividades cotidianas; diálise renal

ABSTRACT

This descriptive study aims to evaluate the quality of life in patients receiving hemodialysis (HD) treatment and to identify the daily activities that may impair their quality of life. We investigated 125 chronic kidney failure patients under hemodialysis treatment by means of the Medical Outcome Survey-Short-Form 36 (SF-36), and their daily activities, by means of semi-structured interviews. For statistical data analysis, a significance level of 5% was used. The results evidenced that these individuals' quality of life is impaired, with lower scores for physical, emotion and vitality aspects. There was a negative correlation between time spent on HD and the physical component (r= - 0.75) and between hemodialysis time and daily activities such as work, housework and practical activities. Physical and leisure activities were the most affected in the general sample as well as in the one stratified by gender.

Descriptors: quality of life; kidney failure, chronic; activities of daily living; renal dialysis

RESUMEN

Estudio descriptivo que objetiva analizar las variables de la calidad de vida del enfermo renal crónico en tratamiento hemodialítico (HD) y conocer las actividades cotidianas y las implicaciones en la calidad de vida. Se investigó a 125 enfermos renales crónicos en tratamiento hemodialítico mediante el Cuestionario Genérico de la Calidad de Vida SF-36, y las actividades cotidianas a través de entrevista semiestructurada. Los datos fueron sometidos al análisis estadístico con nivel de significancia de 5%. Los resultados revelaron empeoramiento de la calidad de vida en aspectos físicos, emocionales y vitalidad. Se encontró correlación negativa entre tiempo de HD y las variables da calidad de vida en el componente físico (r = - 0.75). Las actividades corporales y de recreación fueron las más perjudicadas en la muestra global y la muestra estratificada en género. El tiempo de HD también tiene correlación negativa con las actividades cotidianas de trabajo, actividades caseras y prácticas.

Descriptores: calidad de vida; insuficiencia renal crónica; actividades cotidianas; diálisis renal

INTRODUÇÃO

A extensão e a complexidade dos problemas inerentes à vivência da cronicidade de uma doença estimulam a análise da qualidade de vida dos doentes(1).

As doenças crônicas têm recebido maior atenção dos profissionais de saúde nas últimas décadas. Isso se deve ao importante papel desempenhado na morbimortalidade da população mundial, não sendo apenas privilégio da população mais idosa, já que também as doenças crônicas atingem os jovens em idade produtiva(2). Entre essas doenças está a insuficiência renal crônica (IRC), considerada uma condição sem alternativas de melhoras rápidas, de evolução progressiva, causando problemas médicos, sociais e econômicos(3).

A doença renal é considerada um grande problema de saúde pública, porque causa elevadas taxas de morbidade e mortalidade e, além disso, tem impacto negativo sobre a qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS). A QVRS é a percepção da pessoa de sua saúde por meio de uma avaliação subjetiva de seus sintomas, satisfação e adesão ao tratamento(4-5).

Os tratamentos disponíveis nas doenças renais terminais são: a diálise peritoneal ambulatorial contínua (DPAC), diálise peritoneal automatizada (DPA), diálise peritoneal intermitente (DPI), hemodiálise (HD) e o transplante renal (TX). Esses tratamentos substituem parcialmente a função renal, aliviam os sintomas da doença e preservam a vida do paciente, porém, nenhum deles é curativo(6). Atualmente, no Brasil, existem 54.523 pacientes em terapia renal substitutiva, conforme o Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia de 2002, sendo 48.874 pacientes em hemodiálise, 3.728 em DPAC, 1.570 em DPA e 351 pacientes em DPI(7).

Os avanços tecnológicos e terapêuticos na área de diálise contribuíram para o aumento da sobrevida dos renais crônicos, sem, no entanto, possibilitar-lhes o retorno à vida em relação aos aspectos qualitativos(3-4).

Esses pacientes, que dependem de tecnologia avançada para sobreviver, apresentam limitações no seu cotidiano e vivenciam inúmeras perdas e mudanças biopsicossociais que interferem na sua qualidade de vida tais como: a perda do emprego, alterações na imagem corporal, restrições dietéticas e hídricas(8- 9).

Dessa forma a qualidade de vida (QV) tem se tornado importante critério na avaliação da efetividade de tratamentos e intervenções na área da saúde. Esses parâmetros têm sido utilizados para analisar o impacto das doenças crônicas no cotidiano das pessoas e para isso, é necessário avaliar indicadores de funcionamento físico, aspectos sociais, estado emocional e mental, da repercussão de sintomas e da percepção individual de bem-estar(10-11). A relevância dos indicadores de QV é fundamental não só por ser um aspecto básico de saúde, como também porque permite mostrar a relação existente entre a QV, a morbidade e a mortalidade(12).

Muito recentemente é que as atenções começaram a se voltar para uma terapêutica, visando a qualidade de vida do paciente renal crônico como um fator relevante no cenário da terapêutica renal(7).

Essa busca origina-se a partir da constatação de que alcançar um estado de bem-estar físico e mental é possível, resultando na recuperação da autonomia, das atividades de trabalho e lazer, da preservação da esperança e do senso de utilidade destes indivíduos(9).

O tratamento hemodialítico é responsável por um cotidiano monótono e restrito, e as atividades desses individuos são limitadas após o início do tratamento, favorecendo o sedentarismo e a deficiência funcional, fatores que refletem na QV(9).

O doente renal crônico sofre alterações da vida diária em virtude da necessidade de realizar o tratamento, necessitando do suporte formal de atenção à saúde, isto é, vive dependente da equipe de saúde, da máquina e do suporte informal para ter o cuidado necessário(13-14).

Em estudos de QV devem ser consideradas as realidades social e familiar, inclusive as atividades cotidianas. Abordando essa problemática, este estudo buscou avaliar a qualidade de vida de pessoas com IRC e identificar as atividades cotidianas comprometidas, relacionando-as com o tempo do tratamento hemodialítico e com o sexo, obtendo-se, assim, a compreensão da realidade dessas pessoas, para possibilitar subsídios na implementação de novas estratégias eficientes no ensino, na prática e pesquisas relacionadas à pessoa com doença renal crônica em tratamento hemodialítico, visando a melhoria das suas condições de vida.

Considerando a contribuição que estudos sobre QV, atividades cotidianas das pessoas com IRC e, por não ter sido encontrado pesquisas na literatura nacional e internacional sobre essas temáticas correlacionadas com o tempo de tratamento, buscou-se elaborar este trabalho, pois ainda são abordadas de forma incipiente na enfermagem em nefrologia, a hemodiálise apresenta progressiva desumanização devido à evolução tecnológica.

OBJETIVOS

Os objetivos deste estudo foram: a) avaliar a qualidade de vida de pessoas com IRC em tratamento hemodialítico; b) identificar as atividades cotidianas comprometidas após o início do tratamento hemodialítico; c) estudar a relação das variáveis de qualidade de vida e das atividades cotidianas quanto ao tempo de HD e ao sexo.

CASUÍSTICA E MÉTODO

Este é um estudo descritivo, do tipo transversal e com abordagem quantitativa.

A amostra constituiu-se de 125 pessoas (74 homens e 51 mulheres) com insuficiência renal crônica, em tratamento na Unidade de Hemodiálise do Hospital de Base de São José do Rio Preto, SP. Os critérios de inclusão da amostra foram: pessoas com IRC em tratamento hemodialítico com idade acima de 18 anos, sem déficit cognitivo e que assinaram o termo de consentimento informado para participar do estudo. Foram excluídas do estudo pessoas que durante a coleta foram transferidas para outra modalidade de tratamento (CAPD ou TX).

Após o encaminhamento, apreciação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, iniciou-se a coleta de dados.

Como instrumento utilizou-se o Questionário Genérico de Qualidade de Vida SF-36, traduzido e validado no Brasil(11). Esse questionário é largamente utilizado em todo o mundo demonstrando propriedades de reprodutibilidade, validade e suscetibilidade às alterações.

O SF-36 é um instrumento multidimensional, composto por 36 itens, que avaliam dois componentes: o componente saúde física (CSF) e a saúde mental (CSM). O CSF apresenta as seguintes dimensões: capacidade funcional (desempenho das atividades diárias, como capacidade de se cuidar, vestir-se, tomar banho e subir escadas); aspectos físicos (impacto da saúde física no desempenho das atividades diárias e/ou profissionais); dor (nível de dor e o impacto no desempenho das atividades diárias e/ou profissionais); estado geral de saúde (percepção subjetiva do estado geral de saúde). O CSM consta das dimensões: vitalidade (percepção subjetiva do estado de saúde); aspectos sociais (reflexo da condição de saúde física nas atividades sociais); aspectos emocionais (reflexo das condições emocionais no desempenho das atividades diárias e/ou profissionais) e saúde mental (escala de humor e bem-estar). Os resultados de cada componente variam de 0 a 100 (do pior para o melhor status de saúde), com média de 50 e desvio padrão 10(11).

Foi também utilizada entrevista semi-estruturada, a qual foi elaborada a partir da experiência prática das autoras, com a finalidade de caracterizar os sujeitos quanto à idade, estado civil, escolaridade, ocupação e tempo de tratamento de hemodiálise e identificar as atividades cotidianas comprometidas dessas pessoas, após o início do tratamento hemodialítico, pois o SF-36 não permite especificar essas atividades. As atividades cotidianas, ou da rotina diária, são atividades que instrumentalizam as pessoas, através de conhecimentos práticos e técnicas específicas, na realização eficiente de tarefas diárias e compreendem o desenvolvimento de habilidades físicas, mentais e sociais(9). Neste estudo as atividades cotidianas foram categorizadas em: atividades corporais, atividades recreativas, o trabalho, as atividades domésticas, as atividades práticas, o humor e o sono. A QV e as atividades cotidianas foram analisadas e relacionadas com o tempo de HD e com o sexo, com o objetivo de compreender a realidade dessas pessoas para intervir adequadamente.

Quanto ao procedimento, os pacientes foram abordados durante as sessões de hemodiálise, nas quais a pesquisadora esclarecia sobre a pesquisa, realizava a entrevista e verificava se o paciente tinha condições de auto-administrar o instrumento SF-36. Nos pacientes que tinham condições de auto-administrar (N = 100) foi dado o prazo de uma semana para entrega do instrumento, e quando não tinham condições (N = 25), a pesquisadora, mediante contato prévio com o paciente, aplicou o questionário. A coleta de dados ocorreu no segundo bimestre de 2003.

Os dados foram agrupados, ordenados, transferidos para um banco de dados (Excel) e, então, processados. Foi utilizada a análise estatística descritiva para a caracterização dos sujeitos; as médias foram comparadas pelo teste t de Student para análise das variáveis relacionadas ao questionário SF-36 (média e desvio padrão), o teste c2 (qui-quadrado) para atividades comprometidas (número de ocorrências); o coeficiente de correlação de Pearson para correlacionar os componentes físico e mental do questionário SF-36 com o tempo de hemodiálise, e o teste de comparação de proporções para quantificar as atividades comprometidas. Os testes foram efetuados no nível de 5% de significância. Os dados obtidos são apresentados em tabelas cruzadas e gráficos de dispersão.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na amostra estudada a média de idade foi de 53,1 anos, com desvio padrão de 14,6 anos, predominando a faixa etária de 36 a 55 anos, variando entre 18 e 81 anos.

Com relação ao tempo médio de HD verificou-se 28,5 meses, a mediana de 23 meses e o desvio padrão de 24 meses, para pacientes submetidos à hemodiálise por um tempo que variou de 1 a 108 meses. Em relação ao estado civil, a maioria era casada (53,6%), predominando o ensino fundamental (64,8%), com média de cinco anos de estudo quanto à escolaridade. A mudança de hábitos depois de iniciado o tratamento foi referida por 95,2% dos pacientes e 52,8% estavam inativos (aposentadoria ou licença-saúde).

Quanto à análise das variáveis relacionadas ao questionário SF-36, as médias para cada domínio são apresentadas na Tabela 1.

Os valores de média e desvio padrão para o componente saúde física (CSF) foram 52,2 ± 5,8, respectivamente, mostrando valores abaixo de 50 para o domínio dos aspectos físicos mais afetados, com média de 32,3 ± 11,3. Esse resultado evidencia problemas com as atividades diárias e o trabalho resultante da saúde física, indicando prejuízo na QV e são concordantes com os estudos(14-15) os quais revelam valores similares nessa população.

O componente saúde mental (CSM) que engloba a vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental teve a média de 53,7 ± 5,6 e mostrou duas dimensões mais comprometidas: aspectos emocionais com média de 46,1 ± 16,3 e vitalidade com média de 48,7 ± 7,3.

Outros pesquisadores(13-17) ao estudarem nessa população, as suas limitações referentes aos aspectos emocionais, os quais no SF-36 referem-se a problemas com o trabalho ou outras atividades diárias como resultantes de problemas emocionais, também verificaram baixos escores, refletindo, assim, comprometimento desse domínio, de forma generalizada nessa clientela. Nesses estudos, os aspectos emocionais correlacionaram-se positivamente com anos de estudo, sugerindo que os pacientes com maior escolaridade podem possuir recursos intelectuais capazes de gerar melhor adaptação emocional às conseqüências da doença renal crônica e do tratamento.

Na dimensão da vitalidade, esses resultados refletem o sentimento de cansaço e esgotamento, concordando com pesquisas sobre fadiga em pacientes renais crônicos em hemodiálise. A fadiga está significativamente associada à presença de sintomas como problemas do sono, limitação por aspectos físicos e depressão(15).

Quanto aos dados obtidos para as variáveis relacionadas ao questionário SF-36 de QV em relação ao sexo os mesmos podem ser observados na Tabela 2.

Os resultados mostram que não houve diferença estatisticamente significante em relação aos componentes do questionário SF-36 de QV entre os sexos, tanto o componente físico (p= 0,1307) como o mental (p=0,2007). Os resultados por componente foram: para homens média do CSF de 52,8 ± 6,2 e do CSM de 51,4 ± 6,1 e, para as mulheres, a média do CSF foi de 54,4 ± 5,1 e do CSM 52,8 ± 5,8.

Na pesquisa desta amostra foram observadas diferenças de respostas quando comparadas ao tempo de hemodiálise a que estavam submetidos. Essas diferentes respostas suscitaram indagações sobre os componentes da QV, que podiam se modificar em relação ao tempo de tratamento. O cálculo do coeficiente de correlação de Pearson resultou em -0,75 (p<0,001) para o componente físico (CSF) e - 0,29 (p=0,001) para o componente mental (CSM).

Na Figura 1 o componente físico mostra alta correlação negativa com o tempo de HD, indicando que, quanto maior o tempo de HD, mais baixos são os valores desse componente. Esses fatores influenciam não apenas a demanda ocupacional como a comorbidade, sendo fatores chaves de prejuízos sociais(13).


Com relação ao componente mental, apesar da correlação ser estatisticamente diferente de zero, não se pode julgar que a correlação encontrada (r = - 0,29) seja relevante em termos práticos para estabelecer uma associação que permita concluir que o componente mental sofra as reduções com o aumento do tempo de HD, conforme se nota na Figura 2.


Pesquisas sobre o tempo de hemodiálise, influenciando a QV desses pacientes, são escassas, mas, de acordo com alguns estudos, destaca-se que, quanto mais tempo de HD, mais resignação à doença é percebida(12-15).

Considerando-se esses resultados e o fato da HD ser o método terapêutico mais utilizado desde as últimas décadas(6-7), torna-se necessário aprofundar estudos sobre alterações na QV em relação ao tempo de hemodiálise.

Com relação à identificação das atividades comprometidas com a IRC, essas foram analisadas, observando-se o percentual de ocorrência de cada atividade. Os resultados foram dispostos, obedecendo às grandezas dos percentuais encontrados em que as atividades corporais (AC) obtiveram o maior número de ocorrências (120-96%), seguidas pelas atividades recreativas (116-92,8%) e trabalho (68-54,4%).

A seguir, na Tabela 3, é mostrada a distribuição dos percentuais de ocorrência de cada atividade comprometida para homens e mulheres, observando que a ordem de ocorrências se modifica quanto ao sexo.

Outro ponto importante, que merece ser destacado sobre os cálculos apresentados na Tabela 3, é que a ordem de ocorrência das atividades comprometidas não se manteve para homens e mulheres, por isso foi realizado o teste estatístico apenas nessas atividades. Enquanto 74,5% das mulheres pareciam se sentir mais afetadas pela IRC no desenvolvimento das atividades domésticas, apenas 31,1% dos homens acusaram tal comprometimento. Sobre esse aspecto, os dados dão evidências de diferença estatisticamente significante (p<0,0001).

Outra atividade que também se destaca é o sono, mais afetado nos homens do que nas mulheres (27% contra 11,8%), mostrando diferença significante (p=0,039). Pesquisas(4,8) que relacionam distúrbios do sono à QV relatam baixos escores de QV e estão associados ao sexo masculino, doença coronariana e alto nível de fosfato-sérico. Para as demais atividades a diferença não foi estatisticamente significante (p>0,05).

Algumas atividades comprometidas mostraram-se relacionadas ao tempo de hemodiálise, como: trabalho, atividades domésticas e cuidado pessoal. A Tabela 4 traz uma síntese dos resultados obtidos sobre a associação de cada uma das atividades com o tempo de hemodiálise. Nota-se que a variável tempo de hemodiálise foi transformada numa variável categorizada em que as categorias são: (1) tempo de até 12 meses; (2) tempo entre 13 e 60 meses; e (3) tempo acima de 60 meses.

Em relação ao tempo de HD e as atividades comprometidas, constatou-se diferença estatisticamente significante no trabalho (p=0,0014), nas atividades domésticas (p=0,0014) e nas atividades práticas (p=0,0459). É relevante considerar as alterações físicas, psicossociais e ocupacionais para que haja melhor condução e adequação do tratamento hemodialítico e ajudem a entender os padrões de participação desses indivíduos(13, 18).

Assim, este estudo oferece subsídios para implementação de novas estratégias para melhoria na qualidade de vida e que esforços devem ser realizados no sentido de otimizar o tratamento hemodialítico tais como: hemodiálise diária, diálise no período noturno, visitas domiciliares, adequação do tratamento entre outros, visando apoiar essas pessoas no enfrentamento da doença renal crônica e seu tratamento, além de servir de motivação para novas pesquisas.

CONCLUSÕES

Neste estudo constatou-se prejuízo da QV das pessoas com doença renal crônica, que apresentaram menores escores nos domínios dos aspectos físicos, emocionais e vitalidade.

Quanto às atividades cotidianas comprometidas, identificou-se que as atividades corporais e recreativas mostraram maiores percentuais de ocorrência.

As variáveis de QV em relação ao sexo não apresentaram diferenças estatisticamente significantes e quando essas variáveis foram relacionadas ao tempo de HD, mostraram diferenças estatisticamente significantes no componente físico.

Em relação às atividades cotidianas e o tempo de HD, verificou-se diferença estatisticamente significante no trabalho, nas atividades domésticas e nas atividades práticas e, em relação ao sexo, houve diferenças estatisticamente significantes nas atividades domésticas.

Este estudo oferece subsídios para que o enfermeiro e sua equipe de saúde percebam a necessidade de avaliar a qualidade de vida das pessoas com doença renal crônica e as atividades cotidianas, que são comprometidas com o tempo, para promover transformações condizentes com a realidade e prevenir o comprometimento dessas atividades cotidianas.

7. Sociedade Brasileira de Nefrologia. Censo - dezembro/ 2001

: centro de diálise no Brasil. [acesso em: 17 dez. .2003]. Disponível em: URL:http://www.sbn.org.Br/Censo/censo01.htm

Recebido em: 19.11.2003

Aprovado em: 2.9.2005

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Out 2005

Histórico

  • Aceito
    02 Set 2005
  • Recebido
    19 Nov 2003
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