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Método mãe canguru: vivências maternas e contribuições para a enfermagem

Resumos

O objetivo deste estudo foi descrever vivências das mães, analisando-as à luz dos princípios do Método da Mãe Canguru (MMC) e discutir as contribuições das mães a partir dos significados dessas vivências para as ações de enfermagem. Na coleta dos dados, empregou-se questionário que caracterizou o perfil socioeconômico das mães e, por meio da técnica grupo focal, obtiveram-se relatos dos benefícios dessas vivências que subsidiaram a construção das categorias: sobrevivência e recuperação do bebê, o dia a dia das mães modificado pelo MMC e valorização dos laços afetivos familiares no MMC. Constatou-se que as vivências estão relacionadas ao aumento do vínculo entre a mãe e o bebê, à diminuição do tempo de separação do recém-nascido da família, além de proporciona maior competência e confiança aos pais nos cuidados com seu filho, mesmo antes da alta hospitalar, melhorando o relacionamento da mãe com a família, entre eles e com a equipe que cuida do bebê.

Método Mãe Canguru; Vivências Maternas; Cuidados de Enfermagem; Enfermagem


This research aimed to describe mothers' experiences, analyzing them in the light of the principles of the Kangaroo Mother Method (KMM), and discuss the mothers' contributions based on the meanings of these experiences for nursing actions. In data collection, a questionnaire was used that characterized the mothers' socioeconomic profile and, through focus groups, stories were obtained about the benefits of these experiences, which supported the construction of the following categories: survival and recovery of the baby; the mothers' daily life modified by the KMM and valuation of affective family bonds in the KMM. The experiences are related to increased bonding between mother and baby, reduction of the infant's time of separation from the family, besides leading to increased competition and confidence in the parents to take care of their child, even before discharge, improving the mother's relation with the family, inside the family and with the team that takes care of the baby.

Kangaroo Mother Care; Maternal Experiences; Nursing Care; Nursing


El objetivo de este estudio fue describir vivencias de las madres, analizándolas bajo los principios del Método de la Madre Canguro (MMC) y discutir las contribuciones de las madres a partir de los significados de esas vivencias para las acciones de enfermería. En la recolección de los datos, se empleó un cuestionario que caracterizó el perfil socioeconómico de las madres y, por medio de la técnica grupo focal, se obtuvieron relatos de los beneficios de esas vivencias que subsidiaron la construcción de las categorías: sobrevivencia y recuperación del bebé; el día a día de las madres modificado por el MMC; y, valorización de los lazos afectivos familiares en el MMC. Se constató que las vivencias están relacionadas al aumento del vínculo entre la madre y el bebé, a la disminución del tiempo de separación del recién nacido de la familia, además de proporcionar mayor competencia y confianza a los padres en los cuidados con su hijo, inclusive antes del alta hospitalaria, mejorando las relaciones de la madre con la familia, entre ellos y con el equipo que cuida del bebé.

Cuidado Madre Canguru; Vivencias Maternas; Atención de Enfermería; Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Método mãe canguru: vivências maternas e contribuições para a enfermagem

João Carlos ArivabeneI; Maria Antonieta Rubio TyrrellII

IMestre em Enfermagem, e-mail: jcarivabene@yahoo.com.br

IIDoutor em Enfermagem, Professor Titular, Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil, e-mail: direcao@eean.ufrj.br

Endereço para correspondência

RESUMO

O objetivo deste estudo foi descrever vivências das mães, analisando-as à luz dos princípios do Método da Mãe Canguru (MMC) e discutir as contribuições das mães a partir dos significados dessas vivências para as ações de enfermagem. Na coleta dos dados, empregou-se questionário que caracterizou o perfil socioeconômico das mães e, por meio da técnica grupo focal, obtiveram-se relatos dos benefícios dessas vivências que subsidiaram a construção das categorias: sobrevivência e recuperação do bebê, o dia a dia das mães modificado pelo MMC e valorização dos laços afetivos familiares no MMC. Constatou-se que as vivências estão relacionadas ao aumento do vínculo entre a mãe e o bebê, à diminuição do tempo de separação do recém-nascido da família, além de proporciona maior competência e confiança aos pais nos cuidados com seu filho, mesmo antes da alta hospitalar, melhorando o relacionamento da mãe com a família, entre eles e com a equipe que cuida do bebê.

Descritores: Método Mãe Canguru; Vivências Maternas; Cuidados de Enfermagem; Enfermagem.

Considerações iniciais

Em todo mundo, nascem anualmente 20 milhões de crianças prematuras e/ou com baixo peso (inferior a 2.500g ao nascimento, sem considerar a idade gestacional). Dessas, um terço morre antes de completar um ano de vida(1). A condição de prematuridade (recém-nascido que não completou 37 semanas de gestação, a despeito do peso de nascimento; classificada em: prematuridade limítrofe – 35 a 37 semanas incompletas; prematuridade moderada – gestação de 31 a 34 semanas; prematuridade extrema – gravidez inferior a 30 semanas)(2), no recém-nascido (RN) constitui-se em grande problema de saúde infantil.

Amparado no processo epidemiológico da prematuridade, principalmente nas questões neonatais, desde 1979, no Instituto Materno-Infantil de Bogotá (Colômbia), os médicos Edgar Rey Sanabria e Héctor Martinez Gómez preocuparam-se com a normatização do Método Mãe Canguru (MMC) que, naquele momento, tinha como objetivo reduzir a mortalidade neonatal.

No decorrer dessas três décadas, o MMC vem sendo utilizado em vários países, principalmente naqueles que dispõem de número insuficiente de incubadoras e de recursos humanos para zelar pela alta qualidade de cuidados aos recém-nascidos de baixo peso (RNBP). Nesses países, o propósito básico foi o de dar alta precoce aos RNBPs frente à situação crítica vivenciada(3).

No Brasil, os primeiros serviços que desenvolveram o MMC foram os do Hospital Guilherme Álvaro em Santos, SP (1992) e do Instituto Materno-Infantil em Recife, PE (1993). A partir dessas exitosas experiências, houve considerável expansão do método no país, em decorrência das vantagens, tanto para mãe quanto para o bebê, embora, nas políticas brasileiras, a ênfase esteja vinculada mais para os benefícios relacionados ao bebê: diminui o tempo de separação do recém-nascido da família, evitando longos períodos sem estimulação sensorial, proporciona maior competência e confiança aos pais no manuseio de seu filho, mesmo antes da alta hospitalar, facilita o controle térmico da criança, diminui as doenças e infecções hospitalares, propiciando período de permanência menor do bebê no hospital, entre outros, conforme definido na Norma de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso – Método Canguru – Portaria n.º 693, de 5 de julho de 2000(4).

Partindo do entendimento que o nascimento de uma criança, sobretudo prematura (idade gestacional inferior a 38 semanas) e muitas vezes dependentes de cuidados profissionais e/ou cuidados maternos, transforma a organização familiar, necessitando adaptações em suas vidas cotidianas, envolvendo as relações internas e externas desses entes familiares, considera-se, aqui, que a enfermagem tem papel fundamental no MMC, onde deve existir esclarecimentos e mudanças das concepções e práticas de cuidados ao RNBP, proporcionando, assim, conhecimentos, dentre outros, sobre direitos e deveres paternos e maternos e por que não fraternos e solidários.

Nesse contexto, a mãe, o pai, o bebê e os familiares estão vivendo momentos de crise em suas vidas, inseridos num meio social, econômico, espiritual e cultural. Dessa forma, as mães e seus familiares devem ser ouvidos em suas dúvidas e dificuldades, anseios e preocupações, sendo isso possível somente a partir do reconhecimento da realidade familiar, atingindo, assim, o entendimento do processo saúde-doença-saúde e sua (re)integração familiar, atendendo as necessidades biopsiquicossociais dos envolvidos.

Como é previsto no MMC, “só serão considerados como ‘Método Canguru’ os sistemas que permitam o contato precoce entre o bebê e sua mãe/familiares, realizado de maneira orientada e supervisionada, por livre escolha da família, de forma crescente e segura”(3). Esses entes envolvidos deverão ser acompanhados por uma equipe de saúde adequadamente treinada, dando a eles suporte assistencial e educacional digno e propiciando que exerçam o direito de cidadão, permitindo, assim, atender os princípios do MMC que se baseiam na alta precoce, independente do peso, desde que o bebê apresente condições clínicas estáveis; incentivo ao contato precoce entre a mãe e bebê, sendo o mesmo colocado entre as mamas; manutenção do bebê na posição vertical.

Apesar de a assistência ao MMC ter nascido e, ainda, desenvolvida com base nas necessidades do bebê, a norma brasileira contempla a atenção humanizada aos integrantes do método, isto é, a mãe, filho, família e profissionais envolvidos(4).

Nesse processo de assistir a mãe e a família, no entanto, os cuidados médicos, de enfermagem e de outros terapeutas quase sempre são muito valorizados, tendendo a ser considerados poderosos, assim, a estrutura institucional torna-se autoritária, na qual a equipe de saúde exerce poder dominante sobre a realidade cultural da mulher/mãe e da família, com sérios prejuízos à qualidade da assistência. Assim, esses profissionais desenvolvem ações educativas e assistenciais que substituem as crenças e práticas populares, pois essas são tidas como não científicas e podem causar prejuízo aos cuidados requeridos pela criança(5).

Com base no exposto, selecionou-se, como objeto de estudo, as vivências das mães no MMC implantado em um hospital público da Grande Vitória, no Estado do Espírito Santo. Para tanto, foram traçados como objetivos: descrever as vivências das mães no MMC, analisar as vivências das mães à luz dos princípios do MMC, discutir as contribuições das mães, a partir dos significados de suas vivências no MMC, para as ações de enfermagem.

Percurso teórico-metodológico

A pesquisa é de natureza qualitativa, pois essa abordagem possibilita a incorporação dos significados, dos motivos, das inspirações, crenças, dos valores e atitudes, compreendida, aqui, como fenômeno humano que faz parte da realidade social dos envolvidos(6). E, ainda, que essa abordagem parte do pressuposto de que há relação dinâmica e construída entre o mundo real e o sujeito nele inserido, dando ao mundo objetivo uma visão subjetiva do sujeito.

Adequando o método à pesquisa e ao cenário, foi utilizado o estudo de caso de natureza reveladora, pois essa é utilizada quando o pesquisador tem a oportunidade de observar e analisar um fenômeno, previamente inacessível à investigação científica, isto é, pretende desvendar alguns fenômenos predominantes previamente inacessíveis aos cientistas, até então. Esse método possibilita ver como é o dia a dia desses atores sociais. Ainda mais, o estudo de caso como método permite conhecimento amplo e detalhado do objeto, além de possuir grande flexibilidade, e se refere à capacidade de lidar com ampla variedade de evidências presenciadas no desenvolvimento da pesquisa(7).

Os atores da pesquisa foram 13 mães de bebês prematuros de baixo peso, assistidos nas três etapas (primeira etapa: Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTIN) e Unidade Intermediária; segunda etapa: Alojamento Conjunto Canguru; terceira etapa: Follow-Up – Canguru Domiciliar) do MMC, no período de 2000 a 2005, considerando-se que, nesse recorte temporal, o método se desenvolveu de forma plena e completa no cenário escolhido, tanto na organização estrutural como em recursos humanos.

A operacionalização da coleta dos dados, que se deu de novembro de 2006 a março de 2007, os atores tiveram livre-arbítrio para participar. Foram esclarecidos quanto ao projeto e cuidados éticos do processo investigatório, para tanto, houve aproximação prévia com esses atores. A coleta de dados abrangeu duas fases, na primeira, aplicou-se questionário, o que foi feito através de entrevistas individuais constando de perguntas com dados sociodemográficos e com o objetivo de caracterizar os atores da pesquisa e também o cenário.

Após esse momento individual, consecutivamente, as mães foram reunidas para as entrevistas coletivas (segunda fase), onde foi aplicada a estratégia do grupo focal, que é “uma forma de coletar dados diretamente das falas de um grupo, que relata suas experiências e percepções em torno de um tema de interesse coletivo”(8). Ainda, é adequada às relações familiares, de equipes de trabalho e de redes interpessoais, e possibilita o favorecimento da elaboração dialética do pensamento grupal(9).

No desenvolvimento do grupo focal, reuniu-se cada grupo pesquisado numa sessão, que teve em média uma hora e meia de duração, ocorrendo em local neutro – auditório do hospital pesquisado, ambiente fora do convívio dos participantes e de fácil acesso, livre de ruídos, o que possibilitou o registro das falas sem interferências. Inicialmente, pretendía–se formar esses grupos com seis a oito entrevistados, para atender as necessidades de obtenção de dados de interesse coletivo que contribuem para a construção das categorias empíricas e analíticas.

Mediante as dificuldades climáticas (chuva em excesso) e indisponibilidade de tempo de alguns entrevistados, esses se resumiram a dois grupos compostos de quatro entrevistadas e um grupo com cinco participantes, totalizando as 13 mães de bebês atendidos pelo MMC que participaram deste estudo.

A pesquisa está de acordo com a Resolução n.º 196/96 da Comissão Nacional Comitê de Ética em Pesquisa (CONEP) com seres humanos(10). Contou com a aprovação do CEP/EEAN/HESFA/UFRJ e da instituição cenário da pesquisa. As mãe, ao concordarem em participar do estudo, assinaram termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

A pesquisa foi realizada em um hospital público estadual, localizado no município de Serra, pertencente à Grande Vitória, no Estado do Espírito Santo. Essa instituição é integrante do Sistema Único de Saúde (SUS). É também hospital de referência, por sua habilitação, em nível terciário, para o atendimento à gestante, à parturiente, à puérpera e ao recém-nascido de alto risco.

A partir dos resultados preliminares, foram construídas as seguintes categorias temáticas: a) benefícios das vivências no MMC: sobrevivência e recuperação do bebê; b) o dia a dia das mães, modificado pelo MMC; c) valorização da afetividade entre familiares; d) dificuldades vivenciadas no MMC; e) benefícios das vivências relacionadas à equipe de enfermagem e f) comentários e sugestões das mães. Neste artigo, serão tratadas as três primeiras categorias expostas.

Análise e discussão dos resultados

Perfil sociodemográfico das mães

Verificou-se as seguintes características: a faixa etária variou entre 18 e 40 anos, sendo que prevaleceu, entre as mães, a faixa etária de 33 anos ou mais. Quanto ao estado civil, dez das entrevistadas eram casadas 76,9%, sendo que a maioria (69,2%) ocupava-se dos afazeres domésticos, dispondo, também, na sua maioria (69,2%, de renda familiar insuficiente (1 a 3 salários mínimos), dificultando a progressão do desenvolvimento social, econômico, cultural, familiar e, também, a aquisição terapêutica do seu bebê (consultas, terapias, medicamentos, outros), quando esses não são proporcionados pelo SUS. Quanto à escolaridade, 92,3% apresentavam 1º ou 2º grau completo. Observa-se que o processo educacional ainda apresenta níveis insatisfatórios nessa população. A maioria delas declarou-se evangélica (61,5%) e, nessa perspectiva, entende-se, aqui, que os indivíduos em situação de risco valorizam as crenças e seus valores religiosos.

Categorias temáticas

Benefícios das vivências no método mãe cangurú: sobrevivência e recuperação do bebê

As mães destacaram, explicitaram e afirmaram que a adesão ao método se deu pela sobrevivência e recuperação do bebê. Essas mães têm como primeira preocupação a sobrevivência de seu filho prematuro. Ressalta-se que a adesão materna ao MMC vem acompanhada de medo, ansiedade e sentimento de culpa, sentimentos esses que podem dificultar o processo do método, assim como as relações sociais dessa mãe com outros envolvidos no MMC(11). Tal situação é confirmada nas afirmações coletivas que se seguem.

[...] o bebê se desenvolve melhor e recupera peso mais rápido.

[...] Ele tem a necessidade de amor, afeto, contato comigo.

Segundo as mães, a adesão ao método foi sugestão dos profissionais da equipe de saúde (assistente social, enfermeira, médico) e para uma das mães a sugestão partiu do esposo. Nesse processo, observa-se que não existe uma fala única sobre a participação da equipe de saúde – isto é, as falas das mães referenciam os profissionais de forma isolada, e não pertencente a uma equipe interdisciplinar. Ressalta-se que nem todas as mães participaram do MMC de forma consensual, embora tenham aderido por causa dos benefícios ao bebê, ainda, cinco mães afirmaram ter muitas dificuldades, mas aderiram ao método também pelo beneficio de sobrevivência do RN. Outra situação que deve ser considerada é a abordagem do profissional/equipe sobre a adesão ao método, justificando a necessidade da adesão pelas vantagens para o bebê, como identificadas a seguir.

[...] desenvolver, crescer, ganhar peso, quando a gente pega o neném, o que a gente mais quer é que ele recupere o peso, porque se não recuperar o peso tal, não vai embora.

[...] ah, você tem que fazer por causa da sua filha, pra ela ter mais peso, protege mais [...] falaram assim: faça o método que sua filha vai desenvolver mais rápido, engordar, crescer. Então eu fiz.

O dia a dia das mães modificado pelo MMC

As mães explicaram não medir esforços para atender as necessidades dos bebês. Entende-se a aflição vivenciada por muitas dessas mulheres/mães ao abandonar os outros filhos, o marido, o emprego ou o estudo, para se dedicarem quase que exclusivamente aos cuidados com o bebê prematuro, podendo, assim, abandonar seu papel mulher, trabalhadora ou esposa. Tal situação poderá propiciar às mães e aos familiares um estado de vulnerabilidade e ocorrência de distúrbios sociais, culturais, econômicos, dentre outros, como se evidencia a seguir

[...] foi muito difícil, mas valeu a pena. Cheguei a abandonar a casa e os outros filhos.

[...] eu vivia exclusivamente para ele (bebê, justificando que esse necessitava mais de sua atenção).

Pertinente ao convívio familiar, três mães explicaram que os esposos ou outro familiar (sogra, irmãos, mães) não incorporaram o MMC, dificultando a relação entre a mãe e outros entes sociais, como é observado nas falas abaixo.

[...] minha filha adolescente, então foi o maior sofrimento, pois eu acumulava a preocupação com o neném e o meu marido arrumava problemas, trazia tudo para a minha cabeça.

Nas relações em que os familiares eram compreensivos e colaboradores, porém, notou-se que esses ajudam muito no desenvolvimento do MMC, dando uma visão de cidadania no processo saúde-doença-saúde, como se identifica nas falas a seguir.

[...] um casal de pastores nos adotou, eu, meu marido e minha filha, a esposa do pastor mandava minha outra filha para a escola, fazia os deveres de casa com ela, lavava as roupinhas do neném, eu realmente estava precisando, foi muito bom.

[...] minha mãe foi muito especial, estava sempre presente, foi ela que me aconselhou, ela vinha direto aqui (hospital) comigo. [...] minha família foi primordial, foi tudo.

Reconhece-se a dura realidade das mulheres/mães, pois essas, além de exercerem o papel de mães/cuidadoras, desempenham outros papéis na sociedade. Mesmo em 2007, após 13 anos decorridos da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento(12), os avanços, na prática, ficam muito aquém das necessidades vivenciadas pela mulher, não se percebendo sob o risco de adoecer e morrer.

Outro fato que deve ser ressaltado é que as mães prestam cuidados profissionais (formais), isto é, os profissionais de saúde, que as assistem, cobram dessas mães atividades/cuidados que deveriam ser prestados por eles (dar banho na técnica, segurar o bebê para punção de veia, outros), e, também, os cuidados maternos (informais) aos seus bebês, esses sim, cuidados de aproximação afetiva com o bebê (trocar fralda, acariciar, outros), que são propósitos e não tarefas maternas de mãe. No desenvolvimento dessas atividades, das quais muitas são complexas, as mães se sentem sobrecarregadas, o que, na maioria das vezes, lhes é imposto sem ao menos discutir e propor tal assistência, como descrito a seguir.

[...] Quando tinha que “pegar uma veia”, meu Deus que coisa tristeza, eu tinha que ficar do lado e às vezes segurar o bebê para “furá-lo”.

[...] eu vinha para cá (hospital) cuidar do bebê e depois chegava em casa para ajudar a minha menina de 7 anos a fazer a janta. [...] depois que chegava em casa, chegava cansada, ia cuidar de lavar as roupinhas dele (bebê) para no outro dia ter que voltar para o hospital e cuidar do meu bebezinho.

Ainda, algumas mães relataram que, em sua ausência, os bebês não eram bem atendidos e elas não recebiam as informações de forma completa e correta, o que dificultava o relacionamento entre elas e a equipe profissional, como exemplificado nas falas a seguir.

[...] quando eu vi ela e estava com a cabeça raspada, nossa, foi péssimo, e eles me explicaram que era porque estava sem veia, aí eu fiquei com raiva mesmo.

[...] pensava, meu Deus do céu, a menina não trocava nem a fralda, ela ficava toda encharcada, assim eu chegava em casa, eu não queria fazer nada, eu só queria chorar.

Valorização da afetividade entre familiares

Caracterizou-se pela melhoria do convívio, afetividade, compreensão quando há participação efetiva dos familiares no MMC. Nesse sentido, concorda-se, aqui, com alguns autores, quando consideram que a família tem no amor e no apoio mútuo do casal a principal determinante da educação dos filhos, a fim de poder desempenhar a importante tarefa de formar hábitos, atitudes e valores(5). Com essa base teórica, fundamenta-se a melhoria na qualidade de vida dos envolvidos, em que as ações das famílias estão centradas no indivíduo integral, considerando as transformações sociais, econômicas e culturais.

[...] a família e os vizinhos, a força que eles deram à gente, ajudou muito.

[...] todos estavam muito felizes, rezando, pedindo a Deus, orando, fazendo campanha e tudo.

[...] tive a colaboração de toda a família, dele (marido), da minha mãe, da minha família, muita força, muito apoio, muito afago, muito carinho foi o que me ajudou muito.

A relação direta entre a mãe e seu filho evidencia que o contato íntimo com o bebê prematuro pode interferir positivamente na relação desse bebê com o mundo. Tais fatos são exemplificados nas falas a seguir.

[...] eles ficam bem agarradinhos com a gente [...] a gente acaba criando uma superproteção [...] hoje ele é muito agarradinho comigo. [...] eles não querem mais perder aquele vínculo, de ficar agarrado, são crianças que não querem ficar dentro do berço, não querem ficar dentro do carrinho, só querem ficar com a gente, dormir com a gente.

Na perspectiva das contribuições, em termos assistenciais, enfatiza-se a dimensão educativa e sociocultural dos cuidados oferecidos aos familiares do RNBP, assegurando a essa clientela o direito constitucional à saúde do cidadão. Essa contribuição é extensiva aos profissionais de saúde e em especial aos de enfermagem, garantindo a qualidade na relação do profissional cuidador com a pessoa cuidada.

Considerações finais

Se se refletir sobre os resultados à luz das vantagens contidas na norma de 2000, sobre o MMC, constata-se que, de acordo com as falas das mães, são evidentes as vivências relacionadas, de um lado, com: a) o aumento do vínculo entre a mãe e o bebê; b) diminuição do tempo de separação entre o recém-nascido e a família, evitando longos períodos sem a vigilância dos cuidados pela mãe e c) melhora o relacionamento da mãe e família entre eles e com a equipe que cuida do bebê.

Se se relacionar os resultados ainda do MMC ao Programa de Humanização no Atendimento ao Recém-Nascido Pré-Termo, poder-se-ia inferir que o mesmo ainda apresenta grande fragilidade relacionada à segurança técnica dos profissionais e de recursos adequados ao êxito do método.

Através dos resultados obtidos, entende-se que a participação familiar se torna essencial para o sucesso do método. Essa participação deve acontecer de forma harmoniosa no ambiente hospitalar (primeira e segunda etapa) e no ambiente domiciliar (terceira etapa), assegurando a essas mulheres/mães apoio, conforto, confiança e parceria nos cuidados profissionais (formais), e também nos cuidados maternos (informais), quando assim propostos pela equipe de saúde. Nesse sentido, há necessidade de trabalhar melhor o entendimento da indicação do MMC e a adesão espontânea por parte da mãe, evitando, assim, situações de crise familiar e de estresse, inclusive de perda de trabalho ou abandono do estudo.

Nesse sentido, a equipe de enfermagem deverá conhecer o perfil socioeconômico dos clientes e reconhecer a realidade da vivência da mãe-família em seu contexto social, valorizando a incorporação desses indivíduos no processo de cuidar e de assistir o recém-nascido prematuro e a mãe prematura. Para tal proposta, é necessário que a enfermagem conheça, compreenda e transforme sua assistência, na qual mãe-bebê-família devem ser vistos em sua cultura própria, entendendo a necessidade de promover cuidados de enfermagem na perspectiva transcultural.

E, ainda, visto que no MMC, segundo a política de saúde, o protagonista é o bebê-prematuro, observa-se que a enfermagem responsabiliza excessivamente a mulher-mãe, não ajudando a mãe a transformar-se ou se adequar à situação de ser mãe prematura que vivencia, causando desarmonia relacional, devido à falta de habilidade profissional em reconhecer as dificuldades de adaptação por parte da mãe e família à prematuridade.

Para tanto, entende-se que este estudo poderá servir como ponto de referência para outras pesquisas e/ou estudos a serem desenvolvidos, fortalecendo a linha de pesquisa sobre Políticas e Modelos de Ensinar e Assistir em Enfermagem e Saúde da Mulher e do Recém-Nascido, favorecendo o desenvolvimento de ações educativas e assistenciais que promovam o fortalecimento do papel cidadão dos envolvidos no MMC.

Referências

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    Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento. Relatório final. Cairo: CNPD; FNUAP; 1994.
  • Corresponding Author:

    João Carlos Arivabene
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jun 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2010

    Histórico

    • Aceito
      18 Dez 2009
    • Recebido
      30 Abr 2009
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