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Avaliação da autoestima em docentes de enfermagem de universidades pública e privada

Resumos

OBJETIVO: avaliar a autoestima em docentes de enfermagem de universidades pública e privada e comparar as medidas apresentadas pelos dois grupos de professores. MÉTODO: trata-se de pesquisa descritiva, correlacional, transversal, quantitativa, desenvolvida com 71 docentes de duas universidades (pública e privada) de um município do sul do Estado de Minas Gerais. Utilizaram-se um questionário, após validação e teste piloto, e a Escala de Autoestima de Rosenberg. RESULTADO: constatou-se que a maioria dos docentes apresentou autoestima alta, não havendo diferença significativa entre os dois grupos. Analisando-se os escores contínuos dessa escala, observou-se diferença significativa entre as universidades, mostrando que os docentes da universidade privada apresentaram escores mais baixos de autoestima. A Escala de Autoestima de Rosenberg apresentou valor alto de coeficiente alfa. CONCLUSÃO: a autoestima alta foi predominante nos professores estudados, mas os da universidade privada apresentaram escores mais baixos. Esses dados podem auxiliar as instituições a refletir sobre o assunto e investir na construção de ambientes saudáveis, tendo como protagonista o trabalhador/docente de enfermagem, representando avanços para o conhecimento da temática na área de enfermagem.

Docentes de Enfermagem; Universidades; Educação Superior; Saúde do Trabalhador; Autoestima


The aim of this study was to evaluate the self-esteem of Nursing faculty in public and private universities and compare the measures presented by two groups of teachers. This descriptive, correlational, cross-sectional quantitative study was conducted with 71 teachers from two universities (public and private) from a municipality in the south of the State of Minas Gerais. After pilot testing and validation, A questionnaire and the Rosenberg Self-Esteem Scale were used. It was found that most teachers had high self-esteem, with no significant difference between the two groups. When the continuous scores on this scale were analyzed, there was a significant difference between universities, showing that the private university teachers had lower self-esteem scores. The Rosenberg Self-Esteem Scale showed high value for coefficient alpha. It was concluded that self-esteem was high predominantly in the studied teachers, but those from the private university had lower scores. These data may help institutions to reflect on the issue and invest in building healthy environments, with the worker/teacher of Nursing as the protagonist, which represents advancement in the knowledge of the subject in the field of Nursing.

Faculty Nursing; Universities; Education Higher; Occupational Health; Self-esteem


OBJETIVO: evaluar la autoestima de profesores de Enfermería en universidades pública y privada y comparar las medidas presentadas por los dos grupos de profesores. MÉTODO: Se trata de una investigación descriptiva, correlacional, transversal, cuantitativa, desarrollada con 71 profesores de dos universidades (pública y privada) de un municipio en el sur del estado de Minas Gerais, Brasil. Se utilizó un cuestionario, tras prueba piloto y validación, y la Escala de Autoestima de Rosenberg. RESULTADO: Se encontró que la mayoría de los profesores tenía autoestima alta, sin diferencia significativa entre los dos grupos. Cuando se analizaron los resultados continuos en esta escala, fue encontrada una diferencia significativa entre las universidades, que muestra que los profesores universitarios privados tenían puntuaciones más bajas de autoestima. La Escala de Autoestima de Rosenberg mostró un alto coeficiente alfa. CONCLUSIÓN: La autoestima alta predominó entre los profesores estudiados, pero aquellos de la universidad privada tuvieron puntuaciones más bajas. Estos datos pueden ayudar a las instituciones a reflexionar sobre el tema e invertir en la construcción de entornos saludables, en que el trabajador/profesor de Enfermería sirva como protagonista, lo que representa avances para el conocimiento sobre el tema en el área de Enfermería.

Docentes de Enfermería; Universidades; Educación Superior; Salud Laboral; Autoestima


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da autoestima em docentes de enfermagem de universidades pública e privada

Fábio de Souza TerraI; Maria Helena Palucci MarzialeII; Maria Lúcia do Carmo Cruz RobazziII

IPhD, Professor Adjunto, Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Alfenas, Brasil

IIPhD, Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: avaliar a autoestima em docentes de enfermagem de universidades pública e privada e comparar as medidas apresentadas pelos dois grupos de professores.

MÉTODO: trata-se de pesquisa descritiva, correlacional, transversal, quantitativa, desenvolvida com 71 docentes de duas universidades (pública e privada) de um município do sul do Estado de Minas Gerais. Utilizaram-se um questionário, após validação e teste piloto, e a Escala de Autoestima de Rosenberg.

RESULTADO: constatou-se que a maioria dos docentes apresentou autoestima alta, não havendo diferença significativa entre os dois grupos. Analisando-se os escores contínuos dessa escala, observou-se diferença significativa entre as universidades, mostrando que os docentes da universidade privada apresentaram escores mais baixos de autoestima. A Escala de Autoestima de Rosenberg apresentou valor alto de coeficiente alfa.

CONCLUSÃO: a autoestima alta foi predominante nos professores estudados, mas os da universidade privada apresentaram escores mais baixos. Esses dados podem auxiliar as instituições a refletir sobre o assunto e investir na construção de ambientes saudáveis, tendo como protagonista o trabalhador/docente de enfermagem, representando avanços para o conhecimento da temática na área de enfermagem.

Descritores: Docentes de Enfermagem; Universidades; Educação Superior; Saúde do Trabalhador; Autoestima.

RESUMEN

OBJETIVO: evaluar la autoestima de profesores de Enfermería en universidades pública y privada y comparar las medidas presentadas por los dos grupos de profesores.

MÉTODO: Se trata de una investigación descriptiva, correlacional, transversal, cuantitativa, desarrollada con 71 profesores de dos universidades (pública y privada) de un municipio en el sur del estado de Minas Gerais, Brasil. Se utilizó un cuestionario, tras prueba piloto y validación, y la Escala de Autoestima de Rosenberg.

RESULTADO: Se encontró que la mayoría de los profesores tenía autoestima alta, sin diferencia significativa entre los dos grupos. Cuando se analizaron los resultados continuos en esta escala, fue encontrada una diferencia significativa entre las universidades, que muestra que los profesores universitarios privados tenían puntuaciones más bajas de autoestima. La Escala de Autoestima de Rosenberg mostró un alto coeficiente alfa.

CONCLUSIÓN: La autoestima alta predominó entre los profesores estudiados, pero aquellos de la universidad privada tuvieron puntuaciones más bajas. Estos datos pueden ayudar a las instituciones a reflexionar sobre el tema e invertir en la construcción de entornos saludables, en que el trabajador/profesor de Enfermería sirva como protagonista, lo que representa avances para el conocimiento sobre el tema en el área de Enfermería.

Descriptores: Docentes de Enfermería; Universidades; Educación Superior; Salud Laboral; Autoestima.

Introdução

O mercado de trabalho em saúde vem sofrendo importantes transformações determinadas pelas políticas econômicas, tecnológicas e sociais. Essas transformações exigem mudanças das instituições formadoras, para que os egressos das universidades atendam às novas demandas geradas(1).

Entre os múltiplos ambientes de trabalho na área educativa e os vários tipos de atividades universitárias, incluem-se os desenvolvidos pelos trabalhadores de enfermagem.

No Brasil, há dois tipos de universidades: pública e privada. Parte-se da suposição de que a identidade dos docentes das instituições de ensino superior (IES) particulares sofre fortes repercussões nas transformações ocorridas no mundo do trabalho e nas mudanças relativas ao processo de expansão dessas instituições no Brasil, desde os anos 1990(2).

O profissional responsável pela educação nas universidades é o docente. O trabalho que ele realiza constitui-se em um conjunto de ações específicas que são empreendidas pela pessoa do professor, durante sua vida profissional. Dessa forma, ele é transmissor de conteúdos, preocupado em cumprir objetivos, metas e prazos, visando um produto para o mercado de trabalho(3).

Existem várias situações nesse ambiente laboral, citadas pelos docentes, como o trabalho repetitivo, o ambiente estressante, o ritmo acelerado, a fiscalização contínua e a pressão da direção/chefia, entre outras, que podem se tornar nocivas aos trabalhadores(4).

Na docência de enfermagem parece haver mais fatores dificultadores que facilitadores. Fatores impeditivos estão relacionados ao trabalho, tais como organização laboral, demanda de trabalho, falta de acesso aos serviços de saúde e remuneração. Dessa forma, esses docentes tendem ao adoecimento, o que certamente afetará sua vida laboral, com prejuízos em relação à sua saúde na condição de trabalhador(5).

Com isso, as condições de trabalho dessas pessoas, ou seja, as circunstâncias sob as quais elas mobilizam as suas capacidades físicas, cognitivas e afetivas para atingir os objetivos da produção escolar podem desmotivá-las facilmente e gerar alterações em suas funções psicofisiológicas. Se não há tempo para a recuperação, podem desencadear sintomas clínicos, possibilitando alterações em sua autoestima(6).

A autoestima é definida como uma orientação positiva ou negativa em direção a si, uma avaliação global do próprio valor do indivíduo em relação a si mesmo. Pessoas motivadas a terem elevada autoestima apresentam indícios de autoconsideração positiva, que pode ser desenvolvida por meio das experiências cotidianas de cada indivíduo. É um componente do autoconceito, definido como a totalidade de pensamentos e sentimentos individuais, tendo como referência a própria pessoa como um objeto(7).

Cabe salientar que a autoestima tem sido igualmente relacionada ao desempenho social, uma vez que ela pode influenciar a expectativa que as pessoas possuem sobre o resultado de seu próprio desempenho(8).

Diante dessas considerações e em virtude do reduzido número de estudos internacionais e, principalmente, nacionais, referentes a essa temática, relacionada a docentes de enfermagem, optou-se por realizar este estudo com o objetivo de avaliar a autoestima em docentes de enfermagem de duas universidades, uma pública e outra privada, de um município do sul do Estado de Minas Gerais e comparar as medidas apresentadas pelos dois grupos de professores.

Método

Trata-se de estudo descritivo, correlacional, de corte transversal e abordagem quantitativa, desenvolvido com 71 docentes do curso de graduação em enfermagem de duas universidades (39 da pública e 32 da privada), localizadas no município de Alfenas (Minas Gerais). Dos 75 docentes do curso de enfermagem das duas universidades, apenas dois professores de cada universidade não participaram do estudo, uma vez que se encontravam afastados das atividades docentes por motivo de gestação/maternidade ou para cursar pós-graduação.

A coleta dos dados ocorreu no final do primeiro semestre letivo do ano 2010, ou seja, no mês de junho. Para essa etapa, foi utilizado um questionário semiestruturado, contendo variáveis sociodemográficas da atividade laboral e hábitos de vida. Esse instrumento foi submetido a um processo de refinamento, por meio da avaliação de cinco juízes: dois pesquisadores especialistas na temática saúde do trabalhador, dois com experiência em construção e validação de instrumentos de pesquisas e um com experiência na temática saúde do trabalhador e em construção e validação de instrumentos de pesquisas. Posteriormente, foi submetido a um teste-piloto com dez docentes selecionados, aleatoriamente, no curso de graduação em enfermagem de uma IES pública do Estado de São Paulo, com o objetivo de verificar a compreensão das questões pelos sujeitos e a necessidade de adequação do vocabulário.

Para a avaliação da autoestima utilizou-se a Escala de Autoestima de Rosenberg. O instrumento original, em inglês, foi elaborado por Rosenberg, em 1965, traduzido e validado para o português em 2001(9).

Trata-se de uma escala de 4 pontos do tipo Likert, contendo 10 itens destinados à avaliação da autoestima por meio de uma única dimensão. Das 10 afirmativas, 5 avaliam sentimentos positivos do indivíduo sobre si mesmo e as demais avaliam sentimentos negativos. O escore é calculado somando-se as pontuações obtidas por meio da avaliação das 10 frases, totalizando um valor único para a escala. O intervalo possível dessa escala varia de 10 (10 itens multiplicados por valor 1) a 40 (10 itens multiplicados por valor 4)(10).

A classificação da autoestima é definida pela seguinte escala: autoestima alta (satisfatória) – escore maior que 30 pontos; média – escore entre 20 e 30 pontos e baixa (insatisfatória) – escore menor que 20 pontos(9).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, segundo Protocolo nº0900/2008. Solicitou-se a autorização prévia à reitoria e coordenação dos cursos de graduação em enfermagem das universidades em estudo, assim como a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido dos docentes de enfermagem participantes da pesquisa, sendo garantido o anonimato e o direito de desistência em qualquer fase da mesma, conforme a Resolução 196/96, que trata de pesquisa relacionada a seres humanos.

Após a coleta, os dados foram tabulados no programa Software Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 15.0, para análise estatística descritiva e inferencial. Realizou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov, encontrando-se uma distribuição de caráter assimétrico das variáveis analisadas. Foram realizadas comparações das medidas (escores contínuos) da autoestima dos docentes de enfermagem da universidade pública com os da universidade privada, aplicando-se o teste Mann-Whitney.

Em seguida, foi realizada análise bivariada, comparando-se as variáveis independentes à medida de autoestima, com aplicação dos testes qui-quadrado de Pearson ou exato de Fisher, para comparação de proporções e Mann-Whitney, para comparação de variáveis numéricas (contínuas). Para todas as variáveis supracitadas, estimou-se a Odds Ratio (razão de chance). Foi considerado o nível de significância de 5%, ou seja, os dados foram estatisticamente significantes para p<0,05.

Após a análise bivariada, foram selecionadas para os modelos de regressão logística binária múltipla as variáveis com valor-p menor que 0,25 nas análises univariadas. Foi avaliado o ajuste do modelo final por meio da estatística de Hosmer & Lemeshow. Quando nenhum modelo de regressão logística foi encontrado, optou-se por um segundo tipo de análise multivariada, denominado árvore de decisão. E, por fim, para a avaliação da confiabilidade da Escala de Autoestima de Rosenberg, foi feita análise da consistência interna, por meio do coeficiente alfa de Cronbach.

Resultados

Como resultado, constatou-se predomínio de docentes do sexo feminino, com faixa etária de 31 a 40 anos, católicos, casados, renda familiar mensal de 4.001 a 6.000 reais, com casa própria e formação universitária em enfermagem, mestres, com tempo de trabalho em docência de 6 a 10 anos e, na atual instituição, de 1 a 5 anos. Alguns professores praticavam semanalmente exercícios físicos e outros eram sedentários. Poucos eram tabagistas e a maioria não consomia bebida alcoólica, não apresentando doença crônica e não fazendo uso de medicamentos diários. A ocorrência de evento marcante na vida (perda/morte de ente querido e diagnóstico de doença em ente querido) e na carreira de docência (acúmulo de responsabilidades/funções e falta de reconhecimento profissional) foi frequente entre os sujeitos avaliados.

A Escala de Autoestima de Rosenberg apresentou valor alto de coeficiente alfa, 0,907. Dessa forma, considerou-se a consistência interna dessa escala muito boa e aceitável para os itens avaliados e altamente correlacionados uns aos outros, indicando homogeneidade.

Com relação à classificação da autoestima, baseada nos pontos de corte, não houve diferença significativa entre os dois grupos (p=0,170), sendo que o percentual de autoestima média foi de 17,9% nos docentes da universidade pública e de 34,4%, nos da universidade privada. A autoestima baixa ocorreu em apenas um docente da universidade pública (2,6%) (Tabela 1).

Ao se analisar os escores contínuos da escala de autoestima, observou-se diferença significativa entre as universidades (p=0,008), mostrando que os docentes da universidade privada apresentaram escores mais baixos na medida de autoestima, quando comparados com os docentes da universidade pública.

Identificou-se, neste estudo, que nenhuma das variáveis analisadas [tipo de universidade, sexo, faixa etária, crença religiosa, estado civil, renda familiar mensal, número de filhos, tipo de moradia, formação universitária, titulação, possui mais de um curso de graduação, tempo de formado, tempo de trabalho na docência, tempo de trabalho na atual IES, tipo de contrato de trabalho na IES, carga horária semanal de trabalho na instituição, plano de carreira na IES e outro trabalho fixo, além da atividade de docência] mostrou associação significativa com a autoestima (p>0,05). Apenas as variáveis tipo de universidade, renda familiar mensal e plano de carreira na IES apresentaram alguma tendência para tal associação (p=0,189, p=0,167 e p=0,189, respectivamente). Destaca-se que os docentes da universidade privada tiveram maior tendência a apresentar autoestima baixa ou média.

A Tabela 2 mostra que nenhuma variável analisada mostrou associação significativa com a autoestima (p>0,05); apenas a variável prática de atividade física apresentou associação limítrofe (p=0,063), sendo que os docentes que praticavam atividade física tiveram menor prevalência de autoestima baixa ou média (19,6%). Destaca-se também que a variável uso de medicamentos diários apresentou alguma tendência para tal associação (p=0,090).

A Tabela 3 mostra que as variáveis ocorrência de evento marcante na vida e ocorrência de evento marcante na carreira de docência tiveram associação significativa com a autoestima (p=0,004 e p=0,028, respectivamente). Pela razão de chances, verificou-se que os docentes que já tiveram algum evento marcante na vida e também na carreira de docência, têm maior chance de apresentar autoestima baixa ou média.

Todas as variáveis com valor-p<0,25 na análise bivariada (tipo de universidade, renda familiar mensal, carga horária semanal, prática de exercícios físicos, tipo de contrato de trabalho, plano de carreira na IES, uso de medicamentos diários e ocorrência de evento marcante na vida e na carreira de docência) foram incluídas no modelo multivariado de regressão logística binária, tendo como variável resposta a autoestima.

Permaneceram no modelo final de regressão logística as variáveis ocorrência de evento marcante na vida e ocorrência de evento marcante na carreira de docência. Com isso, constatou-se que um docente que teve algum evento marcante na vida tem 5 vezes mais possibilidade de apresentar autoestima média ou baixa do que aquele que não teve esse evento. Quando se trata de algum evento marcante na carreira de docência, essa possibilidade passa para 3,80. Esse modelo teve bom ajuste, de acordo com o teste de Hosmer & Lemeshow.

De acordo com a análise multivariada, por meio da árvore de decisão, as variáveis ocorrência de evento marcante na vida e uso de medicamentos diários permaneceram no modelo final, indicando que a maior prevalência de autoestima média ou baixa está associada à ocorrência de evento marcante na vida e ao uso diário de medicamentos diários. O modelo apresentado teve bom ajuste, classificando corretamente 78% dos dados.

Discussão

A autoestima diz respeito à avaliação positiva ou negativa que o indivíduo faz de si mesmo, constituindo-se, assim, em um aspecto central do Eu, que desempenha papel fundamental na construção da identidade adulta. Além disso, é considerado o componente avaliativo do autoconceito, que inclui aspectos cognitivos e comportamentais, assim como avaliativos e afetivos(11).

No presente estudo, a frequência de autoestima média nos docentes avaliados foi de 34,4% na universidade privada e de 17,9%, na pública; e um professor da instituição pública apresentou autoestima baixa. Investigação sobre a saúde mental dos professores de 1º e 2º graus em todo o país, abrangendo 1.440 escolas e 30 mil professores, encontrou que 26% da amostra estudada apresentavam exaustão emocional, sendo a autoestima baixa o principal fator para a configuração desse quadro(12).

É importante enfatizar, também, que a autoestima dos indivíduos pode ser influenciada pelas características sociais como sexo, idade e estado civil. Pesquisa constatou que a autoestima esteve negativamente correlacionada à idade ou que aquela aumenta com o envelhecimento, isto é, os idosos têm maior autoestima(13).

Encontrou-se neste estudo que a variável prática de atividade física apresentou associação limítrofe com a autoestima, mostrando que os docentes que praticavam atividade física tiveram menor prevalência de autoestima baixa ou média. Indivíduos fisicamente ativos tendem a ter melhor saúde, têm atitudes mais positivas em relação ao trabalho e revelam maior capacidade para lidar com o estresse, apresentando autoestima mais elevada(14).

No contexto da universidade, o professor apresenta seu cotidiano conflitante e agitado, sendo possível ter problemas com alunos. Há uma série de responsabilidades que podem ser listadas como: tarefas de planejamento; realização de orientações; prestação de serviços à comunidade; assessorias e consultorias; comprometimento com a descoberta de novos saberes e sua divulgação; participação em comissões, palestras, entre outros. Todos esses fatores podem estar associados a alterações em sua autoestima(15).

O Manual de Procedimentos para os Serviços de Saúde do Ministério da Saúde e da Organização Pan-Americana da Saúde aponta fatores de risco de natureza ocupacional conhecidos para as alterações na autoestima. Entre eles, aparecem decepções sucessivas em situações de trabalho, perdas acumuladas ao longo de anos de trabalho, perda do posto de trabalho e demissão(16).

Destaca-se, também, que as alterações na autoestima podem estar associadas aos fatores estressores ambientais. Autores identificam seis categorias que agrupam os fatores potencialmente estressantes no ambiente ocupacional da universidade: a) falta de apoio administrativo; b) a relação com os alunos; c) a relação com os colegas; d) excesso de trabalho; e) insegurança financeira e f) a falta de reconhecimento(17). O pouco reconhecimento do trabalho desenvolvido é relatado, por docentes de enfermagem, como fator estressante durante seu desempenho nos campos clínicos(18). Cabe destacar que, no presente estudo, constatou-se que os docentes que já tiveram algum evento na carreira de docência têm maior probabilidade de apresentar autoestima baixa ou média.

Estudo realizado com professores suíços identificou que a maior causa de alterações na autoestima, com desgaste profissional, foi o mau relacionamento professor/alunos(19). Uma outra pesquisa, realizada com professores do ensino fundamental ,em Belo Horizonte (MG), revelou que alguns docentes consideraram ter mau relacionamento no trabalho com alunos (13%), com colegas (14%), com superiores (20%) e com pais de alunos (26%)(20). Diante do exposto, é possível observar que os docentes, dentre eles os universitários, estão expostos aos vários fatores de riscos psicossociais, os quais apresentam potencial para causar prejuízo físico, social e psicológico, podendo alterar sua autoestima(21).

Observou-se, neste estudo, que os docentes da universidade privada apresentaram mediana dos escores de autoestima mais baixo. Diante desse fato, cabe mencionar que os professores de escolas privadas estão submetidos a processo e organização do trabalho distintos dos existentes nas escolas públicas, podendo ocasionar frequentes distorções salariais, inseguranças e incertezas(22).

Ainda nesse contexto, a identidade dos docentes das IES vai se constituir na interseção das relações sociais e no reconhecimento da sociedade. No entanto, constata-se que elementos como o desencantamento e o sofrimento são comuns entre os professores, no confronto do cotidiano das instituições e da gestão educacional. É nesse sentido que as identidades dos docentes de IES particulares vêm sendo construídas, permeadas pela angústia em torno da questão da demissão, associada ao fracasso, em relação à carreira ou ao exercício profissional(2).

Apesar de haver aumento da demanda dos cursos de graduação em termos absolutos, como a oferta também se encontra em expansão, especialmente a oferta privada, a demanda de alunos em termos relativos para as instituições privadas encontra-se em retração, o que pode ser comprovado pela redução na relação candidatos/vaga nesse segmento. Por outro lado, essa relação nas instituições públicas apresenta movimento oposto. O docente da universidade privada passa a temer a demissão por não existirem novas turmas no curso em que leciona, o que não é muito observado nos docentes de IES públicas, pelo fato desses terem cargos efetivos(23). Assim, a insegurança no trabalho contribui para a utilização do enfrentamento do tipo fuga, o qual implica pessimismo, tendo sido considerado como precursor da autoestima baixa(24).

É importante destacar que existem poucos resultados publicados relacionados a docentes de nível superior, principalmente da área de enfermagem(25). Essa deficiência de investigações com essa temática dificultou a comparação dos resultados do presente estudo. Mas, em algumas situações, a comparação dos dados desta pesquisa ocorreu com aqueles originados de estudos com docentes de ensino básico e médio.

As principais limitações deste estudo que merecem ser destacadas incluem o desenho transversal da pesquisa e o tamanho amostral. Contudo, como pesquisa exploratória inicial, o estudo atingiu os objetivos, demonstrando a realidade dos docentes estudados. Os dados encontrados podem auxiliar a reflexão sobre o assunto, possibilitando às instituições investir na construção de ambientes saudáveis, tendo como protagonista o trabalhador/docente de enfermagem, o que representa avanços para o conhecimento da temática nessa área profissional.

Conclusão

A autoestima alta foi predominante nos professores estudados, porém, alguns apresentaram autoestima média ou baixa. Quando se analisou os escores contínuos da escala, os docentes da universidade privada apresentaram escores mais baixos de autoestima, quando comparados com os docentes da universidade pública.

Cabe às instituições de ensino viabilizarem práticas que favoreçam a saúde de seus docentes, assim como adotarem estratégias preventivas de redução dos riscos do ambiente de trabalho voltadas para esses profissionais. É importante também a elaboração de condições favoráveis para a promoção da saúde, ou seja, intervenções que promovam resultados benéficos aos docentes em nível psicológico e fisiológico, minimizando-se os efeitos dos eventos geradores de alterações na autoestima.

Diante do exposto, faz-se necessária a realização de estudos adicionais, principalmente pesquisas longitudinais e em outras universidades brasileiras e internacionais, para tentar compreender mais profundamente os fatores que estão ligados à atividade do docente de enfermagem e às alterações na autoestima, esclarecendo essa associação.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      02 Ago 2012
    • Aceito
      01 Out 2012
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