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Promovendo saúde através da formação de recursos humanos: experiência da escola de enfermagem de ribeirão preto-usp, centro colaborador da oms

NOTAS E INFORMAÇÕES

Promovendo saúde através da formação de recursos humanos: experiência da escola de enfermagem de ribeirão preto-usp, centro colaborador da oms

Maria Helena Palucci MarzialeI; Isabel Amélia Costa MendesII

IProfessora Doutora do Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem

IIProfessora Titular do Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem

1. INTRODUÇÃO

A saúde é considerada como um valor devido ao vínculo à vida. Constitui-se um marco jurídico por ser um bem público e, dessa maneira, torna-se um direito de cada cidadão2 .

Como direito do indivíduo é resultante de vários fatores, tais como: ambiente, condições de vida compatíveis à dignidade humana, organização e utilização de recursos que se transformem em serviços de saúde, decisões individuais de cada família e de cada comunidade em relação à adoção do estilo de vida e utilização de práticas que visem à diminuição dos riscos com o objetivo de preservar e proteger a saúde.

Como direito e bem público, a saúde torna-se responsabilidade de toda a população e do Estado. Dessa forma, tal responsabilidade traduz-se em obrigação do poder público como também um dever de cada indivíduo1.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) a saúde tem que ser conseguida, não pode ser imposta; então, a primeira exigência para o alcance da saúde é um comprometimento tanto por parte de pessoas como por parte do governo.

A promoção da saúde consiste de combinação da educação e intervenções legais, fiscais, econômicas, ambientais e organizacionais relacionadas e desenvolvidas para facilitar a aquisição da saúde e prevenção da doença. A educação é pré-requisito essencial em todos os programas de promoção à saúde6.

A OMS adota a promoção para a saúde com um conceito unificador para aqueles que reconhecem a necessidade de mudança nas maneiras e condições de vida, a fim de promover a saúde. Neste sentido, este conceito engloba todos os fatores que influenciam a saúde. Admite-se que a promoção da saúde é uma atividade inter-setorial, onde não só os serviços médicos tem a responsabilidade de assegurar a saúde, mas também as indústrias, os sindicatos e os profissionais.

A função tradicional da educação para promover a saúde é influenciar as opções individuais de saúde; seu papel mais radical é influenciar a adoção de políticas públicas saudáveis, aumentando a consciência pública dos problemas em questão. Para tanto, uma das estratégias utilizadas é o aumento da consciência crítica através da intervenção educacional, que procura não meramente fazer com que as pessoas pensem nos problemas, mas que examinem criticamente suas vidas, suas circunstâncias e o ambiente em que vivem, para então agirem como uma comunidade e pressionarem os políticos para implementação de políticas mais adequadas.

A educação profissional é um outro campo educacional que contribui para o processo de promoção da saúde. Refere-se à tentativa de influenciar a saúde e outros profissionais. Seu propósito é duplo: o primeiro é persuadir os tomadores de decisão a assumirem em responsabilidade de promover a saúde e o segundo é facilitar a distribuição dos serviços de saúde necessários à comunidade. A educação profissional tem a função de aumentar a consciência e oferecer conhecimentos e habilidades imprescindíveis ao profissional da saúde para que se torne e efetivamente atue como provedor e educador de saúde.

O objetivo deste trabalho é particularizar um caso institucional, realçando suas ações que tem sido dirigidas para a promoção de saúde através da formação profissional. Para tanto, situaremos a EERP-USP enquanto Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da enfermagem e em seguida apresentaremos indicadores demonstrativos do modo pelo qual a referida instituição tem contribuido para o processo de promoção à saúde.

2. CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA DE ENFERMAGEM DE RIBEIRÃO PRETO COMO CENTRO COLABORADOR DA OMS

A Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP-USP) há 42 anos vem formando recursos humanos para atuarem como educadores de saúde. Tendo em vista o comprometimento do corpo docente para com o desenvolvimento dos postulados de "saúde para todos", a EERP-USP colocou-se à disposição daquele Organismo Internacional em agosto de 1987, para atuar como um Centro de Referência.

Apresentou um projeto de trabalho baseado na formação de recursos humanos em Enfermagem a níveis de graduação e pós-graduação, na educação continuada de profissionais, priorizando a pesquisa, no estabelecimento de mecanismos de intercâmbio regional para contribuição científica através da difusão da informação, assim como na criação e desenvolvimento de núcleos de trabalho voltados para a investigação, ensino e assistência, sintonizados com os programas daquela Organização. Resultou desta iniciativa uma proposta da OMS, datada de 03 de março de 1988, de designação da Escola como Centro Colaborador para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem. Em 1992 foi redesignado para mais um quadriênio5.

Um Centro Colaborador é uma instituição designada para participar de uma rede colaborativa internacional, realizando atividades de apoio aos programas daquela Organização em todos os níveis. Contribui ainda para o aumento da cooperação técnica com e entre países, fornecendo-lhes informações, serviços e consultoria, além de estimular e apoiar o treinamento e a pesquisa5.

A rede de Centros Colaboradores da OMS representa um mecanismo para que se efetive a cooperação técnica entre este Organismo e os Estados Membros, mecanismo este que tem sido desenvolvido e adaptado às novas exigências programáticas assegurando consistência com as necessidades de cooperação internacional.

Dentre vários Centros da OMS, atualmente 30 são específicos para a área de Enfermagem os quais localizam-se em seis regiões; Região das Américas (11); Região Européia (10); Região do Oriente Médio (1); Região Africana (2); Região do Pacífico Ocidental (4) e Região do Sudeste da Ásia (2).

A caracterização Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP como Centro Colaborador está orientada para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem através de oito Termos de Referência, quais sejam:

Termos de Referência:

1. Promoção e incentivo à pesquisa em Enfermagem orientada pelos critérios de atenção primária de saúde em diferentes níveis e áreas da prática de Enfermagem: saúde mental, saúde escolar, saúde ocupacional, saúde da mulher, saúde da criança e saúde do idoso, bem como outros programas que beneficiem a comunidade.

2. Facilitação do desenvolvimento de uma massa crítica de enfermeiras pesquisadoras envolvidas em pesquisas em serviços de saúde, especialmente aqueles que são vinculados à tomada de decisões e os que contribuem para uma prática de enfermagem mais eficaz e aprimorada.

3. Apoio ao desenvolvimento de programas de educação continuada para pesquisa em Enfermagem, orientada no sentido de introduzir mudanças nas quais os hospitais sirvam como efetivos pontos de referência e apoio para a atenção primária de saúde.

4. Incentivo e promoção ao intercâmbio de pesquisadores em educação e serviços, assim como instituições.

5. Desenvolvimento de mecanismos para divulgação nacional, regional e internacional dos achados das pesquisas, conforme seja apropriado.

6. Estabelecimento de um centro de recursos bibliográficos mediante integração de uma rede para partilha e distribuição de material de ensino/aprendizagem para pesquisa em Enfermagem.

7. Desenvolvimento de atividades de pesquisa em Enfermagem em apoio ao programa de trabalho de unidades pertinentes à OMS.

8. Organização e preparação de reuniões entre estudantes graduandos e formandos para abordar medidas importantes no contexto dos termos de referências.

3. CONTRIBUINDO PARA O PROCESSO DE PROMOÇÃO À SAÚDE: ESTRATÉGIAS EM AÇÃO

Com o propósito de formar massa crítica de pessoal de Enfermagem a partir de 1989 foram tomadas medidas a nível de ensino, pesquisa e serviço de extensão visando acentuar os programas já existentes e introduzidas novas vias de formação de pessoal. Passaremos a pontuar alguns deles.

3.1. Nível de Graduação:

- Participação no projeto da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP denominado "Universidade e Profissões" cujo enfoque está voltado a oferecer orientação aos vestibulandos sobre as profissões a fim de auxiliá-los a uma opção consciente da carreira escolhida.

- Oferecimento anual de 7 vagas destinadas a alunos estrangeiros oriundos do programa Estudante Convênio Graduação(PEC-G), de responsabilidade compartilhada entre a USP e o Ministério de Relações Exteriores do Brasil. A Escola já recebeu 23 alunos estrangeiros tendo formado até o momento 16 enfermeiros oriundos do Peru, Panamá e Angola.

- Introdução do aluno de graduação em atividades de pesquisa de forma extra curricular integrada ao programa de formação de recursos humanos em pesquisa mantido por agências financiadoras de ciência e tecnologia tais como: Programa Especial de Treinamento - PET/CAPES, Bolsa Trabalho COSEAS-USP, Programa de Iniciação Científica do CNPq e da FAPESP, entre outros.

3.2. Nível de Pós-Graduação

- Oferecimento de vagas nos programas de Pós-Graduação, nas áreas; Enfermagem Fundamental (níveis mestrado e doutorado), Enfermagem Psiquiátrica (nível mestrado), Enfermagem em Saúde Pública (nível mestrado) e através do programa Interunidades de Doutoramento em Enfermagem, mantido conjuntamente com a Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Os cinco programas visam formar enfermeiros pesquisadores que atuarão como líderes visando a melhoria da prática de Enfermagem e, portanto, a promoção à saúde.

Através da figura 1 verifica-se o número de alunos regularmente matriculados nos programas de pós-graduação da instituição aqui analisada no período de 1975 a 1995. Os dados relativos aos últimos vinte anos demonstram a vitalidade dos programas de pós-graduação desta Escola/Centro em termos de freqüência dos alunos matriculados, de constância na oferta e ocupação das vagas, e especialmente o seu acentuado acréscimo a partir de sua designação como Centro Colaborador. Conforme já mencionado por Mendes4, registrou-se neste período duas tendências. Uma delas é a de atendimento preponderante de enfermeiros-docentes de instituições de ensino de diferentes regiões do país, considerando-se apenas os alunos que exercem a docência. A outra tendência é de maior procura pelos cursos de Mestrado por enfermeiros assistênciais ligados a hospitais e unidade básicas de saúde. Acredita-se que o expressivo número de mestrandos provenientes da área assistêncial represente um fator relevante para que, através desta formação, estes profissionais assumam liderança e o poder de decisão nos serviços de saúde para a melhoria da assistência de enfermagem4.


Estes dados vem reforçar a atuação deste Centro como polo formador de recursos humanos de enfermagem a nível de pós-graduação, absorvendo cada vez mais profissionais de várias partes do Brasil que atuam em docência e que vem buscar sua formação neste nível, além de exercer influência sobre profissionais de instituições de assistência a saúde, a ponto de ter apresentado uma inversão na demanda dos cursos de Mestrado. A partir de 1988 começou a haver concorrência entre enfermeiros docentes e assistênciais pelas vagas oferecidas. Em 1992, por exemplo, 42,7% dos alunos selecionados eram ligados à docência à época da matrícula, enquanto 57,3% atuavam em serviços de saúde. Este novo perfil da demanda indicou a possibilidade de maior alcance do Termo de Referência 2, uma vez que este Centro passou a formar maior contingente de enfermeiros assistênciais aptos a assumirem a liderança e o poder decisório nos serviços de saúde, a promoverem mudanças em seus serviços em prol da promoção à saúde e melhoria da assistência de enfermagem.

Figura 2


Com o a umento do número de pós-graduandos inseridos nos programas, conseqüentemente houve aumento na produção de dissertações e teses especialmente no período de 1989 a 1995, como mostra a figura 3.


A produção de pesquisas em Enfermagem tem se mostrado extremamente necessária pois é através delas que o conhecimento se solidifica propiciando uma prática profissional consistente e eficaz. Com o propósito de favorecer a divulgação do conhecimento, desde 1993 a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo conta com um órgão de divulgação: a Revista Latino-Americana de Enfermagem, que destina-se à publicação de pesquisas originais, relatórios de experiências, revisões, atualizações, documentos considerados relevantes no campo de enfermagem, resenhas, resumos de teses e assuntos de interesse geral para os profissionais de enfermagem da América Latina. A criação deste novo veículo demostrou a sensibilidade deste Centro para com a "demanda, traduzida pelo compromisso para com a criação e distribuição da informação, para com a produção e expressão do conhecimento"3.

Esta sensibilidade é nutrida pela convicção de que um veículo desta natureza presta-se à integração dos enfermeiros através do conhecimento, incentiva a pesquisa e seus desdobramentos na prática profissional, subsidia programas de formação de pessoal, de educação continuada e de intercâmbio, instrumentalizando, em última análise, ações de promoção à saúde.

Através da Figura 4 podemos observar as publicações junto a referida revista no período de 1993 a 1995 segundo a origem dos autores.


Outro instrumento de comunicação com a comunidade de enfermagem também criado com este fim foi o Informativo Latino-Americano de Enfermagem, através do qual a Escola/Centro divulga informações consideradas relevantes para os enfermeiros tais como científicos, resumos de teses de dissertações realizados, opiniões e reflexões sobre temas emergentes na enfermagem, informações sobre atuação de Grupos e Núcleos de Pesquisas, entre outros.

3.3 Aperfeiçoamento - Pesquisa:

Oferecimento de programas de treinamento de enfermeiros assistênciais em pesquisa, cujo objetivo é favorecer a formação de uma massa crítica de enfermeiros dedicados à investigação em serviços de saúde. Tais programas são elaborados e conduzidos pelos coordenadores de núcleo e grupos de pesquisa da Escola.

3.4 Núcleos e grupos de pesquisa e extensão a comunidade:

Articulando os serviços de extensão, pesquisa e ensino de graduação a EERP conta com 26 grupos e núcleos os quais, além do desenvolvimento de investigações científicas, oferecem cursos em diversas modalidades objetivando proporcionar a reciclagem de conhecimentos aos profissionais de enfermagem, cursos, aulas e palestras e atendimento assistêncial à comunidade.

Tabela

3.5. Educação Continuada

Outra estratégia empregada para promover aprimoramento dos profissionais de enfermagem se dá através da educação continuada.

A Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo ofereceu no período de 1989-1995 um total de 153 cursos correspondendo a 6643 horas de atividades destinadas a educação continuada abrangendo a clientela de 4068 enfermeiros.

3.6. Intercâmbio

Uma outra atribuição deste centro é incentivar e promover intercâmbio nas áreas de ensino, de serviço e entre instituições, o que tem sido operacionalizado através de visitas técnicas efetuadas por docentes no país e no exterior, visitas recebidas do país e do exterior, assessorias realizadas e constituição de núcleos e grupos de pesquisas.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos traçar um breve esboço de seis ações estratégicas institucionais, vinculadas especialmente à formação de recursos humanos em enfermagem, tendo como propósito precípuo de contribuir para com a promoção da saúde. Para o alcance dos resultados e dos indicadores aqui apontados tem sido essencial o comprometimento intelectual, social, emocional e profissional dos integrantes desta instituição, comprometimento este que tem garantido a consistência e a constância das ações de formação de recursos humanos, tendo sempre em perspectiva a meta de promover saúde.

  • 01. LESCURA, Y.; MAMEDE, M.V. Educação em Saúde: abordagem para o enfermeiro. São Paulo: Sarvier, 1990.
  • 02. MACEDO, C.G. Discurso pronunciado na cerimônia de abertura. In. 8ª Conferência Nacional de Saúde, Anais Brasília, Ministério da Saúde, 1986.
  • 03. MENDES, I.A.C.; GIR, E.; TREVIZAN, M.A. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo: Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde. Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto. v.1, nº especial, p.53-68 dez. 1993.
  • 04. TONES, K.; TILFORD, S.; ROBINSON, Y.K. Health Education: Effectiveness and efficiency, London: Chapman & Hall, 1991.
  • 05. WORLD HEALTH ORGANIZATION Who Collaborating Centers: general information. Geneva: WHO, 1987. p.12-3.
  • 06. MENDES, I.A.C. Universidade de São Paulo Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/Centro Colaborador OMS para o desenvolvimento de pesquisa em enfermagem. Relatório Anual fevereiro 1993. Ribeirão Preto, EERP/USP. 43p.
  • 07. MENDES, I.A.C. Carta ao Leitor. Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 1 n. 1, p. 7-8, janeiro 1993.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Dez 2005
    • Data do Fascículo
      Jul 1997
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