RESUMO
A análise mecanística de pavimentos consiste na determinação das respostas estruturais com base nos princípios da mecânica, calculando tensões, deformações e deslocamentos considerando as propriedades dos materiais constituintes, a geometria da estrutura, as condições de contorno e o carregamento aplicado. Essa abordagem é fundamental para compreender o comportamento dos pavimentos sob diferentes condições de solicitação, permitindo a previsão de falhas e a otimização do desempenho estrutural. A deformabilidade dos materiais que compõem o pavimento e suas relações tensão-deformação são aspectos críticos para a análise estrutural. Assim, a importância de ensaios de módulo de resiliência (MR) e deformação permanente (DP) para avaliar o comportamento das misturas. Esses ensaios fornecem dados essenciais sobre a resposta elástica e plástica dos materiais, que influenciam diretamente a capacidade do pavimento de suportar cargas repetidas ao longo do tempo. Neste contexto, este estudo avaliou o desempenho mecânico de um solo laterítico fino estabilizado com cal e polímero acrílico industrial, seguindo a Metodologia de Classificação Universal de Solos Lateríticos (CUSL). Foram realizados ensaios de CBR, resistência à tração e resistência à compressão simples e módulo de resiliência. A estabilização com cal, utilizando o teor mais econômico, proporcionou ganhos significativos de resistência, com o melhor desempenho observado após 28 dias de cura. Os resultados evidenciaram que o tempo de cura influencia diretamente a resistência dos solos estabilizados, com períodos mais prolongados resultando em melhorias substanciais nas propriedades mecânicas. Entre os teores de polímero estudados, a mistura SLC + PL5% destacou-se pelo melhor desempenho em todas as propriedades mecânicas avaliadas, reforçando a viabilidade técnica do uso de estabilizantes alternativos na engenharia de pavimentos.
Palavras-chave:
Propriedades mecânicas; estabilização de solos; pavimentação
ABSTRACT
The mechanistic analysis of pavements involves determining structural responses based on the principles of Mechanics, calculating stresses, strains, and displacements while considering the properties of constituent materials, the geometry of the structure, boundary conditions, and the applied loading. This approach is fundamental for understanding pavement behavior under different loading conditions, enabling the prediction of failures and the optimization of structural performance. The deformability of the materials composing the pavement and their stress-strain relationships are critical aspects of structural analysis. The importance of resilient modulus (MR) and permanent deformation (PD) tests to evaluate the behavior of mixtures. These tests provide essential data on the elastic and plastic responses of materials, which directly influence the pavement's ability to withstand repeated loads over time. In this context, this study evaluated the mechanical performance, of a fine lateritic soil stabilized with lime and industrial acrylic polymer, following the Universal Classification Methodology for Lateritic Soils (CUSL). Tests were conducted for CBR, tensile strength, unconfined compressive strength and resilient modulus. Stabilization with lime, using the most economical content, provided significant strength gains, with the best performance observed after 28 days of curing. The results demonstrated that curing time directly influences the strength of stabilized soils, with longer periods resulting in substantial improvements in mechanical properties. Among the polymer contents studied, the SLC + PL5% mixture stood out for its superior performance in all evaluated mechanical properties, reinforcing the technical feasibility of using alternative stabilizers in pavement engineering.
Keywords:
Mechanical Properties; soil stabilization; paving
1. INTRODUÇÃO
Os pavimentos asfálticos são compostos por quatro camadas principais: o revestimento asfáltico, a base, a sub-base e o reforço do subleito. Estas três últimas camadas possuem função estrutural, uma vez que a tensão a que o revestimento está submetido se dissipa através delas, e é função da mecânica dos pavimentos projetar adequadamente a espessura das camadas e combinação dos materiais constituintes, a fim de obter um pavimento com tensões e deformações limitadas [1].
As concentrações de óxidos e hidróxidos de ferro e alumínio (sesquióxidos) em alguns solos lateríticos concrecionados ou pedregosos podem chegar a até 80% do produto da laterização. O argilomineral predominante na fração fina desses solos é a caulinita, cuja atividade coloidal é reduzida. Essa atividade é ainda mais reduzida quando a caulinita está associada a óxidos e hidróxidos de ferro ou alumínio, que frequentemente a revestem [2]. A caulinita desempenha um papel fundamental na resistência dos solos lateríticos, pois suas propriedades físicas e químicas conferem maior coesão e estabilidade, reduzindo a suscetibilidade à erosão e ao colapso. Além disso, sua presença auxilia na retenção de água no solo, contribuindo para a manutenção da estrutura e resistência ao longo do tempo.
Nos últimos anos, uma abordagem mecanicista-empírica de dimensionamento de pavimentos tem se desenvolvido frente aos métodos empíricos, ainda válidos, agregando os conceitos da mecânica dos materiais para previsão do comportamento do conjunto. Dentre os métodos inseridos nesta nova abordagem, VENKATESH et al. [3] destaca o de limitação de ruptura por cisalhamento, o de deflexão, de regressão com base no desempenho do pavimento e, finalmente, o método mecanístico-empírico que, segundo BASTOS [4], determina os valores de tensão-deformação a partir de simulações analíticas ou numéricas com base nos dados de propriedades dos materiais.
FARIAS [5] aborda em sua pesquisa que climas tropicais, a exemplo do Brasil e da África, favorecem a formação em grandes quantidades de solos lateríticos, que são caracterizados como materiais de baixa capacidade de carga para camadas de pavimento flexíveis [6] e, em muitos casos, é observado que esses solos não atendem às especificações em termos de limites de Atterberg e outros parâmetros de resistência e, com isso, precisam de melhorias para possibilitar o uso em camadas estruturais do pavimento [7].
Considerando que estes solos cobrem 19% da superfície terrestre [5], a técnica de promover melhoramento ou estabilização do solo se torna uma solução adequada para a problemática. O comportamento mecânico do solo laterítico pode ser melhorado pela adição de cal ou cimento, no entanto, estes conferem também rigidez ao material.
PATRÍCIO [8] avaliou o comportamento de três solos estabilizados com uma associação polimérica para a utilização em camada de base em pavimentos flexíveis e obteve ganhos de CBR, resistência à tração, resistência à compressão simples e módulo de resiliência.
Este estudo tem como principal objetivo avaliar as propriedades mecânicas de um solo laterítico fino estabilizado com cal e polímero, visando otimizar a sua utilização em camadas de base e sub-base de pavimentos flexíveis.
2. MATERIAIS E MÉTODOS
O solo utilizado nesta pesquisa foi coletado e caracterizado por FARIAS [5]. De acordo com o autor, a escolha do local de coleta partiu da análise dos mapas pedológicos disponíveis para consulta pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A partir desta análise, foi feita a coleta do solo no estado de Pernambuco.
A estabilização proposta foi realizada com a aplicação de Cal Hidratada I (CH-I) Callev®, obtida no comércio local da cidade de Campina Grande-PB e com Polímero Acrílico Industrial.
2.1. Metodologia
A estabilização do solo com a cal foi realizada de acordo com os procedimentos da norma DNIT-ME 419 [9]. Nela, sugere-se que sejam preparadas soluções de solo, cal e água destilada, variando o teor de cal e homogeneizando a solução. Para cada solução preparada, deve-se medir o pH da mistura e o teor mais baixo que corresponder ao pH de 12,4 é considerado como teor mínimo de cal para proporcionar a estabilização. O pH tende a estabilizar-se e não apresentar ganhos significativos após determinados teores.
Os teores de polímero adotados nesta pesquisa advêm dos estudos de PATRÍCIO [8] e MACHADO et al. [10]. O primeiro autor estudou a modificação de solos por adição de polímeros para uso em pavimentação, analisando três variações de associação polimérica contendo Polycure, TerraDry e Polímero Acrílico Industrial semelhante ao empregado no presente estudo.
O Polycure objetiva acelerar o tempo de cura do polímero acrílico industrial, enquanto o TerraDry é agente impermeabilizante, visando reduzir a sensibilidade das partículas de solo à ação da água. O polímero acrílico industrial une as partículas de solo, formando uma estrutura coesa. Foram utilizados os teores de 2,2%, 6,4% e 10,7% de associação polimérica e, em tais associações, os teores de polímero acrílico industrial correspondiam a 1%, 3% e 5%, respectivamente.
Nos estudos de MACHADO et al. [10] os teores de associação polimérica foram 2%, 4% e 6%, dos quais o polímero acrílico industrial correspondia a 1%, 3% e 5%, respectivamente. Ambas as pesquisas citadas fizeram uso dos mesmos polímeros.
Nesta pesquisa, as amostras foram nomeadas conforme se apresenta no Quadro 1.
2.1.1. Propriedades mecânicas
Para a análise das propriedades mecânicas do solo natural e do solo estabilizado, foram moldados corpos de prova cilíndricos com dimensões de 20 cm de altura e 10 cm de diâmetro (Figura 1). O solo utilizado para a moldagem foi previamente seco ao ar, destorroado e peneirado na peneira de malha nº 4. No caso dos solos estabilizados, o processo de moldagem iniciou-se com a mistura do solo seco com cal, seguida pela adição de água e homogeneização da mistura.
Para o solo estabilizado com cal e polímero, o polímero foi inicialmente diluído em água. Como a emulsão polimérica apresentava 50,14% de resíduo sólido, foi necessário calcular o volume de água contido na massa do polímero a ser adicionado à mistura, a fim de ajustar a quantidade de água total para atingir o teor de umidade ótima do solo.
Os corpos de prova foram compactados em 10 camadas, com 10 golpes aplicados em cada camada. Entre as camadas, foi realizada a escarificação da superfície para garantir uma melhor aderência entre elas. Após a moldagem, os corpos de prova de solo estabilizado foram submetidos a um processo de cura de 7 dias em câmara úmida. O período de cura de 7 dias foi adotado considerando a aplicação prática do solo em pavimentação, uma vez que períodos mais longos de cura até a liberação do trecho executado podem se tornar inviáveis em campo.
2.1.1.1. Resistência à compressão simples
Para avaliar a tensão máxima que corpos de prova dos solos natural e estabilizados podem suportar antes de romper, quando submetidos a uma carga axial crescente, foram executados ensaios de compressão simples de acordo com as orientações das normas DNIT-ME 201 [11], DNIT-ME 202 [12], DNIT-IE 004 [13], ABNT NBR 12025 [14] e ABNT NBR 12770 [15].
Tais ensaios foram realizados com deformação controlada, aplicando-se uma taxa de deformação de 1 mm/min até a ruptura, e a resistência calculada com base na carga máxima de ruptura e na área da seção transversa. A Figura 2 ilustra a execução do ensaio de RCS.
2.1.1.2. Resistência à tração
O ensaio de resistência à tração por compressão diametral foi realizado seguindo os procedimentos estabelecidos pela norma DNIT-ME 136 [16], conforme instrução da norma DNIT-ME 434 [17], utilizando carregamento estático crescente até a ruptura. A montagem do aparato de frisos na prensa é exibida na Figura 3.
Para que os corpos de prova do ensaio atendessem aos requisitos de dimensões da norma DNIT-ME 434 [17], foram compactados corpos de prova de 20 cm de altura e 10 cm de diâmetro e, então, serrados em corpos de prova com altura entre 5 e 7 cm.
2.1.1.3. Módulo de resiliência
O ensaio de módulo de resiliência (MR) foi realizado utilizando norma DNIT-ME 134 [18]. No ensaio de MR, conforme Tabela 1, na primeira etapa (condicionamento) foram aplicados 500 ciclos de carga para cada par de tensões, a fim de eliminar as deformações permanentes que podem ocorrer nas primeiras aplicações de tensão desvio.
Em sequência, para a determinação do módulo de resiliência foram aplicados 18 pares de tensões com 100 ciclos de carga cada, sendo definido o MR médio das últimas 10 repetições de carga. A frequência das cargas repetidas na tensão desvio foi de 1 Hz, com duração de pulso de carga de 0,1 segundo e descanso de 0,9 segundo.
3. RESULTADOS
Os resultados dos ensaios de granulometria e de limites de liquidez e de plasticidade são apresentados na Tabela 2. A partir deles, foi realizada a classificação conforme a metodologia TRB, resultando em um solo A-7-6, solo argiloso considerado ruim para uso em subleito.
Com base na análise granulométrica e nos parâmetros classificatórios obtidos nos ensaios de compactação mini-MCV e perda de massa por imersão, foi possível enquadrar o solo segundo as diretrizes da Metodologia MCT e do sistema G-MCT.
Para a classificação do solo laterítico seguindo a metodologia de CUSL, é necessária, após a comprovação do caráter laterítico do solo através da gênese química, a avaliação da granulometria do material, para definir se trata-se de um solo laterítico fino (SLF), solo laterítico arenoso (SLA) ou solo laterítico pedregulhoso (SLP).
O passante na peneira #200 representa 57,39%, conforme apresentado na Tabela 3, classificando este solo como SLF. A etapa seguinte é a determinação do valor de adsorção de azul de metileno (VA): quando VA ≤ 3,00 g/100g, são feitos os ensaios de Limite de Retração (LR) e CBR para finalizar a classificação do solo.
De acordo com os ensaios realizados, conforme Tabela 4, têm-se valor de adsorção de azul de metileno da ordem de 1,86 g/100g. Pela metodologia da CUSL, foi necessária a realização dos ensaios de limite de retração e CBR. Para LR ≥ 20% e CBR ≥ 10%, obteve-se solo de classificação SLF12.
Realizando a comparação entre as classificações TRB, MCT, G-MCT e a CUSL, nota-se considerável diferença entre as metodologias. A TRB inviabiliza o aproveitamento do solo para pavimentação. Para a MCT e G-MCT, o solo estudado estaria em 4° lugar em prioridade de escolha para utilização em camadas de base e sub-base.
3.1. Estabilização do solo
Como previamente apresentado, o solo PE-1 foi estabilizado com a cal hidratada I (CH-I), seguindo as diretrizes da norma DNIT-ME 419 [9]. A Tabela 5, a amostra com adição de 2% de cal já apresentou pH acima do valor de referência indicado pela norma, sendo este percentual adotado como o teor em que a cal proporciona a estabilização do solo.
A adição do polímero, conforme mencionado anteriormente, foi realizada para os teores de 1%, 3% e 5%. Posteriormente, foi realizado ensaio de compactação, cujas curvas podem ser observadas na Figura 4 e, consequentemente, as umidades ótimas e densidades aparentes secas máximas apresentadas na Tabela 6.
Densidade máxima aparente seca e teor de umidade ótimo do solo natural e dos solos estabilizados.
Com a análise das curvas de compactação, observou-se redução no peso específico aparente seco entre o solo natural e os solos estabilizados. A adição do polímero acrílico industrial causou grande impacto no peso específico, mas pouca variação no teor de umidade das misturas propostas. Comparando as misturas com polímero, aquela que apresentou maior peso específico aparente foi a SLC + PL3%. O solo com adição de 5% de polímero apresentou redução no teor de umidade, se comparadas às misturas de 1% e 3%, que apresentaram mesmo valor de umidade ótima.
Os resultados obtidos por PATRÍCIO [8] para o ensaio de compactação não obtiveram padrão bem definido. Dos quatro solos estabilizados com associação polimérica, três apresentaram aumento de massa específica. Apenas um apresentou comportamento semelhante ao desta pesquisa, e o autor justificou que a redução do peso específico se deu pelo solo se tratar de uma estabilização granulométrica com pó de pedra. Assim, o polímero acrílico industrial agiu apenas nas partículas de solo, tornando a mistura com pouca quantidade de finos, consequentemente.
Na pesquisa de MACHADO et al. [10] houve redução da massa específica do solo com o aumento do teor de associação polimérica. Os autores consideram a redução esperada, uma vez que a massa específica do polímero é menor do que a do solo.
3.2. Índice de suporte califórnia
Apesar de ser um ensaio simples, de fácil entendimento e execução, cujos resultados são reconhecidos mundialmente, o CBR ainda sofre fortes críticas na pavimentação. Isto porque a metodologia do ensaio não é capaz de representar os esforços a que o pavimento está submetido, se fazendo necessária a complementação dos estudos com análise mecanística-empírica para avaliar o desempenho estrutural do pavimento.
A partir da análise da Figura 5, que apresenta os resultados de CBR e expansão das amostras estudadas e, tendo em vista os valores de referência do Manual de Pavimentação [19], o solo laterítico natural (PE-1) atende aos requisitos apenas para as camadas de subleito e reforço de subleito.
Para camada de sub-base, apesar de o solo atingir aos requisitos de CBR e expansão, o índice de grupo é diferente de zero. Todos os solos atingem os critérios de CBR e expansão para utilização do material na camada de sub-base, sendo necessária a verificação do índice de grupo para os materiais estabilizados. Para a camada de base, apenas o SLC possui CBR e expansão com valores satisfatórios.
Os resultados de PATRÍCIO [8] e MACHADO et al. [10] corroboram entre si, havendo ganhos significativos nos valores de CBR comparando o solo natural e os estabilizados. Quanto maior o teor de associação polimérica utilizado, maior o ganho de CBR. MACHADO et al. [10] ainda avaliou a influência da cura, e notou ganho de valor de CBR com 7 dias de cura.
3.3. Resistência a compressão simples e resistência a tração por compressão diametral
Para estes ensaios foram considerados adequados os corpos de prova com altura de 200 ± 2 mm e diâmetro de 100 ± 1 mm, umidade de moldagem compreendida entre ± 0,5 ponto percentual em relação à umidade ótima e grau de compactação entre 98% e 102% da densidade determinada no ensaio de compactação. Posteriormente, para o ensaio de RT, os corpos de prova foram serrados para atender ao requisito da norma DNIT-ME 136/2018, utilizada como referência para resistência à tração pela norma do ensaio de fadiga, DNIT-ME 434/2021, em que os CPS devam ter altura compreendida entre 35 e 65 mm.
Os resultados de resistência à compressão simples (RCS) e resistência à tração por compressão diametral (RTCD) estão apresentados na Tabela 7 e Figuras 6 e 7.
A incorporação de cal ao solo natural promoveu ganhos da ordem de 47% na resistência à compressão simples e 102% na resistência à tração por compressão diametral para 7 dias de cura, o que se assemelha, em termos de tendência observada, aos estudos de PATRÍCIO [8] e MACHADO et al. [10]. LIMA et al. [20] obteve em seu estudo valores de resistência à compressão simples de 0,56 MPa para um solo laterítico arenoso estabilizado com 2% de cal e 5% de cinza do bagaço de cana de açúcar.
Os autores mencionados também constataram uma tendência de aumento na resistência à tração (RT) e na resistência à compressão simples (RCS) após 28 dias de cura, embora os valores obtidos tenham sido inferiores aos observados no presente estudo. Esses resultados reforçam a influência significativa do tempo de cura no desempenho mecânico do material. No entanto, é importante destacar que a associação polimérica empregada por PATRÍCIO [8] e MACHADO et al. [10] incluía um polímero adicional com a função de acelerar o tempo de cura do polímero acrílico industrial utilizado. Dessa forma, os resultados obtidos para 7 dias de cura nos estudos desses pesquisadores não apresentam uma correlação direta com os resultados de 7 dias de cura observados nesta pesquisa.
O processo de estabilização pela mistura do solo com a cal ocorre logo após o umedecimento da mistura, quando se iniciam as reações entre os íons Ca2+ e OH− provenientes da cal e os componentes do solo. Esse processo induz uma troca iônica, na qual os cátions Na+ e K+ da argila são substituídos por Ca2+, resultando em um aumento na concentração eletrolítica nos poros do solo.
Conforme os componentes argilosos do solo reagem com a cal, iniciam-se reações cimentantes, impulsionadas pela interação entre as partículas reativas do solo, especialmente a sílica (SiO2), formando compostos cimentantes. O pH elevado da mistura, decorrente das moléculas de Ca(OH)2 leva à dissolução das moléculas de silício e alumínio, que se combinam com os íons de cálcio, originando compostos cimentícios que interligam as partículas do solo.
Contudo, a adição do polímero promoveu a redução das resistências à compressão simples e à compressão por tração diametral para os tempos de cura de 7 e 28 dias. A RTCD dos solos estabilizados teve maior redução entre as amostras de solo-cal e solo-cal-polímero com teor de 3%, com valor de aproximadamente 15%.
3.4. Módulo de resiliência
Para este ensaio foram considerados adequados os corpos de prova com altura de 200 ± 2 mm e diâmetro de 100 ± 1 mm, umidade de moldagem compreendida entre ± 0,5 ponto percentual em relação à umidade ótima e grau de compactação entre 98% e 102% da densidade determinada no ensaio de compactação.
Foram realizados os ensaios de módulo de resiliência para o solo natural e os solos estabilizados. Os parâmetros de regressão foram obtidos através de regressão múltipla não linear no programa “STATISTICA”, versão 10.
Entre os modelos de regressão, o modelo composto foi o que melhor explicou o comportamento resiliente do solo. O valor de R2 para todos os ensaios neste modelo foi superior a 0,8. O modelo de tensão confinante apresentou boa conformidade para os solos estabilizados, enquanto o modelo de desvio apresentou valor de R2 aceitável apenas para o solo PE-1.
De modo geral, os coeficientes de regressão k2 e k3 indicam quais tensões possuem mais influência no valor de MR do solo. Um valor alto de tensão, submetido a um coeficiente de regressão negativo indica redução no módulo de resiliência do material. Para o solo natural, tanto o modelo clássico quanto o composto apresentaram o mesmo comportamento: o coeficiente de regressão associado à tensão desviadora é negativo para ambos os casos. Assim, quanto maior o valor de tensão desviadora, menor o valor de MR [21].
O coeficiente de regressão k2 para o modelo composto apresentou valores positivos e superiores ao coeficiente k3. Isso indica que o aumento da tensão confinante resulta em um acréscimo do módulo de resiliência. Sabendo que a tensão de desvio é responsável pela deformação angular dos materiais, enquanto a tensão de confinamento influencia a deformação volumétrica, o incremento da deformação volumétrica promove um aumento do atrito entre as partículas.
As Figuras 8, 9 e 10 apresentam, respectivamente, um comparativo entre os valores de MR mínimo, médio e máximo entre o solo natural e os solos estabilizados para 7 e 28 dias de cura.
Comparativo do MR mínimo entre o solo natural e os solos estabilizados, para 7 e 28 dias de cura.
Comparativo do MR médio entre o solo natural e os solos estabilizados, para 7 e 28 dias de cura.
Comparativo do MR máximo entre o solo natural e os solos estabilizados, para 7 e 28 dias de cura.
Como esperado, para 28 dias houve aumento no valor do módulo de resiliência para o solo-cal, que pode ser atribuído à rigidez que a cal promove no solo. Analisando os valores de MR médio, o SLC+PL3% apresentou os ganhos mais significativos de rigidez.
Os resultados de módulo de resiliência foram considerados satisfatórios. As variações no módulo de resiliência (MR) observadas para as diferentes propostas de solo estabilizado ao longo de 7 e 28 dias de cura podem ser justificadas com base nas interações físico-químicas e na evolução das propriedades mecânicas dos materiais ao longo do tempo.
Para o SLC, com 7 dias o MR inicial é relativamente baixo, refletindo a fase inicial de cura, onde a reação pozolânica entre a cal e o solo ainda está em estágio inicial. Aos 28 dias é possível observar um aumento significativo no MR, indicando que a reação pozolânica atingiu um estágio mais avançado. A formação dos silicatos de cálcio hidratados (C-S-H) e aluminatos de cálcio hidratados (C-A-H) contribui para o aumento da rigidez e da resistência do material.
Com 7 dias, o SLC+PL1% resultou em um MR ligeiramente inferior ao do SLC, indicando que o polímero começa a revestir as partículas, impedindo a ação da cal e atuando como agente ligante. Não houve alteração significativa para 28 dias. O mesmo comportamento pode ser observado para o teor de 5% de polímero. Em virtude do aumento do teor, a cal possivelmente não desempenha mais papel significativo para ganho de resistência, sendo o ganho dependente da cura do polímero e da sua capacidade de revestir e unir as partículas.
VON DER OSTEN [22], PASCOAL [23] e SERRA [24] verificaram que solos lateríticos naturais podem apresentar módulo de resiliência variando de 100 a 500 MPa. PATRÍCIO [8] observou incremento no módulo de resiliência dos solos A-2-6, A-5 e A-2-4 estabilizados com a associação polimérica em comparação com o solo natural.
4. CONCLUSÕES
A estabilização com 2% de cal demonstrou ser eficaz, atingindo o pH mínimo normatizado. A adição de polímero, por sua vez, resultou em redução do peso específico aparente seco e em um leve aumento no teor de umidade.
Em termos de desempenho mecânico, o solo natural mostrou-se adequado apenas para subleito ou reforço de subleito, enquanto os solos estabilizados com cal e polímero atenderam aos requisitos de CBR e expansão para sub-base. Apenas o solo estabilizado com cal (SLC) atendeu aos critérios para camada de base, sob uma energia intermediária de compactação. A adição de cal promoveu ganhos significativos na resistência à compressão simples (47%) e na resistência à tração por compressão diametral (102%) após 7 dias de cura.
Os resultados do módulo de resiliência (MR) foram satisfatórios, com variações ao longo de 7 e 28 dias de cura explicadas pelas interações físico-químicas e pela evolução das propriedades mecânicas. Para o SLC, o MR inicial foi baixo aos 7 dias, refletindo a fase inicial da reação pozolânica, mas aumentou significativamente aos 28 dias devido à formação de C-S-H e C-A-H. A adição de polímero (SLC + PL1% e SLC + PL5%) resultou em MR ligeiramente inferior aos 7 dias, indicando que o polímero atua como agente ligante, revestindo as partículas e limitando a ação da cal. Aos 28 dias, o MR manteve-se estável, sugerindo que o ganho de resistência depende principalmente da cura do polímero.
Dentre as metodologias de classificação de solos empregadas, a Metodologia de Classificação Universal de Solos Lateríticos (CUSL) destacou-se por sua eficácia na avaliação do solo natural, reforçando seu potencial de aplicação em camadas granulares de pavimentos.
A estabilização do solo com cal, utilizando o teor mais econômico, proporcionou um ganho satisfatório de resistência, com o melhor desempenho observado após 28 dias de cura. Os ensaios realizados evidenciaram que o tempo de cura influencia diretamente a resistência dos solos estabilizados, sendo que períodos mais prolongados resultam em melhorias significativas nas propriedades mecânicas do material.
Entre os teores de polímero estudados, a mistura SLC + PL5% apresentou o melhor desempenho em todas as propriedades mecânicas, reforçando a viabilidade técnica do estabilizante alternativo analisado.
5. AGRADECIMENTOS
Ao Laboratório de Engenharia de Pavimento – LEP e à ATECEL por disponibilizar os equipamentos para a realização desta pesquisa.
À FAPESQ e à CAPES pela concessão das bolsas e apoio financeiro aos autores.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
08 Set 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
14 Fev 2025 -
Aceito
17 Jul 2025




















