Acessibilidade / Reportar erro

Efeitos das variáveis de formulação de suspensões sobre o comportamento reologico e sobre a microestrutura de filmes cerâmicos NiO-YSZ

Effect of slurry variables formulation on the reological behavior and microstructure of NiO-YSZ ceramic film

Resumos

A preparação de filme cerâmico granular compósito NiO-YSZ por deposição a jato de suspensão exige rigoroso controle das variáveis de processamento, especialmente a reologia da suspensão devido sua importância tanto na viabilização do processo de deposição como na definição da microestrutura do filme final. Neste trabalho foi estudado como as variáveis de formulação da suspensão afetam sua viscosidade e a microestrutura do filme granular. Foram escolhidas seis variáveis de formulação: teor de sólidos, razão em massa dos componentes NiO e YSZ, granulometria do NiO, teor de dispersante, tipo do modificador reologico e misturas de solventes. O efeito dessas variáveis sobre a reologia da suspensão foi avaliado com base no modelo de Mooney para suspensões concentradas. O planejamento fatorial fracionário foi escolhido como ferramenta estatística de avaliação dos efeitos das variáveis de formulação. Foi observado que os defeitos no filme granular são gerados durante o processo de secagem e ocorrem devido à seleção incorreta de aditivos de formulação da suspensão.

Planejamento fatorial fracionário; viscosidade; tixotropia; formulação de suspensão; microestrutura


The preparation of granular composite NiO-YSZ ceramic films, prepared by slurry spraying, demands rigorous control of processing variables, specially the slurry rheology due to its influence on the deposition process as well as on the film microstructure. This paper studied the influence of suspension formulation on both rheological behavior and microstructure of granular film. The following variables were chosen to prepare the suspensions: solid concentration, the NiO/YSZ mass proportion, NiO particle size, dispersant amount, kind of rheological changer, and mixture of solvents. The effect of these variables on the suspension rheology was analyzed considering the Mooney’s model for concentrated suspension. By using factorial fractional design it was possible to evaluate the formulation variables effects. It was determined that the defects present on the granular film are generated during the drying process and they happen due to wrong addictive choice.

Fractional Factorial design; viscosity; tixotropy; slurry formulation; microstructure


Efeitos das variáveis de formulação de suspensões sobre o comportamento reologico e sobre a microestrutura de filmes cerâmicos NiO-YSZ

Effect of slurry variables formulation on the reological behavior and microstructure of NiO-YSZ ceramic film

Mota Lima, A.B.; Souza, D.P.F.

Departamento de Engenharia de Materiais, UFScar, LAPCEC, CEP 13565-905. e-mail: andressaml@yahoo.com.br, dulcina@power.ufscar.br

RESUMO

A preparação de filme cerâmico granular compósito NiO-YSZ por deposição a jato de suspensão exige rigoroso controle das variáveis de processamento, especialmente a reologia da suspensão devido sua importância tanto na viabilização do processo de deposição como na definição da microestrutura do filme final. Neste trabalho foi estudado como as variáveis de formulação da suspensão afetam sua viscosidade e a microestrutura do filme granular. Foram escolhidas seis variáveis de formulação: teor de sólidos, razão em massa dos componentes NiO e YSZ, granulometria do NiO, teor de dispersante, tipo do modificador reologico e misturas de solventes. O efeito dessas variáveis sobre a reologia da suspensão foi avaliado com base no modelo de Mooney para suspensões concentradas. O planejamento fatorial fracionário foi escolhido como ferramenta estatística de avaliação dos efeitos das variáveis de formulação. Foi observado que os defeitos no filme granular são gerados durante o processo de secagem e ocorrem devido à seleção incorreta de aditivos de formulação da suspensão.

Palavras chaves: Planejamento fatorial fracionário, viscosidade, tixotropia, formulação de suspensão, microestrutura.

ABSTRACT

The preparation of granular composite NiO-YSZ ceramic films, prepared by slurry spraying, demands rigorous control of processing variables, specially the slurry rheology due to its influence on the deposition process as well as on the film microstructure. This paper studied the influence of suspension formulation on both rheological behavior and microstructure of granular film. The following variables were chosen to prepare the suspensions: solid concentration, the NiO/YSZ mass proportion, NiO particle size, dispersant amount, kind of rheological changer, and mixture of solvents. The effect of these variables on the suspension rheology was analyzed considering the Mooney’s model for concentrated suspension. By using factorial fractional design it was possible to evaluate the formulation variables effects. It was determined that the defects present on the granular film are generated during the drying process and they happen due to wrong addictive choice.

Keywords: Fractional Factorial design, viscosity, tixotropy, slurry formulation, microstructure.

1 INTRODUÇÃO

Filme compósito de Ni-YSZ empregado como anodo da célula SOFC (célula combustível de óxido sólido) é atualmente fabricado pelas vias tradicionais de processamento cerâmico a partir de óxido de níquel e óxido de zircônia sendo que o NiO é reduzido a Ni metálico em uma etapa posterior [1, 2]. A preparação de filme granular a partir de suspensões, no LAPCEC, apresentou alguns defeitos tais como: falta de recobrimento do substrato devido à aglomeração de partículas, formação de ilhas e de trincas. A formação de ilhas consiste na presença de regiões com denso empacotamento de partículas separadas por regiões com baixo empacotamento ou mesmo com ausência de qualquer material. Filmes cerâmicos preparados a partir de suspensões reportados na literatura apresentam outros tipos de defeitos, por exemplo, suspensões com 20 % em volume de sólidos apresentaram trincas perpendiculares ao eixo central da peça [3]. Nesse trabalho, há a tentativa de entender como as variáveis de formulação da suspensão afetam sua reologia e como estas variáveis estão relacionadas com os defeitos e microestruturas geradas no filme sinterizado.

Para estudar o efeito das variáveis de formulação da suspensão na reologia foi utilizada uma ferramenta estatística capaz de identificar e quantificar a média desses efeitos. Esse estudo foi realizado empregando-se planejamento fatorial fracionário em dois níveis com resolução III para investigar seis variáveis de formulação sobre as propriedades reológicas das suspensões. As formulações preparadas conforme a matriz de planejamento foram empregadas para fabricação do filme cerâmico a fim de avaliar os defeitos presentes após a queima.

A avaliação dos parâmetros reológicos será discutida baseando-se em modelos para suspensões concentradas válidos para suspensões defloculadas e com teor em sólido superior a 15%(f =0.15). Para a viscosidade, há dois modelos que descrevem o efeito do teor de sólidos na suspensão. O Modelo proposto por Mooney [4] é descrito pela equação 1:

(1)

onde hr é a viscosidade relativa dada pela relação (viscosidade da suspensão / viscosidade do meio); f é a fração em volume de sólidos e K é uma constante. O modelo proposto por Dougher-Krieger [5] é descrito pela equação 2:

(2)

onde [h] é a viscosidade intrínseca. Posteriormente ao trabalho de Mooney, o parâmetro K foi relacionado com o inverso da concentração máxima de sólidos que a suspensão suporta, K=1/jmax, de modo a validar tais equações, na condição de contorno onde a viscosidade é infinita e f = jmax. A viscosidade infinita é alcançada na concentração máxima de sólidos (jmax) onde as partículas estão em contato uma com as outras dentro de um empacotamento sendo impedidas de movimentarem-se. O parâmetro jmax pode ser entendido como sendo a fração de sólidos cujo empacotamento discreto (esferas de mesmo tamanho) em vários arranjos que vão desde o cúbico simples (jmax=0,52) até o arranjo hexagonal compacto (jmax=0,74). Mais tarde, outros autores [6], estenderam o entendimento do parâmetro jmax para empacotamento de uma distribuição contínua de tamanho de esferas seguindo os modelos de empacotamento de Andreasen [7] e Alfred [8].

Por essas relações, percebe-se que a viscosidade das suspensões depende apenas de dois fatores: a concentração de sólidos (j) e o teor máximo de partículas que o fluido pode suportar (jmax). A princípio, qualquer parâmetro que afete um desses dois fatores pode ser discutido pela medida de viscosidade. O jmax é afetado pelos fatores que afetam o empacotamento de partículas tais como tamanho de partícula, distribuição de tamanho de partícula, forma da partícula e rugosidade superficial da partícula [6]. A análise da viscosidade levando em consideração o fator jmax pode ser realizado somente para sistema completamente defloculado.

Por outro lado, suspensões floculadas podem ter o valor da viscosidade discutido em relação ao grau de floculação (número de partículas que participam de cada floco) pela alteração do parâmetro j. Por exemplo, quando o pó previamente disperso na suspensão inicia um processo de floculação de partículas ocorre o aprisionamento de líquido nos interstícios do floco fazendo com que uma menor fração de líquido fique disponível para promover o cizalhamento das partículas e, como conseqüência, ocorre o aumento da viscosidade. Este aumento na viscosidade pode ser interpretado como um pseudo aumento do teor de sólidos em função da menor quantidade de líquido disponível para cisalhar. Não é uma maneira segura discutir o estado de aglomeração pelo parâmetro jmax em sistema floculado pois este pode altera-se com a fração em volume de sólido como já foi observado anteriormente [9]. Além disso, não há regras claras para o empacotamento de flocos, porém sabe-se que é sempre menor do que o empacotamento de partículas esféricas devido à fatores tais como: baixo empacotamento dentro do floco e maior rugosidade superficial. Portanto, o grau de aglomeração floculação pode ser seguramente discutido através da alteração da pseudo fração em volume de sólidos, j.

A tixotropia descreve a dependência da viscosidade com o tempo e consiste na redução da viscosidade aparente com o tempo de aplicação de uma taxa de cisalhamento constante. Quando suspensões que apresentam comportamento "shear thining" apresentam o comportamento tixotropico, o fenômeno de tixotropia pode ser entendido como a quebra de aglomerados fracos [10], com o tempo de aplicação da taxa de cisalhamento.

2 EXPERIMENTAL

2.1 Preparação das Suspensões e Deposição dos Filmes

Os pós de partida foram zirconia estabilizada com 8% mol de Ítria (8YSZ, Tosoh) e NiSO4. Os modificadores reologicos foram o Polivinil Butirol (PVB-B-98, Monsanto,) e óleo de linhaça (OL, Campestre). Como solvente da suspensão foram utilizados álcool terpênico (Campestre) e álcool isopropílico (Synth). Como dispersante foi empregado o Octilfenolpoli(etilenoglicoleter)x (TX-100, Merck).

O NiSO4 foi tratado termicamente a 1000°C por 5h com a finalidade de obter NiO. Após tratamento térmico, o pó de NiO foi moído sob diferentes condições gerando pós com distintas distribuições de tamanho de partículas.

As suspensões foram preparadas conforme as formulações da matriz de planejamento fatorial (Tabela 1). Utilizou-se jarro de polietileno de alta densidade (HDPE) e como meio de moagem esferas de zircônia (Tosoh). Foi mantida a relação de 1:2 entre a massa de pó e massa do meio de moagem. As suspensões foram preparadas em um tempo total de 1,5 h de mistura.

As suspensões foram depositadas sobre substrato de zircônia sinterizada densa por um jato de suspensão utilizando-se aerógrafo. Para cada suspensão foram preparadas duas amostras cada qual contendo apenas uma camada. As camadas foram secas a 25 °C. As amostras foram queimadas a 1200 °C por 2 h com rampa de aquecimento de 5 °C/min até 400 °C e mantido por 0.5 h, seguida de taxa de aquecimento de 13 °C/min até 1200 °C e mantido por 2 h. O resfriamento foi realizado com taxa de 17 °C/min. As camadas depositadas tiveram espessura de camada variável entre 30 e 50 μm. Foi produzida réplicas das oitos suspensões afim de avaliar o erro experimental associado à preparação das suspensões e ao dispositivo de medida de viscosidade.

2.2 Construção de um Planejamento Fatorial Fracionário

A realização de um planejamento fatorial completo é realizada selecionando-se um número fixo de níveis (valores) para cada uma das variáveis (fatores) e em seguida o experimento é realizado com todas as combinações possíveis [11]. A análise do planejamento fatorial consiste em quantificar, em porcentagem, o efeito dos fatores sobre uma determinada resposta. Neste trabalho duas propriedades reologicas (viscosidade e tixotropia) foram as respostas do planejamento.

Planejamento fatorial fracionário é uma fração do planejamento completo. Esta fração é especialmente útil quando o pesquisador deseja identificar o efeito principal dos fatores ou variáveis sobre a resposta do sistema. Neste trabalho seis variáveis de formulação foram investigadas: razão em massa NiO/YSZ, teor de sólidos (razão em massa pó/solvente), granulometria do pó de NiO, teor de dispersante (razão em massa dispersante/pó), tipo do modificador reológico e mistura de solventes (razão em massa álcool terpênico/solvente). Um planejamento fatorial completo para essas seis variáveis realizado em dois níveis (+ e -) requer a realização de 26 experimentos, ou seja, 64 experimentos. Entretanto, usando-se um planejamento fatorial fracionário, o efeito médio (efeitos principais) das variáveis pode ser estimado enquanto o número de experimentos é significativamente reduzido. Nesse trabalho foi escolhido um planejamento fatorial fracionário saturado 26-3 com resolução III, ou seja, foi realizado apenas (½)3 dos 26 experimentos necessários para a matriz completa. Foi feita uma fração oitava. Este planejamento fracionário requer apenas a realização de oito experimentos.Vale lembrar que os efeitos cruzados não podem ser calculados numa fração (½)3 uma vez que é realizada apenas um oito avos da matriz de planejamento completo. As respostas avaliadas foram os parâmetros reológicos viscosidade e tixotropia.

Os fatores, as variáveis de formulação, e os seus níveis estão listados na Tabela 2. A seleção do nível do fator F4, concentração de dispersante, foi baseada em experimentos prévios de coluna de sedimentação. Para o nível (+) observa-se que as partículas de YSZ estavam no estado floculado, enquanto que as partículas de NiO permaneceram no estado de máxima defloculação. Ou seja, os pós de NiO e YSZ não defloculam no mesmo teor de defloculante. Os fatores F1 e F3 alteram a distribuição de tamanho de partícula da mistura (NiO-YSZ). O fator F5 consiste em testar dois aditivos distintos capazes de alterar a reologia da suspensão, empregando dois tipos de modificadoes reológico: PVB e OL. O PVB altera a reologia pois soluções de polímeros apresentam maior viscosidade do que o solvente puro. O óleo de linhaça (OL) possui baixa pressão de vapor exercendo pouca influência na velocidade de secagem do filme. O óleo de linhaça possui comportamento newtoniano e viscosidade igual a 45 cP na temperatura ambiente, enquanto que o solvente álcool é de 2,8 cP na mesma condição. Espera-se, portanto que o OL altere a viscosidade da suspensão. A seleção dos níveis do fator F6 foi feita visando avaliar o efeito da presença de álcool terpênico sobre a reologia da suspensão. Um fator importante a ser considerado na formulação da suspensão, para aplicação em estudo, é a velocidade de secagem do filme. A taxa de secagem do filme é dependente da pressão de vapor do solvente. O álcool terpênico exerce função de diminuir a velocidade de secagem do filme em relação ao solvente álcool isopropílico

A matriz de planejamento fracionário (Tabela 1) foi construída a partir de um planejamento fatorial completo das três primeiras variáveis F1, F2 e F3. A matriz completa pode ser visualizada como sendo a parte destacada em cinza na Tabela 1. Os fatores F4, F5 e F6 foram confundidos com os efeitos de interação respectivamente 123, 12 e 23 desse planejamento fatorial 23 completo. Ou seja, a combinação de níveis para os três últimos fatores (F4, F5 e F6) foi obtida através das três relações geradoras escolhidas: 4=1x2x3, 5 =1x2 e 6 =2x3. Por exemplo, o nível do fator F4 é obtido pelo produto dos sinais dos fatores F1, F2 e F3, assim, o nível do fator F4 no primeiro experimento é igual ao produto de sinais dos três primeiros fatores: (-)(-)(-)=(-). O mesmo procedimento foi utilizado para calcular o nível para os fatores F5 e F6 usando-se respectivamente as relações geradoras 5=1x2 e 6=2x3. O algoritmo para o calculo dos efeitos foi montado no programa Excel considerando as operações de matrizes da referência NETO et al. [12].

2.3 Medidas de Parâmetros Reologicos

A medida dos parâmetros reologicos foi realizada utilizando-se viscosímetro computadorizado HAAKE VT-550, sensor PK-100. O volume de suspensão utilizado em cada medida foi de 1,5 ml. Os parâmetros reológicos medidos foram a viscosidade sob alta taxa de cisalhamento e tixotropia.

O dispositivo de medida tem a configuração placa-cone onde o cone aplica uma velocidade de cisalhamento sobre o fluído e a tensão imposta pelo fluido é detectada pelo sensor. Com o valor da velocidade do cone e com a tensão imposta pelo fluido a viscosidade é medida. A avaliação dos parâmetros reológicos foi realizada segundo o programa de medição: curva de fluxo ascendente (aplicação de taxa de cisalhamento de 0 a 3000 s-1 ), patamar de 30 s na taxa de cisalhamento de 3000 s-1 seguida de curva descendente (taxa de cisalhamento de 3000 a 0 s-1). O valor da viscosidade foi calculado como a média dos valores de viscosidade obtidos no patamar na taxa de cisalhamento constante de 3000 s-1. A tixotropia foi calculada como a área da histerese entre as curvas ascedente e descente. Este procedimento não mede um valor absoluto de tixotropia mas sim um valor que serve para comparar o grau de tixotropia entre amostra desde que tenham sido medidas sob as mesmas condições. Sendo a tixotropia o fenômeno da dependência da viscosidade com o tempo temos que a viscosidade além de ser função do tempo é função da taxa de cisalhamento. Isso implica que se for empregado taxa de cisalhamento ou tempo de aplicação de taxa de cisalhamento diferentes daqueles descritos na programação de medida acima valores distintos de tixotropia serão obtidos.

2.4 Caracterização

Os pós foram caracterizados estruturalmente por Difração de Raios X (DRX Siemens, l = 1,54 Å) e caracterizados quanto ao tamanho de partícula pela técnica de sedimentação (Horiba). Os filmes cerâmicos após sinterização tiveram a microestrutura caracterizada por microscopia óptica (Olympus BX60M) e por microscopia eletrônica de varredura, MEV, (Zeiss DSM 940A).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Caracterização dos Materiais de Partida

A análise do difratograma de raios X confirmou a presença de NiO romboédrico após o tratamento térmico do pó de NiSO4, Figura 1. O pó de NiO resultante foi moído sob diferentes condições. O pó moído em moinho de bolas foi denominado "NiO grosseiro" e o pó de NiO moído em moinho de alta energia foi denominado "NiO fino". As distribuições granulométricas dos pós estão apresentadas na Figura 2.



3.2 Análise do Planejamento Fatorial Fracionário

Os efeitos das variáveis de formulação sobre a viscosidade das suspensões estão listados na tabela 3. As respostas foram duas propriedades reológicas distintas (tixotropia e viscosidade) e os cálculos dos efeitos foram realizados para cada uma dessas propriedades considerando planejamentos distintos apesar de utilizar a mesma matriz de planejamento.

Os fatores que tiveram maior influência sobre a viscosidade foram: a granulometria do NiO (F3), o teor de defloculante (F4) e o tipo de modificador reologico (F5). Já os demais fatores exerceram uma menor influência sobre a viscosidade sendo que o fator F6 apresentou influência sem significância estatística. A presença de álcool terpênico não exerce influência sobre a viscosidade, confirmando que este é um aditivo para controlar a taxa de secagem do filme. O fator F1 descreve que o aumento da fração NiO/YSZ reduz a viscosidade em aproximadamente 10%. Em outras palavras, tanto o aumento da quantidade de YSZ ou a diminuição de NiO dentro dessa fração faz com que a viscosidade aumente. Experiências em nosso laboratório já tinham demonstrado uma maior dificuldade de preparação de suspensões com maior fração de YSZ por apresentarem elevada viscosidade. O fato da quantidade de YSZ elevar a viscosidade é atribuída à maior tendência de floculação da YSZ. O aumento do teor de sólidos aumenta a viscosidade em 15.6% (fator F2) o que está de acordo com as teorias para suspensões concentradas onde a viscosidade aumenta exponencialmente com a fração em volume de sólidos. Apesar do fator F2 utilizar o teor de sólidos em massa, este pôde ser relacionado com o teor de sólidos em volume através da densidade.

Dentre os fatores que exercem maior influência sobre a viscosidade, o fator F5 é o único que não está relacionado com a distribuição geométrica das partículas em suspensão. O fator F5 simplesmente altera a viscosidade do meio fluido que recebe as partículas para dispersão. Entende-se por meio fluído a mistura de solvente com os aditivos solúveis. Substituir PVB no teor de 4% em peso (em relação à massa de pó) por óleo de linhaça no teor de 25% em peso (em relação à massa de solvente) torna a viscosidade 66% menor. Em outras palavras, a presença de polímero em solução (PVB) aumenta a viscosidade em torno de 66%. O PVB exerce duas funções na preparação de filme cerâmico granular: conferir resistência mecânica ao filme e elevar a viscosidade do fluído da suspensão.

Os fatores F3 e F4 estão relacionados com a distribuição geométrica das partículas na suspensão. O aumento do teor de dispersante reduz a viscosidade em 54%. O pó é adicionado ao fluído na forma de aglomerados que serão quebrados pela ação do solvente, que depende da tensão superficial e constante dielétrica, e da presença de dispersante. O dispersante torna a suspensão estável através do mecanismo de defloculação estérico. No processo de dispersão do pó, os aglomerados quebrados liberam o ar aprisionado dentro dos interstícios do aglomerado. Assim, o volume inicial do sólido (volume de partículas mais o volume de ar aprisionado) adicionado ao solvente é aparentemente maior que o volume de sólidos depois da quebra de aglomerados (apenas volume de partículas) e com isso a viscosidade é menor no sistema desaglomerado.

Utilizar partículas de NiO fina ao invés de grosseiras eleva a viscosidade em 58%. Em outras palavras, utilizar NiO grosseiro reduz a viscosidade em 58%. O empacotamento de partículas aumenta quando os interstícios do empacotamento das partículas grosseiras são preenchidos pelas partículas de menor diâmetro. É esperado que a mistura de pó YSZ com NiO grosseiro resulte em maior empacotamento de partícula na suspensão e no filme. Como o empacotamento das partículas é maior quando se usa NiO grosseiro, o jmax será maior do que quando se utiliza NiO fino e como resultado da análise do Modelo de Mooney a viscosidade é menor.

Os valores de tixotropia, Tabela 1, tiveram média baixa e em torno de 1 Pa/s. Há evidências suficientes para afirmar que o fenômeno de tixotropia não ocorre no sistema estudado. A curva ascendente e descendente da viscosidade versus a taxa de cisalhamento foi coincidente nos oito experimentos. O fenômeno de tixotropia caracteriza-se pela não coincidência entre as curvas descendente e ascendente. Os seis efeitos médios sobre a tixotropia tiveram média em torno de zero. O valor dos efeitos sobre a tixotropia não tiveram significância estatística com 95% de confiança.

Apesar do planejamento fatorial fracionário de dois níveis com resolução III confundir os efeitos médios de segunda e terceira ordem com os efeitos principais, os resultados obtidos tiveram uma boa aproximação, uma vez que foi possível identificar as variáveis que exercem maior influência sobre a viscosidade.

3.3 Correlação entre Microestrutura e Variáveis de Processamento

Cada uma das oito suspensões foi utilizada para deposição a jato de uma camada sobre substrato de zircônia densa. Os filmes após sinterização foram observados ao microscópio óptico e ao microscópio eletrônico de varredura e as imagens estão mostradas nas Figuras 3 e 4, respectivamente. Observa-se que alguns grupos de microestruturas foram formados seguindo certos fatores F5 e F3 e por isso as micrografias foram organizadas de maneira a tornar esses grupos perceptíveis. Nas Figuras 3 e 4, a coluna representa o fator F3 sendo a primeira coluna o nível F3(-), e a segunda o nível F3(+); as linhas representam o fator F5, sendo as duas primeiras linhas suspensões com óleo de linhaça e as duas últimas linhas suspensões com PVB. As escalas das micrografias estão diferentes pois, para cada microestrutura, foi escolhido o menor aumento que permitisse observar a microestrutura característica. Para análise dos defeitos superficiais é importante utilizar o menor aumento que possibilite visualizar maior área representativa da amostra.










3.3.1 Efeito da Presença de Óleo de Linhaça e PVB (F5) sobre a Microestrutura

O grupo de suspensões que utilizaram óleo de linhaça apresentou microestruturas distintas do grupo que utilizaram PVB, comparando-se respectivamente as quatro microestruturas superiores Figuras 3-4(A, B, E, F) com as quatro microestruturas inferiores Figuras 3-4(C, D, G, H). O uso de PVB dissolvido em álcool resulta em filmes de maior homogeneidade no plano de observação Figuras 3-4(A, B, E, F). O uso de PVB na formulação da suspensão demonstrou estar relacionado com os filmes livre de defeitos, o que demonstra a importância do PVB em conferir resistência mecânica ao filme superior às tensões geradas durante o processos de secagem. Já o grupo que utilizou óleo de linhaça, Figuras 3-4(C, D, G, H), apresentou defeitos físicos (buraco e trincas) e separação de fases. A separação de fases, Figura3(A), vista no microscópio óptico, apresenta o NiO (fase de cor verde) distintamente separada da zircônia (fase de cor branca).

3.3.2 Efeito de Interação entre Fatores F5 e F3

Dentro do grupo de suspensões que utilizaram óleo de linhaça encontram-se dois tipos de defeitos quando analisado o efeito do fator tipo de pó de NiO, o que é dito ser efeito cruzado dos fatores F5 e F3. Quando se utiliza o pó de NiO fino observa-se defeitos tipo buracos Figuras 3-4(E, F). Já quando se utiliza pó de NiO grosseiro observa-se outros dois tipo de defeitos: separação de fases Figuras 3-4(A) e trincas Figuras 3-4 (B).

3.3.3 Efeito da Granulometria do NiO (F3) sobre a Microestrutura

O efeito da granulometria do NiO sobre o empacotamento de partículas dentro do filme pode ser realizado comparando-se a primeira e segunda coluna das Figuras 3-4. Em metade dos experimentos utilizando NiO-grosseiro, houve separação de fases. No exp-1 houve a separação de fases mostrada nas Figuras 3-4(A). No exp-3, Figuras 3-4(D), houve separação de fases por decantação das partículas grosseira o que resulta numa superfície contendo apenas as partículas finas de zirconia, Figura 4(A). Separação entre componentes de uma mistura de fases com distintos tamanhos de partículas, como é o caso dos experimentos utilizando NiO-grosseiro, é mais suscetível de ocorrer. Em muitos filmes preparados no LAPCEC com NiO-grosseiro, e antecedentes a este trabalho, apresentava uma grande resistência elétrica após a redução do NiO a Ni metálico. Este fato é justificado pela distribuição não homogenia do NiO dentro do compósito e desta forma, a rede metálica de Ni encontra-se não percolada. Os demais experimentos utilizando pó de NiO grosseiro, as fases apresentaram-se homogeneamente distribuídas, com as partículas finas de zirconia nos interstícios do empacotamento das partículas grosseiras de NiO, Figura 5(B e C). Os experimentos utilizando o pó de NiO fino apresentou o empacotamento homogêneo das fases, o que pode ser comprovado pela colação homogênea nas micrografias observadas ao microscópio óptico, Figura 3(E, F, G, H).






4 CONCLUSÕES

O planejamento fatorial fracionário demonstrou ser adequado para avaliar os efeitos médios dos fatores sobre a viscosidade. As formulações estudadas não apresentaram significativo fenômeno de tixotropia. Foi possível observar forte influência de três fatores sobre a viscosidade: modificador reologico, teor de dispersante e granulometria do pó. O efeito de três dos seis fatores estudados foi explicado através da análise da relação matemática fornecida pela teoria de suspensões concentradas.

Apesar deste trabalho usar planejamento fatorial fracionário para investigar a influência dos fatores sobre a reologia, foi possível observar grupos de microestruturas que se formaram em função dos fatores do planejamento, o que demonstra a utilidade dessa ferramenta estatística quando se deseja fazer pesquisa exploratória sobre variáveis cujo efeito é total ou parcialmente desconhecido.

Houve a formação de grupos de microestruturas seguindo a variação de dois fatores: o tipo de modificador reologico e granulometria do pó de NiO. Dessa maneira, foi possível relacionar diretamente a variável de formulação com o tipo de defeito e microestrutura. A presença de óleo de linhaça resultou em microestrutura com defeitos tipo buraco e segregação de fases. Por outro lado, o uso de PVB resultou em filmes de maior homogeneidade demonstrando a importância do PVB em conferir resistência mecânica ao filme granular permitindo que este fique isento de trincas. Além disso, o PVB demonstrou afetar a viscosidade do solvente da suspensão, aumentando-a. A granulometria do pó de NiO demonstrou afetar a microestrutura. Separação dos componentes da mistura de pós, NiO e YSZ, é mais suscetível de ocorrer quando usado componentes com distintos tamanhos de partículas, como é o caso dos experimentos utilizando NiO-grosseiro. Separação de fases e decantação de partículas de NiO, durante a secagem do filme, foram observadas quando usado NiO grosseiro na formulação.

5 AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o suporte concedido pelo Thermo Haake, CNPq, programa de Pós-Graduação de Ciências e Engenharia de Matérias PPG-CEM da UFSCar. Agradecem também ao suporte constante da Helena Racy, técnica do LCE (Laboratório de caracterização estrutural).

6 BIBLIOGRAFIA

Data de envio: 05/01/07 Data de aceite: 08/02/07

  • [1] BROWN, M., PRIMDAHL, S., MOGENSEN, M., "Structure/Performance Relations for Ni/Yttria-Stabilized Zirconia Anodes for Solid Oxide Fuel Cells", Journal of the Electrochemical Society, v. 147, n. 2, pp. 475-485, 2000.
  • [2] CRACIUN, R., PARK, S., GORTE, R.J., "A Novel Method for Preparing Anode Cermets for Solid Oxide Fuel Cells", Journal of The Electrochemical Society, v. 146, n. 11, pp. 4019-4022, 1999.
  • [3] CHIU, R.C., GARINO, T.J., CIMAR, M.J., "Drying of Granular Ceramic Films: I, Effect of Processing Variables on Cracking Behavior", Journal of the American Ceramic Society, v. 76, n. 9, pp. 2257-2264, 1993.
  • [4] MOONEY, M., "The viscosity of a concentrated suspension of spherical particles", Journal of Colloid and Interface Science, v. 6, pp. 162-170, 1957.
  • [5] STEINS, H.N., "Rheological Behavior of Suspensions", In: CHEREMISINOFF, N.P., Encyclopedia of Fluid Mechanics, v. 5, 1 ed., chapter 1, Houston, USA, 1986.
  • [6] PILEGGI, R.G., PANDOLFELLI, V.C., STUDART, A.R., et. al., Dispersăo e Empacotamento de Partículas, Săo Paulo: Fazendo Arte, 2000.
  • [7] ANDREASEN, A.H.M., Ueber die Beziehung zwischen Kornabstufung und Zwischenraum in Produkten aus losen Körnern (mit einigen Experimenten) , v.50, n. 3, pp. 217-228, 1930.
  • [8] DINGER, D.R., FUNK, J.E., "Particle Packing, Part III Discrete Versus Continuous Particles Sizes", Interceram, v. 41, n. 5, pp. 332-334, 1992.
  • [9] MOONEY, M., HERMONAT, W.A., "Effect of Swelling or of an Adsorbed Layer on the Viscosity of a Suspension of Spherical Particles", Journal of Colloid Science, v. 10, n. 1, pp. 1221-122, jan. 1955.
  • [10] STUDART, A.R., AMSTAD, E., ANTONI, M., et al., "Rheology of Concentrated Suspensions Containing Weakly Attractive Alumina Nanoparticles", Journal of the American Ceramic Society, v. 89, n.8, pp. 2118-2425, mar. 2006.
  • [11] BOX, G.E.P., HUNTER, W.G., HUNTER, J.S., Statistics for Experimenters, Wiley, New York, 1978.
  • [12] NETO, B.B., SCARMINIO, I.S., BRUNS, R.E., "Como variar tudo ao mesmo tempo", Como fazer Experimentos, 2Ş ed., capítulo 3, Campinas, editora Unicamp, 2003.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2007
  • Data do Fascículo
    2007

Histórico

  • Recebido
    05 Jan 2007
  • Aceito
    08 Fev 2007
Laboratório de Hidrogênio, Coppe - Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com a Associação Brasileira do Hidrogênio, ABH2 Av. Moniz Aragão, 207, 21941-594, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel: +55 (21) 3938-8791 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revmateria@gmail.com