Open-access Caracterização microestrutural e mecânica de aço 22MnB5 para estampagem a quente soldado a laser

Microstructural and mechanical characterization of laser-welded 22MnB5 hot stamping steel

RESUMO

Os aços avançados de alta resistência (AHSS) têm evoluído nas últimas décadas, consolidando-se como materiais amplamente utilizados na indústria automotiva. Entre os AHSS, destaca-se o aço 22MnB5, que, por meio da estampagem a quente, é moldado em geometrias complexas, alcançando altos valores de resistência mecânica. O resultado é um aço com microestrutura formada por martensita e vestígios de bainita, conferindo elevada capacidade de absorção de energia, ideal para aplicações que exigem alta resistência e durabilidade. O presente trabalho apresenta a caracterização mecânica e microestrutural do aço 22MnB5 estampado a quente e soldado a laser, comparada ao material base. A soldagem propiciou um aumento da resistência à tração, especialmente no limite de escoamento, que apresentou incremento de cerca de 10%, enquanto o limite de resistência à tração aumentou aproximadamente 3%. A dureza da zona fundida e do material base variou em torno de 500 HV, enquanto a zona termicamente afetada apresentou um amolecimento, atingindo cerca de 350 HV. Apesar das mudanças localizadas na microestrutura e da redução de cerca de 50% no alongamento total, comprovou-se a viabilidade da soldagem do aço 22MnB5 com laser de fibra e dois passes opostos.

Palavras-chave
Aços avançados de alta resistência; Estampagem a quente; 22MnB5; Solda a laser

ABSTRACT

Advanced high-strength steels (AHSS) have evolved over the past decades, establishing themselves as widely used materials in the automotive industry. Among the AHSS, the 22MnB5 steel stands out, which, through hot stamping, is shaped into complex geometries, achieving high mechanical strength values. The result is a steel with a microstructure formed by martensite and traces of bainite, providing high energy absorption capacity, ideal for applications requiring high strength and durability. This study presents the mechanical and microstructural characterization of hot-stamped and laser-welded 22MnB5 steel, compared to the base material. Welding led to an increase in tensile strength, especially in the yield strength, which showed an increase of approximately 10%, while the ultimate tensile strength increased by about 3%. The hardness of the fusion zone and the base material varied around 500 HV, while the heat-affected zone exhibited softening, reaching approximately 350 HV. Despite localized changes in the microstructure and a reduction of about 50% in total elongation, the feasibility of welding 22MnB5 steel with fiber laser and two opposite passes was demonstrated.

Keywords
Advanced high-strength steel; Hot stamping; 22MnB5; Laser welding

1. INTRODUÇÃO

Visando a economia de energia, redução de emissões de gases CO2, redução do peso e melhoraria na segurança dos automóveis, o uso de aços avançados de alta resistência (AHSS) vem sendo utilizado pelas indústrias automobilísticas [1,2,3,4]. Dentre os AHSS estão os aços ao boro, dedicados à estampagem a quente. Recebem essa denominação devido ao elemento boro que é de grande importância em relação a temperabilidade desse material [5]. No estado como processado, o aço ao boro, 22MnB5 apresenta uma boa resistência à abrasão, devido sua microestrutura ser composta por ferrita e perlita e uma dureza entre 170 e 200 HV e seu limite de resistência nessa condição fica em torno de 600 MPa [6].

Com a queda de custos e o aumento da eficiência de processos e ferramentas, a estampagem a quente é uma técnica necessária para produzir peças automotivas leves e resistentes a colisões. A produção desse material é realizada a partir do aquecimento dos esboços em torno de 950 ºC para austenitizar o aço por completo e são transferidos para uma ferramenta refrigerada onde são conformados e temperados quase simultaneamente [7]. Depois desse processo, a resistência mecânica da chapa de 340 MPa eleva-se para até 1500 MPa e seu alongamento restringe-se em torno de 6%, obtendo assim as necessidades da aplicação final, no quesito alta resistência mecânica e reduzido retorno elástico [8].

Costa e colaboradores [9] em seu estudo sobre o desempenho do aço 22MnB5 mostraram que após a estampagem a quente e exposição a 100 ciclos de forjamento, as chapas de 22MnB5 apresentaram uma redução progressiva de dureza, especialmente nas regiões em maior contato com os tarugos. Tal redução foi atribuída ao revenimento da bainita, decorrente da permanência do material a temperaturas superiores a 700 ºC. A dureza variou de uma média inicial de 416 HV para 268 HV, na região mais solicitada. Contudo, a morfologia da bainita foi preservada, indicando estabilidade estrutural mesmo em condições severas. Apesar dos sinais de desgaste abrasivos e deformação plástica, não foram identificadas falhas críticas que comprometessem a integridade funcional da peça.

De acordo com Mohrbacher [10], na indústria automotiva, a utilização de componentes estampados a quente é amplamente adotada nas estruturas de veículos, representando uma boa parte do peso total. No mercado de caminhões, o chassi precisa suportar cargas pesadas sem grandes deformações, o que exige o uso de aços mais espessos, portanto a vantagem econômica e ambiental de reduzir o peso através do uso de aços de alta resistência estampados a quente pode ser ainda mais impactante no mercado de caminhões, pois isso leva a uma capacidade de carga maior juntamente a uma redução ainda mais significativa do peso.

Com a larga utilização dos aços estampados a quente, especialmente o 22MnB5, nas indústrias automobilísticas, vem a necessidade do desenvolvimento dos processos de soldagem dado que a soldabilidade do material possui limitações em relação a utilização de processos de soldagem convencionais [11]. Sendo assim, a soldagem a laser é amplamente aplicada em função da zona termicamente afetada (ZTA) estreita, alta resistência da junta, alta velocidade de soldagem, alta precisão e grande eficiência na transferência de energia [12, 13].

Visto isso, o presente trabalho tem o objetivo de contribuir com o estado da arte sobre a caracterização microestrutural, comportamento mecânico do aço 22MnB5 com 4,5 mm de espessura estampado a quente e posteriormente soldado a laser mantendo a velocidade e a potência constante. São objetivos específicos do estudo definir os componentes microestruturais depois de soldados e determinar o comportamento mecânico por meio de ensaios de tração uniaxial, flexão e dureza Vickers.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. Material base

Na realização desse estudo, foi utilizado uma chapa de aço 22MnB5 com espessura de 4,5 mm, estampado quente. Este aço conforme disponibilizado para este estudo é dito ter uma microestrutura predominantemente martensítica, a qual é resultante do processo de estampagem a quente de um aço que originalmente possuía uma microestrutura de partida ferrítica-perlítica. O aço 22MnB5 foi fornecido pelo fabricante SSAB e posteriormente estampado a quente em trabalho anterior a este, do mesmo grupo de estudo [14].

Na Tabela 1 é apresentada a composição química do material sem revestimento, fornecida pelo fabricante SSAB [15], e na Tabela 2 são apresentadas suas propriedades mecânicas, conforme avaliação em tração uniaxial a temperatura ambiente após estampagem a quente conduzida por ALMEIDA [14].

Tabela 1
Composição química dos aços 22MnB5, em % peso, via espectrometria de emissão ótica. Adaptado de [14].
Tabela 2
Propriedades mecânicas do aço 22MnB5 estampado a quente [15].

2.2. Material soldado

O material soldado recebido foi confeccionado com o laser instalado no Laboratório de Desenvolvimento de Aplicações de Laser e Ótica (DEDALO) do Instituto de Estudos Avançados (IEAv/DCTA). Trata-se de um laser de potência média de 2 kW da IPG, modelo YLR-2000, instalado em uma cabine de processamento equipada com sistemas de gases auxiliares e exaustão de fumaça.

O procedimento de soldagem do material a ser estudado foi otimizado em um trabalho de tese de doutorado realizado pelo mesmo grupo de pesquisadores do IEAv/DCTA. Nesse estudo, ALMEIDA [14] realizou a soldagem em dois passes parcialmente sobrepostos, frente e verso, unindo dois corpos de provas (CP) como pode ser visto na Figura 1.

Figura 1
Procedimentos da soldagem a laser realizada a) junta de topo; b) primeiro passe de solda; c) segundo passe de solda [15].

Os CPs foram escovados e limpos com um pano com etanol e secos através de um jato de gás de nitrogênio. Esse procedimento também foi feito após a realização do primeiro passe e antes de realizar segundo passe, para retirar pequenas partículas de óxidos que poderiam contaminar o processo. O foco utilizado foi na superfície e a proteção gasosa de argônio alta pureza (99,995%) a 10 L/min com velocidade de 50 mm/s e potência de 2000 W.

2.3. Preparação metalográfica

Para a realização das análises microestruturais e mecânicas, foram aplicadas rotas de preparação metalográfica específicas, conforme descrito na Tabela 3. As amostras foram preparadas para caracterização por microscopia eletrônica de varredura (MEV), utilizando detectores de elétrons secundários (SE) e retroespalhados (BSE), microscopia óptica (MO), com contrastes monocromáticos e coloridos, além de ensaios de microdureza.

Tabela 3
Resumo das etapas de preparação metalográficas das amostras que foram analisadas.

2.4. Caracterização microestrutural

Para análise microestrutural com foco na morfologia das fases, foram realizadas observações no microscópio eletrônico de varredura (MEV) após ataque químico das amostras com Nital 5%, (conforme a Tabela 3), tendo em vista a microestrutura refinada presente nos materiais em estudo (base e soldado), com auxílio dos detectores de elétrons secundários (SE) e retroespalhados (BSE) instalados em um MEV com canhão de emissão de campo (FEG), marca FEI e modelo Quanta FEG 250. Partindo do ponto para averiguar se fato o material de base (MB) realmente é completamente martensítico, conforme indicado pelo fornecedor, e quais as fases que se formaram nas regiões da solda em função da ciclagem térmica a que foi submetido no processo de soldagem a laser, distinguindo as regiões referente a zona termicamente afetada (ZTA) e zona fundida (ZF).

A microscopia óptica (MO) foi utilizada para análise complementar da microestrutura do material soldado para distinguir as fases em que pelo aspecto morfológico no MEV não foi possível distingui-las. Esta análise se deu após a realização da preparação metalográfica das amostras colorido com Le Pera. A observação e o registro das microestruturas das distintas regiões da solda foram conduzidos com um MO, marca Olympus – modelo BX53M, acoplado a uma câmera digital Olympus LC20 e ao software de aquisição LC Micro, versão 2.2.

2.5. Ensaio de tração

A análise das possíveis mudanças nas propriedades mecânicas ocasionadas pela soldagem a laser, foram realizadas via ensaios de tração uniaxial até a ruptura em corpos de prova, sendo três corpos de prova (CPs) por condição em estudo: do metal base e do material soldado. Obtendo assim, o limite de escoamento, resistência a tração e o alongamento uniforme para cada condição em estudo.

Foi utilizada a máquina universal de ensaios mecânicos (marca EMIC, modelo DL), com célula de carga de 10000 kgf e uma velocidade de ensaio de 0,75 mm/min, conduzido a temperatura ambiente e sem uso de extensômetro, de acordo com a norma ASTM E 8M [16]. Os CPs, do material de base e do material soldado, foram usinados em uma máquina de eletroerosão a fio, com direção de laminação perpendicular ao seu comprimento, ou seja, transversal (DT) a direção de laminação (DL). As dimensões dos CPs são apresentadas no desenho da Figura 2 que exemplifica a condição soldada. O cordão de solda está no centro do comprimento útil e paralelo a DT do corpo de prova.

Figura 2
Desenho do corpo de prova, com 4,5 mm de espessura, para ensaio de tração extraídos na direção transversal (DT) a de laminação, dando destaque a porção central que destaca a solda para os corpos de prova do material soldado.

2.6. Ensaio de flexão

A capacidade de deformação plástica por flexão do material soldado foi avaliada por meio da análise da resistência da junta soldada, para identificar possíveis áreas frágeis ao longo da linha de solda.

Para isso, foi utilizado a máquina universal de ensaios mecânicos (marca EMIC, modelo DL), com célula de carga de 10000 kgf e uma velocidade de ensaio de 1,5 mm/min, a temperatura ambiente. O ensaio de flexão foi realizado com um dispositivo acessório que é baseado em um raio de curvatura tanto para os apoios como para o cutelo de 3 mm. Foram realizados ensaios em 3 amostras do material soldado, as quais possuem dimensão de 100 mm de comprimento em DL, 20 mm de largura em DT e 4,5 mm de espessura, com o cordão de solda no centro do comprimento da amostra e paralela a DT, como mostra a Figura 3.

Figura 3
Fotografias de (a) amostra de 4,5 mm de espessura para o ensaio de flexão, contendo a solda em sua região central, e do (b) dispositivo acessório para o ensaio.

2.7. Ensaio de dureza

Para essa análise foram realizadas medições, na espessura da chapa após corte transversal linha de solda, ao longo de todas as regiões da solda até o material de base a esquerda e da direita da linha de solda. As medições foram conduzidas desta forma, com a finalidade de observar as mudanças da microdureza em função das fases presentes nas diferentes regiões, com linhas distintas a ¼, ½ e ¾ da espessura.

O ensaio foi realizado utilizando o Microdurômetro Digital Shimadzu HMV-G21DT. Para a presente análise, foi aplicada uma carga máxima de 25 gf com tempo de permanência de 15 segundos na carga máxima. O valor reduzido da carga máxima adotada visou garantir que o espaçamento adotado entre as indentações fosse de três vezes ou mais do valor da diagonal da impressão da indentação anterior. As medições foram realizadas com um espaçamento de 0,05 mm entre as indentações, posicionadas nas linhas correspondentes a ¼, ½ e ¾ da espessura da amostra.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Aspectos macroestruturais

A Figura 4 apresenta a macrografia obtida por um corte transversal em amostra típica após a solda. Pode-se observar que a junta se compõe de dois cordões de solda parcialmente sobrepostos em profundidade de raiz, sendo que a largura típica do topo da solda é de 2,5 mm e a penetração de cada solda é de aproximadamente 3,8 mm.

Figura 4
Macrografia obtida via MEV com um esquema das regiões analisadas do aço 22MnB5 soldado com dois passes de solda. Ataque com Nital 5%. Setas vermelhos = microporos presentes na região central da solda.

Na Figura 4 observa-se uma região mais clara, ao redor dos cordões, cujo intervalo de temperaturas tem sido associado a uma temperatura intercrítica e uma microestrutura predominantemente ferrítico-martensítica [17]. A zona termicamente afetada (ZTA) se estende a partir dessa região intercrítica limitado pela condução de calor e o revenimento da martensita do material de base (MB). Na Figura também se observa os destaques para as microrregiões analisadas com maior magnificação referente ao material de base (MB), zona termicamente afetada (ZTA) e zona fundida (ZF) do primeiro e do segundo passe de solda. Foram selecionadas posições a ¼, ½ e ¾ da espessura da chapa para as análises, sendo os resultados micrográficos apresentados nas seções 3.2.1, 3.2.2 e 3.2.3.

De acordo com a macrografia da Figura 4, observa-se alguns microporos de formato esférico na região central do interpasse, provavelmente devido aos gases retidos no interior da poça de fusão com formato de keyhole [18]. Estes não influenciaram significativamente no comportamento mecânico do material soldado comparado com o material base. De modo geral, as soldas exibiram um bom aspecto em termos macroscópicos.

3.2. Aspectos microestruturais

3.2.1. Material de base

O material de base de cada uma das regiões analisadas ao longo da espessura da chapa, posições de ¼, ½ e ¾ na Figura 4, apresenta aspecto semelhante como esperado, conforme apresentado na Figura 5. Com base na análise morfológica realizada por MEV, Figura 5(a) e (c), revelada com Nital 5%, comparativamente com a análise realizada via MO. Figura 5(b), revelação com Le Pera, pode-se observar a presença de uma microestrutura refinada, homogênea e martensítica (M) com vestígios de bainita (B).

Figura 5
Micrografias do material de base (a) via MEV com ataque com Nital 5% por 5 s, (b) via MO com ataque Le Pera por 15 s, e (c) via MEV com ataque com Nital 5% por 5 s. Legenda: M (martensita) e B (bainita).
Essa definição das fases presentes no MB se justifica pelos dois fatores:
  1. O contraste monocromático com o reagente Nital 5% ataca preferencialmente regiões de maior energia, tais como contornos de grão, de fases e de maclas. Porém, quando da presença de perlita fina, martensita, austenita retida e bainita, é difícil distinguir estas na análise por MO. Por outro lado, é possível por MEV diferenciar os aspectos morfológicos que distinguem os microconstituintes perlita fina e bainita, assim como a martensita, e, na maioria das vezes, distinguir a martensita do microconstituinte bainita.

  2. O contraste resultante do ataque Le Pera é decorrente de uma ocorrência química seletiva diferenciada para cada fases/microconstituintes formados no aço, promove a formação de filmes translúcidos com espessuras variáveis, cuja intensidade óptica depende diretamente da natureza e da morfologia da fase presente em cada região. Com isto, o feixe de luz visível utilizado na microscopia óptica, sofrerá refração ao transpor a interface que separa o meio externo e filme depositado. Posteriormente, quando esta porção do feixe de luz visível refratado no filme depositado for refletido na superfície da fase/microconstituinte, abaixo do filme depositado, este novamente atravessará a interface que separa a superfície do filme depositado e o meio externo. Neste momento ocorrerá uma interferência destrutiva com parte do feixe de luz que foi refletido na superfície do depósito sem passar por refração e o feixe que foi refratado. A amplitude da onda do feixe de luz coletada pela lente objetiva será diferente da amplitude da onda do feixe de luz que foi fornecido pela lente objetiva, tendo determinados comprimentos de onda da luz visível para compor a imagem formada com distintas colorações [19, 20]. Com base no exposto, foi utilizado o ataque com o Le Pera, o qual ao ser utilizado revela e diferencia por colorações as fases e microconstituintes, a ferrita com a cor azul-esverdeada, a bainita com a cor marrom e a austenita aparece em tom branco para o presente aço nas condições em estudo [21,22,23,24].

Segundo GIRAULT et al. [22] e SILVA et al. [25], para se obter bons resultados na diferenciação entre martensita, bainita e ferrita, o ataque Le Pera, é o mais indicado para aços de baixa liga e elevada resistência, que vai de encontro com o aço em estudo. VUROBI e CINTHO [26] testaram a efetividade desse reagente em uma amostra do aço SAE 4118 HM tratada isotermicamente a 400 ºC. A ferrita presente na microestrutura é revelada pela cor azul e a bainita pela cor marrom. Contudo, foi realizado um segundo tratamento térmico para melhor avaliar a distinção da martensita e bainita, realizando uma austenitização completa a 930 °C. Suportando os resultados observados no presente aço em estudo e destacado na Figura 5(b).

3.2.2. Zona fundida (ZF)

A zona fundida de material soldado apresenta uma multiplicidade de microconstituintes desde a interface ZTA-ZF até o centro da solda. A interface entre a ZF e a ZTA se caracteriza por grãos colunares, nucleados epitaxialmente, e que crescem em direção ao centro da poça de fusão. Eventualmente esses grãos colunares chegam ao centro da poça ou são bloqueados por uma quantidade de grãos equiaxiais, os quais são resultados de inoculação do metal líquido ou por uma zona de superresfriamento constitucional [27]. Além das características típicas da solidificação de ligas metálicas, há o efeito do reaquecimento da ZF do primeiro cordão com o segundo passe de solda, o que refunde parte da região ressolidificada originalmente e trata termicamente regiões colaterais (Figura 4).

A região central da ZF é de interesse, pois nesta pode haver defeitos tais como os microporos observados na Figura 4, os quais influenciam o comportamento mecânico. Face a isto, foi dada atenção ao aspecto microestrutural da região central da ZF, desconsiderando os aspectos das demais regiões da ZF citadas anteriormente [28].

Figura 6 apresenta micrografias da ZF na sua região central, de cada uma das três posições da espessura da chapa estudadas (posições de ¼, ½ e ¾). Nota-se que não há diferenças microestruturais evidentes da região central da ZF nas posições analisadas. A Figura 6 (a), (b) e (c) sugere a presença de martensita e bainita, marcada nas imagens. A Figura 6 (d) mostra uma micrografia via MO com ataque de Le Pera, a qual evidência a presença de martensita (em cor branca) e ilhas de bainita (em cor marrom), com comportamento semelhante do ataque seletivo das fases observado no metal base corroborando com a literatura [2124].

Figura 6
Micrografias obtidas via MEV da região da ZF. (a) do segundo passe de solda (¼ da espessura - Figura 4); (b) do interpasse (1/2 espessura - Figura 4); (c) do primeiro passe de solda (3/4 da espessura - Figura 4). Ataque com Nital 5%. (d) Via MO com ataque Le Pera. Legenda: M (martensita) e B (bainita).
3.2.3. Zona termicamente afetada (ZTA)

A ZTA é uma região com uma mistura de fases e sua extensão entre as interfaces ZF-ZTA e ZTA-MB depende da metalurgia física do aço e dos ciclos térmicos do processo de soldagem. Com isto foram observados os aspectos da ZTA mais próximos das interfaces ZF-ZTA e ZTA-MB para as posições de ¼ e ¾ da espessura (ZTA1- segundo e primeiro passes de solda, respectivamente) e de ½ espessura (ZTA2 - interpasses de solda), conforme se vê na Figura 4. Além disso, foram observados os aspectos da ZF do primeiro passe de solda que foi afetada pelo calor após o segundo passe, aqui denominada de ZTA3, conforme a Figura 4.

Em relação ao primeiro passe de soldagem, a microestrutura deste foi fortemente afetada pelo segundo passe. Sendo assim, a ZTA variou de tamanho (entre 0,5 mm a 1 mm) e de microestrutura ao longo das três posições de ¼, ½ e ¾ da espessura da chapa. Na Figura 7 (posição de ¼, segundo passe de solda) encontra-se as regiões 1 (Figura 7(a)) e 2 (Figura 7(b)) da ZTA. Na posição de ½ da espessura da chapa, no interpasse, observou-se as regiões 1 e 2 da ZTA, Figura 8 (a) e (b), respectivamente.

Figura 7
Micrografias obtida via MEV da posição de ¼ da espessura da Figura 4 (segundo passe de solda). (a) região 1 da ZTA1 e (b) região 2 da ZTA1. Ataque com Nital 5%. Legenda: M (martensita), B (bainita), F (ferrita) e C (cementita).
Figura 8
Micrografias obtida via MEV da posição ½ espessura da Figura 4 (interpasse). (a) região 1 da ZTA2 e (b) região 2 da ZTA2. Ataque com Nital 5%. Legenda: M (martensita), B (bainita), F (ferrita) e C (cementita).

Na Figura 9 encontra-se a ZTA da posição ¾ da espessura da chapa (primeiro passe de solda) onde observa-se quatro regiões. A região 1 (destacada ¾ da espessura na Figura 4) a qual retrata a interface entre a zona refundida e ZF do primeiro passe afetada pelo calor do segundo passe de soldagem (Figura 9(a)). Na região 2 (destacada em ¾ da espessura na Figura 4) elucidada em maior aumento na Figura 9(b) revela a ZTA do primeiro passe afetada pelo calor do segundo passe e com aspecto distinto da ZTA do segundo passe (destacada na região 1 em ¼ da espessura na Figura 4). Já a região 3 e 4, onde se encontra a ZTA, (destacada 3/4 da espessura na Figura 4) apresenta-se na Figura 9(c) e 9(d), respectivamente.

Figura 9
Micrografias obtida via MEV da posição ¾ da espessura da Figura 4 (primeiro passe de solda) (a) região 1 da ZTA3; (b) região 2 da ZTA3; (c) região 3 da ZTA1 (d) região 4 da ZTA1. Ataque com Nital 5%. Legenda: M (martensita), B (bainita), F (ferrita) e C (cementita).

A Figura 10(a) apresenta uma micrografia via MEV da amostra soldada revelada com Nital 5% com aumento de 1000x. Observa-se na parte superior da micrografia o início da ZF e na parte inferior o MB, evidenciando assim a ZTA. Na Figura 10(b) apresenta a micrografia via MO da amostra soldada atacada com o Le Pera, com aumento de 50x. Encontra-se na parte central da micrografia a ZTA, na região superior esquerda a ZF e na inferior direita o MB.

Figura 10
Micrografias da ZTA (A) Via MEV com ataque com Nital 5%. (B) Via MO com ataque Le Pera. Legenda: B (bainita), F (ferrita), MA (martensita/austenita) e M (martensita).

A utilização do ataque Le Pera revela a ferrita com a cor azul-esverdeada, a bainita com a cor marrom e a austenita aparece na cor branca, dito isso, observa-se na Figura 10(b) a presença de ferrita, bainita e martensita/austenita na região da ZTA. A distinção entre martensita e austenita é particularmente desafiadora e, frequentemente, quando são caracterizadas, são agrupadas sob a designação “MA” [29].

As diferentes regiões apresentadas na Figura 4 também foram encontradas em um estudo de juntas soldadas a laser, após a estampagem a quente. Observaram em sua caracterização quatro regiões diferentes, a primeira, no final da ZTA, apresentou martensita revenida, essa região foi submetida a uma temperatura abaixo de AC3. A segunda região, onde as temperaturas variaram entre AC1 e AC3, obtiveram a microestrutura bainita. Na terceira região, encontram martensita e bainita devido a essa região atingir temperaturas entre Ac3 e de fusão e na quarta região, a ZF, que passou pelo processo de fusão e têmpera foi observado martensita em ripas, sendo essas bem maiores das que apresentam o material base. Isso em devido ao crescimento de grão da ZF [30, 31].

Um aço equivalente ao 22MnB5 estampado a quente foi estudado e observou-se que a velocidade de soldagem afeta a microestrutura e as propriedades da junta soldada com laser Nd:YAG. Encontraram um amolecimento na ZTA devido ao revenimento da microestrutura martensítica e uma diminuição da sua largura com o aumento da velocidade. A microestrutura na ZTA também variou ao longo da sua extensão, mais próximo da ZF observou-se martensita, porém na região mais próxima ao MB foi encontrado martensita revenida e ferrita [32]. Foram encontrados resultados similares nos estudos de JIA et al. [33], onde as amostras do material semelhante foram soldadas a laser de fibra.

KUNDU et al. [34] investigaram um aço similar ao deste estudo soldado a ponto por um laser de fibra onde foi observado a formação de martensita do tipo agulha e dureza entre 390 e 450 HV na ZF. Na ZTA foi observado quatro diferentes regiões, sendo essas observadas partindo da ZF até o MB. Na primeira região, mais próxima da ZF, encontrou-se pacotes de martensita separados por contornos de alto ângulo com durezas entre 360 e 390 HV. Na segunda região, observou-se que houve uma transformação mais lenta da austenita em ferrita com uma taxa de crescimento da ferrita controlado devido principalmente a difusão do C na austenita, formando ao final do resfriamento martensita fina. Na terceira região, encontrou-se martensita recém-formada junto com alguma austenita não transformada. O curto tempo de resfriamento retarda a difusão do C gerando uma microestrutura degenerada. A dureza dessa região variou entre 290 e 320 HV. Na última região (mais próxima ao MB) com a dureza média variou entre 228 e 260 HV, encontrou-se martensita revenida que se decompôs em cementita e ferrita.

Variações da microestrutura também ocorreram em seu estudo, de acordo com CHOI et al. [35], utilizando solda a ponto em uma chapa de 22MnB5, foi observado na fronteira da ZTA com o MB, bainita em matriz ferritica, resultado de um recozimento devido a lenta taxa de resfriamento na ZTA mais próxima do metal base. Ainda na ZTA, porém próximo da ZF observou-se martensita refinada. Também foi analisado que houve uma significativa redução na dureza na ZTA (na região mais próxima do MB) que de acordo com a literatura é uma zona de amolecimento causado pela presença de martensita revenida. E a maior dureza foi observada na ZTA próxima da ZF. Relatou-se que essa dureza é devido à formação de carbonetos resultantes da difusão do cromo, pois ele tem alta afinidade com o carbono, contudo essa microestrutura não é observada claramente nas análises, então explica-se esse aumento de dureza com a presença de uma martensita mais refinada.

Corroborando com a literatura, constata-se que na ZF, Figura 6, há a formação de martensita (M) em ripas (fase dominante) e bainita (B). Na ZTA, onde a taxa de resfriamento é mais lenta em comparação com a ZF, permitindo a formação de ferrita e transformações parciais de recristalização, observou-se uma região de grãos grosseiros e grãos refinados, com a presença majoritária de martensita (M), e frações de ferrita poligonal (F), bainita (B) e cementita (C). No MB observa-se uma microestrutura martensítica em ripas com ilhas de bainita [15, 30–32, 34, 35].

ALMEIDA [14], que estudou o mesmo material, destacou que regiões de grãos finos passaram pela austenitização em temperaturas mais baixas que regiões de grãos grosseiros. Na região da ZTA mais próxima do MB (grãos finos), onde sofrem aquecimento abaixo de AC1, ocorre um revenimento da martensita original e é onde ocorre a precipitação da cementita do carbono soluto saturado. Porém, na região da ZTA mais próxima da ZF (grãos grosseiros), onde sofre aquecimento entre AC1 e AC3, a martensita original se decompõe em ferrita e cementita e a fração que se transformou em austenita, forma martensita e bainita durante o resfriamento.

3.3. Ensaio de tração

Os resultados obtidos por meio dos ensaios de tração uniaxial são apresentados em termos de limite de resistência (LR), limite de escoamento (LE) e alongamento total (AL) apresentados nas Tabelas 4 e 5, referentes aos materiais de base e soldado. Os valores de LR e LE foram extraídos das curvas tensão-deformação de engenharia. No entanto, como os ensaios foram conduzidas sem extensômetro até a fratura, o alongamento total (AL) percentual foi medido nos corpos de prova fraturados. Pode-se constatar observando os CPs rompidos do material soldado que todos os romperam muito próximo da região soldada, mais especificamente na região da ZTA, onde encontra-se uma zona de amolecimento e menor dureza (Figura 11).

Tabela 4
Resultados dos ensaios de tração dos CPs do material de base.
Tabela 5
Resultados dos ensaios de tração dos CPs do material soldado.
Figura 11
CPs de tração ensaiados. (a) os três CPs rompidos do material base evidenciando a região central deles. (b) os três CPs rompidos do material soldado, onde pode ser observado que todos os CPs romperam muito próximo ao cordão de solda.

Os resultados dos ensaios de tração das três amostras soldadas apresentaram uma média de 1367 MPa de limite de resistência, 1278 MPa de limite de escoamento e alongamento médio de 6,1%. Comparando com os resultados das propriedades mecânicas do material de base encontrados para as três amostras ensaiadas (média de 1323 MPa de limite de resistência, 1153 MPa de limite de escoamento e alongamento médio de 13,9%), nota-se que os valores de limite de resistência e limite de escoamento são muito próximos, diferente do alongamento médio que é claramente diminuído.

Os valores para o limite de resistência e limite de escoamento obtidos nos ensaios realizados tanto para o material de base quanto para o material soldado, não apresentam significativas alterações em comparação com os valores encontrados na literatura para o material de base (Tabela 1). Contudo deve-se observar que o valor de 9% para o alongamento médio encontrado nos estudos de [14] é menor do que o encontrado no presente trabalho, 13,9%. Essa diferença pode ser atribuída à ausência do uso do extensômetro durante os ensaios, uma vez que também não foram encontradas informações relacionadas a este aspecto no estudo de ALMEIDA [14].

Em relação a valores encontrados na literatura para o material soldado os autores NĚMEČEK et al. [36] que compararam a soldagem a laser com a soldagem a arco elétrico com gás de proteção, MAG (Metal Active Gás) em aços de alta resistência. As juntas soldadas a laser do aço martensítico DOCOL 1200 (22MnB5) estampado a quente mantiveram a resistência do material e o alongamento apresentou apenas uma ligeira diminuição. Porém em relação a junta soldada a arco MAG, a resistência caiu para 700 MPa, esse resultado é explicado a partir do revenimento da martensita no material de base da chapa durante processo de soldagem a arco. Ademais, a resistência mecânica a tração das juntas soldadas do aço TRIP 900 também seguiu a mesma tendência, sendo que a soldagem a laser teve um mínimo impacto no comportamento mecânico.

ALMEIDA [14] encontrou em seus estudos do aço 22MnB5 estampado a quente e soldado a laser, o valor médio para limite de resistência com base em 5 amostras de 1472 MPa, para o limite de escoamento, em média em torno de 940 MPa e o alongamento máximo entre 5 e 6%. XU et al. [37] observaram valores de resistência a tração (1510 MPa) e alongamento (2,6%), menores que o metal base, que são 1603 MPa e 6,9%, respectivamente durante seus estudos sobre os efeitos dos parâmetros de soldagem por oscilação do feixe de laser em uma junta de topo do aço 22MnB5 revestido com Al-Si.

Em um estudo de juntas dissimilares soldadas a laser do aço 22MnB5 com resistência a tração máxima de 1500 MPa (PHS1500) e 2000 MPa (PHS2000) foi observado que tanto a solda linear a laser e por oscilação a laser apresentaram resistência à tração máxima de ~1200 MPa e uma trinca que se propagou resultando em uma fratura no lado do PHS1500 [38]. Sendo assim, observa-se que os valores encontrados nos ensaios estão de acordo com a literatura do aço 22MnB5 estampado a quente e soldado a laser.

3.4. Ensaio de flexão

A Figura 12 apresenta três corpos de prova ensaiados por flexão do material soldado. A literatura disponível sobre ensaios de flexão para esse tipo de aço é limitada, embora esses ensaios sejam relevantes para avaliar o comportamento mecânico em conformação, tais como dobramento e estampagem. Todos os CPs apresentaram trinca em um dos lados da solda, na região ZTA/MB, junto superfície a qual teve o esforço máximo em tração no ensaio de flexão. Encontra-se na Tabela 6 os valores de tensão máxima, tensão de ruptura e deformação e na Figura 13 a curva de tensão versus deformação dos três corpos de prova ensaiados.

Figura 12
CPs ensaiados em flexão. Aumento das regiões onde encontra-se as soldas e as trincas.
Tabela 6
Resultados dos ensaios de flexão apresentados no gráfico da Figura 13.
Figura 13
Curva de tensão x deformação dos resultados dos três CPs ensaiados apresentados na Tabela 6.

Após o ensaio de flexão, foi realizado o teste de líquido penetrante nas amostras (Figura 14) para verificar a presença de trincas além daquela já identificada na inspeção macroscópica. O resultado confirmou apenas a trinca previamente observada, já destacada na Figura 12.

Figura 14
Ensaio de líquido penetrante nas amostras pós ensaio de flexão apresentados na Figura 12.

TANG et al. [39] estudaram o teste de flexão em três pontos com a finalidade de analisar como os tratamentos térmicos e as condições de carga afetam a fratura e evolução dos danos no material. Estes autores constataram que a direção de aplicação da tensão de cisalhamento máxima influenciou significativamente na superfície de fratura e no comportamento de coalescência dos vazios no interior do material. Em amostras sujeitas a tensões de cisalhamento, a superfície de fratura exibiu bandas de cisalhamento, o que preconiza que a falha ocorreu por coalescência de vazios. Os autores observaram que os vazios cresceram na direção da tensão máxima e ao aumentar a carga, rotacionam em direção a tensão de cisalhamento máxima, causando a fratura.

3.5. Ensaio de dureza

Os resultados obtidos por meio do ensaio de dureza estão apresentados na Figura 15, onde o zero, no eixo horizontal, indica o centro da solda. Observa-se que nas medidas de dureza do primeiro passe de solda há interferências do segundo passe, apresentando uma ZTA ligeiramente mais larga. No gráfico foi apresentado as regiões do MB, ZTA e ZF para facilitar a visualização das variações das medidas de dureza realizadas.

Figura 15
Perfil de dureza referente a cada uma das três linhas de marcação nas áreas onde foram realizadas as indentações. MB – Metal Base; ZTA – Zona Termicamente Afetada; ZF – Zona Fundida

A dureza da ZF variou entre 450 e 560 HV, da ZTA variou entre 350 e 550 HV, e no material base entre 490 e 560 HV. De acordo com os estudos de LIN et al. [40] e GU et al. [32] foi encontrado valores similares para a ZTA e ligeiramente menores para a ZF.

Observa-se que no perfil de dureza referente ao primeiro passe de solda, há uma queda na dureza na ZTA próxima ao MB, algo que também ocorreu nos estudos de CHOI et al. [35] apresentado como uma zona de amolecimento do material. KUNDU et al. [34] também observou essa região, contudo a dureza encontrada nessa região em seus estudos foi relativamente menor, em torno de 240 HV.

ALMEIDA [14] que estudou o mesmo material encontrou valores de dureza similares para o MB e a ZTA, onde também foi observado uma região de menor dureza, o que representa predominantemente a microestrutura recristalizada. Contudo, a região ZF apresentou valores significativamente maiores, sendo observado alguns picos de dureza (700 HV), o que não foi observado no presente trabalho.

3.6. Correlação entre aspectos microestruturais e propriedades mecânicas

Os resultados obtidos permitiram correlacionar a microestrutura com os ensaios de dureza e os testes mecânicos de tração e flexão. Observou-se que o material soldado apresentou menor dureza na ZTA, especialmente na região mais próxima a ZF, onde ocorreram as maiores alterações microestruturais em termos de morfologia e fases, em comparação com o MB. Essa característica foi confirmada pelos ensaios mecânicos, nos quais as regiões de ruptura dos CPs soldados de tração e das regiões de trinca dos CPs soldados do ensaio de flexão concentraram-se na ZTA. No entanto, ao comparar os resultados dos ensaios de tração do material de base e soldado, não foi identificada uma redução significativa nas propriedades LE e LR, sendo os valores obtidos similares. Esses resultados permitem assegurar a capacidade do material soldado de manter um desempenho mecânico global próximo ao do material de base, apesar das alterações localizadas na microestrutura e a redução no alongamento total.

4. CONCLUSÕES

O presente estudo mostrou a viabilidade de soldar aços estampados a quente da classe 22MnB5 com uso de um laser a fibra e dois passes opostos de soldagem. As principais conclusões do estudo foram:
  • a)

    Macroscopicamente as soldas apresentaram um bom aspecto, com alguns microporos em sua região central, os quais não influenciaram significantemente o comportamento mecânico. A largura típica do topo da solda é de 2,5 mm e a penetração de cada solda é de aproximadamente 3,8 mm.

  • b)

    A microestrutura típica do aço, como recebido, é marcado pela martensita pelo fato de já ter passado pela estampagem a quente. A microestrutura observada na zona fundida é majoritariamente martensítica, com ilhas de bainita evidenciadas pelo ataque Le Pera. A zona termicamente afetada apresenta uma maior quantidade de microconstituintes, sendo a martensita, ferrita, bainita e carbonetos evidenciados pela análise metalográfica.

  • c)

    Em termos de tração uniaxial, material soldado se apresenta com maior limite de escoamento (1367 ± 7 MPa), comparativamente com o material de base (1153 ± 29 MPa), porém há um decréscimo tanto do limite de resistência quanto alongamento total. O limite de resistência foi de 1323 ± 28 MPa e 1278 ± 7 MPa, para o material de base e soldado respectivamente. O alongamento total foi de 13,9 ± 0,6% e 6,1 ± 0,4%, para o material de base e soldado respectivamente. As características da têmpera e o amolecimento devido ao ciclo térmico foram associados à estas diferenças.

  • d)

    O material soldado foi testado em condições de flexão, apresentando uma tensão máxima e deformação máxima antes da ruptura de 2551 ± 77 MPa e 7,8 ± 0,2 mm, respectivamente. A trinca observada e verificada por ensaios de líquido penetrante se situa na interface entre a zona termicamente afetada e o material de base, corroborando os dados da literatura.

  • e)

    A dureza Vickers medida transversalmente a solda mostra um platô em torno de 500 HV na zona fundida, um amolecimento na ZTA que chega a 350 HV e uma retomada aos valores originais do material de base (500 HV) cerca de 1,5 mm do centro da solda. Esses valores não mudam significantemente se a medida for feita no meio do primeiro passe de solda, no segundo, ou na região interpasses.

5. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos subsídios de custeio do PROEX/Capes do PPGCEM/IME e particularmente a autora T.G.G. agradece a bolsa de doutorado CAPES/PROEX (Processos 88887.645473/2021-00 e 88887.134786/2025-00), CNPq (Processo 141468/2023-8) e FAPERJ (Processo E-26/202.243/2024). O autor MSFL agradece ao CNPq (407217/2022-3).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    27 Jan 2025
  • Aceito
    14 Maio 2025
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