Acessibilidade / Reportar erro

Argamassa geopolimérica: estudo da degradação por sulfato de sódio e ácido sulfúrico

Geopolymeric mortar: study of degradation by sodium sulfate and sulfuric acid

Resumos

Este trabalho tem por objetivo avaliar a durabilidade de uma argamassa geopolimérica exposta a ambientes altamente agressivos compostos por sulfato de sódio e ácido sulfúrico em soluções com 10% e 5% de concentração, respectivamente. A argamassa foi constituída de metacaulim, cimento Portland, hidróxido de potássio e silicato de sódio alcalino. As propriedades avaliadas foram: resistência à compressão axial e características microestruturais. A microestrutura da pasta geopolimérica foi avaliada por microscopia eletrônica de varredura e por análise termodiferencial. Os resultados indicaram que o metacaulim utilizado não possuiu propriedades satisfatórias para fins de geopolimerização, comprometendo de sobremaneira a resistência mecânica da argamassa submetida aos dois ambientes agressivos.

ácido; ataque químico; durabilidade; geopolímero; sulfato


This work aims to evaluate the durability of a geopolymer mortar in contact with highly aggressive environments by sodium sulfate and sulfuric acid, in solutions with 10wt% and 5wt% of concentration, respectively. The mortar was made with metakaolin, Portland cement, potassium hydroxide and alkaline sodium silicate. The evaluated properties were: axial compressive strength and microstructural characteristics. The microstructure of the geopolymer paste was observed by scanning electron microscopy and thermodiferential analysis. The results indicated that the metakaolin did not have adequate properties for the geopolymerization, causing deleterious effects on the mechanical strength of the mortars which are submitted to both aggressive environments.

acid; chemical attack; durability; geopolymer; sulfate


Argamassa geopolimérica: estudo da degradação por sulfato de sódio e ácido sulfúrico

Geopolymeric mortar: study of degradation by sodium sulfate and sulfuric acid

Mauri, J.; Dias, D.P.; Cordeiro, G.C.; Dias, A.A.

Laboratório de Engenharia Civil, Centro de Ciência e Tecnologia - Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - LECIV/CCT/UENF - Av. Alberto Lamego 2000, 28013-602, Parque Califórnia, Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro-RJ. e-mail: julianamauri@yahoo.com.br, dylmar@uenf.br, gcc@uenf.br, alineuenf@ig.com.br

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo avaliar a durabilidade de uma argamassa geopolimérica exposta a ambientes altamente agressivos compostos por sulfato de sódio e ácido sulfúrico em soluções com 10% e 5% de concentração, respectivamente. A argamassa foi constituída de metacaulim, cimento Portland, hidróxido de potássio e silicato de sódio alcalino. As propriedades avaliadas foram: resistência à compressão axial e características microestruturais. A microestrutura da pasta geopolimérica foi avaliada por microscopia eletrônica de varredura e por análise termodiferencial. Os resultados indicaram que o metacaulim utilizado não possuiu propriedades satisfatórias para fins de geopolimerização, comprometendo de sobremaneira a resistência mecânica da argamassa submetida aos dois ambientes agressivos.

Palavras-chave: ácido, ataque químico, durabilidade, geopolímero, sulfato.

ABSTRACT

This work aims to evaluate the durability of a geopolymer mortar in contact with highly aggressive environments by sodium sulfate and sulfuric acid, in solutions with 10wt% and 5wt% of concentration, respectively. The mortar was made with metakaolin, Portland cement, potassium hydroxide and alkaline sodium silicate. The evaluated properties were: axial compressive strength and microstructural characteristics. The microstructure of the geopolymer paste was observed by scanning electron microscopy and thermodiferential analysis. The results indicated that the metakaolin did not have adequate properties for the geopolymerization, causing deleterious effects on the mechanical strength of the mortars which are submitted to both aggressive environments.

Keywords: acid, chemical attack, durability, geopolymer, sulfate.

1 INTRODUÇÃO

A maioria das pesquisas na área de tecnologia de novos materiais cimentícios visa conferir maior durabilidade através da melhoria das propriedades químicas, físicas ou mecânicas dos aglomerantes. Isto pode ser feito por meio de emprego de aglomerantes que apresentam comportamento diferenciado em relação ao cimento Portland, material aglomerante mais empregado no mundo. A busca por alternativas ao cimento, sobretudo em condições de exposição a ambientes agressivos [1], visa, além da maior durabilidade, mitigar efeitos negativos do emprego deste tradicional material, sobretudo associados ao impacto ambiental atrelado à indústria cimenteira.

Em termos de durabilidade, os ataques químicos por sulfatos e ácidos são freqüentes e afetam a durabilidade das estruturas de materiais cimentícios em longo prazo. O ataque por sulfatos ao material cimentício conduz à expansão, fissuração e deterioração de muitas estruturas da engenharia civil expostas ao ambiente sulfatado, tais como cais, pontes, fundações, tubulações de concreto, etc. [2]. Já o ataque por ácidos, por sua vez, acarreta lixiviação de compostos da matriz cimentícia e degradação gradativa do material.

Uma alternativa ao cimento Portland, amplamente estudada nas últimas décadas, consiste no cimento geopolimérico, que é um cimento polimérico inorgânico, também conhecido como polissialato. Este composto apresenta características particulares que revelam o seu grande potencial de aplicação como aglomerante em substituição total ou parcial ao cimento Portland convencional [3]. De acordo com vários pesquisadores, os materiais obtidos por ativação alcalina são, em geral, mais resistentes do ponto de vista mecânico e apresentam maior durabilidade [4]. Com estes novos cimentos vislumbram-se aplicações nas quais mudanças reológicas bruscas e resistência inicial elevada são necessárias, aplicações em ambientes agressivos e, ainda, devido às propriedades zeolíticas, o emprego na contenção de resíduos tóxicos e/ou radioativos.

A qualidade do geopolímero depende essencialmente da natureza do material de origem. Caso sejam produtos obtidos por calcinação como, por exemplo, metacaulim (caulim calcinado), o geopolímero possuirá boas características de resistência quando comparados com outros produtos de origem não-calcinada. O ativador (substância alcalina) pode ser simples ou composto. A diferença reside no fato de se utilizar um ativador constituído por uma única substância ou por duas ou mais substâncias [5]. Em comparação com os sistemas de cimento convencional, os geopolímeros são materiais que necessitam ainda de uma história longa de serviço para que permita a predição e o controle de sua verdadeira durabilidade estrutural. Desempenhos requeridos, formas e meios para a deterioração, caracterização dessas mudanças e, finalmente, resultados que mapeiem esse novo material em todas suas características são ainda necessários [6].

Alguns estudos já realizados em diferentes tipos de geopolímero puderam mostrar o bom desempenho em ambientes com a presença de sulfatos e ácidos ([5], [7], [8] e [9]). Este trabalho tem por objetivo avaliar a durabilidade de uma argamassa geopolimérica exposta a ambientes altamente agressivos compostos por sulfato de sódio e ácido sulfúrico em soluções com 10% e 5% de concentração, respectivamente.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

O metacaulim utilizado como fonte de sílica (SiO2) e alumina (Al2O3) foi obtido junto à empresa Metacaulim do Brasil. O cimento Portland utilizado como fonte de cálcio (CaO) foi o cimento composto com adição de escória de alto-forno (CPII E-32), fornecido pela Votorantim Cimentos S/A. Como fonte adicional de sílica (SiO2) foi utilizado o silicato de sódio alcalino (Na2SiO3), fornecido pela Unaprosil. Para garantir o pH necessário à geopolimerização foi utilizado hidróxido de potássio (KOH), fornecido pela empresa VETEC. O agregado miúdo utilizado na confecção das argamassas foi proveniente do rio Paraíba do Sul na cidade de Campos dos Goytacazes-RJ. A Figura 1 apresenta o difratograma de raios X do metacaulim, onde se pode observar que o mesmo apresenta elevada cristalinidade, com presença de quartzo (SiO2), anatásio (TiO2), ilita {(K,H3O)Al,Mg,Fe) 2(Si,Al)4O10[(OH)2,(H2O)]} e caulinita [Al2Si2O5(OH)4]. A elevada cristalinidade do metacaulim pouco contribui para a geopolimerização; entretanto, optou-se por esse material comercial pela facilidade em reproduzir os dados da pesquisa em outras regiões e/ou em outra escala de produção.


Foram realizados ciclos de imersão em solução agressiva e secagem ao ar, ambos com 10 dias de duração para a solução de sulfato de sódio. Já para a solução de ácido sulfúrico, o ataque foi realizado em imersão contínua, pois a agressividade do ácido é superior a do sulfato e, em ciclagem, os corpos-de-prova sofreriam grande degradação e não seria possível a realização das análises. As soluções do sulfato de sódio e do ácido sulfúrico foram de 10% e 5% de concentração, respectivamente. Os ciclos agressivos analisados em parâmetros de resistência mecânica foram referentes ao de número 2, 4, 6 e 8. A resistência à compressão foi avaliada em ensaios de compressão axial em prensa Versa Tester com velocidade de carregamento de 0,5 kN/s. As análises microestruturais foram realizadas após o sexto ciclo agressivo em pastas geopoliméricas por meio de microscopia eletrônica de varredura (MEV) e por análises termodiferenciais (ATD).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os valores de resistência à compressão estão indicados na Figura 2. Percebe-se que até o sexto ciclo não houve variação significativa de resistência ao se comparar a argamassa de referência com o geopolímero submetido aos ciclos em água. Com relação ao geopolímero em solução de sulfato de sódio, observa-se uma queda de resistência após o sexto ciclo de exposição, equivalente a 17% do valor de resistência verificado ao final do quarto ciclo. O geopolímero exposto ao sulfato de sódio apresentou razoável comportamento mecânico em comparação com a argamassa de referência. Isto pode ser explicado pelo equilíbrio químico que se estabeleceu entre os compostos da argamassa geopolimérica, à base de compostos de sódio e a solução de sulfato de sódio. O geopolímero mantido em solução de ácido sulfúrico apresenta, após o segundo ciclo, uma redução acentuada de resistência: 43% em relação ao valor inicial e 72% em comparação com a referência. A queda expressiva da resistência à compressão, em relação à referência, é conseqüência da elevada agressividade da solução ácida utilizada.


Na Figura 3 pode-se observar que a pasta geopolimérica exposta à ciclagem em água apresenta uma microestrutura massiva e composta por uma única fase. De acordo com Silva et al. [3] a formação de uma fase única é comum, uma vez que o geopolímero é formado por sílico-aluminatos, com formação de fases não distintas. A matriz geopolimérica apresentou microfissuras em sua superfície que podem ser provenientes de pressões de cristalização de produtos formados no interior da matriz [10].


As Figuras 4 e 5 mostram micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura, que evidenciam alguns aspectos microestruturais das pastas geopoliméricas expostas aos ataques por sulfato de sódio e por ácido sulfúrico, respectivamente. A Figura 4 mostra as micrografias obtidas por MEV da pasta geopolimérica exposta ao ataque por sulfato de sódio. Ao final do sexto ciclo foi observada a formação de produtos expansivos como, por exemplo, de uma estrutura cristalina conhecida por "dente de cachorro". Os cristais presentes no poro da matriz geopolimérica são de barrilha ou natrão (Na2CO3). Cristais semelhantes a estes foram encontrados por Dias [10]. A Figura 5 mostra as micrografias obtidas por MEV da pasta geopolimérica exposta ao ataque por ácido sulfúrico. Ao final do sexto ciclo foi observada a completa lixiviação dos compostos presentes na matriz. O ácido sulfúrico é bastante agressivo e lixiviou a amostra, o que gerou uma superfície bastante degradada e sem nenhum produto expansivo.



As análises termodiferenciais das pastas geopoliméricas são apresentadas nas Figuras 6, 7 e 8 . Pode-se observar que o geopolímero possui estrutura química semelhante às das zeólitas cristalinas, porém, com o diferencial de ser parcialmente cristalino. Com isso, são apresentadas estruturas de minerais que possuem estrutura química semelhante às encontradas nas pastas geopoliméricas.Para a pasta geopolimérica com ciclagem em água (Figura 6) são apresentados na Tabela 1 os compostos encontrados referente ao ensaio de ATD. O pico endotérmico 1 está associado à evaporação da água capilar e adsorvida pelo cimento geopolimérico [1]. O pico endotérmico 2, situado entre 100 e 200ºC, é referente à perda de água estrutural da ilita. No pico endotérmico 3, a estrutura do geopolímero assemelha-se à estrutura de algumas zeólitas, tais como a gismondina, a stilbita e a yugawaralita, as quais possuem perda de água na faixa de temperatura de 250 a 400ºC [12]. O pico endotérmico 4, situado na faixa de temperatura de 400 a 600ºC, é referente à perda de água da laumonita, da faujasita-Na ou da natrolita. Por fim, o pico endotérmico 5 está associado à perda de água da analcima, da erionita ou da ofretita.

A análise térmica diferencial da pasta geopolimérica submetida ao ataque agressivo por sulfato de sódio (Figura 8 ) apresentou a alteração dos picos 2 e 3 em comparação com a pasta geopolimérica submetida à ciclagem em água (pasta de referência), como mostra a Tabela 3. O pico endotérmico 2 situado na faixa de temperatura de 100 a 150ºC é referenciado como a faixa de perda de água do gesso secundário. O pico endotérmico 3, situado na faixa de temperatura de 280 a 300ºC, refere-se à decomposição da anidrita.

A análise térmica diferencial da pasta geopolimérica submetida à solução de ácido sulfúrico (Figura 9) mostra que alguns compostos, antes existentes em água, desapareceram devido à lixiviação decorrente da ação do ácido. Apenas a água livre no pico 1 e os compostos dos picos 2 e 3 referentes à ilita são observados, como mostra a Tabela 4.


4 CONCLUSÕES

Com base nos procedimentos experimentais adotados, é possível observar que:

  • a argamassa geopolimérica mantida na solução de sulfato de sódio apresentou reduzida queda de resistência à compressão axial em comparação à argamassa de referência. Quando mantida na solução de ácido sulfúrico, a argamassa apresentou uma queda expressiva da resistência devido ao grande poder de degradação do ácido utilizado;

  • houve formação de produtos expansivos na argamassa geopolimérica mantida na solução de sulfato de sódio. Para a solução de ácido sulfúrico, observou-se a lixiviação do geopolímero, causando apenas a decomposição dos compostos da matriz geopolimérica;

  • os resultados indicaram que a argamassa geopolimérica apresentou bom desempenho em solução de sulfato de sódio e um desempenho esperado na solução de ácido sulfúrico, com queda de resistência mecânica e lixiviação da pasta geopolimérica devida à agressividade do ácido, comportamento comprovado pelos ensaios de análise térmica diferencial.

5 AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à UENF e à FAPERJ pelo auxílio financeiro e à COPPE/UFRJ e o CETEM/MCT, onde os ensaios de difração de raios X e de análise térmica diferencial foram realizados, respectivamente.

6 BIBLIOGRAFIA

Data de envio: 26/11/08 Data de aceite: 15/10/09

  • [1] SILVA, F.J., Reforço e fratura em compósitos de matriz álcali-ativada, Tese D. Sc., IME, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2000.
  • [2] AL-AKHRAS, N.M., "Durability of metakaolin concrete to sulfate attack", Cement and Concrete Research, v. 36, pp. 1727-1734, 2006.
  • [3] SILVA, F.J., OLIVEIRA, M.C., MACHADO, M.V.S., DUARTE, F.P., THAUMATURGO, C., "Cimentos geopoliméricos", Revista Matéria, v. 7, n. 3, pp. 12, 2002.
  • [4] DAVIDOVITS, J., "Geopolymer: inorganic polymeric new materials", Journal of Thermal Analisys, v. 37, pp. 1633-1656, 1991.
  • [5] PINTO, A.T., Sistemas ligantes obtidos por activação alcalina do metaucalino, Tese D.Sc., Universidade do Minho, Portugal, 2004.
  • [6] NICHOLSON, C., FLETCHER, R., MILLER, N., STIRLING, C., MORRIS, J., HODGES, S., MACKENZIE, K., SCHMUCKER, M., "Building innovation through geopolymer technology", Chemistry in New Zealand, pp. 3, 2005.
  • [7] BAKHAREV, T., "Durability of geopolymer materials in sodium and magnesium sulfate solutions", Cement and Concrete Research, v. 35, pp. 1233-1246, 2005.
  • [8] BAKHAREV, T., "Resistance of geopolymer materials to acid attack", Cement and Concrete Research, v. 35, pp. 658-670, 2005.
  • [9] WALLAH, S.E., RANGAN, B.V., Low-calcium fly ash-based geopolymer concrete: Long-term properties, Faculty of Engineering Curtin University of Technology Perth, Australia, pp. 107, 2006.
  • [10] DIAS, D.P., Cimentos geopoliméricos: estudo de agentes químicos agressivos, aderência e tenacidade à fratura,. Tese D.Sc., IME, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2001.
  • [11] OSORIO, P.D.L., Concepção de um saferoom anti-tornado em betão geopolimérico, Dissertação M. Sc., Universidade do Minho, Portugal, 2006.
  • [12] RAMACHANDRAN, V.S., PAROLI, R.M., BEAUDOIN, J.J., DELGADO, A.H., Handbook of thermal analysis of construction materials, Noyes Publication, New York, pp. 680, 2002.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Dez 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Recebido
      26 Nov 2008
    • Aceito
      15 Out 2009
    Laboratório de Hidrogênio, Coppe - Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com a Associação Brasileira do Hidrogênio, ABH2 Av. Moniz Aragão, 207, 21941-594, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel: +55 (21) 3938-8791 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: revmateria@gmail.com