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Anemia ferropriva em crianças de 6 a 12 meses atendidas na rede pública de saúde do município de Viçosa, Minas Gerais

Iron deficiency anemia in 6 to 12-month-old infants attended at the public health service of Viçosa, Minas Gerais, Brazil

Resumos

Este estudo teve como objetivos verificar a prevalência de anemia em lactentes de 6 a 12 meses atendidos na rede pública de saúde do município de Viçosa, MG e analisar alguns possíveis fatores de risco. As informações foram obtidas através de questionário aplicado aos responsáveis pela criança e através da verificação de medidas antropométricas e da dosagem de hemoglobina por hemoglobinômetro portátil. No diagnóstico de anemia, utilizou-se o ponto de corte de 11 g/dL. A prevalência de anemia ferropriva nas 204 crianças estudadas foi 60,8%, e 55,6% dos casos de anemia eram graves. A média da hemoglobina foi 9,28<FONT FACE=Symbol>±</FONT>1,07 nos anêmicos e 12,07<FONT FACE=Symbol>±</FONT>0,89 mg/dL nos não-anêmicos. A baixa escolaridade paterna e a idade materna mostraram associação estatística com a anemia (p<0,05). A alta prevalência e a gravidade da anemia encontrada neste estudo comprovam a necessidade de prevenção e controle desta carência no município.

anemia ferropriva; deficiência de ferro; estado nutricional; lactente; ferro


This study aimed at verifying the prevalence of anemia in 6 to 12-month-old infantsattended at the public health service of the city of Viçosa, state of Minas Gerais, and analyzing some possible risk factors. Information was obtained through questionnaire applied to those responsible for the infants and through the verification of the anthropometric measures and the hemoglobin dosage by portable hemoglobinometer. In diagnosing anemia, a 11g/dL cutoff point was used. The prevalence of iron deficiency anemia in a total of 204 infants reached 60.8%, and 55.6% of the cases of anemia were serious. The hemoglobin average was 9.28<FONT FACE=Symbol>±</FONT>1.07 mg/dL in anemic infants, and 12.07<FONT FACE=Symbol>±</FONT> 0.89 mg/dL in non-anemic ones. The father's low school level and the mother's age showed statistical association with anemia (p<0.05). A high prevalence and severity of the anemia was found, emphasizing the need for prevention and control of this disease in the city of Viçosa.

anemia; iron-deficiency; iron deficiency; nutritional status; infant; iron


ORIGINAL | ORIGINAL

Anemia ferropriva em crianças de 6 a 12 meses atendidas na rede pública de saúde do município de Viçosa, Minas Gerais

Iron deficiency anemia in 6 to 12– month – old infants attended at the public health service of Viçosa, Minas Gerais, Brazil

Danielle Góes da SILVA1 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Sylvia do Carmo Castro FRANCESCHINI1 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Silvia Eloiza PRIORE1 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Sônia Machado Rocha RIBEIRO1 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Sophia Cornbluth SZARFARC2 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Sônia Buongermino SOUZA2 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Laerte Pereira ALMEIDA3 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Nerilda Martins Miranda de LIMA4 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

Úrsula Comastri de Castro MAFFIA4 1 Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/ Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI. E-mail: sylvia@mail.ufv.br

RESUMO

Este estudo teve como objetivos verificar a prevalência de anemia em lactentes de 6 a 12 meses atendidos na rede pública de saúde do município de Viçosa, MG e analisar alguns possíveis fatores de risco. As informações foram obtidas através de questionário aplicado aos responsáveis pela criança e através da verificação de medidas antropométricas e da dosagem de hemoglobina por hemoglobinômetro portátil. No diagnóstico de anemia, utilizou-se o ponto de corte de 11 g/dL. A prevalência de anemia ferropriva nas 204 crianças estudadas foi 60,8%, e 55,6% dos casos de anemia eram graves. A média da hemoglobina foi 9,28±1,07 nos anêmicos e 12,07±0,89 mg/dL nos não-anêmicos. A baixa escolaridade paterna e a idade materna mostraram associação estatística com a anemia (p<0,05). A alta prevalência e a gravidade da anemia encontrada neste estudo comprovam a necessidade de prevenção e controle desta carência no município.

Termos de indexação: anemia ferropriva, deficiência de ferro, estado nutricional, lactente, ferro.

ABSTRACT

This study aimed at verifying the prevalence of anemia in 6 to 12-month-old infantsattended at the public health service of the city of Viçosa, state of Minas Gerais, and analyzing some possible risk factors. Information was obtained through questionnaire applied to those responsible for the infants and through the verification of the anthropometric measures and the hemoglobin dosage by portable hemoglobinometer. In diagnosing anemia, a 11g/dL cutoff point was used. The prevalence of iron deficiency anemia in a total of 204 infants reached 60.8%, and 55.6% of the cases of anemia were serious. The hemoglobin average was 9.28±1.07 mg/dL in anemic infants, and 12.07± 0.89 mg/dL in non-anemic ones. The father's low school level and the mother's age showed statistical association with anemia (p<0.05). A high prevalence and severity of the anemia was found, emphasizing the need for prevention and control of this disease in the city of Viçosa.

Index terms: anemia, iron-deficiency, iron deficiency, nutritional status, infant, iron.

INTRODUÇÃO

A anemia causada pela deficiência de ferro vem aumentando nas últimas décadas, acometendo cerca de dois bilhões de habitantes no mundo todo (Fisberg et al., 1998). Crianças e gestantes representam um grupo com grande vulnerabilidade a esta carência, em virtude do aumento das necessidades de ferro, induzidas pela rápida expansão da massa celular vermelha e pelo crescimento acentuado dos tecidos (Szarfarc et al., 1995).

No Brasil, a anemia ferropriva constitui um importante problema de saúde pública, em face da prevalência nacional, pois atinge 50% dos menores de 2 anos e 35% das gestantes (Carvalho, 1999).

Estudos em diversas regiões do País vêm demonstrando alta prevalência de anemia em crianças de várias faixas etárias. Salzano et al. (1985), analisando dois serviços ambulatoriais, em Recife, PE, encontraram prevalências que variaram de 41,0% a 77,0% em faixas etárias inferiores a 24 meses. Soares et al. (2000), estudando crianças menores de 12 meses, em dois bairros periféricos de Fortaleza, CE, registraram prevalência de 60,0%. Prevalências de 28,7% em Brasília, DF (Schmitz et al., 1998) e de 54,0% em Criciúma, SC (Neuman et al., 2000) foram observadas em menores de 36 meses. Monteiro et al. (2000) encontraram 46,9% de crianças anêmicas de 0 a 59 meses, no município de São Paulo. Neste mesmo estudo, foi observado um aumento de cerca de 25,0% na prevalência de anemia durante o período de 1984/85 a 1995/96. A faixa etária inferior a 24 meses é citada, na maioria das pesquisas, como o grupo que apresenta maiores prevalências (Salzano et al., 1985; Szarfarc et al., 1995; Schmitz et al., 1998; Monteiro et al., 2000).

Os lactentes, particularmente, estão submetidos a uma maior dependência das fontes dietéticas de ferro, em razão dos elevados requerimentos fisiológicos deste elemento para atender à intensa velocidade de crescimento (Souza et al., 1997). Neste grupo, destacam-se como fatores envolvidos na etiologia da anemia ferropriva: as reservas de ferro ao nascer, a velocidade de crescimento, as perdas do mineral e a ingestão e/ou absorção insuficiente de ferro dietético (Sigulem, 1988).

Recém-nascidos de baixo peso, por desnutrição intra-uterina ou prematuridade, acumulam menor quantidade de ferro em comparação com os recém-nascidos a termo, pois o mais importante aumento de peso e armazenamento deste mineral ocorre no último trimestre da vida intra-uterina. Para o recém-nascido a termo e com peso adequado à idade gestacional, o estoque deste nutriente ao nascimento (75 mg/kg) garante o suprimento até o quarto ou sexto mês, quando o ferro da dieta passa a ser fundamental na prevenção da anemia (Sigulem, 1988; Loggetto et al., 1995; Szarfarc et al., 1995), visto que, neste período de vida, a intensa velocidade de crescimento provoca esgotamento das reservas férricas do bebê.

O curto tempo de aleitamento materno exclusivo, a introdução tardia ou insuficiente de alimentos ricos em ferro e o consumo inadequado de estimuladores de sua absorção têm sido os fatores indicados como causas de anemia em crianças (Szarfarc, 1988; Schmitz et al., 1998).

Assim, em virtude de a anemia ferropriva ser considerada uma carência nutricional de grande destaque em nosso meio, tanto por sua magnitude quanto por sua precocidade, desenvolveu-se este estudo objetivando verificar a sua prevalência em crianças de 6 a 12 meses, atendidas na rede pública de saúde do município de Viçosa, MG, e também analisar alguns possíveis fatores de risco.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

O estudo foi constituído por 204 crianças na faixa etária de 6 a 12 meses, atendidas em dois serviços de saúde da rede pública do município de Viçosa, MG. Destes, um localiza-se em bairro periférico e outro em região central. Esta amostra corresponde a aproximadamente 30% das crianças na faixa etária de 6 a 12 meses do município.

Este trabalho fez parte de um estudo nacional sobre dosagem de hemoglobina no primeiro ano de vida, desenvolvido pelo Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, e Viçosa foi um dos municípios que participaram dessa pesquisa. O período de coleta de dados foi de setembro de 1998 a setembro de 1999.

A amostra foi obtida segundo a demanda espontânea dos serviços. Após autorização assinada pelos pais ou responsáveis, foi preenchido um questionário, verificado o peso e o comprimento da criança, e dosada a hemoglobina. Todos os responsáveis receberam orientação nutricional quanto aos alimentos fontes de ferro e inibidores de sua absorção, bem como quanto às características da dieta específica à faixa etária. Além disto, as crianças diagnosticadas como anêmicas foram encaminhadas para o serviço médico.

O questionário incluía informações sobre a criança (idade, sexo, peso ao nascer), a mãe (idade, escolaridade) e o pai (escolaridade). A prática alimentar foi verificada por meio de um questionário de freqüência alimentar, analisando-se apenas os aspectos qualitativos da dieta.

Algumas informações de determinados bebês não foram obtidas, em razão do desconhecimento por parte da mãe ou responsável; desta forma, o número de crianças estudadas não foi o mesmo para todas as variáveis.

Os lactentes foram pesados em balança eletrônica digital, com capacidade de 150.kg e divisão de 50.g. O comprimento foi medido em antropômetro infantil de 1,0.m, dividido em cm e subdividido em mm. As técnicas utilizadas foram as recomendadas por Jelliffe (1968).

A dosagem de hemoglobina foi verificada através de um hemoglobinômetro portátil, marca HemoCue, para leitura direta da amostra sangüínea obtida por puntura do pé ou do dedo da mão, sendo esta última usada para as crianças que já andavam.

Para diagnóstico de anemia ferropriva, utilizou-se o ponto de corte de 11 g/dL, preconizado pela Organização Mundial da Saúde para a respectiva faixa etária (DeMayer, 1989), enquanto para o diagnóstico de anemia grave foram considerados os valores de hemoglobina inferiores a 9,5 g/dL (Szarfarc, 1988; Schmitz et al., 1998).

Na avaliação do estado nutricional, foram usados os índices peso/idade, estatura/idade e peso/estatura, expressos em escore–Z, seguindo a referência antropométrica do National Center for Health Statistics (NCHS) (Organización..., 1983). As crianças com peso/idade ou peso/estatura inferiores a -2 desvios-padrão foram classificadas como desnutridas, e aquelas com estatura/idade inferior a -2 desvios-padrão como de baixa estatura (Organización..., 1995).

Os dados foram tabulados, utilizando-se o programa Epi Info, versão 6.04, específico para análises epidemiológicas.

Na análise estatística, foram aplicados o teste Qui-quadrado, o de Fisher e o "t'' de Student, considerando-se significância de p<0,05.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A maioria das crianças (52%) pertencia ao sexo masculino, e aproximadamente 19,0% das mães e dos pais tinham escolaridade inferior a quatro anos. Em relação à idade materna, 18,5% eram adolescentes (idade < 20 anos). Quanto à duração da gestação e peso ao nascer, aproximadamente 7,0% das crianças estudadas nasceram antes dos 9 meses e com menos de 2500.g (Tabela 1).

A análise do estado nutricional revelou valores muito próximos aos encontrados no país pela Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde (Pesquisa..., 1996), com prevalência de desnutrição de 6,5% para peso/idade e de 2,5% para peso/estatura, e ocorrência de 6,0% de baixa estatura (Tabela 2).

Nesta população, a prevalência de anemia ferropriva foi alta, correspondendo a um percentual de 60,8%, e mais da metade (55,6%) das crianças diagnosticadas como anêmicas apresentou anemia grave (Hb< 9,5 g/dL) (Tabela 3).

Resultados diferentes do valor da prevalência de anemia obtido neste estudo, isto é, 67,8%, 71,8%, 65,4% e 76,0%, mas também considerados altos, foram encontrados por Devincenzi (1999), Monteiro et al. (2000), Neuman et al. (2000) e Soares et al. (2000), respectivamente, para crianças menores de 12 meses. Portanto, comprova-se que esta carência nutricional acomete de maneira significativa crianças de 6 a 12 meses, em fase de crescimento intenso e com conseqüente aumento das necessidades de ferro dietético, quando a alimentação complementar passa a exercer importante papel na prevenção de anemia (Sigulem, 1988).

Verifica-se um percentual de anêmicos de 65,1% no sexo masculino e 56,1% no feminino, não havendo diferença estatística. Estudos como os de Devincenzi (1999) e Neuman et al. (2000) também não encontraram associação entre anemia e sexo (Tabela 4).

Ao considerar o nível de instrução da mãe e do pai como indicador socioeconômico, observa-se que, nesta pesquisa, a anemia não esteve relacionada à baixa escolaridade materna, enquanto a paterna demonstrou associação estatística (Tabela 4). É possível estar a maior escolaridade paterna relacionada com uma melhor inserção do homem no mercado de trabalho e, conseqüentemente, com uma maior renda e disponibilidade de alimentos no domicílio, além de maior acesso aos serviços de saúde. O aumento da escolaridade paterna e da renda familiar relacionou-se com menores prevalências de anemia em estudo realizado por Neuman et al. (2000).

Diferentemente da desnutrição energético-protéica, a anemia está presente em todas as classes sociais, embora haja maior risco nas famílias de menor nível socioeconômico (Schmitz, 1999). Entretanto, em levantamento realizado por Sigulem et al. (1978), não foi observada associação entre o aparecimento de anemia em crianças menores de 24 meses e o baixo nível socioeconômico, havendo associação somente com as características da dieta, pobre em ferro.

Gestantes adolescentes apresentam maior risco de ter filhos prematuros e com baixo peso ao nascer, predispondo-os a menores reservas de ferro e, por conseguinte, à anemia. Além disso, elas são mais inexperientes quanto aos cuidados com a criança. Neste estudo, foi constatada associação estatística significante entre anemia e idade materna. Neuman et al. (2000) também observaram maior prevalência de anemia entre mães adolescentes.

A deficiência de ferro pode se manifestar mais precocemente em recém-nascidos pré-termo, pois suas reservas neonatais deste mineral são menores e sua taxa de crescimento é maior em relação a dos recém-nascidos a termo (Dallman, 1996). Apesar de não ter havido diferença estatística significante quanto à prematuridade, esta demonstrou ser um possível fator de risco para a anemia, visto que 78,6% dos prematuros eram anêmicos.

Recém-nascidos de baixo peso têm menores reservas de ferro, sendo maiores os riscos de apresentarem anemia mais precocemente (Lönnerdal & Dewey, 1996). No presente estudo, dentre as crianças nascidas com baixo peso, 66,7% encontravam-se anêmicas, demonstrando, portanto, a importância da atenção pré-natal no sentido de reduzir a incidência de baixo peso ao nascer na população.

Apesar de não se observarem diferenças significantes entre anemia e estado nutricional, em crianças com déficit de peso/idade, peso/estatura e estatura/idade, as prevalências de anemia foram altas (69,2%, 60,0% e 75,0%, respectivamente). De acordo com Waterlow (1996), os fatores etiológicos da anemia em crianças desnutridas ainda não estão suficientemente esclarecidos, sugerindo possíveis aspectos dietéticos capazes de limitar a hematopoiese, a adaptação à redução da demanda de oxigênio e o aumento de eritrócitos.

A média da concentração de hemoglobina entre os anêmicos (9,3±1,07.g/dL) foi estatisticamente menor do que entre os não-anêmicos, caracterizando a gravidade dos casos de anemia nesta população. Verifica-se para as crianças com anemia uma média de idade materna um pouco menor, quando comparada àquela das crianças sem esta deficiência nutricional. A diferença média entre o peso ao nascer dos anêmicos e o dos não-anêmicos foi de aproximadamente 33 g, não havendo diferença significante entre eles (Tabela 5).

Baseado na importância da alimentação de desmame para assegurar o atendimento das necessidades nutricionais de ferro no primeiro ano de vida, avaliou-se o consumo de alimentos de alta biodisponibilidade e de estimuladores da absorção de ferro. Conforme se observa na Figura 1, o consumo desses alimentos, entre as 204 crianças estudadas, não apresentou diferença estatística entre anêmicos e não-anêmicos. Entretanto, estes dados não excluem a importância desses alimentos na prevenção da anemia ferropriva, pois trata-se de uma análise qualitativa, havendo necessidade, mesmo no primeiro ano de vida, de se avaliar quantitativamente a prática alimentar (Sigulem et al., 1978).


CONCLUSÃO

De acordo com os resultados obtidos no presente estudo, a anemia ferropriva é uma carência nutricional que acomete, significativamente, crianças no primeiro ano de vida, no município de Viçosa, MG.

Com prevalência superior a 50% de casos graves, crianças de 6 a 12 meses atendidas na rede pública de saúde caracterizam-se como um grupo de risco para a anemia, demonstrando tanto a precocidade quanto a gravidade desta carência no município estudado.

A escolaridade paterna e a idade materna constituíram fatores de risco para anemia. Sobretudo a baixa escolaridade do pai, a qual possivelmente, determina o baixo poder aquisitivo. Com referência à gestação em idades precoces, provavelmente relaciona-se com menores reservas de ferro do recém-nascido, além da inexperiência da mãe quanto ao cuidado com o lactente.

Considerando-se os efeitos prejudiciais da anemia, e reconhecendo a importância das condições de saúde e nutrição para a garantia de crescimento e desenvolvimento adequados, os resultados deste estudo alertam para a necessidade de implantação de medidas preventivas e de controle nesta população.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, as ações básicas para prevenção da anemia ferropriva incluem a suplementação medicamentosa, o controle das infecções parasitárias e a educação associada às medidas de aumento do consumo de ferro e à fortificação de alimentos com este mineral (Demayer, 1989).

A maior atenção ao acompanhamento pré-natal, diminuindo o baixo peso ao nascer e a prematuridade e, assim, assegurando melhores condições de nascimento, bem como o incentivo ao aleitamento materno exclusivo e a orientação sobre a adequada alimentação de desmame, poderão ser medidas importantes para a redução da prevalência de anemia em crianças no primeiro ano de vida, no município de Viçosa, MG.

Recebido para publicação em 25 de maio e aceito em 9 de novembro de 2001

2 Departamento de Nutrição, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo.

3 Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Uberlândia.

4 Setor de Nutrição, Secretaria Municipal de Saúde, Prefeitura Municipal de Viçosa. Apoio: FAPESP, processo 96/068863.

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    Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Campus Universitário, 36571-000, Viçosa, MG, Brasil. Correspondência para/
    Correspondence to: S.C.C. FRANCESCHINI.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jan 2006
    • Data do Fascículo
      Set 2002

    Histórico

    • Recebido
      25 Maio 2001
    • Aceito
      09 Nov 2001
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