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Nutrição e excesso de massa corporal: fatores de risco cardiovascular em adolescentes

Nutrition and excess body mass: cardiovascular risk factors in adolescents

Resumos

OBJETIVO: Verificar a freqüência de hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar inadequado em adolescentes com excesso de massa corporal. MÉTODOS: Estudo transversal com 56 adolescentes, sendo 21 meninos e 35 meninas, entre 10 e 19 anos. As variáveis foram: sexo, idade, peso, estatura, índice de massa corporal, classificação nutricional, hipertensão arterial, atividade física e consumo alimentar de risco cardiovascular. Avaliou-se o consumo alimentar com questionário que estabelece consumo de risco cardiovascular entre adolescentes por categorias de consumo, segundo pontuações por quantidades e freqüência consumida. Do questionário originaram-se as variáveis categorias de consumo e pontuações. Aplicou-se correlação de Spearman entre índice de massa corporal, idade e pontuação de consumo. Por teste "t" de Student compararam-se entre os sexos as médias de índice de massa corporal, idade, massa corporal, estatura e pontuação de consumo, e por qui-quadrado as freqüências por presença e ausência de hipertensão arterial, prática de atividade física e categorias de consumo. Com teste Kruskal-Wallis, analisou-se a variância da pontuação de consumo entre grupos. RESULTADOS: Não houve diferenças estatísticas entre os sexos para atividade física (p=0,68), hipertensão arterial (p=0,94), excesso de massa corporal (p=0,31) e categorias de consumo (p=0,53). O índice de massa corporal não se correlacionou com a idade (r=0,20 e p=0,14) e a pontuação de consumo (r=-0,06 e p=0,60). Não houve diferença estatística (p=0,19) na pontuação do consumo por grupos. CONCLUSÃO: Os adolescentes não apresentaram distinções por sexo quanto à prevalência de hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar de risco cardiovascular, embora as meninas apresentassem maior freqüência desses fatores quando agrupados.

adolescente; doenças cardiovasculares; nutrição; obesidade


OBJECTIVE: To assess the frequency of arterial hypertension, inactivity and inadequate food intake related to cardiovascular risk in adolescents with excess body mass. METHODS: Cross-sectional study including 56 adolescents (21 boys and 35 girls) aged 10-19 years. Variables were: gender, age, weight, height, body mass index, nutritional classification, arterial hypertension, physical activity, and food intake categories scored in terms of cardiovascular risk. This intake was assessed through a questionnaire which established cardiovascular risk intake among adolescents by intake categories according to scored amounts and intake frequency. The questionnaire originated the variables intake categories and scores. Spearman's correlation was applied among body mass index, age and intake score. Student's test compared body mass index averages, age, body mass, stature and intake score, according to gender; and the chi-square test assessed frequencies according to presence and absence of arterial hypertension, physical exercise practice and intake categories. The Kruskal-Wallis test analyzed the variation of intake scores among the groups. RESULTS: There was no statistical difference between genders in physical activity (p=0.68), arterial hypertension (p=0.94), body mass excess (p=0.31), or intake categories (p=0.53). Body mass index did not correlate with age (r=0.20, p=0.14) or intake score (r=-0.06, p=0.60). There was no statistical difference (p=0.19) in intake scores among the groups. CONCLUSION: Adolescents showed no gender differences concerning arterial hypertension prevalence, inactivity and food intake related to cardiovascular risk, although for girls these factors were more frequent when these were grouped.

adolescent; cardiovascular diseases; nutrition; obesity


ORIGINAL ORIGINAL

Nutrição e excesso de massa corporal: fatores de risco cardiovascular em adolescentes

Nutrition and excess body mass: cardiovascular risk factors in adolescents

Ana Lúcia Viégas RêgoI ; Vera Lucia ChiaraII, * * Correspondência para/ Correspondence to: V.L. CHIARA.

ICurso de Especialização em Nutrição Materno-Infantil, Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IIDepartamento de Nutrição Social, Instituto de Nutrição, Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rua São Francisco Xavier, n. 524, 12º andar, Maracanã, 20559-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Verificar a freqüência de hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar inadequado em adolescentes com excesso de massa corporal.

MÉTODOS: Estudo transversal com 56 adolescentes, sendo 21 meninos e 35 meninas, entre 10 e 19 anos. As variáveis foram: sexo, idade, peso, estatura, índice de massa corporal, classificação nutricional, hipertensão arterial, atividade física e consumo alimentar de risco cardiovascular. Avaliou-se o consumo alimentar com questionário que estabelece consumo de risco cardiovascular entre adolescentes por categorias de consumo, segundo pontuações por quantidades e freqüência consumida. Do questionário originaram-se as variáveis categorias de consumo e pontuações. Aplicou-se correlação de Spearman entre índice de massa corporal, idade e pontuação de consumo. Por teste "t" de Student compararam-se entre os sexos as médias de índice de massa corporal, idade, massa corporal, estatura e pontuação de consumo, e por qui-quadrado as freqüências por presença e ausência de hipertensão arterial, prática de atividade física e categorias de consumo. Com teste Kruskal-Wallis, analisou-se a variância da pontuação de consumo entre grupos.

RESULTADOS: Não houve diferenças estatísticas entre os sexos para atividade física (p=0,68), hipertensão arterial (p=0,94), excesso de massa corporal (p=0,31) e categorias de consumo (p=0,53). O índice de massa corporal não se correlacionou com a idade (r=0,20 e p=0,14) e a pontuação de consumo (r=-0,06 e p=0,60). Não houve diferença estatística (p=0,19) na pontuação do consumo por grupos.

CONCLUSÃO: Os adolescentes não apresentaram distinções por sexo quanto à prevalência de hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar de risco cardiovascular, embora as meninas apresentassem maior freqüência desses fatores quando agrupados.

Termos de indexação: adolescente; doenças cardiovasculares; nutrição; obesidade.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To assess the frequency of arterial hypertension, inactivity and inadequate food intake related to cardiovascular risk in adolescents with excess body mass.

METHODS: Cross-sectional study including 56 adolescents (21 boys and 35 girls) aged 10-19 years. Variables were: gender, age, weight, height, body mass index, nutritional classification, arterial hypertension, physical activity, and food intake categories scored in terms of cardiovascular risk. This intake was assessed through a questionnaire which established cardiovascular risk intake among adolescents by intake categories according to scored amounts and intake frequency. The questionnaire originated the variables intake categories and scores. Spearman's correlation was applied among body mass index, age and intake score. Student's test compared body mass index averages, age, body mass, stature and intake score, according to gender; and the chi-square test assessed frequencies according to presence and absence of arterial hypertension, physical exercise practice and intake categories. The Kruskal-Wallis test analyzed the variation of intake scores among the groups.

RESULTS: There was no statistical difference between genders in physical activity (p=0.68), arterial hypertension (p=0.94), body mass excess (p=0.31), or intake categories (p=0.53). Body mass index did not correlate with age (r=0.20, p=0.14) or intake score (r=-0.06, p=0.60). There was no statistical difference (p=0.19) in intake scores among the groups.

CONCLUSION: Adolescents showed no gender differences concerning arterial hypertension prevalence, inactivity and food intake related to cardiovascular risk, although for girls these factors were more frequent when these were grouped.

Indexing terms: adolescent; cardiovascular diseases; nutrition; obesity.

INTRODUÇÃO

As elevadas prevalências de doenças cardiovasculares (DCV) e de obesidade na população brasileira, ao longo dos anos, vêm sendo associadas à redução da prática de atividade física e a modificações no padrão alimentar1. As mudanças na alimentação revelaram aumento do consumo de açúcares simples, em detrimento do consumo de carboidratos complexos, e de gorduras saturadas e trans, além de redução no consumo de hortaliças, frutas e fibras2,3.

Diversas doenças cardiovasculares associadas ao sobrepeso e à obesidade, têm sido detectadas na infância e adolescência, até a idade adulta1,4. A fase da adolescência é particularmente importante, devido às mudanças físicas e psicossociais que ocorrem de forma acelerada, facilitando o desenvolvimento de fatores de risco para tais enfermidades. Em várias regiões do país, estudos apontam a crescente presença de sobrepeso e obesidade, além de doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial e hipercolesterolemia, já na adolescência1,5,6.

São múltiplos os fatores de risco para doenças cardiovasculares apontados na literatura. No entanto, têm-se enfatizado a hipertensão arterial, o diabetes, o excesso de massa corporal, as variáveis alimentares e o sedentarismo7.

Fatores de risco são atributos ou exposições que elevam a probabilidade de ocorrência de determinada doença8. Segundo Marcondes & Laurenti9, a presença de alguns fatores de risco para DCV contribui para estabelecer a possibilidade de risco em grupos populacionais e indivíduos. Este estudo teve por objetivo verificar a freqüência de hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar inadequado em adolescentes com excesso de massa corporal.

MÉTODOS

A população de adolescentes estudada originou-se no Ambulatório do Núcleo de Estudo da Saúde do Adolescente (NESA), do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), na cidade do Rio de Janeiro. A pesquisa foi realizada no período de outubro de 2001 a janeiro de 2002, tendo sido retomada de maio de 2004 a julho de 2004, durante a atuação da pesquisadora no serviço, e os dados referiram-se sempre à primeira consulta. A amostra incluiu todos os adolescentes atendidos no período do estudo, desde que os mesmos apresentassem excesso de massa corporal. Foram 56 adolescentes, sendo 33 do sexo feminino e 21 do masculino, com idades entre 10 a 19 anos.

As variáveis do estudo foram: sexo, idade, massa corporal, estatura, índice de massa corporal (IMC=kg/m2), classificação nutricional, diagnóstico clínico de hipertensão arterial, prática de atividade física e consumo alimentar de risco cardiovascular. Esta variável de consumo foi subdividida entre categorias de consumo e pontuação de consumo, sendo definidas com a aplicação de um questionário de freqüência alimentar6. A proposta do referido instrumento é identificar adolescentes com consumo de risco para doenças cardiovasculares a partir de questionário reduzido. O estudo reporta o desenvolvimento de teste preliminar de replicabilidade, mas, até a realização desta pesquisa, são desconhecidos os resultados sobre validação.

O questionário de freqüência inclui nove alimentos com suas respectivas pontuações, obtidas de acordo com o consumo diário, semanal e a totalização. Para avaliar a adequação do consumo alimentar dos adolescentes quanto ao risco de DCV, o instrumento propõe critérios de classificação do consumo, sugerindo três categorias: consumo adequado, com pontuação total de até 100 pontos; consumo elevado, entre 101 e 119, e consumo muito elevado, para valores iguais ou superiores a 120 pontos. Embora o estudo original6 sugerisse que o questionário fosse auto-aplicável, optou-se, nesta pesquisa, por sua aplicação pelo próprio pesquisador.

Para a classificação nutricional, seguiu-se a conduta do serviço, utilizando-se o IMC conforme critérios da Organização Mundial da Saúde10. Os adolescentes que apresentaram o IMC com valores entre percentis 85 (inclusive) e 95 (exclusive) foram classificados como sobrepeso, enquanto que, para obesidade, incluíram-se os adolescentes com valores de IMC acima do percentil 95 (inclusive), segundo sexo e idade. A massa corporal e a estatura foram aferidas por nutricionista, de acordo com o proposto por Lohman11.

Os dados deste estudo originaram-se do prontuário de uso da equipe multidisciplinar e da aplicação do questionário de consumo alimentar, sendo ambas as informações referentes ao mesmo dia da consulta. Elaborou-se um formulário incluindo, na parte inicial, dados individuais sobre: nome, sexo, data de nascimento, data da consulta, idade e prática de atividade física.

Para o conhecimento sobre a prática de atividade física, perguntou-se aos adolescentes se os mesmos praticavam ou não algum tipo de atividade física e, em caso afirmativo, solicitou-se que especificassem o tipo, a freqüência semanal e o tempo destinado à atividade. Foram considerados praticantes de atividade física os adolescentes que declararam freqüência de, pelo menos, 30 minutos de exercício, realizados duas vezes na semana, com base no trabalho de Matsudo et al.12, que caracteriza como prática de atividade física a realização de pelo menos 60 minutos por semana.

A segunda parte do formulário continha dados antropométricos, a saber: massa corporal, estatura, IMC e classificação do estado nutricional. No mesmo bloco foi registrada a presença ou não de hipertensão arterial, já diagnosticada pela equipe médica, que adotou o critério universalmente recomendado e estabelecido por Task Force Report on High Blood Pressure in children and adolescents: a Working Group Report from the National High Blood Pressure Education Program13.

Na terceira parte foram incluídos os resultados obtidos por meio da aplicação do questionário de avaliação do consumo alimentar, informando-se a classificação dos adolescentes, segundo categoria de consumo e pontuação obtida com o instrumento aplicado.

Os dados foram analisados de forma descritiva, além de comparar as médias de IMC e da pontuação de consumo entre os sexos, por meio do teste "t" de Student. Aplicou-se o teste de qui-quadrado (c2) para comparar entre os sexos, a distribuição de freqüência dos adolescentes quanto às variáveis: atividade física, hipertensão arterial, classificação nutricional e categorias de consumo alimentar. Analisou-se a correlação entre as variáveis IMC, com idade e pontuação de consumo dos alimentos pelo teste de correlação não-paramétrica de Spearman.

Verificou-se a freqüência dos adolescentes, segundo o sexo, por grupos de fatores de risco para doenças cardiovasculares. Para tanto foram definidos quatro grupos: (1) com excesso de massa corporal, exclusivamente; (2) com hipertensão arterial e excesso de massa corporal, mas não sedentários; (3) sedentários e com excesso de massa corporal, mas não hipertensos e, por último, (4) com excesso de massa corporal, hipertensão arterial e sedentários. Desenvolveu-se análise de variância com aplicação do teste Kruskal-Wallis (H), com os dados contínuos da pontuação de consumo alimentar dos adolescentes, subdivididos segundo grupos de fatores de risco. A finalidade foi verificar se existiriam diferenças nas distribuições das pontuações de consumo alimentar, a partir do aumento de presença de fatores de risco para DCV.

A análise dos dados utilizou os programas estatísticos Epi Info versão 6.114 e SAS versão 7.1215.

RESULTADOS

As médias de idade (p=0,15), massa corporal (p=0,22) e IMC (p=0,96) não revelaram diferenças estatisticamente significantes entre os sexos, embora tenha sido observado elevado valor de IMC entre os adolescentes do sexo masculino. Diferenças estatisticamente significantes foram encontradas entre as médias de estatura (p<0,001), tendo os meninos se revelado mais altos. O sexo feminino apresentou o maior valor da pontuação de consumo dos alimentos, porém também não foi encontrada diferença estatística significante p= 0,53 entre as médias (Tabela 1).

Os adolescentes revelaram praticar regularmente atividade física, com prevalência de 46,4% no grupo, enquanto que, em torno de 50,0%, apresentavam hipertensão arterial. A análise por categorias de consumo alimentar para risco cardiovascular demonstrou distribuição similar, se considerado como adequado e não-adequado (não-adequado = elevado e muito elevado). Não houve diferença estatisticamente significante entre os sexos, em nenhuma dessas variáveis (Tabela 2). A Tabela 3 demonstra que o IMC não se correlacionou com a idade e a pontuação de consumo alimentar dos adolescentes, tanto entre os sexos quanto para todo o grupo.

Segundo dados expressos na Figura 1, o sexo feminino apresentou mais elevada freqüência, entre os quatro grupos considerados de risco cardiovascular.


A análise de variância não demonstrou diferenças estatisticamente significantes entre as pontuações de consumo alimentar nos grupos estabelecidos (p= 0,19) (Tabela 4).

DISCUSSÃO

A prevalência de sobrepeso e obesidade triplicou no Brasil nas últimas décadas1. Os adolescentes que apresentam excesso de massa corporal são focos de atenção especial, por se tratar de condição nutricional que se reflete negativamente na situação de saúde atual e futura. A Organização Mundial da Saúde16 destacou, recentemente, a gravidade do ganho excessivo de massa corporal, principalmente ao final da adolescência, observando que, no mundo, cerca de 20% dos adolescentes nessa condição apresentam fatores de risco de DCV.

As adolescentes do presente estudo se encontravam predominantemente em fase pós-menarca, com média de idade em torno de 15 anos. Nesse período o ganho estatural evolui muito lentamente, enquanto o ganho ponderal ocorre mais diretamente em função do acúmulo de gordura, especialmente no sexo feminino17. Esse aspecto do processo de crescimento e desenvolvimento na adolescência, para o sexo feminino, pode desencadear tanto o excesso de massa corporal quanto outros fatores de risco para DCV. Considerando-se os diferentes agrupamentos de fatores adotados neste estudo, foram as meninas que sempre apresentaram mais elevada freqüência. Tais resultados colocaram adolescentes em condições de saúde mais inadequadas do que os meninos.

O estudo Schaefer18 mostrou que a mortalidade por doenças cardiovasculares que, em tempos passados, foi dominante no sexo masculino, atinge atualmente homens e mulheres de forma semelhante.

Entre os adolescentes estudados, a prática de atividade física foi comum para quase 50% do grupo. No entanto, pesquisa de caráter domiciliar desenvolvida em 1996, no Rio de Janeiro, observou que apenas 20% dos adolescentes realizavam atividade física regularmente19. Para Ekelund et al.20, ainda é controversa a ação da prática de atividade física durante a infância e a adolescência sobre o peso corporal. Todavia, estudiosos consideram que resultados distintos são conseqüência da forma como se investiga essa prática21, 22.

Sugere-se que os efeitos da prática de atividade física sobre a prevenção de DCV estejam relacionados ao melhor condicionamento cardiovascular e ao aumento do gasto energético, com redução de pressão arterial e elevação da lipoproteína de alta densidade21. Estudo de caráter longitudinal, incluindo adolescentes e adultos jovens, examinou a relação entre grupos de fatores de risco cardiovasculares e atividade física, encontrando associação inversa entre ambos22.

A atividade física acompanha o ritmo da vida moderna; ou seja, é cada vez maior o número de pessoas inativas que apresentam quadro favorável ao incremento das taxas de sobrepeso e obesidade, especialmente quando existe associação com padrão alimentar inadequado23. Considera-se que o reduzido gasto metabólico ocasionado pelo sedentarismo, acrescido do consumo excessivo de energia, lipídios e outros elementos da dieta, estejam relacionados às DCV e à obesidade22,24.

Em estudo analisando a relação entre obesidade e DCV, em crianças e adolescentes, Lusky et al.25 destacaram que a hipertensão arterial esteve presente em 20% do grupo, e que aqueles que apresentaram IMC maior ou igual a 40kg/m2 tiveram como principais causas de morbidade as doenças cárdio-respiratórias. No presente estudo, para ambos os sexos observaram-se valores de IMC superando 50kg/m2, o que aponta para maior risco de morbidade de DCV26. Resultados similares foram observados em pesquisa com adolescentes de comunidade canadense, porém o IMC esteve correlacionado positivamente com a idade27, o que não ocorreu neste trabalho.

Sabe-se que na adolescência o IMC tende a apresentar maior correlação com a estatura do que com a idade cronológica28. A ausência de correlação entre IMC e idade durante a adolescência tem sido justificada pela capacidade do índice para captar apenas o ganho ponderal total. Vale destacar que o IMC não revelou diferenças na distribuição entre os sexos, conforme demonstrado, comparando-se as médias. Todavia sabe-se que, na adolescência, ocorrem importantes mudanças biopscicossociais, em função do processo de crescimento e desenvolvimento. A maturação sexual, que se passa em idades diferenciadas entre sexos, está diretamente relacionada ao ganho ponderal29. Tais diferenciações poderiam estar refletidas nos valores de IMC, especialmente tratando-se de adolescentes com excesso de massa corporal.

No entanto, a ausência de correlação do IMC com a pontuação de consumo alimentar de risco cardiovascular poderia refletir o número reduzido da amostra, uma vez que, com maiores valores amostrais, Teixeira30 observou resultado diferenciado com escolares adolescentes da cidade de Niterói, utilizando o mesmo instrumento. Outra questão a ser considerada, nesse contexto, diz respeito à ausência de associação entre a pontuação de consumo alimentar, obtida com o questionário aplicado para os diversos grupos considerados.

Independentemente da presença de dois ou mais fatores de risco cardiovasculares adotados nos grupos, a pontuação de consumo alimentar não apresentou distribuição diferenciada. Por outro lado, os adolescentes também apresentaram maior freqüência na categoria de consumo alimentar adequado.

Considerando-se que o estudo buscou verificar a presença de fatores de risco para doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial, sedentarismo e consumo alimentar de risco, em adolescentes já portadores de excesso de massa corporal, os resultados demonstraram que as freqüências, tanto de presença quanto de ausência dessas situações, foram aproximadas. E, embora não se tenham observado diferenças entre os sexos quanto a essas questões, as meninas apresentaram maior freqüência, especialmente no grupo que incluiu a presença de hipertensão arterial, sedentarismo e classificação de consumo alimentar de risco elevado para DCV.

Recebido em: 17/5/2005

Versão final reapresentada em: 21/3/2006

Aprovado em: 24/4/2006

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    Correspondência para/
    Correspondence to: V.L. CHIARA.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2006

    Histórico

    • Revisado
      21 Mar 2006
    • Recebido
      17 Maio 2005
    • Aceito
      24 Abr 2006
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