Acessibilidade / Reportar erro

Duas novas ocorrências de hepáticas folhosas (Marchantiophyta) para o estado da Bahia, Brasil

Two new occurrences of the liverworts (Marchantiophyta) for the state of Bahia, Brazil

Resumo

Estão sendo apresentados dois novos registros de hepáticas folhosas da família Lejeuneaceae para o estado da Bahia: Colura calyptrifolia e Cololejeunea dauphinii, esta última está sendo referida pela primeira vez para o Brasil. São fornecidos material examinado, comentários taxonômicos, ecológicos, distribuição geográfica e fotomicrografias de caracteres distintivos de cada espécie.

Palavras-chave:
Lejeuneaceae; Lejeuneeae; Cololejeuneinae; ambientes serranos; domínio caatinga

Abstract

Two new records of liverworts of Lejeuneaceae of the State of Bahia are presented: Colura calyptrifolia and Cololejeunea dauphinii. This latter is being reported for the first time to Brazil. Examined material, taxonomic, ecological comments, and photos are provided for each species.

Key words:
Lejeuneaceae; Lejeuneeae; Cololejeuneinae; montane environments; caatinga domain

Dada a extensão do território brasileiro e à variedade de ambientes existentes em cada região e, apesar dos esforços empreendidos na última década, a brioflora brasileira ainda não está totalmente conhecida, visto o número de novas adições que continuamente são publicadas para as várias regiões do Brasil, tanto para musgos como para hepáticas, contando mais de 200 novos registros nos últimos anos. Cada um dos estados brasileiros enfocando-se uma região ou domínio fitogeográfico específico, conta sempre com novos registros de briófitas na medida em que sua brioflora prossegue em estudo, a exemplo de Germano & Pôrto (2004)Germano, S.R. & Pôrto, K.C. 2004. Novos registros de briófitas para Pernambuco, Brasil. Acta Botanica Brasilica 18: 343-350. para Pernambuco (9 spp.); Yano & Bastos (2004)Yano, O. & Bastos, C.J.P. 2004. Adições à flora de briófitas de Mato Grosso do Sul, Brasil. Acta Botanica Brasilica 18: 437-458. para o Mato Grosso do Sul (100 spp.); Oliveira & Alves (2007)Oliveira, H.C. & Alves, M.H. 2007. Adições à brioflora do Ceará, Brasil. Rodriguésia 58: 1-11. e Oliveira & Bastos (2009)Oliveira, H.C. & Bastos, C.J.P. 2009. Antóceros (Anhocerotophyta) e hepáticas talosas (Marchantiophyta) da Chapada da Ibiapaba, Ceará, Brasil. Rodriguésia 60: 1-8. para o Ceará (28 spp.); Souza et al. (2008)Souza, M.A.R.; Klein, V.L.G.; Rezende, M.H. & Yano, O. 2008. Antóceros e hepáticas do Parque Estadual Serra dos Pirineus e arredores, município de Pirenópolis, Goiás, Brasil. Revista de Biologia Neotropical 5: 1-16. para Goiás (38 spp.); Yano et al. (2010)Yano, O.; Peralta, D.F. & Bordin, J. 2010. Musgos dos estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe, Brasil, depositados no herbário SP. Hoehnea 37: 211-265. para Alagoas (86 spp.); Silva & Piassi (2010)Silva, L.T.P. & Piassi, M. 2010. Briófitas da formação herbácea inundada do Parque Estadual Paulo César Vinha, Setiba, Guarapari, Espírito Santo, Sudeste do Brasil. Natureza on line 8: 32-39. para o Espírito Santo (4spp.); Yano & Luizi-Ponzo (2014)Yano, O. & Luizi-ponzo, A.P. 2014. Adições à brioflora do parque Estadual do Ibitipoca, Minas Gerais, Brasil. Revista de Biologia Neotropical 11: 71-96. para Minas Gerais (30 spp.); Brito & Ilkiu-Borges (2014)Brito, E.S. & Ilkiu-Borges, A.L. 2014. Briófitas de uma área de Terra Firme no município de Mirinzal e novas ocorrências para o estado do Maranhão, Brasil. Iheringia, Série Botânica 69: 133-142. para o Maranhão (5 spp.).

Especificamente para a Bahia, mais de 100 novos registros já foram publicados nos últimos 10 anos, destacando-se os produtos de estudos intensivos dos projetos cujo foco principal é a biodiversidade do estado da Bahia: Bastos et al. (2000)Bastos, C.J.P.; Yano, O. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000. Briófitas de campos rupestres da Chapada Diamantina, estado da Bahia, Brasil. Revista Brasileira de Botânica 23: 359-370. - 23 spp.; Vilas Bôas-Bastos & Bastos (2000Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2000. New occurrences of pleurocarpous mosses for the state of Bahia, Brazil. Tropical Bryology 18: 65-73., 2008Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2008. Neckeraceae (Bryophyta, Bryopsida) da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. Sitientibus, Série Ciências Biológicas 8: 263-274., 2009)Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2009. Musgos pleurocárpicos dos fragmentos de Mata Atlântica da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. II - Hypnales (Bryophyta: Bryopsida) Acta Botanica Brasilica 23: 630-643. - 18 spp; Bastos & Yano (2006Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2006. Lejeuneaceae holostipas (Marchantiophyta) no estado da Bahia, Brasil. Acta Botanica Brasilica 20: 687-700., 2008Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2008. O gênero Ceratolejeunea Jack & Steph. (Lejeuneaceae, Marchantiophyta) no estado da Bahia, Brasil. Hoehnea 35: 69-74., 2009)Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2009. O Gênero Lejeunea Libert (Lejeuneaceae) no estado da Bahia, Brasil. Hoehnea 36: 303-320. - 13 spp.; Bastos & Vilas Bôas-Bastos (2000aBastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000a. Occurrence of some Lejeuneaceae (Jungermanniophyta) in Bahia, Brasil. Tropical Bryology 20: 45-54.,bBastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000b. Some new additions to the hepatic flora (Jungermanniophyta) for the state of Bahia, Brasil. Tropical Bryology 18: 1-11., 2008)Bastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2008. Musgos acrocárpicos e cladocárpicos (Bryophyta) da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. Sitientibus, Série Ciências Biológicas 8: 275-279. - 29 spp.; Valente & Pôrto (2006)Valente, E.B. & Pôrto, K.C. 2006. Novas ocorrências de hepáticas (Marchantiophyta) para o estado da Bahia, Brasil. Acta Botanica Brasilica 20: 195-201. - 13 spp.; e Valente et al. (2008)Valente, E.B.; Pôrto, K.C.; Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2008. Musgos (Bryophyta) de um fragmento de Mata Atlântica na Serra da Jibóia, município de Santa Terezinha, BA, Brasil. Acta Botanica Brasilica 23: 369-375. - 11 spp.

Especificamente para o Domínio Caatinga, a maioria dos estudos se refere à Chapada Diamantina, a qual é marcada pela variedade de fitofisionomias, a saber: caatinga, cerrado, florestas estacionais, ombrófila submontana e montana, além dos campos rupestres, tendo como ponto culminante o Pico do Barbado situado a 2012 m elev. Sua biodiversidade tem sido alvo de estudos intensivos e figura, segundo Giulietti et al. (1997)Giulietti, A.M.; Pirani, J.R. & Harley, R.M. 1997. Espinhaço Range Region, Eastern Brazil. In: Davis, S.D.; Heywood, V.H.; Herrera-Macbryde, O.; Villa-Lobos, J. & Hamilton, A.C. (eds.). Centres of plant diversity. A guide and strategy for their conservation. Vol. 3. The Americas. IUCN Publication Unity, Cambridge. Pp. 397-404., como um dos centros de diversidade de plantas das Américas. Em que pese a extensão territorial, sua brioflora já foi significativamente registrada por Harley (1995)Harley, R.M. 1995. In: Stannard, B.L. (ed.). Flora of the Pico das almas, Chapada Diamantina - Bahia, Brazil. Royal Botanical Garden, Kew. Pp. 803-812., para o Pico das Almas, Bastos et al. (1998)Bastos, C.J.P.; Stradmann, M.T.S. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 1998. Additional contribution to the bryophyte flora of the Chapada Diamantina National Park, state of Bahia, Brazil. Tropical Bryology 15: 15-20., para matas ciliares, Bastos et al. (2000)Bastos, C.J.P.; Yano, O. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000. Briófitas de campos rupestres da Chapada Diamantina, estado da Bahia, Brasil. Revista Brasileira de Botânica 23: 359-370., para os campos rupestres, Ballejos & Bastos (2009aBallejos, J. & Bastos, C.J.P. 2009a. Musgos pleurocárpicos do Parque Estadual das Sete Passagens, Miguel Calmon, Bahia, Brasil. Hoehnea 36: 479-495.,b)Ballejos, J. & Bastos, C.J.P. 2009b. Orthotrichaceae e Rhizogoniaceae (Bryophyta - Bryopsida) do Parque Estadual das Sete Passagens, Bahia, Brasil. Rodriguesia 60: 723-733., para o Parque Estadual da Sete Passagens na Chapada Diamantina Setentrional e Valente et al. (2013)Valente, E.B.; Pôrto, K.C. & Bastos, C.J.P. 2013. Species richness and distribution of bryophytes within different phytophysiognomies in the Chapada Diamantina region of Brazil. Acta Botanica Brasilica 27: 294-310., para várias áreas que representam a variedade fitofisionômica e altitudinal. Neste último, foi apresentada uma expressiva brioflora, com 400 espécies, indicando que a riqueza específica está relacionada a estes dois fatores. As áreas adjacentes, no entanto, necessitam ser melhor estudadas para efeito de registro e comparação de sua brioflora, o que permitirá a compreensão de vários aspectos como, por exemplo, os biogeográficos.

Embora a abrangência territorial dos estudos já realizados, novas áreas estão sendo contempladas em projeto em andamento que objetiva tanto os aspectos florístico-taxonômicos, como biogeográficos, a exemplo da ARIE Serra do Orobó, em área adjacente à Chapada Diamantina. Assim, o presente artigo objetiva ampliar o conhecimento da biodiversidade dos ambientes serranos do Domínio Caatinga e, consequentemente, do estado da Bahia, através do registro de duas novas ocorrências de hepáticas folhosas, das quais uma está sendo registrada pela primeira vez para o Brasil.

A Serra do Orobó está localizada entre os municípios de Ruy Barbosa e Itaberaba (12º15'S, 40º19'W e 12º25'S, 40º30"W) e se constitui em uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) de acordo com o Decreto Estadual 8.267 de 5/6/2002 (Bahia 2002Bahia. 2002. Decreto 8.267. Diário Oficial do Estado, Salvador. 13p.). São encontradas, entre as cotas de 350−1021 m, as fisionomias de cerrado, florestas sazonalmente seca, ciliar e ombrófila submontana, além de campo rupestre, totalizando 7.397 ha inseridos dentro do Domínio Caatinga.

O material foi coletado nos ambientes de floresta sazonalmente seca e campo rupestre da face Norte da Serra (município de Ruy Barbosa), e na floresta ombrófila submontana em sua face Sudeste (município de Itaberaba). Para a identificação taxonômica e ajuste nomenclatural foram utilizadas as seguintes literaturas: Jovet-Ast (1953)Jovet-Ast, S. 1953. Le genre Colura Hépatiques. Lejeuneaceae, Diplasiae. Revue Bryologique et Lichénologique. 22: 206-312., Gradstein & Costa (2003)Gradstein, S.R. & Costa, D.P. 2003. The Hepaticae and Anthocerotae of Brazil. Memoirs of the New York Botanical Garden 87: 1-318., Morales & Dauphin (1998)Morales, M.I. & Dauphin, G. 1998. A new species of Cololejeunea (Lejeuneaceae: Cololejeuneoideae) from Panama. Tropical Bryology 14: 133-136. e Zhu (2006)Zhu, R.-L. 2006. Cololejeunea dauphinii nom. nov. for Cololejeunea tixieri M. Morales & G. Dauphin from Panama (Jungermanniopsida: Lejeuneaceae). Journal of Bryology 28: 277.. Os espécimes se encontram depositados no Herbário Alexandre Leal Costa do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (ALCB).

Estão sendo fornecidos o material examinado com comentários taxonômicos, de distribuição geográfica e fotomicrografias de caracteres distintivos obtidas com câmera fotográfica OLYMPUS SC-30 adaptada ao Microscópio OLYMPUS BX41-BF-II-20 para as seguintes espécies de Lejeuneaceae:

1. Cololejeunea dauphinii R.L.-Zhu, J. Bryol. 28: 277. 2006. Fig. 1a-h

Figura 1
Cololejeunea dauphinii R.-L. Zhu - a. aspecto geral do gametófito; b,c. lobo ventral; d. lobo dorsal; e. ápice do filídio; f. margem dorsal; g. dente apical; h. gema. (a,b,g,h: Sara A. 17; c-f: R. de Freitas 01).
Figure 1
Cololejeunea dauphinii R.-L. Zhu - a. general view of gametophyte; b,c. ventral lobe; d. dorsal lobe; e. apex of leaf; f. dorsal margin; g. apical tooth; h. gemma. (a,b,g,h: Sara A. 17; c-f: R. de Freitas 01).

Cololejeunea dauphinii se caracteriza pelos gametófitos muito pequenos, congestos entre si, filídios ovalado-lanceolados com ápice agudo e margem dorsal arqueada na metade proximal, crenulada em toda a extensão. Os lobos ventrais são planos, elíptico-ovalados com dente apical de até duas células orbiculares, concordando com os caracteres distintivos apresentados por Morales e Dauphin (1998Morales, M.I. & Dauphin, G. 1998. A new species of Cololejeunea (Lejeuneaceae: Cololejeuneoideae) from Panama. Tropical Bryology 14: 133-136., como C. tixierii M. I. Morales & G. Dauphin) e Zhu (2006)Zhu, R.-L. 2006. Cololejeunea dauphinii nom. nov. for Cololejeunea tixieri M. Morales & G. Dauphin from Panama (Jungermanniopsida: Lejeuneaceae). Journal of Bryology 28: 277.. Exceto pelos ápices agudos e os lóbulos planos, nunca sacatiformes (Fig. 1b,c,e) pode ser confundida com a também diminuta Myriocoleopsis minutissima (Sm.) R.L.-Zhu subsp. myriocarpa (Nees & Mont.) R.L. Zhu, Y. Yu & Pócs, sendo ambas pertencentes ao subgênero Protocolea. Pode, ainda, ser confundida com C. panamensis G. Dauphin & Pócs e C. ecuadoriensis Pócs (Pócs 2002Pócs, T. 2002. New or little known epiphyllous liverworts, IX. Two new neotropical Cololejeunea species. Acta Botanica Hungarica 44: 158-168., Brito & Ilkiu-Borges 2012) devido a forma dos filídios e os ápices agudos, no entanto essas duas espécies diferem por apresentar 1-2 células hialinas no ápice dos filídios (característica do subgênero Pedinolejeunea), e os lobos ventrais sempre inflados, sacatiformes. Em adição a esses caracteres, as gemas disciformes (Fig. 1h) são semelhantes à ilustração de Morales & Dauphin (1998Morales, M.I. & Dauphin, G. 1998. A new species of Cololejeunea (Lejeuneaceae: Cololejeuneoideae) from Panama. Tropical Bryology 14: 133-136., como C. tixierii).

Sua ocorrência até o momento era restrita ao Panamá, também em área de altitude (Morales & Dauphin 1998Morales, M.I. & Dauphin, G. 1998. A new species of Cololejeunea (Lejeuneaceae: Cololejeuneoideae) from Panama. Tropical Bryology 14: 133-136.) e Costa Rica (T. Pócs, comunicação pessoal). Está sendo referida pela primeira vez para o Brasil, sendo, portanto, disjunta entre América Central e Brasil.

Na área de estudo, ocorreu exclusivamente como corticícola sempre associada a Lejeunea setiloba Spruce, tanto na floresta sazonal de ambos os municípios, como na floresta ombrófila submontana em Itaberaba.

Material examinado: Itaberaba, Serra do Orobó, Fazenda Gameleira, após a Fazenda Monte Verde, 12º24'S, 40º32'W, 600 m elev. 18.I.2015, Sara A. 97p.p. (ALCB); Ruy Barbosa, Serra do Orobó, trilha para o pátio das orquídeas, 12º17'59''S, 40º29'13''W, 522 m elev., 16.I.2015, Sara A. 17 (ALCB), R. de Freitas 01 (ALCB).

2. Colura calyptrifolia (Hook.) Dumort., Rec. D'Obs. Jung. 12. 1835. Fig. 2a-b

Descrição e ilustração adicional: Jovet-Ast (1953)Jovet-Ast, S. 1953. Le genre Colura Hépatiques. Lejeuneaceae, Diplasiae. Revue Bryologique et Lichénologique. 22: 206-312., Hassel et al. (2014)Hassel K.; Appelgren L.; Blom, H.H.; Flynn, K.M.; Gaarder G.; Heegaard E.; Høitomt, T.; Jordal J.B.; Lima M.; Söderström L. & Wangen, K. 2014. Colura calyptrifolia a new oceanic liverwort to Norway and Scandinavia. Lindbergia 37: 1-5..

Colura calyptrifolia é distinta entre as Jungermanniales encontradas na Serra do Orobó pelos filídios com lobo dorsal fortemente sacado, caráter distintivo do gênero. A porção terminal do filídio é marcada por um prolongamento cônico com até 1/4(-5) do comprimento da porção sacada cuja transição entre as duas regiões é abrupta (Fig. 2a,b). A presença de gemas desenvolvidas foi escassa, porém foram encontradas no ápice do prolongamento apical dos filídios, inúmeras células gemíferas em desenvolvimento.

Figura 2
Colura calyptrifolia (Hook.) Dumort - a. aspecto geral do gametófito; b. ápice do filídio. (Sara A. 58).
Figure 2
Colura calyptrifolia (Hook.) Dumort - a. portion of gametophyte; b. apex of leaf. (Sara A. 58).

De acordo com Hassel et al. (2014)Hassel K.; Appelgren L.; Blom, H.H.; Flynn, K.M.; Gaarder G.; Heegaard E.; Høitomt, T.; Jordal J.B.; Lima M.; Söderström L. & Wangen, K. 2014. Colura calyptrifolia a new oceanic liverwort to Norway and Scandinavia. Lindbergia 37: 1-5., esta espécie tem distribuição global ampla, porém dispersa, com ocorrência nas faixas oceânicas da Irlanda, Grã-Bretanha, França e Escandinávia, além da Macaronésia, áreas montanas centro e sul africanas, Himalaia e Sri Lanka, distribuindo-se do Caribe ao sul do Chile. No Brasil, de acordo com Costa & Peralta (2015)Costa, D.P. & Peralta, D.F. 2015. Bryophytes diversity in Brasil. Rodriguésia 66: 1603-1071. ocorre em Minas Gerais e Rio de Janeiro. Esta é sua primeira referência para o estado da Bahia.

Na área de estudo ocorre exclusivamente como corticícola no campo rupestre, área de maior altitude, predominantemente associada a outras espécies como Cheilolejeunea xanthocarpa (Lehm. & Lindenb.) Malombe, Microlejeunea epiphylla Bischler e M. cystifera Herzog. Essa preferência de substrato na área de estudo não indica uma exclusividade relacionada à estratégia de sobrevivência, uma vez que Averis (2007Averis, A.B.G. 2007. Habitats of Colura calyptrifolia in North-western Britain. Field Bryology 91: 17-21., 2009)Averis, A.B.G. 2009. Colura calyptrifolia growing on rubbish in a scottish conifer plantation. Field Bryology 99: 19-22. reporta o crescimento de C. calyptrifolia como generalista, sobre substratos variados, inclusive os sintéticos como plástico e borracha ao nível do solo. Pode, apenas, estar relacionada à uma estratégia local, uma vez que sua distribuição está limitada à influência oceânica (Jovet-Ast 1953Jovet-Ast, S. 1953. Le genre Colura Hépatiques. Lejeuneaceae, Diplasiae. Revue Bryologique et Lichénologique. 22: 206-312.; Hassel et al. 2014Hassel K.; Appelgren L.; Blom, H.H.; Flynn, K.M.; Gaarder G.; Heegaard E.; Høitomt, T.; Jordal J.B.; Lima M.; Söderström L. & Wangen, K. 2014. Colura calyptrifolia a new oceanic liverwort to Norway and Scandinavia. Lindbergia 37: 1-5.), sendo, portanto, dependente de altas taxas de umidade. A área de estudo é uma das serras ilhadas pelas condições semiáridas do bioma caatinga, cujo topo se situa em elevação superior a 1000 m, forçando uma ocupação estratégica sobre substratos suspensos, em ramos de arbustos, o que a expõe ao fluxo de neblina a que a área está exposta diariamente, ao menos durante a noite e nas primeiras horas da manhã.

Material examinado: Ruy Barbosa, Serra do Orobó, Dedo de Deus, 12º18'48''S, 40º28'51''W, 1.021 alt., 17.I.2015, Sara A. 37, 39p.p., 58p.p., 72p.p. (ALCB); R. de Freitas 50p.p. (ALCB).

As espécies apresentadas no presente artigo, embora se constituam em primeira referência, tanto para a Bahia (Colura calyptrifolia), como para o Brasil (Cololejeunea dauphinii), podem ter, ainda, sua área de distribuição ampliada, devido a dois fatores principais: a) muitas áreas do território brasileiro, cujas condições ambientais são similares à da presente ocorrência, ainda necessitam ser melhor amostradas, b) estas espécies são de tamanho muito reduzido, bem como suas populações, além de ocorrem associadas com outras briófitas, o que as torna, muitas vezes imperceptíveis, principalmente para os iniciantes. Nesse caso, coleções de herbários podem conter espécimes "indet".

Na Bahia, com o prosseguimento das coletas nas áreas serranas contempladas dentro do projeto Briófitas de Ambientes Serranos do Domínio Caatinga no estado da Bahia, há a perspectiva de novos registros dessas espécies para o estado.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Diretoria de Unidades de Conservação do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA) do Estado da Bahia, a autorização de coletas na ARIE Serra do Orobó (Portaria nº 9095/2015). À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), o apoio financeiro (TO PNE 0020/2011). Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o apoio financeiro (CNPq/SiB-Br 504208/2012-8). Ao Dr. Tamás Pócs do Departamento de Botânica do Eszterházy College, Eger, Hungria, a confirmação da identidade de Cololejeunea dauphinii.

Referências

  • Averis, A.B.G. 2007. Habitats of Colura calyptrifolia in North-western Britain. Field Bryology 91: 17-21.
  • Averis, A.B.G. 2009. Colura calyptrifolia growing on rubbish in a scottish conifer plantation. Field Bryology 99: 19-22.
  • Bahia. 2002. Decreto 8.267. Diário Oficial do Estado, Salvador. 13p.
  • Ballejos, J. & Bastos, C.J.P. 2009a. Musgos pleurocárpicos do Parque Estadual das Sete Passagens, Miguel Calmon, Bahia, Brasil. Hoehnea 36: 479-495.
  • Ballejos, J. & Bastos, C.J.P. 2009b. Orthotrichaceae e Rhizogoniaceae (Bryophyta - Bryopsida) do Parque Estadual das Sete Passagens, Bahia, Brasil. Rodriguesia 60: 723-733.
  • Bastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000a. Occurrence of some Lejeuneaceae (Jungermanniophyta) in Bahia, Brasil. Tropical Bryology 20: 45-54.
  • Bastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000b. Some new additions to the hepatic flora (Jungermanniophyta) for the state of Bahia, Brasil. Tropical Bryology 18: 1-11.
  • Bastos, C.J.P. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2008. Musgos acrocárpicos e cladocárpicos (Bryophyta) da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. Sitientibus, Série Ciências Biológicas 8: 275-279.
  • Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2006. Lejeuneaceae holostipas (Marchantiophyta) no estado da Bahia, Brasil. Acta Botanica Brasilica 20: 687-700.
  • Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2008. O gênero Ceratolejeunea Jack & Steph. (Lejeuneaceae, Marchantiophyta) no estado da Bahia, Brasil. Hoehnea 35: 69-74.
  • Bastos, C.J.P. & Yano, O. 2009. O Gênero Lejeunea Libert (Lejeuneaceae) no estado da Bahia, Brasil. Hoehnea 36: 303-320.
  • Bastos, C.J.P.; Stradmann, M.T.S. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 1998. Additional contribution to the bryophyte flora of the Chapada Diamantina National Park, state of Bahia, Brazil. Tropical Bryology 15: 15-20.
  • Bastos, C.J.P.; Yano, O. & Vilas Bôas-Bastos, S.B. 2000. Briófitas de campos rupestres da Chapada Diamantina, estado da Bahia, Brasil. Revista Brasileira de Botânica 23: 359-370.
  • Brito, E.S. & Ilkiu-Borges, A.L. 2014. Briófitas de uma área de Terra Firme no município de Mirinzal e novas ocorrências para o estado do Maranhão, Brasil. Iheringia, Série Botânica 69: 133-142.
  • Costa, D.P. & Peralta, D.F. 2015. Bryophytes diversity in Brasil. Rodriguésia 66: 1603-1071.
  • Germano, S.R. & Pôrto, K.C. 2004. Novos registros de briófitas para Pernambuco, Brasil. Acta Botanica Brasilica 18: 343-350.
  • Giulietti, A.M.; Pirani, J.R. & Harley, R.M. 1997. Espinhaço Range Region, Eastern Brazil. In: Davis, S.D.; Heywood, V.H.; Herrera-Macbryde, O.; Villa-Lobos, J. & Hamilton, A.C. (eds.). Centres of plant diversity. A guide and strategy for their conservation. Vol. 3. The Americas. IUCN Publication Unity, Cambridge. Pp. 397-404.
  • Gradstein, S.R. & Costa, D.P. 2003. The Hepaticae and Anthocerotae of Brazil. Memoirs of the New York Botanical Garden 87: 1-318.
  • Harley, R.M. 1995. In: Stannard, B.L. (ed.). Flora of the Pico das almas, Chapada Diamantina - Bahia, Brazil. Royal Botanical Garden, Kew. Pp. 803-812.
  • Hassel K.; Appelgren L.; Blom, H.H.; Flynn, K.M.; Gaarder G.; Heegaard E.; Høitomt, T.; Jordal J.B.; Lima M.; Söderström L. & Wangen, K. 2014. Colura calyptrifolia a new oceanic liverwort to Norway and Scandinavia. Lindbergia 37: 1-5.
  • Jovet-Ast, S. 1953. Le genre Colura Hépatiques. Lejeuneaceae, Diplasiae. Revue Bryologique et Lichénologique. 22: 206-312.
  • Morales, M.I. & Dauphin, G. 1998. A new species of Cololejeunea (Lejeuneaceae: Cololejeuneoideae) from Panama. Tropical Bryology 14: 133-136.
  • Oliveira, H.C. & Alves, M.H. 2007. Adições à brioflora do Ceará, Brasil. Rodriguésia 58: 1-11.
  • Oliveira, H.C. & Bastos, C.J.P. 2009. Antóceros (Anhocerotophyta) e hepáticas talosas (Marchantiophyta) da Chapada da Ibiapaba, Ceará, Brasil. Rodriguésia 60: 1-8.
  • Pócs, T. 2002. New or little known epiphyllous liverworts, IX. Two new neotropical Cololejeunea species. Acta Botanica Hungarica 44: 158-168.
  • Silva, L.T.P. & Piassi, M. 2010. Briófitas da formação herbácea inundada do Parque Estadual Paulo César Vinha, Setiba, Guarapari, Espírito Santo, Sudeste do Brasil. Natureza on line 8: 32-39.
  • Souza, M.A.R.; Klein, V.L.G.; Rezende, M.H. & Yano, O. 2008. Antóceros e hepáticas do Parque Estadual Serra dos Pirineus e arredores, município de Pirenópolis, Goiás, Brasil. Revista de Biologia Neotropical 5: 1-16.
  • Valente, E.B. & Pôrto, K.C. 2006. Novas ocorrências de hepáticas (Marchantiophyta) para o estado da Bahia, Brasil. Acta Botanica Brasilica 20: 195-201.
  • Valente, E.B.; Pôrto, K.C.; Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2008. Musgos (Bryophyta) de um fragmento de Mata Atlântica na Serra da Jibóia, município de Santa Terezinha, BA, Brasil. Acta Botanica Brasilica 23: 369-375.
  • Valente, E.B.; Pôrto, K.C. & Bastos, C.J.P. 2013. Species richness and distribution of bryophytes within different phytophysiognomies in the Chapada Diamantina region of Brazil. Acta Botanica Brasilica 27: 294-310.
  • Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2000. New occurrences of pleurocarpous mosses for the state of Bahia, Brazil. Tropical Bryology 18: 65-73.
  • Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2008. Neckeraceae (Bryophyta, Bryopsida) da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. Sitientibus, Série Ciências Biológicas 8: 263-274.
  • Vilas Bôas-Bastos, S.B. & Bastos, C.J.P. 2009. Musgos pleurocárpicos dos fragmentos de Mata Atlântica da Reserva Ecológica da Michelin, município de Igrapiúna, Bahia, Brasil. II - Hypnales (Bryophyta: Bryopsida) Acta Botanica Brasilica 23: 630-643.
  • Yano, O. & Bastos, C.J.P. 2004. Adições à flora de briófitas de Mato Grosso do Sul, Brasil. Acta Botanica Brasilica 18: 437-458.
  • Yano, O. & Luizi-ponzo, A.P. 2014. Adições à brioflora do parque Estadual do Ibitipoca, Minas Gerais, Brasil. Revista de Biologia Neotropical 11: 71-96.
  • Yano, O.; Peralta, D.F. & Bordin, J. 2010. Musgos dos estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe, Brasil, depositados no herbário SP. Hoehnea 37: 211-265.
  • Zhu, R.-L. 2006. Cololejeunea dauphinii nom. nov. for Cololejeunea tixieri M. Morales & G. Dauphin from Panama (Jungermanniopsida: Lejeuneaceae). Journal of Bryology 28: 277.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2015
  • Aceito
    23 Mar 2016
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Rua Pacheco Leão, 915 - Jardim Botânico, 22460-030 Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21)3204-2148, Fax: (55 21) 3204-2071 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rodriguesia@jbrj.gov.br