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Flora das cangas da Serra dos Carajás, Pará, Brasil: Dioscoreaceae

Flora of the canga of the Serra dos Carajás, Pará, Brazil: Dioscoreaceae

Resumo

Este estudo apresenta um tratamento florístico das espécies de Dioscoreaceae registradas nas cangas da Serra dos Carajás, Pará. Apresentam-se descrições detalhadas, chave para identificação, fotografias, distribuição geográfica, comentários morfológicos e ecológicos das espécies tratadas. Foram registradas seis espécies de Dioscoreaceae para área de estudos, todas pertencentes ao gênero Dioscorea, incluindo D. planistipulosa, um novo registro para o estado e para a região amazônica.

Palavras-chave:
Cará; complexo Dioscorea piperifolia; Dioscorea; inhame; FLONA Carajás

Abstract

The study presents a floristic survey for the species of Dioscoreaceae recorded in the canga of Serra dos Carajás, Pará state. Detailed descriptions, identification key, photos, geographical distribution and morphological comments are provided for all species, as well comments on the habitat. Six species were recorded in the study area, all belonging to the genus Dioscorea, including D. planistipulosa, a new record for the state and the Amazonian region.

Key words:
Cará; Dioscorea piperifolia complex; Dioscorea; yam; FLONA Carajás

Dioscoreaceae

A familia dos inhames e carás é composta por cerca de 650 espécies organizadas em quatro gêneros (Caddick et al. 2002Caddick L, Rudall PJ, Wilkin P, Hedderson TAJ & Chase MW (2002a) Yams reclassified: a recircumscription of Dioscoreaceae and Dioscoreales. Taxon 51: 103-114.), sendo o gênero Dioscorea L. o mais representativo, com a grande maioria das espécies, apresentando distribuição basicamente tropical, com alguns poucos representantes em regiões temperadas (Knuth 1924Knuth R (1924) Dioscoreaceae. In: Engler A (ed.) Das Pflazenreich 4: 1-386.). Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley pode ser caracterizada por serem plantas geralmente trepadoras, com sistemas subterrâneos compostos por órgãos de reserva, com acúmulo de amido, por possuir inflorescências axilares e flores geralmente unissexuais e trímeras. Na Serra dos Carajás, a família está representada apenas pelo gênero Dioscorea.

1. Dioscorea L.

São plantas dioicas ou monoicas, volúveis, herbáceas ou de aspecto lenhoso, com tubérculos anuais ou perenes, folhas alternas e pecíolos com pulvinos em ambas as extremidades, limbo cordado a lanceolado, nervuras 3-15, as três centrais convergindo para o ápice e venação secundaria reticulada. Inflorescências estaminadas axilares, em espigas, racemos, panículas ou cimas. Inflorescências pistiladas axilares, em espigas. Flores protegidas por duas bractéolas, tépalas seis em dois ciclos, livre ou unidas, as estaminadas com seis ou três estames, sendo os três mais internos por vezes transformados em estaminódios, as pistiladas com três estiletes, livre ou unidos na base. Frutos em cápsula trialadas, deiscentes, portando duas sementes aladas em cada lóculo.

Dioscorea apresenta quase a totalidade das espécies da família, com mais de 600 espécies distribuídas pelo mundo (Couto 2014Couto RS, Lopes RC & Braga JMA (2014) Dioscorea sphaeroidea (Dioscoreaceae), a threatened new species from the highaltitude grasslands of southeastern Brazil with wingless seeds. Phytotaxa 163: 229-234.). Para o Brasil são registradas 141 espécies (BFG 2015BFG - The Brazil Flora Group (2015) Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.). Na Serra dos Carajás, todos os representantes da família pertencem a este gênero, com um total de seis espécies, uma delas um novo registro para a região amazônica.

    Chave de identificação das espécies de Dioscorea das cangas da Serra dos Carajás
  • 1. Flores estaminadas com pistilódio central .......................................................................................... 2

    • 2. Inflorescências estaminadas compostas ................................................ 1.3. Dioscorea marginata

    • 2’. Inflorescências estaminadas simples ........................................................................................... 3

      • 3. Flores estaminadas pediceladas ................................................ 1.1. Dioscorea dodecaneura

      • 3’. Flores estaminadas sésseis ...................................................... 1.6. Dioscorea planistipulosa

  • 1’. Flores estaminadas sem pistilódio central ........................................................................................... 4

    • 4. Flores estaminadas tomentosas .......................................................... 1.4. Dioscorea pilosiuscula

    • 4’. Flores estaminadas glabras ............................................................................................................ 5

      • 5. Flores estaminadas de tépalas 1-nervadas .................................... 1.5. Dioscorea piperifolia

      • 5’. Flores estaminadas de tépalas 3-nervadas ................................... 1.2. Dioscorea glandulosa

1.1. Dioscorea dodecaneura Vell., Fl. Flum. Icon. 10: tab. 123. 1831. Fig. 1a-b

Figura 1
Folhas e flores estaminadas - a. Dioscorea dodecaneura - folha; b. Dioscorea dodecaneura - flor; c. Dioscorea glandulosa - folha; d. Dioscorea glandulosa - flor; e. Dioscorea marginata - folha; f. Dioscorea marginata - flor; g. Dioscorea piperifolia - folha; h. Dioscorea piperifolia - flor; i. Dioscorea planistipulosa - folha; j. Dioscorea planistipulosa - flor. Fotos: a-f,i. R.S.Couto; g-h,j. N. Mota; j. F.R.M. Fraga.
Figure 1
Leaves and staminate flowers - a. Dioscorea dodecaneura - leaf; b. Dioscorea dodecaneura - flower; c. Dioscorea glandulosa - leaf; d. Dioscorea glandulosa - flower; e. Dioscorea marginata - leaf; f. Dioscorea marginata - flower; g. Dioscorea piperifolia - leaf; h. Dioscorea piperifolia - flower; i. Dioscorea planistipulosa - leaf; j. Dioscorea planistipulosa - flower. Photos: a-f,i. R.S.Couto; g-h. N. Mota; j. F.R.M. Fraga

Trepadeira geófita, dioica, dextrorsa. Sistema subterrâneo constituído de raízes fasciculadas fibrosas, simples e um caule subterrâneo disposto horizontalmente, tendo na porção terminal tubérculos globosos, globosos a ovoides, um ponto meristemático de onde parte o caule, periderme amarelada a marrom e medula alvo-amarelada, a ca. 5 cm da superfície do solo. Ramos 0,5-15 m compr., volúveis, glabro a piloso ou tomentoso, cilíndricos, 1,8-4 mm de diam., inermes, verdes a avermelhados, herbáceos; basais afilos, com rudimento foliar adpresso. Folhas alternas; pecíolo 4,5-11,5 cm compr.; lâmina 4,6-18,2 × 3,7-15,4 cm, face adaxial verde escura marmorada de vinoso e com manchas alvas e face abaxial verde-clara a vinosa, velutina em ambas as faces, membranácea, oval-cordiforme a oblonga, com sinus amplo a atenuado, base cordada, ápice acuminado, 7-9 nervuras saliente na face abaxial. Inflorescência estaminada 9,7-28,5 cm compr., em racemo, ereta. Flores estaminadas pediceladas, 2 bractéolas membranáceas, perianto alvacento a esverdeado, campanulado, profundamente partido, tépalas 2-3 mm compr., oblongas, pilosas, uninervadas; estames 6, livres, inseridos na base de cada segmento do perianto, filetes ca. 1 mm compr., anteras ca. 0,5 mm compr., pistilódio central, crasso, cônico, com 3 sulcos desde a base, ca. 1 mm compr. Inflorescência pistilada 16-31,5(<37) cm compr., em racemo, pêndula. Flores pistiladas pediceladas, 2 bractéolas, oblongo-lanceolada, perianto verde-claro a amarelado, campanulado, profundamente partido, tépalas 1-2 mm, oblongo-lanceoladas, pilosos, uninervadas; estilete 1-2 mm compr., crasso, colunar 3-partido no ápice e com os ramos 2-fendidos, lanceolados na extremidade; 6 estaminódios ca. 0,5 mm compr., anteríferos, sésseis; ovário alvo, piloso. Cápsulas 3,5-4,6 × 2,1-3,9 cm, amareladas a marrons ou avermelhadas, transversalmente oblongas, com valvas coriáceas, glabras, com vestígios do perianto no ápice; sementes ca. 2 cm compr., marrom-clara, orbicular, centrais de ala circular.

Material selecionado: Parauapebas [Marabá] Serra dos Carajás, 5º49’S, 50º32’W, 15.VI.1982, fl. e fr., C.R. Sperling et al. 6183 (MG, NY); Serra do Norte, Carajás, 2.VI.1986, fl. e fr., M.P.M. Lima 82 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. PARÁ: 28.IV.1924, J.G. Kuhlmann 2098 (RB). BAHIA, Maracás. Rod. BA-026, 15 km ao SW de Maracás. Folhas SD-24 (14-40a), 05.V.1979, fl., S.A. Mori & T.S. dos Santos 11809 (NY, CEPEC).

Dioscorea dodecaneura é espécie de fácil identificação, sendo possível diferenciá-la pelas folhas com coloração purpúrea na face abaxial e variegada com tons de verde diversos e algumas áreas brancas, normalmente acompanhando as nervuras na face adaxial (Fig. 1a) , além das inflorescências estaminadas em racemo (Fig. 1b) e os frutos transversalmente oblongos. A espécie apresenta uma ampla distribuição no continente americano, ocorrendo desde a América Central (México) até o sul da América do Sul (Argentina), nos mais diversos ambientes e domínios (Couto 2010Couto RS (2010) Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Dissertação de Mestrado. Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Pp. 445.). Na Serra dos Carajás foi coletada na Serra Norte: N1, geralmente em locais parcialmente sombreados, como a parte mais interna da orla de florestas.

1.2. Dioscorea glandulosa (Klotzsch ex Griseb.) Kunth., Enum. Pl. 5: 352. 1850. Fig. 1c-d

Trepadeira vivaz, dioica, sinistrorsa. Sistema subterrâneo constituído de um tubérculo discoide, com apenas 1 ponto meristemático de onde parte o caule aéreo, com raízes finas emergindo principalmente da extremidade, periderme castanho-claro e medula esverdeada a branco-amarelada, a ca. 10 cm da superfície do solo. Ramos 0,5-3 m compr., volúveis, glabros, cilíndricos, 1-2 mm de diam., inermes, verdes marmoreados de vinoso, herbáceos; basais afilos, com rudimento foliar adpresso. Folhas alternas, inteiras; pecíolo 2,2-6 cm compr.; lâmina 5,1-16,5 × 3,7-12,8 cm, face adaxial verde-escura e face abaxial verde-clara, glabras em ambas as faces, membranácea, ovais a cordadas, com sinus amplo, base cordada, ápice acuminado, 7-9 nervuras saliente na face abaxial, nectários extraflorais entre as nervuras junto a inserção com o pecíolo. Inflorescência estaminada 5-18,3 cm compr., em racemo, ereta. Flores estaminadas pediceladas, 2 bractéolas, membranáceas, triangular-acuminadas, perianto esverdeado a atropurpureo, rotáceo, tépalas 1,5-3 mm compr., obovada, glabras, 3-nervadas; 6 estames, livres, inseridos na parte central da flor, inclusos, subsésseis a sésseis, anteras ca. 0,3 mm compr., pistilódio ausente. Inflorescência pistilada 5,5-15(24>) cm compr., em espiga simples, pêndula. Flores pistiladas sésseis, 2 bractéolas, estreito-triangulares, perianto verde vinoso, rotáceo, tépalas 1,5-3 mm, obovada, glabras, 3-nervadas; 3 estiletes 0,5-1 mm compr., livres na sua maior extensão e com ramos inteiros, arredondados na extremidade; estaminódios ausentes. Cápsulas 2,3-2,9 × 1-1,3 cm, verdes a marrom-claras, elípticas com valvas cartáceas, glabras, com vestígios do perianto no ápice; sementes 1,3-1,7 cm compr., marrom-escuras, oval-lanceoladas, de ala basal alongada.

Material selecionado: Parauapebas [Marabá], Serra dos Carajás, estrada do estéril sul, 06.II.1985, fl., O.C. Nascimento & R.P. Bahia 1186 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. PARÁ: fl., ​Martius (M0213501). MINAS GERAIS, Corinto. Fazenda do Diamante, Olhos de Água, 01.IV.1931, fr., Y.E.J. Mexia 5507 (MO).

Dioscorea glandulosa integra o grupo de espécies associado ao complexo D. piperifolia, sendo considerada sinônimo da mesma por alguns autores (e.g.,Pedralli 2004Pedralli G (2004) Dioscoreáceas. In: Reitz R (ed.) Flora ilustrada Catarinense, fascículo Diosc., Herbário Barbosa Rodrigues, Santa Catarina.) e inclusive D. glandulosa foi inicialmente descrita como variedade de D. piperifolia. A espécie, porém, apresenta diferenças significativas com D. piperifolia, sendo atualmente considerado um táxon distinto. A espécie pode ser identificada por suas folhas tenras com nectários extraflorais entre as nervuras da base da folha (Fig. 1c), pelas inflorescências estaminadas em racemos, pelas flores estaminadas com seis estames subsésseis na parte central, circundados por um disco nectarífero, com tépalas multinervadas (ao menos três nervuras em cada tépala) e pistilódio ausente (Fig. 1d). Além disso, as plantas pistiladas possuem inflorescências com as flores agrupadas no terço superior e frutos geralmente oblongos. Dioscorea glandulosa apresenta ampla distribuição possui ampla distribuição na América do Sul, com especial concentração na Floresta Atlântica.

Na Serra dos Carajás ocorre na Serra Sul: S11D, em locais geralmente bem iluminados e com maior umidade, como bordas de mata.

1.3. Dioscorea marginata Griseb., Fl. bras. 3(1): 37. 1842. Fig. 1e-f

Trepadeira perene, dioica, dextrorsa. Sistema subterrâneo constituído de um tubérculo irregularmente alongado, lobado, com apenas 1 ponto meristemático de onde parte o caule aéreo, com raízes finas emergindo principalmente da extremidade, periderme marrom-acinzentada e medula amarelada, a ca. 20 cm da superfície do solo. Ramos 0,5-7 m compr., volúveis, glabros, cilíndricos, 3-3,5 mm de diam., inermes, verdes; basais de aspecto lenhoso, com espinhos substituindo as folhas nos nós. Folhas alternas, inteiras; pecíolo 1,3-3 cm compr.; lâmina 6,4-15,5 × 1,3-6,3 cm, verde em ambas as faces, glabra em ambas as faces, membranáceas, basal sagitada, apical ovada a elíptica ou lanceolada, com sinus muito estreito, base arredondada a subcordada, ápice acuminado, 3-5 nervuras saliente na face abaxial. Inflorescência estaminada 11,5-18,7 cm compr., em espiga composta, ereta. Flores estaminadas sésseis, 2 bractéolas, membranáceas, triangulares, perianto esverdeado a vinoso ou pintalgados de vermelho, rotáceo, tépalas 1-1,5 mm compr., oblongas, glabras, uninervadas; 6 estames, livres, inseridos na base de cada segmento do perianto, inclusos, anteras ca. 0,3 mm compr., sésseis a subsésseis, pistilódio central, trigono, com 3 sulcos longitudinais pouco profundos, ca. 0,3 mm compr. Inflorescência pistilada 14,2-33 cm compr., em espiga simples, pêndula. Flores pistiladas sésseis, 2 bractéolas, oval-acuminadas, perianto verde a amarelado, campanulado, tépalas 1,2-2 mm, oblongas, glabras, uninervadas; estilete colunar ca. 1mm compr., crasso, 3-partidos no ápice, e com ramos 2-fendidos, aplanados na extremidade; 6 estaminódios ca. 0,5 mm compr., anteríferos, sésseis a subsésseis; ovário amarelado, glabro. Cápsulas 4-5,4 × 2,3-4,7 cm, amareladas a castanho-acinzentadas, obovadas com valvas coriáceas, glabras, com vestígios do perianto no ápice; sementes 2,5-3,3 cm compr., marrom-escuras, semicirculares, de ala circular.

Material selecionado: Serra dos Carajás, Serra do Norte, 16.X.1977, fl. e fr., C.C. Berg & A.J. Henderson 579 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. AMAZONAS: São Gabriel da Cachoeira, Rio Uaupés, Ipanuré, estrada para Urubuquara, 17.XI.1987, fl., H.C. de Lima 3215 (RB); Humaitá, 22.IX.1979, fl., J.L. Zarucchi (RB 00597805). PARÁ: Almeirim, Distrito de Monte Dourado, Área de Manejo da Orsa Florestal, Mirante, 31.VI.2010, fr., R.C. Forzza 5907 (RB).

Dioscorea marginata possui folhas lanceoladas a oblongas, de margem espessa (Fig. 1e), flores estaminadas com seis estames (Fig. 1f) e flores pistiladas com estilete tripartido no ápice com ramos bífidos e seis estaminódios, porém, podem ser realmente diferenciadas pelas inflorescências estaminadas de raque composta e glomérulos em cada nó e pelos frutos típicos, grandes e obovados. A espécie é endêmica do Neotrópico, com distribuição restrita somente ao Brasil, Paraguai e Peru, ocorrendo em diversos biomas, porém com maior abundância na região da Floresta Atlântica e poucas ocorrências documentadas na região amazônica (Couto 2010Couto RS (2010) Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Dissertação de Mestrado. Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Pp. 445.).

Pedralli (2002Pedralli G (2002) Levantamento florístico das Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley da cadeia do Espinhaço, Minas Gerais e Bahia, Brasil. Boletim de Botânica da Universidade de São Paulo 20: 63-119., 2004)Pedralli G (2004) Dioscoreáceas. In: Reitz R (ed.) Flora ilustrada Catarinense, fascículo Diosc., Herbário Barbosa Rodrigues, Santa Catarina. propôs a combinação D. spicata (Vell). Pedralli, e sinonimiza diversos nomes, incluindo D. marginata, ampliando consideravelmente a circunscrição da espécie. Aqui consideramos D. marginata distinta dos táxons tratados por Pedralli (2004)Pedralli G (2004) Dioscoreáceas. In: Reitz R (ed.) Flora ilustrada Catarinense, fascículo Diosc., Herbário Barbosa Rodrigues, Santa Catarina. como sinônimos de D. spicata, assim como a proposto por Couto (2010)Couto RS (2010) Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Dissertação de Mestrado. Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Pp. 445. e Flora do Brasil (2020, em construção)Flora do Brasil (2020, em construção). Dioscoreaceae. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB104>. Acesso em 18 setembro 2017.
http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora...
.

Na Serra dos Carajás ocorre na Serra Norte: N1, em locais ligeiramente sombreados, em ambiente perturbado.

1.4. Dioscorea pilosiuscula Bertero ex Spreng. In: Systema Vegetabilium 2: 152. 1825.

Trepadeira geófita, dioica, dextrorsa. Sistema subterrâneo não visto. Ramos 0,5-15 m compr., volúveis, pilosos, cilíndricos, 3 mm de diam., inermes, avermelhados, herbáceos; basais áfilos, com rudimento foliar adpresso. Folhas alternas; pecíolo 4,5-11,5 cm compr., piloso; lâmina 4,6-18,2 × 3,7-15,4 cm, face adaxial verde escura e face abaxial verde-clara, tomentosa na região das nervuras primárias, papirácea, oval, base cordada a truncada, ápice acuminado, 7-9 nervuras saliente na face abaxial. Inflorescência estaminada 9,7-28,5 cm compr., composta, raqui não-ramificada, velutina, eixo primário em racemo, eixos secundários em fascículos, 2 fascículos por nó da raqui, opostos entre si, 2-4 flores por fascículo, ereta. Flores estaminadas pediceladas, 2 bractéolas membranáceas, perianto alvacento a amarelado, rotáceo, profundamente partido, tépalas 2-3 mm compr., lanceoladas, tomentosas, uninervadas; estames 6, livres, inseridos no centro do perigônio, filetes ca. 1 mm compr., anteras ca. 0,3 mm compr., pistilódio ausente. Inflorescência pistilada 12-25,3 cm compr., em espiga. Flores pistiladas sésseis, 2 bractéolas, lanceoladas, perianto amarelado, rotáceo, profundamente partido, tépalas 1-2 mm, lanceoladas, tomentosas, uninervadas; estilete 1-2 mm compr., crasso, colunar 3-partido no ápice e com os ramos 2-fendidos, sinuosos na extremidade; 6 estaminódios ca. 0,5 mm compr., anteríferos, sésseis; ovário alvo, tomentoso. Cápsulas 3,5-4,6 × 2,1-3,9 cm, marrons, elípticas, com valvas coriáceas, tomentosas, com vestígios do perianto no ápice; sementes não vistas.

Material selecionado: Canaã dos Carajás, mata baixa, S11-D; 6º24’45”S, 50º20’3”W, 7.X.2009, fl., V.T. Giorni et al. 355 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. ACRE: Rio Branco, Boa Vista 1971, fl., J.G. Kuhlmann 632 (RB). PARÁ: Remansão, Rio Tocantins, 15.IX.1948, fl., R.L. Fróes 23468 (RB). SÃO PAULO: Fernandópolis, 10.V.1993, fl., R. Neves 223 (RB); Fernandópolis, Mata do Zoológico, 1.VIII.1993, fl., R. Neves 320(RB).

Dioscorea pilosiuscula caracteriza-se por ramos, folhas e inflorescência tomentosos, além de suas inflorescências compostas em fascículos. A espécie se distribui da América Central (Caribe) até o norte da América do Sul, incluindo a região Norte do Brasil, no domínio da Amazônia (Raz 2016Raz L (2016) Untangling the West Indian Dioscoreaceae: New combinations, lectotypification and synonymy. Phytotaxa 258: 26-48.). Na Serra dos Carajás ocorre na Serra Sul: S11D, em matas baixas, com maior incidência luminosa.

1.5. Dioscorea piperifolia Humb. & Bonpl. ex Willdenow, Sp. Pl. 4: 795. 1805. Fig.1g-h

Trepadeira vivaz, dioica, sinistrorsa. Sistema subterrâneo constituído de um tubérculo discoide, com apenas 1 ponto meristemático de onde parte o caule aéreo, com raízes finas emergindo principalmente da extremidade, periderme castanho-claro e medula esverdeada a branco-amarelada, a ca. 10 cm da superfície do solo. Ramos 0,5-3 m compr., volúveis, glabros, cilíndricos, 1-2 mm de diam., inermes, verdes marmoreados de vinoso, herbáceos; basais áfilos, com rudimento foliar adpresso. Folhas alternas; pecíolo 1,2-5,1 cm compr.; lâmina 4,3-10,8 × 2,5-4 cm, face adaxial verde-escura e face abaxial verde-clara, glabras em ambas as faces, membranácea, ovadas acuminadas, com sinus amplo, base cordada, ápice acuminado, 7-9 nervuras saliente na face abaxial, nectários extraflorais entre as nervuras junto a inserção com o pecíolo. Inflorescência estaminada 2,6-14,5 cm compr., em racemo, ereta. Flores estaminadas pediceladas, 2 bractéolas, membranáceas, triangular-acuminadas, perianto esverdeado a atropurpureo, rotáceo, tépalas 1,5-3 mm compr., lanceoladas acuminadas, glabras, 1-nervadas; 6 estames, livres, inseridos na parte central da flor, inclusos, subsésseis a sésseis, anteras ca. 0,3 mm compr., pistilódio ausente. Inflorescência pistilada 5,5-15(24>) cm compr., em espiga simples, pêndula. Flores pistiladas sésseis, 2 bractéolas, estreito-triangulares, perianto verde vinoso, rotáceo, tépalas 1,5-3 mm, obovada, glabras, 1-nervadas; 3 estiletes 0,5-1 mm compr., livres na sua maior extensão e com ramos inteiros, arredondados na extremidade; estaminódios ausentes. Cápsulas 1,5-2,9 × 0,8-1,3 cm, verdes a marrom-claras, elípticas com valvas cartáceas, glabras, com vestígios do perianto no ápice; sementes 1-1,7 cm compr., marrom-escuras, oval-lanceoladas, de ala basal alongada.

Material selecionado: Parauapebas, Serra Norte, N1, 6º00’55”S, 50º17’51”W, 11.XII.2007, fl., P.L. Viana et al 3449 (BHCB, MG); Serra dos Carajás, 12.I.2010, fl., L.C.B. Lobato et al 3801 (MG); Serra Norte, N8, 6º10’01”S, 50º09’29”W, 18.III.2015, fl., L.C.B. Lobato et al 4348 (MG); [Marabá], Serra dos Carajás, 14.III.1984, fl., A.S.L. da Silva et al 1789 (MG); 19.I.1985, fl., O.C. Nascimento & R.P. Bahia 935 (MG); 27.II.2012, fl., P.P. Chaves et al 02 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. ACRE: Manoel Urbano, Bacia do Purus, Rio Chandless, Parque Estadual Chandless, 21.XI.2010,​ fl., Medeiros ​ 664 (RB); AMAZONAS: Humaitá, East Bank of Rio Madeira, 1 km. North of Humaitá, 02.XII.1966, fl., G.T. Prance ​ 3535 (RB, NY). PARÁ: Marapanim, Vila de Câmara, 02.IV.1980, fl., Davidse​ 17781 (RB, NY); Viseu, Localidade de Jutaí, Serra do Piriá, 28.V.2010, fl. e fr., Forzza 5885 (RB); Alto Tapajós, Rio Cururú, 8.II.1974, fl., Anderson 10651 (RB, NY).

É circunscrita pelas folhas membranáceas, cordiformes (Fig. 1g), de flores gráceis, de pedicelo filiforme, com seis estames subsésseis, no centro da flor e perianto com segmentos sempre uninervados (Fig. 1h).

Dioscorea piperifolia é amplamente distribuída, ocorrendo nas Guianas, Colômbia, Uruguai, Peru, Paraguai, Equador, Argentina e Brasil (Pedralli 2002Pedralli G (2002) Levantamento florístico das Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley da cadeia do Espinhaço, Minas Gerais e Bahia, Brasil. Boletim de Botânica da Universidade de São Paulo 20: 63-119.). No Brasil ocorre principalmente nos Estados do Norte, habitando a borda e o interior de floresta atlântica, florestas de galeria, restinga, afloramentos rochosos, campos rupestres e áreas abertas.

Na Serra dos Carajás ocorre na Serras Norte: N1, N8, em vegetação de campo rupestre, em locais de maior luminosidade.

1.6. Dioscorea planistipulosa Uline ex. R. Knuth., Notizbl. Königl. Bot. Gart. Berlin 7 (65): 204. 1917. Fig. 1i-j

Trepadeira perene, dioica, dextrorsa. Sistema subterrâneo constituído de um conjunto de raízes tuberosas, com 1 ponto meristemático de onde parte o caule aéreo, raízes finas curtas emergem de todo a tubera, periderme amarela a alaranjada e medula amarelada, a ca. 25 cm da superfície do solo. Ramos 0,5-3,5 m compr., volúveis, glabros, cilíndricos, 2-3 mm de diam., inermes, verdes, herbáceos; basais áfilos, com rudimento foliar adpresso. Folhas alternas; pecíolo 2,5-6,7 cm compr., com pulvino basal atropurpureo, dilatando-se em uma aurícula carnoso-coriacea de margens onduladas; lâmina 7,5-19 × 3,3-11,7 cm, face adaxial verde escura a rósea com manchas alvas e face abaxial verde-clara a purpúrea, velutina em ambas as faces, membranácea, triangular a oblonga, com sinus amplo, base sagitada, ápice atenuado acuminado, 5-7 nervuras saliente na face abaxial, externas 2-3-furcadas. Inflorescência estaminada 5-10,5 cm compr., em racemo, ereta. Flores estaminadas pediceladas, 2 bractéolas, membranáceas, lanceolado-acuminadas, perianto esverdeado a vinoso ou rubro, rotáceo, tépalas 2-3 mm compr., oblongo-acuminadas, glabras, uninervadas; 6 estames, livres, inseridos na base de cada segmento do perianto, inclusos, filetes ca. 1,5 mm compr., anteras ca. 0,5 mm compr., pistilódio central, crasso, cônico, ca. 0,3 mm compr. Inflorescência pistilada 10-18 cm compr., em espiga simples, pêndula. Flores pistiladas sésseis, 2 bractéolas, oval-acuminadas, perianto verde a vinoso, rotáceo, tépalas 1-2 mm, lanceoladas, glabras, uninervadas; estilete colunar 1-2 mm compr., crasso, 3-partido no ápice e com os ramos 2-fendidos, aplanados horizontalmente na extremidade; 6 estaminódios ca. 1mm compr., anteríferos, pedunculados; ovário verde com nuances vinosos, glabro. Cápsulas 2,5-3,5 × 1,5-2,2 cm, amareladas a castanho-escuras com pontuações esparsas, oblongas com valvas subcoriáceos, glabras, com vestígios do perianto no ápice; sementes 1-1,5cm compr., marrom-claras, oblongas, de ala basal alongada.

Material selecionado: Canaã dos Carajás, Serra Sul, S11C, 6º22’18”S, 50º23’5”W, 8.XII.2007, fl., P.L. Viana et al. 3413 (BHCB, MG).

Material adicional: BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Santa Teresa, estrada para 25 de julho, 13.XII.2016, fl., F.R.M. Fraga 49 (RB). BAHIA: Ilhéus, 7.III.1985, fr., L.A.M. Silva 1844 (RB); 12.XI.1970, fl., S. Vinha (RB 00489823); Maraú, 16.X.2002, fl., P. Fiaschi 1122 (RB, NY, W). PIAUÍ: Ribeiro Gonçalves, Parcela de Monitoramento C7 do empreendimento da Linha de Transmissão LT 500 km Colinas - São João do Piauí, 22.III.2010, fl., E.M. Saddi 340 (RB); Guaribas, 7.XII.2011, fl., J.A. Siqueira Filho 2581 (RB).

Dioscorea planistipulosa é, assim como D. dodecaneura, uma espécie bastante característica, por ser uma das poucas espécies neotropicais que apresenta uma expansão cartilaginosa na base do pecíolo, além das folhas que podem apresentar coloração desde verde a rósea ou vinosa, com manchas alvas junto às nervuras (Fig. 1i-j). A espécie está distribuída somente no Brasil, apresentando anteriormente registros para os Estados da Bahia, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo (Couto 2010Couto RS (2010) Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Dissertação de Mestrado. Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Pp. 445.), sendo este o primeiro registro da espécie para a região amazônica e para o Estado do Pará. Na Serra dos Carajás ocorre na Serra Sul: S11C, em canga arbustiva, com grande incidência luminosa.

  • Lista de exsicatas

    Anderson 10651 (1.5). Berg CC 579 (1.3). Chaves PP 02 (1.5). Davidse G 17781 (1.5). Fiaschi P 1122 (1.6). Forzza RC 5885 (1.5), 5907 (1.3). Fraga FRM 49 (1.6). Fróes RL 23468 (1.4). Giorni VT 355 (1.4). Kuhlmann JG 632 (1.4), 2098 (1.1). Lima HC 3215 (1.3). Lima MPM 82 (1.1), 5507 (1.2). Lobato LCB 3801 (1.5), 4348 (1.5). Martius (M0213501) (1.2). Medeiros 664 (1.5). Mexia YEJ 5507 (1.2). Mori SA 11809 (1.1). Nascimento OC 935 (1.5), 1186 (1.2). Neves R 223, 320 (1.4). Prance G T 3535 (1.5). Saddi EM 340 (1.6). Silva ASL 1789(1.5). Silva LAM 1844 (1.6). Siqueira Filho JA 2581 (1.6). Sperling CR 6183 (1.1). Viana PL 3413 (1.6), 3449 (1.5). Vinha S (RB 00489823) (1.6). Zarucchi JL (RB 00597805) (1.3).
  • Editor de área: Dr. Pedro Viana

Agradecimentos

Ao CNPq, a concessão de bolsa de Mestrado (processo n. 132166/2016-0) à primeira autora para estudar as Dioscoreaceae. Aos coordenadores da Flora das cangas de Carajás, Dr. Pedro Viana e Dra. Ana Maria Giulietti-Harley, o convite para participar do projeto. Aos revisores, as contribuições pertinentes.

Referências

  • BFG - The Brazil Flora Group (2015) Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.
  • Caddick L, Rudall PJ, Wilkin P, Hedderson TAJ & Chase MW (2002a) Yams reclassified: a recircumscription of Dioscoreaceae and Dioscoreales. Taxon 51: 103-114.
  • Couto RS, Lopes RC & Braga JMA (2014) Dioscorea sphaeroidea (Dioscoreaceae), a threatened new species from the highaltitude grasslands of southeastern Brazil with wingless seeds. Phytotaxa 163: 229-234.
  • Couto RS (2010) Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Dissertação de Mestrado. Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Pp. 445.
  • Flora do Brasil (2020, em construção). Dioscoreaceae. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB104>. Acesso em 18 setembro 2017.
    » http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB104
  • Knuth R (1924) Dioscoreaceae. In: Engler A (ed.) Das Pflazenreich 4: 1-386.
  • Pedralli G (2002) Levantamento florístico das Dioscoreaceae (R. Br.) Lindley da cadeia do Espinhaço, Minas Gerais e Bahia, Brasil. Boletim de Botânica da Universidade de São Paulo 20: 63-119.
  • Pedralli G (2004) Dioscoreáceas. In: Reitz R (ed.) Flora ilustrada Catarinense, fascículo Diosc., Herbário Barbosa Rodrigues, Santa Catarina.
  • Raz L (2016) Untangling the West Indian Dioscoreaceae: New combinations, lectotypification and synonymy. Phytotaxa 258: 26-48.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    19 Out 2017
  • Aceito
    23 Fev 2018
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