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Avaliação da aptidão cardiorrespiratória por meio de protocolo submáximo em idosos com transtorno de humor e doença de Parkinson

Resumos

CONTEXTO: Evidências demonstram benefícios para a saúde mental com o treinamento aeróbico orientado em percentuais do VO2max, indicando a importância dessa variável para a prática clínica. OBJETIVO: Validar um método para estimar o VO2max por meio de um protocolo submáximo em idosos com diagnóstico clínico de transtorno depressivo maior (DM) e doença de Parkinson (DP). MÉTODOS: A amostra foi composta por 18 pacientes (64,22 ± 9,92 anos; sete pacientes com DM e 11 com DP). Foram realizadas três avaliações: I) estadiamento da doença, II) mensuração direta de VO2max e III) teste de esforço submáximo. Foi realizada regressão linear para verificar a precisão de estimativa do VO2max estabelecido na ergoespirometria pelo VO2max predito no teste submáximo. Também foi analisada a concordância de Bland-Altman entre os procedimentos. RESULTADOS: A análise de regressão mostrou que os valores de VO2max estimados pelo protocolo submáximo associam-se com o VO2max medido, tanto no valor absoluto (R² = 0,65; EPE = 0,26 ; p < 0,001) quanto no relativo (R² = 0,56; EPE = 3,70; p < 0,001). A análise de concordância de Bland-Altman mostrou boa associação entre as duas medidas. CONCLUSÃO: O VO2max predito por meio do protocolo submáximo demonstrou satisfatória validade de critério e simples execução comparado à ergoespirometria.

Teste de esforço; exercício; transtornos de humor; doença de Parkinson


BACKGROUND: Evidence has shown benefits for mental health through aerobic training oriented in percentage of VO2max, indicating the importance of this variable for clinical practice. OBJECTIVE: To validate a method for estimating VO2max using a submaximal protocol in elderly patients with clinically diagnosis as major depressive disorder (MDD) and Parkinson's disease (PD). METHODS: The sample comprised 18 patients (64.22 ± 9.92 years) with MDD (n = 7) and with PD (n = 11). Three evaluations were performed: I) disease staging, II) direct measurement of VO2max and III) submaximal exercise test. Linear regression was performed to verify the accuracy of estimation in VO2max established in ergospirometry and the predicted VO2max from the submaximal test measurement. We also analyzed the correlation between the Bland-Altman procedures. RESULTS: The regression analysis showed that VO2max values estimated by submaximal protocol associated with the VO2max measured, both in absolute values (R² = 0.65; SEE = 0.26; p < 0.001) and the relative (R² = 0.56; SEE = 3.70; p < 0.001). The Bland-Altman plots for analysis of agreement of showed a good correlation between the two measures. DISCUSSION: The VO2max predicted by submaximal protocol demonstrated satisfactory criterion validity and simple execution compared to ergospirometry.

Exercise test; exercise; mood disorders; Parkinson's disease


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da aptidão cardiorrespiratória por meio de protocolo submáximo em idosos com transtorno de humor e doença de Parkinson

Natacha Alves de OliveiraI,II; Heitor Santos SilveiraI,II; Alessandro CarvalhoI,II; Christiane Gouvêa e Silva HellmuthIII; Tony Meireles SantosIV; José Vicente MartinsV; José Luiz Sá CavalcantiV; Jerson LaksI,VI; Andrea Camaz DeslandesI,II

ICentro para Doença de Alzheimer e outros Transtornos Mentais na Velhice, Instituto de Psiquiatria, Universidade Federal do Rio de Janeiro (CDA-IPUB-UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IILaboratório de Neurociência do Exercício (PPGCEE), Universidade Gama Filho (UGF), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IIIClínica Médica do Exercício (MEDSPORT), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IVLaboratório Performance (PPGCEE), UGF, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

VInstituto de Neurologia Deolindo Couto, UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

VICentro de Estudos e Pesquisa do Envelhecimento (CEPE), Instituto Vital Brazil, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

CONTEXTO: Evidências demonstram benefícios para a saúde mental com o treinamento aeróbico orientado em percentuais do VO2max, indicando a importância dessa variável para a prática clínica.

OBJETIVO: Validar um método para estimar o VO2max por meio de um protocolo submáximo em idosos com diagnóstico clínico de transtorno depressivo maior (DM) e doença de Parkinson (DP).

MÉTODOS: A amostra foi composta por 18 pacientes (64,22 ± 9,92 anos; sete pacientes com DM e 11 com DP). Foram realizadas três avaliações: I) estadiamento da doença, II) mensuração direta de VO2max e III) teste de esforço submáximo. Foi realizada regressão linear para verificar a precisão de estimativa do VO2max estabelecido na ergoespirometria pelo VO2max predito no teste submáximo. Também foi analisada a concordância de Bland-Altman entre os procedimentos.

RESULTADOS: A análise de regressão mostrou que os valores de VO2max estimados pelo protocolo submáximo associam-se com o VO2max medido, tanto no valor absoluto (R2 = 0,65; EPE = 0,26 ; p < 0,001) quanto no relativo (R2 = 0,56; EPE = 3,70; p < 0,001). A análise de concordância de Bland-Altman mostrou boa associação entre as duas medidas.

CONCLUSÃO: O VO2max predito por meio do protocolo submáximo demonstrou satisfatória validade de critério e simples execução comparado à ergoespirometria.

Palavras-chave: Teste de esforço, exercício, transtornos de humor, doença de Parkinson.

Introdução

O transtorno depressivo maior (DM) e a doença de Parkinson (DP) são desordens altamente prevalentes, cujos registros atingem cerca de 7% e 1%-2% da população idosa, respectivamente1,2. Além de seus sintomas específicos, observam-se também comorbidades como doenças cardiovasculares e metabólicas que comprometem a qualidade de vida e aumentam o seu risco de morte3. A DM está associada à hiperatividade do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), elevação dos níveis de cortisol e maior ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona4,5. Essas alterações fisiológicas em depressivos contribuem para maior risco de doenças cardiovasculares, como a hipertensão6. Além disso, a hiperatividade do sistema colinérgico e o comprometimento no sistema nervoso autonômico observado em pacientes depressivos e com DP podem estar associados a maior risco de doenças cardiovasculares7,8.

Dentre os fatores que contribuem para o risco de morte por diversas causas, incluindo as doenças cardiovasculares, pode-se destacar a baixa aptidão cardiorrespiratória9,10. Valores máximos de equivalente metabólico (MET) acima de 6 MET para mulheres e 8 MET para homens estão associados a uma redução do risco de morte em até 15%9. Com o envelhecimento, espera-se que ocorra declínio do volume máximo de oxigênio consumido (VO2max) de 10%11 e 5%12 por década em indivíduos sedentários e ativos, respectivamente. Por outro lado, a atividade física aeróbica contribui para a redução desse declínio de VO2max13. Além das respostas favoráveis na saúde cardiovascular, observam-se reduções dos sintomas depressivos e declínios funcionais, além de melhora das funções cognitivas, com possíveis benefícios no tratamento das doenças mentais14. Entretanto, a prescrição da intensidade do treinamento aeróbico é fundamental para a eficiência e a segurança do programa de treinamento, especialmente considerando a prevalência elevada de doenças cardiovasculares nessa população.

Na determinação do VO2max, a ergoespirometria é um método direto considerado como "padrão-ouro", possibilitando, ainda, a identificação dos limiares ventilatórios. A medida do VO2max possui boa confiabilidade em pacientes com doença de Alzheimer (r = 0,94; p < 0,001)15 e DP (r = 0,90)16, sendo utilizada para aplicações diagnósticas, prognósticas e terapêuticas, especialmente com o objetivo de prescrição do treinamento aeróbico. Entretanto, sua aplicabilidade em centros de reabilitação e atividade física torna-se difícil por causa de seu alto custo financeiro e operacional.

Além da baixa aptidão cardiorrespiratória consequente da sintomatologia das doenças e do sedentarismo, as alterações comportamentais e motoras observadas na depressão e DP dificultam a execução de testes máximos nesses pacientes. A perda do prazer e de energia são sintomas depressivos comuns na DM e podem prejudicar o desempenho de um teste de esforço máximo nesses pacientes. Já na DP, tremor, rigidez, bradicinesia e instabilidade postural podem dificultar a execução do teste pelo prejuízo motor. Em estágios mais avançados da doença, esses sintomas podem se agravar. Por causa dos sintomas específicos das doenças, a intensidade alvo de testes máximos dificilmente é atingida por esses pacientes. Por esses motivos, por vezes faz-se necessária e recomendável a utilização das equações metabólicas sugeridas pelo American College of Sports Medicine (ACSM) para a estimativa do consumo de oxigênio, incluindo o VO2max17.

Métodos preditivos do VO2max, por meio de protocolos submáximos, possuem boa confiabilidade18 e podem ser uma alternativa simples e de baixo custo para as intervenções clínicas de prescrição de exercícios. Recentemente, Santos et al.18 verificaram boa reprodutibilidade de um protocolo submáximo em esteira para a obtenção do VO2max predito (r = 0,89) tanto pela frequência cardíaca máxima (FCmax) estimada pela idade (220-idade)19 quanto pela frequência cardíaca de pico (FCpico) (r = 0,83). Além das vantagens do protocolo submáximo, o método permite a individualização do aumento dos incrementos por estágio, sendo possível adaptar as cargas iniciais e ajustes de intensidade durante o procedimento, como a velocidade e a inclinação, até alcançar o steady-state em uma intensidade a 70% da frequência cardíaca de reserva (FCres). Entretanto, ainda não foi estabelecida a validade desse procedimento, em especial em idosos com transtornos mentais.

Assim, este estudo justifica-se pela necessidade de obtenção de parâmetros seguros para a prescrição de treinamento aeróbico na população idosa com diagnóstico clínico de transtorno depressivo maior ou doença de Parkinson. Associado a isso, inexistem protocolos preditivos concebidos para esse público. O objetivo do presente estudo consiste em estabelecer a validade de critério de um protocolo de predição do VO2max baseado na FCres para ser utilizado nessa população.

Métodos

Sujeitos

O presente estudo faz parte de um estudo maior sobre o efeito do treinamento físico na saúde mental de idosos e obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (nº 70Liv2-09). Os pacientes com DM possuíam diagnóstico pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV) e realizavam tratamento no Centro para Doença de Alzheimer e outros Transtornos Mentais na Velhice do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CDA-IPUB-UFRJ). A triagem dos pacientes com DP foi realizada no Instituto de Neurologia Deolindo Couto (INDC/UFRJ).

Os critérios de inclusão para DM foram: pacientes com transtorno depressivo maior que possuíam diagnóstico pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), com idade entre 60 e 80 anos e sintomas depressivos leve a moderado, avaliados por meio da Escala de Depressão de Hamilton (HAM-D) validada para o português20. Critérios de inclusão para DP foram idade entre 45 e 70 anos, diagnóstico de doença de Parkinson idiopática, estágio de 1 a 3 da Escala de Hoehn-Yahr21. Os critérios de exclusão comuns a todos os pacientes foram analfabetismo, acidente vascular cerebral, doenças neurodegenerativas associadas, parkinsonismo, comorbidades mentais, utilização de outros tratamentos como eletroconvulsoterapia, psicoterapia, pacientes que não deambulavam, estado febril, infeccioso ou inflamatório agudo. Os critérios cardiológicos de exclusão foram histórico de infarto agudo do miocárdio e isquemia, sintomas de doença arterial coronariana (angina), extrassístole ventricular bigeminada, pacientes em uso de medicamentos betabloqueadores.

Dos 31 pacientes recrutados, 13 foram excluídos (nove não apresentaram os critérios de elegibilidade para o estudo e quatro não compareceram a todas as visitas). A amostra foi composta por 18 pacientes que leram e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Delineamento experimental

Os voluntários fizeram três visitas no período da manhã com intervalo de até duas semanas entre as avaliações. Na DP foram levados em consideração o "fenômeno on-off" e o "wearing-of", que são flutuações das habilidades motoras decorrentes do uso da levodopa. Por esse motivo, os pacientes foram avaliados no período "on", porque apresentavam redução do comprometimento da função motora. A primeira testagem consistiu no estadiamento da doença e na avaliação da função cognitiva e de sinais motores (para DP). Para o estadiamento da doença, além da anamnese, foram realizadas Escala de Depressão de Hamilton (HAM-D)20, Escala de Hoehn-Yahr21 e o domínio motor da Escala Unificada de Avaliação da Doença de Parkinson (UPDRS III), todas validadas para o português.

Em um segundo momento, os voluntários foram submetidos à mensuração direta do VO2max por meio do protocolo máximo (ergoespirometria) supervisionado por uma cardiologista. Na terceira visita, o VO2max foi estimado por meio do protocolo submáximo18,22.

Os pacientes foram orientados para que no dia do teste fizessem refeições leves, se hidratassem, não ingerissem bebida alcoólica e não fumassem. Em complemento, eles foram orientados a não realizar esforço intenso nas últimas 48 horas anteriores às avaliações. Antes de iniciarem os testes, os pacientes foram instruídos sobre a escala de percepção subjetiva de esforço [Escala de Borg (6-20)]23, além dos procedimentos de segurança para a realização do teste em esteira. O peso e a altura foram aferidos em uma balança mecânica de plataforma (Welmy 110, Welmy Indústria e Comércio Ltda.®, SP, Brasil).

Procedimentos

Teste de esforço máximo com análise de gases: As mensurações diretas por meio do teste máximo com análise de gases foram realizadas na Clínica Médica do Exercício (MEDSPORT), em sala climatizada com temperatura de 23˚C e umidade relativa do ar de 55%. A frequência cardíaca foi monitorada por meio da derivação D2 do eletrocardiógrafo (ECG digital Elite, Micromed Biotecnologia Ltda.®, DF, Brasil) e da pressão arterial foi aferida por esfigmomanômetro de mercúrio (DiagnostixTM, American Diagnostic Corporation®, USA).

O protocolo em Rampa24 em esteira rolante (Super ATL Millennium, Inbramed Ltda.®, RS, Brasil) foi escolhido, pois considera a individualidade biológica dos pacientes. Esse protocolo consistiu em aumentos contínuos e graduais dos estágios de acordo com a adaptação à esteira de cada paciente. Os testes foram exclusivamente de caminhada, nos quais o ergomestrista definiu a velocidade e a inclinação a ser atingida pelo paciente, e o sistema computadorizado (VO2000, Medical Graphics®, software Ergo PC 13® versão 3.3, RS, Brasil) calculou a razão em que a potência foi incrementada durante os testes. As variáveis cardiorrespiratórias VO2, razão de trocas respiratórias (R), produção de dióxido de carbono (VCO2) e ventilação pulmonar (VE) foram medidas utilizando-se um analisador de gases acoplado ao sistema computadorizado, com amostras a cada 10 segundos.

Os sistemas de análise do O2 e CO2 foram calibrados conforme especificação do fabricante antes de cada teste. O consumo de oxigênio de pico (VO2pico) foi considerado como maior valor obtido no final do esforço. Os critérios utilizados para o teste ser considerado como máximo foram alcançar um platô na captação de oxigênio, o esforço percebido acima de 17 (escala de Borg 6-20) e, principalmente, fadiga voluntária. Além disso, os avaliadores estavam atentos aos critérios para finalização de testes com fins diagnósticos sugeridos pelo ACSM17.

Protocolo submáximo: A testagem foi realizada no Instituto de Neurologia Deolindo Couto. Os sinais vitais foram aferidos após 10 min de repouso em posição supina, em ambiente calmo e refrigerado. Durante os testes foram monitorados e registrados, a cada 20 s, a frequência cardíaca por frequencímetros (modelo FS3TM, Polar®, Finland), a sensação subjetiva de esforço, pela escala de Borg (6-20)23, e a pressão arterial foi aferida e registrada a cada 2 min por meio do aparelho Durashock, Welch Allyn, Tycos® (SC, Brasil).

Para a determinação da FCres, foi utilizada a equação: (FCmax - FCrep) x intensidade + FCrep, em que: FCmax = frequência cardíaca máxima estimada pela equação (220 – idade)19; FCrep = frequência cardíaca de repouso aferida após 10 min de repouso do paciente em posição supina; e intensidade = intensidade que o paciente deveria atingir durante o teste (65% da FCres,) e manter no steady-state (70% da FCres).

O protocolo submáximo consistiu em uma fase inicial de 3 min de aquecimento em esteira rolante (modelo JOG 500, Technogym The Wellness Company®, Italy), na qual a velocidade inicial variou de acordo com a adaptação à esteira entre os pacientes. A razão de incremento metabólico por estágio foi equivalente a 1 MET e proporcionada pela manipulação da velocidade e inclinação da esteira. O objetivo foi alcançar a intensidade correspondente a aproximadamente 65% da FCres. Depois de atingida, essa intensidade de esforço era mantida por 6 min, caracterizando um steady-state25. Até o final dessa fase, esperava-se que a FC fosse estabilizada a aproximadamente 70% da FCres. Os critérios para interrupção para ambos os testes seguiram as recomendações do ACSM17.

O VO2 foi obtido pela equação de caminhada: VO2 = [0,1 (velocidade) + 1,8 (velocidade) (inclinação/100) + 3,5], na qual a velocidade é fornecida em m/min. Por fim, o VO2max foi predito pela equação: VO2max = [(VO2 - 3,5) / % FCres + 3,5], na qual VO2max é expresso em mL.kg-1.min-117.

Análise estatística

Para testar a distribuição e a variância dos dados foram utilizados os testes Shapiro-Wilk e Levene, respectivamente. Foi realizada uma regressão linear para verificar a precisão de estimativa do VO2max estabelecido na ergoespirometria pelo VO2max predito no teste submáximo. A precisão da predição foi estabelecida pelo coeficiente de determinação e ajustado pelo erro-padrão estimado (EPE). Para verificar a concordância entre a medida e estimativa do VO2max, foi utilizada complementarmente a análise de concordância Bland-Altman.

O software utilizado para a análise dos dados foi o Statistical Package for the Social Sciences versão 19 (SPSS® Inc., Chicago, IL, EUA) e o nível de significância aceito foi de p ≤ 0,05.

Resultados

A amostra foi constituída por 18 pacientes, sendo 11 com DP e sete com DM. Os pacientes apresentavam média de idade de 64,2 (DP = 9,92) anos e média de escolaridade igual a 9,5 (DP = 4,13) anos. A mediana de peso foi de 67 (62,5-72,3) kg e a média de altura, de 1,63 (DP = 0,09) m. Dentre os pacientes, 11 tomavam medicamentos antiparkinsonianos (61,1%), sete tomavam antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (38,9%) e oito tomavam anti-hipertensivos (44,4%). Houve distribuição normal e homogeneidade para idade, escolaridade, Miniexame do Estado Mental (MEEM), altura, índice de massa corporal, número de medicamentos, pontuação na HAM-D e UPDRS. Em relação aos sintomas da doença, os pacientes depressivos apresentaram sintomas leves de depressão avaliados pela HAM-D (11 ± 6). Já os pacientes com DP obtiveram pontuação mediana de 2,5 (2,0-3,0) na escala de estadiamento da doença Hoehn e Yahr e 31,8 (DP = 10,5) pontos na avaliação dos sintomas motores pela UPDRS III. Os pacientes apresentaram adequada adaptação aos protocolos investigados, não tendo sido observada qualquer intercorrência.

Os pacientes (n = 18) apresentaram VO2max absoluto médio de 1,6 ± 0,4 L.min-1 (medida direta) e 1,9 ± 0,4 L.min-1 (medida indireta). Os valores de VO2max relativizados à massa corporal foram de 23,8 ± 3,8 mL.kg-1.min-1 (medida direta) e de 27,5 ± 5,5 mL.kg-1.min-1 (medida indireta). A análise de regressão mostrou que os valores de VO2max estimados pelo protocolo submáximo associam-se com o VO2max medido, tanto no valor absoluto (R2 = 0,65; F(1,16) = 29,78; EPE = 0,26; p < 0,001) quanto no relativo (R2 = 0,56; F(1,16) = 20,76; EPE = 3,70; p < 0,001). A análise de concordância de Bland-Altman apresentou BIAS -3,70 ± 3,63 (média, DP – IC 95%, -10,82; 3,41) para o VO2max relativo e BIAS -0,25 ± 0,25, (IC 95%, -0,74; 0,25) para o VO2max absoluto, mostrando boa concordância entre os dois métodos (Figura 1).


Discussão

O presente estudo teve por objetivo investigar a utilização de um método indireto para predição do VO2max baseado na FCres e VO2res por meio de um protocolo submáximo em pacientes com transtornos mentais e doença neurodegenerativa altamente prevalentes na população idosa, especificamente a DM e a DP. Os resultados mostraram boa correlação entre o VO2max medido de forma direta e o previsto pelo protocolo submáximo proposto, com erro-padrão estimado de 0,26 L.min-1 e 3,70 mL.kg-1.min-1. Todos os pacientes conseguiram rea–lizar os testes sem nenhuma resposta adversa ou comprometimento durante ou após as avaliações, reforçando a facilidade de execução e segurança do protocolo.

De acordo com a análise de concordância de Bland-Altman, ao se realizar a diferença entre a medida direta e indireta, observam-se na figura 1 valores negativos que podem indicar uma pequena su–perestimativa da medida indireta. Entretanto, os valores de EPE foram similares aos encontrados na literatura22. Pela média do VO2max obtido pela medida direta (23,7 mL.kg-1.min-1) e pela medida indireta (27,4 mL.kg-1.min-1), foi possível calcular a média dos MET dos pacientes (6,8 e 7,8 MET, respectivamente). Acredita-se que indivíduos com capacidade aeróbica máxima de 7,9 MET ou mais apresentem menor taxa de mortalidade e de doença cardiovascular9. Esses dados indicam a adequação do método em dimensão aplicada para avaliação cardiorrespiratória em pacientes com DM e doenças neurodegenerativas, como a DP, visto que estes apresentam maior risco para eventos cardiovasculares3,6. Além disso, transtornos psiquiátricos são prevalentes em pacientes cardiopatas que frequentam um programa de exercícios supervisionados, ainda que eles se apresentem menos graves em termos de prejuízos funcionais e a ausência de múltiplas comorbidades26.

Para maior segurança, recomenda-se a consideração do EPE relatado e demonstrado pelo presente estudo. Nossos dados corroboram os de um estudo que investigou a aptidão aeróbica por meio de um protocolo submáximo de rampa em cicloergômetro em indivíduos sedentários e observou boa reprodutibilidade (r = 0,85; p < 0,001) e validade (r = 0,75; p < 0,001)27. O desenvolvimento desses métodos ou testes indiretos visa auxiliar a avaliação cardiovascular e o direcionamento para a prescrição de treinamento físico.

A adesão a um programa de exercícios e a eficácia do treinamento dependem também de fatores relacionados à prescrição, por exemplo, a intensidade do esforço. A intensidade muito leve ou muito alta parece estar associada a pior resposta afetiva e possivelmente a menor adesão ao programa de exercícios, especialmente em indivíduos sedentários28. Além disso, estudos mostram haver uma intensidade ideal para um melhor benefício para a função motora, cognitiva e comportamental. De acordo com a teoria do "U" invertido29, intensidades moderadas promovem a melhor resposta, sendo necessário o controle rigoroso dessa variável em pacientes com diagnóstico de transtornos mentais30.

Segundo as diretrizes do ACSM para população idosa31, preconiza-se a prática de 150 minutos semanais de atividade física, sendo a atividade aeróbica com frequência mínima de três vezes por semana, intensidade de 40% a 60% da FCres, de 11 a 13 na escala de Borg, com duração mínima de 20 min. Os estudos que investigaram o efeito do exercício aeróbico no tratamento da DM em idosos utilizaram intensidades relativas ao VO2max para a prescrição da intensidade do treinamento32,33. Já foi demonstrado que exercícios aeróbicos realizados de duas a três vezes por semana durante 30 min, com intensidade de 60% do VO2max (12 a 14 na escala de Borg), mostraram-se eficientes para o tratamento adicional da DM32,33. Tais evidências apoiam a importância da determinação do VO2max na tomada de decisão para a prescrição do treinamento aeróbico.

O presente estudo apresenta algumas limitações que devem ser consideradas, por exemplo, o número reduzido de pacientes e a medicação utilizada pelos pacientes com DP, visto que estas reduzem a FC. Em especial, esse aspecto pode explicar a ligeira superestimativa do VO2max observada. Futuros estudos são necessários para reproduzir as análises separadamente para cada população de pacientes, levando em consideração o tipo de medicação em uso. Além disso, sugere-se que próximos estudos comparem as equações de predição da FCmax proposta por Fox et al.19 e Tanaka et al.34. Apesar de esse estudo ter utilizado apenas pacientes com DM e DP, espera-se que o presente método para predição do VO2max a partir de um protocolo submáximo possa ser utilizado por pacientes com outros diagnósticos de transtornos mentais, embora ainda reste ser comprovado para outras patologias. Assim, futuras investigações devem reproduzir esse método com populações específicas.

Conclusão

O VO2max predito por meio do protocolo submáximo demonstrou satisfatória validade de critério e simples execução quando comparado à ergoespirometria. A prescrição de exercício para idosos com transtorno depressivo e doença de Parkinson pode ser adequadamente realizada com base nas variáveis fisiológicas obtidas por meio desse protocolo, devendo ser considerada a precisão reportada pelo presente estudo. Objetiva-se com essa recomendação treinamentos aeróbicos mais seguros e eficazes.

Agradecimentos

Os autores agradecem, pelo apoio, ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq, Brasil) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Rio de Janeiro, Brasil.

Jerson Laks é parcialmente apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo nº 300411/2009-0 e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), nº E-26/112631/2012.

Os autores agradecem aos pesquisadores Helena Sales de Moraes, Raphael Marques Gomes, Dannyel Duarte Barbirato, Ingrid Storck Guimarães e Monique Nunes Carvalhaes Pinheiro, pela assistência durante as coletas, e à Clínica de Medicina do Exercício (MEDSPORT), por realizar os testes de esforço máximo sem custos.

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    Andrea Camaz Deslandes. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Institute of Psychiatry, Laboratory of Geriatric Neuropsychiatry.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      10 Set 2012
    • Aceito
      20 Dez 2012
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