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PREVALÊNCIA DE ANTICORPOS NEUTRALIZANTES CONTRA POLIOVÍRUS 1, 2 E 3 EM PROFISSIONAIS DE SAÚDE DE 20 A 50 ANOS DE IDADE

RESUMO

Objetivo:

Descrever a prevalência de anticorpos neutralizantes contra poliovírus (tipos 1, 2 e 3) em amostra de sangue de profissionais de saúde com idade de 20 a 50 anos.

Métodos:

Profissionais de saúde que atendem crianças do Hospital Infantil Darcy Vargas e do Departamento de Pediatria da Irmandade da Santa Casa de São Paulo. O tamanho da amostra foi de 323 participantes. Os anticorpos contra poliovírus humanos foram detectados pela reação de neutralização. Para os indivíduos suscetíveis, foram administradas vacina para poliomielite inativada+tríplice e nova dosagem de anticorpos neutralizantes após uma semana. Utilizou-se o teste do qui-quadrado de Mantel-Haenszel para verificar as diferenças entre os grupos.

Resultados:

Foram estudados 333 profissionais - 92,8% eram imunes ao poliovírus 1; 86,5%, ao poliovírus 2; 63,57%, ao poliovírus 3; 37% apresentaram títulos inferiores a 1:8 para qualquer sorotipo; 5,1% tinham títulos abaixo de 1:8 para os três. Após a vacinação dos suscetíveis, houve elevação dos títulos para todos os poliovírus.

Conclusões:

Apesar da detecção de percentual significativo de indivíduos com baixo título de anticorpos para poliovírus, o desafio da vacinação demonstrou resposta imune robusta compatível.

Palavras-chave:
Poliomielite; Anticorpos; Profissionais de saúde

ABSTRACT

Objective:

To describe the prevalence of neutralizing antibodies against poliovirus (PV1, PV2, and PV3) in blood samples of healthcare professionals aged 20 to 50 years.

Methods:

Health professionals who serve children at Darcy Vargas Children’s Hospital and the Department of Pediatrics of Irmandade da Santa Casa de São Paulo. The sample size was calculated at 323 participants. The Mantel-Haenszel chi-square was used to verify differences between groups. The neutralization reaction detected human poliovirus antibodies. For susceptible individuals, vaccination with the inactivated+triple acellular polio vaccine was performed, and neutralizing antibodies were re-dosed after one week.

Results:

333 professionals were studied - 92.8% were immune to poliovirus 1, 86.5% to poliovirus 2, and 63.3% to poliovirus 3; 37% had titers less than 1:8 for any serotype, 5;1% had titers below 1:8 for all three. Vaccination with inactivated polio vaccine was performed for susceptible participants, and neutralizing antibodies were dosed after one week, showing increased titers for all polioviruses.

Conclusions:

Despite the detection of a significant percentage of individuals with low poliovirus antibody titer, the challenge with vaccination demonstrated immune response compatible with poliovirus immunity.

Keywords:
Poliomyelitis; Antibodies; Health professionals.

INTRODUÇÃO

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2019 foram registrados 125 casos de poliomielite por vírus selvagens (WPV, do inglês wild poliovirus) tipo 1 no Afeganistão (24) e no Paquistão (101).11. World Health Organization [homepage on the Internet]. Polio this week as of 08 January 2020. Geneva: WHO; 2020 [cited 2020 Jan 08]. Available from: Available from: http://polioeradication.org/polio-today/polio-now/this-week/
http://polioeradication.org/polio-today/...
Mesmo sendo a maioria dos casos de paralisia por WPV e por poliovírus circulantes derivados da vacina (cVDPV, do inglês circulating vaccine-derived polioviruses), diagnosticada em menores de cinco anos, a poliomielite pode acometer pessoas suscetíveis de qualquer idade.22. Morse LJ, Rubin HE, Blount Junior RE. Vaccine-acquired paralytic poliomyelitis in an unvaccinated mother. JAMA. 1966;197:1034-5. https://doi.org/10.1001/jama.1966.03110120140038
https://doi.org/https://doi.org/10.1001/...
,33. Prevots DR, Ciofi degli Atti ML, Sallabanda A, Diamante E, Aylward RB, Kakariqqi E, et al. Outbreak of paralytic poliomyelitis in Albania, 1996: high attack rate among adults and apparent interruption of transmission following nationwide mass vaccination. Clin Infect Dis. 1998;26:419-25. https://doi.org/10.1086/516312
https://doi.org/https://doi.org/10.1086/...
,44. Sutter RW, Kew OM, Cochi SL. Poliovirus vaccine - live. In: Plotkin SA, Orenstein WA, Offit PA, editors. Vaccines. 5th ed. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008. p. 605-30. A infecção por WPV ou cVDPV em países certificados como livres de pólio é um risco em razão do aumento do fluxo de viajantes por turismo, trabalho, intercâmbio cultural ou missões políticas, religiosas e eventos culturais.44. Sutter RW, Kew OM, Cochi SL. Poliovirus vaccine - live. In: Plotkin SA, Orenstein WA, Offit PA, editors. Vaccines. 5th ed. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008. p. 605-30. Embora as crianças não vacinadas sejam o principal grupo envolvido na cadeia de transmissão da pólio, o papel de adultos com infecção assintomática por poliovírus não deve ser subestimado.

No Brasil, existem poucas informações sobre a imunidade aos poliovírus em adultos, e não encontramos nenhum estudo sobre profissionais de saúde.55. Niederman JC, Henderson JR, Opton EM, Black FL, Skvrnova K. A nationwide serum survey of Brazilian military recruits, 1964. II. Antibody patterns with arboviruses, polioviruses, measles and mumps. Am J Epidemiol. 1967;86:319-29. https://doi.org/10.1093/oxfordjournals.aje.a120742
https://doi.org/https://doi.org/10.1093/...
Também desconhecemos o percentual de profissionais de saúde vacinados contra a poliomielite. Tendo em vista que os WPV deixaram de circular no país há três décadas (último registro em 1989), que muitos adultos, principalmente os nascidos antes de 1980, não devem ter sido vacinados contra a poliomielite na infância e que existe redução progressiva nos títulos de anticorpos contra poliovírus, consideramos essencial pesquisar a imunidade sérica em profissionais de saúde para avaliar a necessidade de revacinação.

Este estudo visou descrever a prevalência de anticorpos neutralizantes contra poliovírus - poliovírus 1 (PV1), 2 (PV2) e 3 (PV3) - em amostra de profissionais de saúde com idade entre 20 e 50 anos no período de 2016 a 2017.

MÉTODO

Trata-se de estudo transversal de profissionais de saúde (médicos e profissionais de enfermagem) que atendiam crianças do Hospital Infantil Darcy Vargas e do Departamento de Pediatria da Irmandade da Santa Casa de São Paulo durante os anos de 2016 e 2017 e que concordaram em participar do estudo. As premissas utilizadas para o cálculo do tamanho da amostra foram as seguintes: prevalência estimada de suscetíveis a um ou mais poliovírus=30%,66. Luchs A, Cilli A, Russo DH, Costa FF, Carmona RC, Timenetsky MC. Monitoring of poliovirus neutralizing antibodies in São Paulo State, Brazil. Trans R Soc Trop Med Hyg. 2010;104:625-7. https://doi.org/10.1016/j.trstmh.2010.05.004
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
erro de estimativa=5%, nível de confiança=95%, poder do estudo=80% e perdas=5%. O tamanho da amostra foi calculado em 323 participantes. Profissionais que tinham títulos de anticorpos neutralizantes inferiores a 1:8 foram considerados potencialmente suscetíveis.77. Costa-Carvalho BT, Sullivan KE, Fontes PM, Aimé-Nobre F, Gonzales IG, Lima ES, et al. Low rates of poliovirus antibodies in primary immunodeficiency patients on regular intravenous immunoglobulin treatment. J Clin Immunol. 2018;38:628-34. https://doi.org/10.1007/s10875-018-0531-x
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...

Foram incluídos profissionais de saúde (médicos e profissionais de enfermagem) entre 20 e 50 anos que trabalhavam nas instituições envolvidas no atendimento de crianças, sendo excluídos os que tivessem recebido Vacina Oral Poliomielite (VOP) e/ou Vacina Inativada Poliomielite (VIP) nos últimos 10 anos. Para a seleção dos participantes, mediante relação dos profissionais de cada uma das categorias nas duas instituições envolvidas, procedeu-se a sorteio por meio de uma amostra casual simples dos sujeitos. Se no dia aprazado o sujeito sorteado não se apresentou, foi substituído por outro da mesma instituição, com idade próxima e na mesma categoria profissional. Em 1980, com o intuito de eliminar a doença, o Ministério da Saúde realizou duas campanhas nacionais de vacinação de maneira indiscriminada para os menores de cinco anos de idade. Dividimos nossa população entre os que nasceram antes de 1980 e os nascidos posteriormente a esse ano, que, portanto, tiveram chance de receber a VOP nas campanhas nacionais.

Para a determinação da soroprevalência de anticorpos neutralizantes, as amostras de sangue coletadas foram enviadas para o laboratório Fleury Medicina e Saúde. Os soros foram coletados em tubos apropriados. As amostras foram guardadas a 4oC, caso a reação de neutralização fosse feita nos três dias seguintes à coleta, ou congelados a -20oC, se o teste fosse realizado após três dias. O laboratório Fleury realizou o transporte das amostras das instituições participantes ao seu laboratório central, no bairro do Jabaquara, em São Paulo (SP), e forneceu um laudo contendo os resultados para os poliovírus de cada sujeito.

Os anticorpos contra poliovírus humanos foram detectados pela reação de neutralização. Células HEp-2 (que foram utilizadas para cultura do poliovírus vacinal e medição dos títulos de neutralização) foram inoculadas com doses padronizadas de PV1, PV2 e PV3, separadamente. Soro humano foi adicionado às células em diferentes diluições, iniciando com 1:8 e dobrando até 1:1024. Após o período de incubação de 48 horas, as placas foram lidas por meio de microscópio invertido, buscando os efeitos citopáticos. A última diluição na qual se observou que o efeito citopático foi neutralizado foi considerada o título final dessa amostra. A técnica de neutralização utilizada foi a recomendada pela OMS, sendo titulações inferiores a 1:8 consideradas negativas para essa metodologia.88. World Health Organization. Manual of laboratory methods for testing of vaccines used in the WHO Expanded Programme on Immunization. Geneva: WHO ;1997.

Aos indivíduos que não possuíam títulos de anticorpos neutralizantes para um ou mais poliovírus, por motivos éticos, foi oferecida a vacinação com a vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis (acelular) e VIP (dTpa-VIPR - Sanofi Pasteur). Após a vacinação dos indivíduos com baixos títulos que concordaram em participar, foi feita nova coleta após uma semana, e utilizaram-se os mesmos métodos para avaliação de ­soroconversão/­mudança dos títulos de anticorpos neutralizantes.

Na análise estatística, foi calculada a prevalência de potencialmente suscetíveis para cada poliovírus. Para a comparação das prevalências, utilizou-se o teste do qui-quadrado de Mantel-Haenszel.

A pesquisa observou as recomendações da Conep, de acordo com a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Irmandade da Santa Casa de São Paulo, sob número 379.176, de 28 de agosto de 2013. O estudo foi realizado com a anuência dos profissionais de saúde mediante a leitura e a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Durante os anos de 2013 a 2016, dos 1.100 profissionais de saúde das duas instituições, foram recrutados 333, segundo fluxograma mostrado na Figura 1. Dos 333 profissionais, 158 (47,4%) eram médicos, e 175 (52,6%) eram pessoal de enfermagem. Quanto à faixa etária, 189 (56,8%) tinham 35 anos de idade ou menos, e 144 (43,2%) pertenciam à faixa etária de 36 anos ou mais.

Figura 1
Fluxograma para recrutamento dos participantes.

A maioria dos profissionais de saúde, 209 (62,8% [IC95% 57,5-67,8]), apresentou títulos de anticorpos neutralizantes iguais ou superiores a 1:8 para os três poliovírus e foram considerados imunes. A proporção de imunes não variou de acordo com a categoria profissional (p=0,874; Tabela 1).

Tabela 1
Profissionais de saúde segundo categoria profissional e idade em relação à imunidade. São Paulo, 2015-2016.

A proporção de imunes aos três poliovírus não apresentou diferença significativa segundo a idade dos participantes, mas foi ligeiramente menor para os mais jovens (p=0,743; Tabela 1).

Dos 333 participantes do estudo, 24 (7,5% [4,8-10,4]) eram suscetíveis ao PV1, 33 (9,9% [7,0-13,5]) eram suscetíveis ao PV2, e 104 (31,2% [26,4-36,7]) eram suscetíveis ao sorotipo 3. Com relação aos sorotipos do poliovírus, 37,2% apresentaram títulos inferiores a 1:8 para qualquer sorotipo, e 5,1% tinham títulos abaixo de 1:8 para os três.

Aos 124 profissionais que demonstraram baixo título de anticorpos neutralizantes para um ou mais dos sorotipos (37,2%), foi oferecida, por motivos éticos, a VIP e a participação em um desafio imunológico. Destes, 14 participaram do desafio, nos quais se observou uma soro conversão de todos os indivíduos para os três poliovírus.

DISCUSSÃO

A proteção contra poliomielite é fundamentalmente conferida pela presença de anticorpos neutralizantes contra PV1, PV2 e PV3, tendo em vista que a proteção é sorotipo-específica. A manutenção de altos títulos de anticorpos contra poliovírus em adultos pode resultar tanto da vacinação como do reforço natural (booster), por exposição aos WPV ou vacinais.99. Chen RT, Hausinger S, Dajani AS, Hanfling M, Baughman AL, Pallansch MA, et al. Seroprevalence of antibody against poliovirus in inner-city preschool children. Implications for vaccination policy in the United States. JAMA. 1996;275:1639-45. https://doi.org/10.1001/jama.1996.03530450029028
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Embora muitos acreditem que as vacinas contra pólio confiram imunidade permanente, diversos estudos indicam que, com o passar dos anos, ocorre redução dos anticorpos contra os poliovírus.1010. Schoub BD, Blackburn NK, McAnerney JM. Seroprevalence to polio in personnel at a virology institute. J Infect. 2001;43:128-31. https://doi.org/10.1053/jinf.2001.0867
https://doi.org/https://doi.org/10.1053/...
,1111. Diedrich S, Schreier E. The German Health Interview and Examination Survey for Children and Adolescents (KiGGS): state of immunity against poliomyelitis in German children. Bundesgesundheitsblatt Gesundheitsforschung Gesundheitsschutz. 2007;50:771-4. https://doi.org/10.1007/s00103-007-0239-1
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
,1212. Miranda MP, Gomes MC, Andrade HR. Seroprevalence of antibodies to poliovirus in individuals living in Portugal, 2002. Euro Surveill. 2007;12:E7-8. https://doi.org/10.2807/esm.12.06.00717-en
https://doi.org/https://doi.org/10.2807/...
,1313. Pírez MC, Olivera I, Diabarboure H, Montano A, Barañano R, Badía F, et al. Seroprevalence of anti-polio antibodies in a population 7 months to 39 years of age in Uruguay: Implications for future polio vaccination strategies. Vaccine. 2009;27:2689-94. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2009.02.042
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,1414. Reinheimer C, Friedrichs I, Rabenau HF, Doerr HW. Deficiency of immunity to poliovirus type 3: a lurking danger? BMC Infect Dis. 2012;12:24. https://doi.org/10.1186/1471-2334-12-24
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,1515. Külshammer M, Winke U, Frank M, Skali-Lami U, Steudel H, Schilling G, et al. Poor immunity status against poliomyelitis in medical students: a semi-anonymous study. Med Microbiol Immunol. 2013;202:63-5. https://doi.org/10.1007/s00430-012-0237-2
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,1616. Baldo V, Baldovin T, Cocchio S, Lazzari R, Saracino E, Bertoncello C, et al. Sero-epidemiology of polioviruses among university students in northern Italy. Clin Vaccine Immunol. 2012;19:1292-5. https://doi.org/10.1128/cvi.00054-12
https://doi.org/https://doi.org/10.1128/...
,1717. Centers for Disease Control and Prevention. Outbreaks following wild poliovirus importations --- Europe, Africa, and Asia, January 2009--September 2010. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2010;59:1393-9.,1818. Pianetti A, Salvaggio L, Biffi MR, Baffone W, Bruscolini F, Donato S, et al. Antipoliomyelitis immunity status in a cohort of young men drafted into military service, residing in the suburban Milan area. Eur J Epidemiol. 1997;13:725-7. https://doi.org/10.1023/a:1007331900645
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Em inquéritos soroepidemiológicos, raramente é possível identificar entre os soronegativos quantos apresentam falha primária ou secundária na soroconversão. Sabe-se, entretanto, que as falhas primárias após uso da VOP são mais frequentes em países de clima tropical, e não apenas as taxas de soroconversão mas também a média geométrica dos títulos de anticorpos contra poliovírus são inferiores às observadas após infecção natural ou vacinação com VIP.1010. Schoub BD, Blackburn NK, McAnerney JM. Seroprevalence to polio in personnel at a virology institute. J Infect. 2001;43:128-31. https://doi.org/10.1053/jinf.2001.0867
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O desconhecimento sobre a duração da imunização ao longo do tempo tem determinado que muitos países utilizem doses de reforço em populações adultas. Na Europa, diversos países introduziram uma dose de reforço da VIP, isolada ou combinada com outras vacinas (dT-VIP ou dTpa-VIP), para adolescentes, adultos1919. Le Menach A, Llosa AE, Mouniaman-Nara I, Kouassi F, Ngala J, Boxall N, et al. Poliomyelitis outbreak, Pointe-Noire, Republic of the Congo, September 2010-February 2011. Emerg Infect Dis. 2011;17:1506-9. https://doi.org/10.3201/eid1708.110195
https://doi.org/https://doi.org/10.3201/...
e, em 18 países, para profissionais de saúde.2020. Maltezou HC, Botelho-Nevers E, Brantsæter AB, Carlsson RM, Heininger U5, Hübschen JM, et al. Vaccination of healthcare personnel in Europe: Update to current policies. Vaccine. 2019;37:7576-84. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2019.09.061
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...

Nos Estados Unidos, embora a revacinação contra pólio não seja indicada na rotina, desde o ano 2000, o Centers for Disease Control and Prevention recomenda que adultos não vacinados ou sem comprovação de vacinação contra poliomielite recebam três doses da VIP (zero, dois e seis meses) e que adultos que pretendem viajar para países endêmicos ou recentemente reinfectados por WPV, profissionais de saúde em contato com imunocomprometidos ou trabalhando em laboratórios com amostras biológicas potencialmente contaminadas por WPV e adultos em contato com crianças vacinadas com a VOP recebam uma dose de reforço da VIP, mesmo que tenham sido vacinados na infância.1717. Centers for Disease Control and Prevention. Outbreaks following wild poliovirus importations --- Europe, Africa, and Asia, January 2009--September 2010. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2010;59:1393-9.

Outro fator que dificulta a análise da duração da imunogenicidade conferida pela vacina diz respeito à imunização de grupo observada com a vacina VOP (atualmente, no Brasil, somente para os reforços). A partir do momento que muitos países passam a adotar a VIP, pela importância da poliomielite desencadeada pelo vírus atenuado ou pela mutação deste,11. World Health Organization [homepage on the Internet]. Polio this week as of 08 January 2020. Geneva: WHO; 2020 [cited 2020 Jan 08]. Available from: Available from: http://polioeradication.org/polio-today/polio-now/this-week/
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perde-se o efeito booster da VOP.

Em nosso estudo, 62,8% dos profissionais de saúde apresentaram títulos superiores ou iguais a 1:8. O menor percentual de soroimunes foi observado para o sorotipo 3. Não observamos diferença significativa para as duas faixas etárias e por sexo. A comparação desses resultados com outros trabalhos (Quadro 1), que mediram a presença de anticorpos para poliomielite em adultos, demonstra situação similar à maioria dos países em relação à prevalência de soronegativos, mas em situação pior ao estudo brasileiro realizado em 1967.55. Niederman JC, Henderson JR, Opton EM, Black FL, Skvrnova K. A nationwide serum survey of Brazilian military recruits, 1964. II. Antibody patterns with arboviruses, polioviruses, measles and mumps. Am J Epidemiol. 1967;86:319-29. https://doi.org/10.1093/oxfordjournals.aje.a120742
https://doi.org/https://doi.org/10.1093/...
A maior prevalência de soronegativos foi observada, na maioria dos estudos, para o sorotipo 3, de maneira semelhante ao observado em nossos dados. Poucos estudos foram realizados em profissionais de saúde, dificultando melhor comparação.

Quadro 1
Percentual de adultos soronegativos para poliovírus 1, 2 e 3, em diferentes estudos, de acordo com país, ano de publicação e número de adultos avaliados.

O aumento dos títulos de anticorpos neutralizantes para todos os poliovírus no prazo de uma semana após a vacinação dos indivíduos que apresentavam baixos títulos para um ou mais poliovírus (37% dos sujeitos avaliados) demonstrou resposta imune rápida dessa população, sugerindo presença de imunidade prévia. Acredita-se que esses indivíduos que apresentaram títulos indetectáveis (menores que 1:8) podem ter memória imunológica em decorrência da exposição passada ao vírus selvagem e/ou vacinal e que uma provocação pôde gerar uma resposta rápida e robusta. Essa resposta secundária rápida pode ser suficiente para impedir uma replicação viral ou uma doença paralítica. Indivíduos com memória imunológica, mesmo na ausência de anticorpos detectáveis circulantes, podem responder suficientemente rápido para bloquear a invasão do Sistema Nervoso Central quando da exposição ao vírus da poliomielite selvagem ou derivado da vacina,1919. Le Menach A, Llosa AE, Mouniaman-Nara I, Kouassi F, Ngala J, Boxall N, et al. Poliomyelitis outbreak, Pointe-Noire, Republic of the Congo, September 2010-February 2011. Emerg Infect Dis. 2011;17:1506-9. https://doi.org/10.3201/eid1708.110195
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mas é preciso considerar que o período de incubação dos poliovírus é bastante curto (variando entre um e seis dias),2020. Maltezou HC, Botelho-Nevers E, Brantsæter AB, Carlsson RM, Heininger U5, Hübschen JM, et al. Vaccination of healthcare personnel in Europe: Update to current policies. Vaccine. 2019;37:7576-84. https://doi.org/10.1016/j.vaccine.2019.09.061
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,2121. American Academy of Pediatrics. Poliovirus infectious. In: Pickering LK, Baker CJ, Kimberlin DW, Long SS, editors. Red Book: 2009 Report of the committee on infectious diseases. 28th ed. Elk Grove Village, IL: American Academy of Pediatrics; 2009. p.541-4. portanto, o tempo para responder com altos títulos de anticorpos naqueles que tiveram exposição prévia aos poliovírus por infecção natural ou vacinação pode ser insuficiente para protegê-los contra a doença.2222. Roebuck M, Chamberlain R. Prevalence of antibodies to poliovirus in 1978 among subjects aged 0-88 years. Br Med J (Clin Res Ed). 1982;284: 697-700. https://doi.org/10.1136/bmj.284.6317.697
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Salienta-se que o grupo escolhido era composto de profissionais da saúde com contato próximo com pacientes pediátricos, em período anterior à introdução da VIP, atualmente utilizada na imunização no 1º ano de vida, com consequente possibilidade de imunização de rebanho, podendo determinar viés na real prevalência de imunogenicidade pela vacina para poliomielite VOP ao longo do tempo. Pesquisas para avaliar a resposta imune em pessoas soronegativas para poliovírus são escassas e, como observado no presente estudo, elas podem apresentar títulos indetectáveis, mas ainda assim serem imunes. A diminuição da utilização da VOP, por outro lado, poderá reduzir a imunização de rebanho nos próximos anos, possibilitando, em longo prazo, uma população mais suscetível aos poliovírus.

A resposta com produção de anticorpos neutralizantes observada neste estudo pode sugerir proteção para a poliomielite ao longo do tempo, mas com a preocupação se essa proteção será suficiente para impedir principalmente a doença neurológica pelos poliovírus. Cabe a análise de como será a resposta à infecção pelos cVDPV, que têm sido o maior alvo de discussão da doença poliomielite e motivo para as atuais mudanças no calendário vacinal, com a retirada progressiva da VOP.

Como limitações, vale ressaltar que uma proporção importante de profissionais sorteados recusou-se a participar do estudo ou não cumpriu os procedimentos necessários para ser incluída. A situação vacinal dos profissionais não foi passível de análise com dados documentados, pois a maioria deles não tinha a caderneta de vacinação utilizada em sua infância. As informações orais baseavam-se na recordação dos pais ou dos participantes acerca das vacinas recebidas na infância.

O desafio feito com a vacina inativada aos profissionais suscetíveis teve pouca aderência. A maioria, apesar de informada dos resultados, recusou-se a receber a vacina inativada oferecida ou então não compareceu no 7º dia após a vacinação para nova coleta de sangue.

De qualquer maneira, as medidas para erradicação da poliomielite em nível mundial devem prosseguir, permitindo, após a erradicação, além dos benefícios decorrentes da eliminação da doença, redução dos custos na ordem de 40 a 50 bilhões de dólares.

REFERENCES

  • 1
    World Health Organization [homepage on the Internet]. Polio this week as of 08 January 2020. Geneva: WHO; 2020 [cited 2020 Jan 08]. Available from: Available from: http://polioeradication.org/polio-today/polio-now/this-week/
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  • Financiamento

    O estudo foi financiado pela Sanofi Pasteur Ltda. para compra de material de coleta e realização do exame por um laboratório privado. O financiador não tem nenhuma participação no desenvolvimento da metodologia nem na análise dos dados ou na preparação do manuscrito.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    07 Nov 2019
  • Aceito
    05 Abr 2020
  • Publicado
    03 Fev 2021
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