REVISÃO SISTEMÁTICA DOS INDICADORES DE ATIVIDADE FÍSICA E DE COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO EM PRÉ-ESCOLARES SUL-AMERICANOS

RESUMO

Objetivo:

Sumarizar indicadores e descrever detalhadamente os métodos utilizados na avaliação da atividade física e do comportamento sedentário em pré-escolares sul-americanos.

Fontes de dados:

Em 2017, buscas foram realizadas, nos idiomas espanhol, inglês e português, em quatro bases de dados eletrônicas (LILACS, PubMed, SciELO e Web of Science), no Google Acadêmico e em listas de referências. Foram procurados artigos sobre pesquisas realizadas em países da América do Sul, que apresentaram indicadores de atividade física e/ou de comportamento sedentário em crianças entre dois e seis anos de idade.

Síntese dos dados:

De 416 artigos inicialmente avaliados, 13 compuseram a síntese descritiva. Foram envolvidas amostras da Argentina, Brasil e Chile. Três artigos ofereceram estimativas médias de atividade física moderada, por meio de acelerômetros: 32; 70,1 e 71,3 minutos por dia. Sobre o comportamento sedentário total, foram observadas as médias de 468,3 e 562,9 minutos por dia e, considerando-se o ponto de corte de 2 horas por dia em comportamentos de tela, as seguintes prevalências foram encontradas: 39,4; 40,3 e 100%. Observou-se grande variação no número de instrumentos e estratégias utilizadas para a avaliação dos comportamentos.

Conclusões:

Mesmo que a síntese tenha apontado para elevadas exposições ao comportamento sedentário em pré-escolares, com particular enfoque nas exposições ao tempo de tela, é importante um maior debate e aproximação dos métodos empregados na avaliação da atividade física e do comportamento sedentário, o que tornaria suas evidências mais comparáveis e fortalecidas para a formulação de estratégias e ações preventivas.

Palavras-chave:
Atividade física; Estilo de vida sedentário; Indicadores; Criança; Revisão

ABSTRACT

Objective:

To summarize indicators and describe in detail the methods used to physical activity and sedentary behavior measurement in South American preschool children.

Data source:

In 2017, we searched for articles on researches carried out in South American countries, which presented physical activity and/or sedentary behavior indicators in children aged two to six years. These searches were conducted in Spanish, English, and Portuguese in four electronic databases (LILACS, PubMed, SciELO, and Web of Science), Google Scholar, and in reference lists.

Data summary:

Out of 416 articles initially assessed, 13 composed the descriptive summary. Samples from Argentina, Brazil, and Chile were included. Three articles provided accelerometer-based estimates of moderate physical activity: 32, 70.1, and 71.3 minutes per day. The mean total sedentary behavior was 468.3 and 562.9 minutes per day and, considering the cut-off point of 2 hours per day of screen time, we found the following prevalence rates: 39.4, 40.3, and 100%. The studies adopted a wide number of instruments and strategies to evaluate those behaviors.

Conclusions:

Although the summary has pointed to high exposure to sedentary behavior in preschool children, with particular focus on screen time, it is essential to broaden the discussion and approximate the methods used to assess physical activity and sedentary behavior, making the evidence more comparable and strong, so as to elaborate preventive strategies and actions.

Keywords:
Physical activity; Sedentary lifestyle; Indicators (Statistics); Child; Review

INTRODUÇÃO

A fase pré-escolar é marcada como um período potencial para o crescimento e desenvolvimento de uma pessoa. A introdução de comportamentos saudáveis nessa fase da vida é de grande importância, uma vez que se torna aumentada a chance de sua manutenção ao longo da vida.^1,2

No entanto, evidências recentes apontam tanto para baixos níveis de atividades físicas moderadas e vigorosas,³ quanto para exposições excessivas ao tempo de tela, considerando-se recomendações que sugerem o ponto de corte de menos de duas horas diárias de tempo de tela recreacional (ou não educativo).^4,5 Destaca-se que o tempo de tela recreacional é um dos indicadores mais frequentes de comportamento sedentário em estudos conduzidos com crianças e adolescentes.^6,7

Em paralelo aos reconhecidos benefícios físicos, psicológicos, sociais e cognitivos que estão associados à prática regular de atividade física na infância,^8,9 é importante pontuar que a temática do comportamento sedentário é emergente, muito por conta do reconhecimento das suas associações de risco para com a composição corporal, a saúde psicossocial e o desenvolvimento cognitivo^10,11 em pré escolares, tendo, para essas duas últimas variáveis, inclusive, a apresentação de possíveis relações de dose-resposta.¹⁰

Ao se considerar que a maior parte das pesquisas que fundamentam o conhecimento disponível foi conduzida nos países da América do Norte, Austrália e Europa, e que o nível socioeconômico é um importante determinante do desenvolvimento na idade pré-escolar,¹² torna-se profícuo o levantamento e a discussão dos indicadores de atividade física e comportamento sedentário provenientes de outras localizações do globo. Nesse sentido, a América do Sul desponta como um local de interesse, tanto pelas altas prevalências de adolescentes inativos, assim como expostos ao elevado tempo de tela recreacional em diversas partes do continente,^13,14 quanto por se colocar como um importante polo de desenvolvimento de pesquisas na temática.¹⁵

Dessa maneira, o presente estudo buscou identificar e comparar indicadores de atividade física e comportamentos sedentários em pré-escolares sul-americanos, assim como descrever detalhadamente os métodos empregados na avaliação desses comportamentos.

MÉTODO

Este estudo caracteriza-se como uma revisão sistemática da literatura, que foi delineada, conduzida e comunicada com base nos itens da lista Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA).¹⁶ Esta revisão sistemática não foi registrada.

Como critérios de inclusão, foram procurados artigos originais, com desenho observacional, conduzidos em países da América do Sul, sem necessidade de representatividade amostral, que apresentassem indicadores de atividade física e/ou de comportamento sedentário em crianças pré-escolares, classificadas, para os fins deste estudo, com idade compreendida entre dois e seis anos de idade. Por outro lado, não foram incluídos artigos que envolveram amostras de crianças com deficiências e/ou condições clínicas em comum (e.g. diabetes), à exceção de amostras compostas por crianças com sobrepeso e/ou obesidade.

Em 2017, buscas sistemáticas nos idiomas espanhol, inglês e português foram conduzidas em quatro bases de dados eletrônicas - Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), PubMed, Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Web of Science -, com base nas estratégias desenhadas no PubMed (procurando-se pelos termos no corpo do texto), tanto para a atividade física: Argentina or Bolivia or Brazil or Chile or Colombia or Ecuador or Guyana or Paraguay or Suriname or Uruguay or Venezuela and “physical activity” and toddler or infant or preschool; como para o comportamento sedentário: Argentina or Bolivia or Brazil or Chile or Colombia or Ecuador or Guyana or Paraguay or Suriname or Uruguay or Venezuela and “sedentary behavior” or “sitting time” or “screen time” or television time or computer time or “video game time” and toddler or infant or preschool. A descrição completa das buscas pode ser obtida com o autor correspondente. Como estratégias complementares, buscas foram realizadas no Google Acadêmico, assim como nas listas de referências dos artigos encaminhados para a extração dos dados.

Os procedimentos de avaliação dos títulos e resumos, textos integrais e extração dos dados foram conduzidos, de forma independente, por quatro pesquisadores previamente treinados, com auxílio de um pesquisador sênior, para dirimir eventuais dúvidas e estabelecer consensos ao longo do processo. Todas as referências recuperadas nas bases de dados foram avaliadas (pelos seus títulos, resumos e textos integrais) de forma simultânea. Para evitar perdas potenciais, a avaliação por títulos e resumos foi baseada em quatro critérios de inclusão (objetivo da pesquisa, local do estudo, faixa etária e características da amostra) e conduzida de forma sensível, mantendo no processo de avaliação, além dos artigos potencialmente relevantes, todos os artigos que apresentassem dúvidas quanto à sua elegibilidade, para posterior checagem nos seus textos integrais.

A extração dos dados originais foi realizada em uma planilha eletrônica, organizada em três domínios:

• Informações descritivas (local da pesquisa, ano da coleta, procedimentos utilizados na amostragem, tamanho amostral, percentual de meninas na amostra, faixa etária, média de idade e objetivo do estudo).

• Informações metodológicas (instrumentos utilizados para avaliação da atividade física e do comportamento sedentário, domínios e tipos avaliados, critérios e pontos de corte utilizados para classificação do nível de atividade física e do comportamento sedentário).

• Medidas e indicadores de atividade física e/ou comportamento sedentário (prevalências, tempo por dia) e resultados adicionais (dados de análises de subgrupo e associações entre variáveis). Ao término da extração de dados, a síntese descritiva foi elaborada, separando-se os resultados pelas temáticas da atividade física e do comportamento sedentário.

O risco de viés dos artigos originais foi avaliado por meio de uma versão adaptada do instrumento Quality Assessment Tool for Quantitative Studies of Effective Public Health Practice Project (EPHPP),¹⁷ que abrange os domínios:

• Viés de seleção (informações sobre a amostra, se heterogênea ou específica por condição clínica).

• Desenho de estudo (representatividade amostral e métodos utilizados na amostragem).

• Instrumentos de avaliação da atividade física e/ou comportamento sedentário (validação prévia do instrumento e informações que possibilitem a replicação da medida).

• Perdas e desistências (informações sobre as perdas e desistências, assim como o percentual de crianças que tiveram seus dados analisados).

• Protocolo de análises (adequação dos métodos estatísticos utilizados na pesquisa).

RESULTADOS

Ao todo, 582 artigos foram recuperados nas buscas nas bases de dados (Figura 1). Após identificação e remoção das duplicatas (n=166), 416 artigos potenciais foram encaminhados para a avaliação por seus títulos e resumos. Ao término dessa fase, foram excluídos 345 artigos, tendo como principais motivos: discrepâncias em relação aos objetivos (n=230) e faixa etária (n=82). Dessa forma, dos 71 artigos que remanesceram para avaliação pelos seus textos integrais, 60 foram excluídos, tendo como principais motivos: discrepâncias em relação à faixa etária (n=28) e aos objetivos, (n=19). Assim, 11 artigos foram encaminhados para a extração de dados. Considerando-se a inclusão de dois artigos recuperados pelas buscas manuais, a síntese descritiva contou com 13 artigos originais.^{18,19,20,21,22,23,24,25,26,27,28,29,30}

Figura 1
Fluxograma da revisão sistemática.

Por desenho de estudo, todos os artigos incluídos apresentaram delineamento transversal. Ao todo, a síntese envolveu dados de 11 diferentes amostras, sendo cinco provenientes do Chile, cinco do Brasil e um da Argentina. Os estudos de Lima et al.²⁴ e Melo et al.²⁶ contam com a mesma amostra de Recife (Brasil), avaliada em 2010, assim como os de Vásquez e Salazar²⁸ e Vásquez et al.,²⁹ que analisam a mesma amostra de Santiago (Chile). No total, em cinco amostras foram observadas técnicas randomizadas para sua composição; e no estudo de Roda et al.²⁷ foram envolvidas as crianças de todos os centros de desenvolvimento infantil da cidade de Merlo (Argentina). O tamanho amostral variou entre 24^28,29 e 1.020²⁶ crianças (Tabela 1).

Tabela 1
Características descritivas dos artigos incluídos (n=13).

Referências	Local (ano da coleta)	Técnica de amostragem	Tamanho da mostra (% de meninas)	Faixa etária (anos)
Aguilar-Farías et al.18	Temuco, Chile (nd)	Randomizada	25 (52)	4-5
Barbosa et al.19	Londrina, Brasil (2015)	Randomizada	370 (50)	4-6
Barro et al.30	Olinda, Brasil (2004)	Randomizada	265 (54)	4-6
Bielemann et al.20	Pelotas, Brasil (2015)	Randomizada	59 (nd)	4-5
Cano Cappelacci et al.21	Região Metropolitana do Chile (nd)	nd	29 (57)	5
Cremm et al.22	Santos, Brasil (nd)	Randomizada	302 (48)	<6
Godard et al.23	Santiago, Chile (2006)	Conveniência	109 (nd)	4-10
Lima et. al.24a	Recife, Brasil (2010)	Randomizada	176 (nd)	3-5
Melo et al.26a			1.020 (49)
Lopez e Llanos; Diaz25	Talca, Chile (nd)	Conveniência	45 (44)	3-6
Roda et al.27	Merlo, Argentina (2014)	Todos os centros de desenvolvimento infantil da cidade	183 pais (nd)	1-5
Vásquez e Salazar28b	Santiago, Chile (nd)	Conveniência	24 (50)c	3-5
Vásquez et al.29b

• ^aPertencem ao estudo ELOS-Pré; ^bpertencem a um mesmo estudo; nd: não descrito.

Oito dos 13 artigos incluídos utilizaram acelerômetros para medida dos níveis de atividade física e/ou comportamento sedentário (66,7%). Entretanto, notou-se grande variabilidade dos modelos (n=6), assim como nos protocolos adotados para sua utilização. Como exemplo, podem ser citadas: a grande variação no número de dias adotados para as medidas (entre dois e sete dias), a realização de medidas em dias do final de semana (que ocorreram em três de cinco artigos com relato disponível) e a variação de pontos de corte para determinar atividade física suficiente e comportamento sedentário (Tabela 2).

Tabela 2
Descrição dos instrumentos utilizados para as medidas de atividade física e comportamento sedentário (n=13).

Instrumento de avaliação e descrição do uso
Acelerômetros
Aguilar-Farías et al.:18 ActivPAL micro: quatro dias completos (semana e final de semana). Para avaliação da AF, foram considerados períodos de pelo menos 5 ou 10 minutos de duração. As estimativas de AF e CS para um dia médio foram recuperadas de estudos anteriores: média de passos por dia=(5 passos por dia da semana+2 etapas por dia de fim de semana)/7.
Barbosa et al.:19 Actigraph GT3X: cinco dias escolares consecutivos. O 75º percentil para AF e CS foram adotados como pontos de corte. A média de minutos por dia de uso de acelerômetros considerados válidos foi de pelo menos 360 minutos para crianças de 4 a 5 anos e 120 minutos para crianças de 6 anos de idade. Para classificar a atividade física e o comportamento sedentário, foram adotados dois pontos de cortea,b.
Bielemann et al.:20 Actigraph GT1M: dias completos. Os participantes foram instruídos a escrever em um diário se eles não usassem o dispositivo por mais de uma hora. O epoch foi ajustado para cinco segundos e os acelerômetros foram entregues nos domicílios aos sábados e coletados às quartas-feiras.
Cano Cappelacci et al.:21 Actigraph GT3X: as medidas ocorreram em dois dias da semana (tempo: seis horas contínuas).
Godard et al.:23 Actiwatch AW64: AFMV suficiente: número de minutos por dia com cpm>900, de acordo com a classificação de Puyau et al.c Para a AF noturna, todos os registros mostrando atividade (cpm>25) foram selecionados por mais de 60 minutos.
Lima et al.:24d Actigraph GT1M: sete dias completos (semana e final de semana). O monitoramento do acelerômetro foi realizado usando epochs de 15 segundos. Para definir a intensidade das atividades realizadas, os pontos de corte foram adotados de acordo com referência préviae. A não monitorização foi considerada a partir do trigésimo minuto consecutivo sem que fosse observado qualquer registro de contagem.
Vásquez e Salazar28 e Vásquez.29f Tritrac R3D: três dias consecutivos (semana e final de semana).
Questionários
Barros et al.:30 versão adaptada do questionário Estudo da Obesidade Infantil em Florianópolis.
Cremm et al.:22Children and youth physical activity questionnaire: adaptado para a população brasileira, leva em conta o número de horas diárias que uma criança passa em comportamento de tela, o tipo de transporte que a criança usa para ir à escola e os esportes praticados.
López et al.:25 QDE: os pais relataram a quantidade de AF praticada em uma semana.
Melo et al.26d: QDE: pergunta direcionada aos pais: num dia da semana (segunda a sexta-feira), quanto tempo seu filho gasta brincando ou jogando ao ar livre, nos jardins, no quintal ou nas ruas, em torno da casa onde mora?
Roda et al.:27 QDE: pergunta aberta direcionada aos pais sobre o número de horas que as crianças passaram em atividades de tela. Além disso, a AF foi classificada como “não estruturada”/moderadas ou “estruturadas”/vigorosas.

• ^aSirard et al. J Phys Act Health. 2005; 2:345-357; ^bVan Cauwenberghe et al. Int J Pediatr Obes. 2011; 6:582-589; ^cPuyau et al. Obes Res. 2002; 10:150-157; ^dPertencem ao estudo ELOS-Pré; ^ePate et al. Med Sci Sports Exerc 2010; 42(3):508-512; ^fpertencem a um mesmo estudo; AF: atividade física; CS: comportamento sedentário; AFMV: atividade física moderada e vigorosa; cpm: counts por minuto; QDE: questionário desenvolvido para o estudo.

Os demais cinco artigos utilizaram questionários para as medidas de atividade física e/ou comportamento sedentário, sendo três deles desenvolvidos para os seus fins,^25,26,27 além do uso do questionário Children and Youth Physical Activity e da versão adaptada do questionário Estudo da Obesidade Infantil em Florianópolis. Quanto aos questionários, uma característica em comum é que todos foram aplicados aos pais/responsáveis. Por outro lado, observou-se grande variabilidade entre as questões empregadas, assim como na forma de abordagem da atividade física, considerando-se a abrangência de dias da semana/finais de semana, locais e intensidade das atividades realizadas (Tabela 2).

Visto que os artigos de Vásquez et al.^28,29 representam a mesma amostra e as mesmas técnicas de avaliação da atividade física, 12 artigos foram encaminhados para a avaliação por risco de viés (Figura 2). Quanto ao domínio viés de seleção, apenas a avaliação dos artigos de Vásquez resultaram em alto risco de viés, visto sua amostra específica de crianças obesas.^28,29 Por desenho de estudo, as fragilidades mais frequentes foram: a ausência de relato sobre a representatividade das amostras,^{18,21,23,24,25,27,28,29} assim como os processos de amostragem por conveniência.^23,25 Dois artigos não relataram a validação prévia do instrumento utilizado para avaliação da atividade física²⁷ e do comportamento sedentário.^25,27 Quatro artigos apresentaram um elevado percentual de perdas, considerando-se as diferenças entre as crianças que apresentaram o termo de consentimento assinado e as que, de fato, foram encaminhadas para as análises de atividade física e/ou comportamento sedentário.^{20,21,22,28,29} Em um artigo não foram apresentados os números e/ou informações sobre perdas e desistências ao longo da pesquisa.²²

Figura 2
Análise por risco de viés dos artigos incluídos.

Por volume diário de atividade física moderada, três artigos apresentaram as estimativas de: 32; 70,1 e 71,3 minutos por dia.^20,24,29 Em relação ao volume de atividade física vigorosa, dois artigos contribuíram com as estimativas de: 15 e 21,7 minutos por dia.^20,24 Considerando-se o tempo diário destinado às atividades físicas moderadas e vigorosas, foram observadas as médias de 92 e 97,1 minutos por dia^18,23 (Tabela 3).

Tabela 3
Indicadores de atividade física em pré-escolares sul-americanos.

Tempo médio em AF
Aguilar-Farías et al.18
Caminhada	147,2 minutos/dia (DP=52)
AF (períodos de pelo menos 10 minutos)	97,1 minutos/dia (DP=53)
Barbosa et al.19
AF leve a vigorosa na jornada escolar	275,2 minutos/dia (DP=78)
Bielemann et al.20
AF leve	261,9 minutos/dia (DP=37)
AF moderada	71,3 minutos/dia (DP=19)
AF vigorosa	15 minutos/dia (DP=8)
Cano Cappelacci et al.21
Crianças eutróficas	141,6 minutos/dia
Crianças com sobrepeso	126,2 minutos/dia
Crianças obesas	130,9 minutos/dia
Godard et al.23
AF moderada e vigorosa	92 minutos/dia (DP=41)
Lima et al.24a
AF moderada	70,1 (IC95% 66,2-74,0)b
AF vigorosa	24,7 (IC95% 22,3-23,1)b
Vásquez e Salazar28 e Vásquez29c
AF moderada (dias da semana)	32 minutos/dia
AF moderada e vigorosa (dias do final de semana)	22 minutos/dia
Prevalência de AF por ponto de corte
Barros et al.30q
>60 minutos/dia AF ao ar livre	34,7%
Cano Cappelacci et al.21
>60 minutos/dia AF moderada e vigorosa	100%
Cremm et al.22q	18,9%
Godard et al.23
≥60 minutos/dia AF moderada e vigorosa	81,8%
Lima et al.24a
≥60 minutos/dia AF moderada e vigorosa	12,7 (IC95% 7,6-19,7)c
Melo et al.26q
>60 minutos/dia AF moderada e vigorosa	36,4 (IC95% 33,6-39,2)d
Roda et al.27q
AF moderada	8%
AF vigorosa	58%

• ^aPertencem ao estudo ELOS-Pré; ^bcritério 3 + dias com 10 + h/dia (recomendado pelos autores); ^cpertencem a um mesmo estudo; ^dmedidas realizadas apenas nos dias da semana; AF: atividade física; DP: desvio padrão; IC95%: intervalo de confiança de 95%; q: medida proveniente de questionário.

Considerando-se as medidas obtidas por acelerômetros, a síntese identificou as prevalências de: 12,7; 81,8 e 100% de pré-escolares que atingem pelo menos 60 minutos diários de atividades físicas moderadas e vigorosas^21,23,24 (Tabela 3). Por questionários, foram encontradas prevalências de 34,7 e 58% de crianças que que atingem pelo menos 60 minutos diários de atividades físicas ao ar livre³⁰ e moderadas,²⁷ respectivamente.

Ao todo, sete artigos apresentaram medidas de comportamento sedentário, com medidas baseadas nos comportamentos de tela (n=3), no tempo sentado durante o período escolar (n=2) e no tempo total em comportamento sedentário (n=2) (Tabela 4). Por tempo diário em comportamento sedentário, a Tabela 4 aponta para duas medias provenientes de acelerômetros: 468,3 minutos por dia (7,8 horas)¹⁸ e 562,9 minutos por dia (9,4 horas).²⁰ Com base em questionários respondidos pelos pais, 3 artigos apresentaram prevalências de crianças expostas a pelo menos duas horas por dia ao tempo de tela: 39,4; 40,3 e 100%.^22,25,27 Em dois desses artigos também foram analisadas as prevalências de crianças que ficam expostas a, pelo menos, cinco horas por dia em tempo de tela, com resultados de 7,2 e 15,5%^25,27 (Tabela 4).

Tabela 4
Indicadores de comportamento sedentário em pré-escolares sul-americanos.

Tempo em comportamento sedentário
Aguilar-Farías et al.18
Comportamento sedentário total	468,3 minutos/dia (DP=92)
Barbosa et al.19
Comportamento sedentário na escola	2.234,5 minutos/semana (DP=353)
Bielemann et al.20	562,9 minutos/dia (DP=102)
Prevalência de comportamento sedentário por ponto de corte
Barbosa et al.19
Dia escolar	89,6-90,9%
Cremm et al.22q
Televisão >2 horas/dia	39,4%
Computador e games >1 hora/dia	27,5%
Lopez et al.25q
Televisão ≥2 horas/dia	100%
Televisão ≥5 horas/dia	15,5%
Roda et al.27q
Tempo de tela >2 horas/dia	40,3%
Tempo de tela ≥5 horas/dia	7,2%

• DP: desvio padrão; q: medida proveniente de questionário.

DISCUSSÃO

Com o objetivo de identificar e sumarizar os indicadores de atividade física e de comportamento sedentário em pré-escolares sul-americanos, tal como os métodos utilizados para sua medida, as evidências da presente revisão destacam:

• Que a maior parte dos artigos incluídos apresentou níveis de atividade física moderada superiores a 60 minutos por dia.

• As elevadas exposições ao tempo de tela, ­considerando-se o ponto de corte de duas horas por dia.

• A grande variabilidade nos instrumentos e estratégias utilizadas para a realização das medidas de atividade física e/ou comportamento sedentário.

São de grande importância as pesquisas que investigam os modos de vida das crianças em idade pré-escolar, visto que suas evidências podem, além de oferecer o estado da arte na temática, amparar o planejamento e a condução de estratégias com fins na prevenção e/ou promoção da saúde, sobretudo nas comunidades locais e nas redes de proteção social,³¹ o que poderia controlar os riscos de interferência no desenvolvimento, que, por sua vez, estão também associados ao baixo nível socioeconômico.¹²

Indicadores de atividade física

Na contrapartida do presente achado, três revisões prévias, cujas conclusões estão fundamentadas, praticamente, pelos dados de estudos conduzidos em países de alta renda, sugerem baixos níveis de atividades físicas moderadas e vigorosas nos pré-escolares.^32,33,34 Entretanto, qualquer comparação direta entre os achados da presente revisão e desses referenciais citados deve ser ponderada, reconhecendo-se, para além do conjunto reduzido de pesquisas sul-americanas, as questões pertinentes à representatividade das amostras envolvidas.

Ao se reconhecer tanto a tendência de manutenção moderada da atividade física entre a primeira infância e a pré-adolescência^1,32 quanto à redução gradual da prática de atividade física com o passar dos anos,³⁵ reforça-se a recomendação de que as estratégias e os incentivos para a prática de atividade física sejam fomentados desde os anos iniciais da vida. Nesse sentido, sugere-se que futuros estudos de tracking sejam desenvolvidos na América do Sul, para que essas evidências possam oferecer uma melhor compreensão desse comportamento e aprofundar seu debate na especificidade do continente.

Diante das evidências de duas revisões prévias,^35,36 que sugerem o sexo e o apoio dos pais/responsáveis enquanto determinantes da atividade física, recomenda-se que futuros estudos na temática possam aprofundar suas investigações, desenvolvendo, por exemplo, análises estratificadas, que permitam comparar e discutir seus achados para com aqueles que estão fundamentados nas pesquisas conduzidas nos países previamente acenados. Complementarmente, acreditamos que este é um ponto de importância, pois esse aprofundamento pode amparar a tomada de decisão e a formulação de políticas públicas de promoção da atividade física para essa população, adequadas às particularidades de um determinado grupo, ou mesmo um território, como exemplos.

Indicadores de comportamento sedentário

Na síntese, as menores prevalências de pré-escolares expostos a pelo menos 2 horas por dia em tempo de tela foram de 39²² e 40%.²⁷ Visto o aumento das exposições ao comportamento sedentário na transição entre a infância e a adolescência,³⁷ assim como dos distintos indicadores negativos à saúde que estão associados à sua elevada exposição,¹¹ as intervenções prévias são importantes e apresentam efeitos significativos para seu controle, sobretudo quando são compostas por estratégias de monitoramento do tempo de tela, aconselhamento e envolvimento dos pais/responsáveis.³⁸

Dadas as particularidades socioeconômicas do continente sul-americano, é também importante reconhecer, ao passo da formulação de estratégias preventivas, que diversos aspectos socioeconômicos estão associados ao prolongamento do comportamento sedentário na infância.³⁹ Dessa forma, são requeridas futuras pesquisas na temática, em diferentes cenários, no sentido de que sua evidência possa fortalecer planos de ação e estratégias em maior escala.

Um dos artigos incluídos apresenta dados coletados no ambiente escolar.¹⁹ Além das elevadas prevalências de comportamento sedentário ao longo da jornada escolar, o trabalho também aponta que crianças matriculadas em escolas com sala de recreação e parques apresentam menores níveis de comportamento sedentário, quando comparadas às crianças matriculadas em escolas que não possuem essas facilidades. Pode-se sugerir, dessa forma, o desenvolvimento de novos estudos no ambiente escolar, introduzindo conhecimentos, aproximação dos ­pais/­responsáveis e com possibilidade de alteração do ambiente, para se evitar o tempo excessivo em comportamento sedentário. O ambiente escolar é potencial para intervenções na temática, visto que, em crianças com idade escolar e adolescentes, estratégias educativas⁴⁰ e ambientais, como a introdução de carteiras com altura ajustável,⁴¹ sugerem resultados promissores.

Questões metodológicas

Quanto aos instrumentos para medida, considerando-se a dificuldade dos pré-escolares em responder questionários,⁴² ratificada pela informação de que todos os questionários envolvidos na síntese foram aplicados aos pais, cabe destacar a boa parcela de artigos que utilizaram acelerômetros para medida da atividade física e/ou do comportamento sedentário nas populações de interesse, o que possibilita uma estimativa mais precisa desses comportamentos.

Entretanto, a alta variação entre os acelerômetros utilizados, assim como os critérios e as estratégias adotadas para a realização das medidas, limita comparações mais diretas entre as evidências. Isso corrobora a necessidade de se aprofundar o conhecimento sobre os instrumentos (aspectos de validação e calibração), assim como dos critérios mais adequados para avaliação objetiva da atividade física e do comportamento sedentário,⁴³ de modo que as medidas possam ser mais comparáveis, assim como se aponta em outras pesquisas.^3,34

Nesse sentido, destaca-se a evidência produzida pelo artigo de Lima et al., que apontam que o critério de monitoramento de três dias da semana com medidas ao longo de dez horas por dia é o mais apropriado, em vista de não subestimar os dados, assim como evitar a perda amostral.²⁴ Em complemento à utilização de medidas objetivas, não deve ser descartado o uso do questionário, para melhor identificação das atividades (por exemplo, quais atividades físicas ou de comportamento sedentário), assim como os respectivos locais onde elas aconteceram.

Apontamentos para futuros estudos

Além dos apontamentos feitos nos tópicos anteriores, recomenda-se que as futuras pesquisas possam envolver amostras maiores, no sentido de buscar uma melhor representatividade da evidência, reconhecendo-se que a falta do relato sobre representatividade amostral foi um dos pontos de maior fragilidade na avaliação por risco de viés. É fundamental, também, o desenvolvimento de pesquisas, dentro da temática, em outros países, que não apenas Argentina, Brasil e Chile, de modo que se permita uma futura síntese com dados de populações e locais mais distintos. Considerando-se os dados da presente síntese, cabe também sugerir o desenvolvimento de estratégias e tecnologias para o monitoramento e a vigilância dos níveis de atividade física e comportamento sedentário nessa faixa etária no continente.⁴⁴

Limitações

Como principal limitação desta revisão, não foi realizado um levantamento prévio de todos os periódicos científicos ­sul-americanos não indexados nas bases de dados pesquisadas, o que pode ter acarretado na não avaliação de artigos potenciais. Entretanto, para evitar maiores efeitos dessa limitação, buscas complementares no site Google Acadêmico foram realizadas nos idiomas espanhol, inglês e português. É importante pontuar também que apenas pesquisas de três países ofereceram dados para a síntese, assim como a presença de um elevado número de pesquisas que não relataram informações sobre sua representatividade amostral.

Por fim, mesmo que a síntese tenha apontado para elevadas exposições ao comportamento sedentário em pré-escolares, com particular enfoque nas exposições ao tempo de tela, é importante um maior debate e aproximação dos métodos empregados na avaliação da atividade física e comportamento sedentário, o que tornaria suas evidências mais comparáveis e fortalecidas para a formulação de estratégias e ações preventivas

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Financiamento

• O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  25 Nov 2019
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  17 Abr 2018
• Aceito
  11 Jul 2018
• Publicado
  08 Nov 2019