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Avaliação da Lista de Sintomas Pediátricos como instrumento de triagem para identificar problemas emocionais e psicossociais

Resumos

OBJETIVO

Investigar a Lista de Sintomas Pediátricos (LSP) como instrumento de triagem para identificar problemas emocionais e psicossociais em escolares de seis a 12 anos.

MÉTODOS

Estudo do tipo teste diagnóstico, realizado em uma escola pública de Curitiba, Paraná, para avaliar a acurácia e a consistência da LSP, considerando-se o Child Behavior Checklist (CBCL) como padrão-ouro. Dos 415 pais convidados a participar do estudo, 145 responderam à LSP e ao CBCL, constituindo a amostra. Os resultados dos dois instrumentos foram comparados. Considerou-se como positivo o escore da LSP ≥28 e o do CBCL >70 pontos.

RESULTADOS

Dos 145 questionários, 49 (33,8%) tanto da LSP como do CBCL mostraram-se positivos. A curva ROC indicou 21 como o melhor ponto de corte para triagem de problemas emocionais e psicossociais, com sensibilidade de 96,8% e especificidade de 86,7%. No ponto de corte de referência (≥28), observou-se sensibilidade de 64,5% e especificidade de 100,0%, similares às encontradas na versão americana do instrumento.

CONCLUSÕES

A LSP mostrou-se eficaz para a identifição precoce de problemas emocionais e/ou psicossociais em um grupo de escolares, podendo ser uma ferramenta útil ao pediatra.

criança; triagem; transtornos mentais


OBJECTIVE

To investigate the Brazilian version of Pediatric Symptom Checklist (PSC) as a screening tool to identify psychosocial and emotional problems in schoolchildren from six to 12 years old.

METHODS

Diagnostic test conducted in a public school of Curitiba, Paraná (Southern Brazil), to evaluate the PSC accuracy and consistency, considering the Child Behavior Checklist (CBCL) as the gold standard. Among 415 parents invited for the study, 145 responded to both PSC and CBCL. The results of the two instruments were compared. PSC and CBCL were considered positive if scores ≥28 and >70 respectively.

RESULTS

Among the 145 cases, 49 (33.8%) were positive for both PSC and CBCL. The ROC curve showed the PSC score of 21 as the best cutoff point for screening psychosocial and emotional problems, with a sensitivity of 96.8% and a specificity of 86.7%. Regarding the reference cutoff (score ≥28 points), the sensitivity was 64.5% and the specificity, 100.0%, similar to those found in the original version of the tool.

CONCLUSIONS

The Portuguese version of PSC was effective for early identification of emotional and/or psychosocial problems in a schoolchildren group and may be useful for pediatricians.

child; triage; mental disorders


OBJETIVO

Investigar la Lista de Síntomas Pediátricos (LSP) como instrumento de rastreo para identificar problemas emocionales y psicosociales en escolares de 6 a 12 años.

MÉTODOS

Estudio de tipo prueba diagnóstica, realizado en una escuela pública de Curitiba, Paraná (Brasil), para evaluar la precisión y la consistencia de la LSP, considerando el Child Behavior Checklist (CBCL) como patrón oro. De los 415 padres invitados a participar del estudio, 145 contestaron a la LSP y al CBCL, constituyendo la muestra, y los resultados de los dos instrumentos fueron comparados. Se consideró como positivo el escore de LSP ≥28 y del CBCL >70 puntos.

RESULTADOS

De los 145 cuestionarios, 49 (33,8%) tanto de la LSP como del CBCL se mostraron positivos. La curva ROC indicó 21 como el mejor punto de corte para rastreo de problemas emocionales y psicosociales, con sensibilidad del 96,8% y especificidad del 86,7%. En el punto de corte de referencia (≥28), se observó la sensibilidad del 64,5% y especificidad del 100%, similares a las en contradas en la versión americana del instrumento.

CONCLUSIONES

La LSP se mostró eficaz para la identificación temprana de problemas emocionales y/o psicosociales en un grupo de escolares, pudiendo ser una herramienta útil al pediatra.

niño; rastreo; trastornos mentales


Introdução

A identificação de problemas emocionais e psicossociais deve fazer parte da prática pediátrica. Estudos documentam o aumento da prevalência de transtornos mentais (TM) em crianças e adolescentes. Nos Estados Unidos, estudos epidemiológicos indicam prevalência de 17 a 27% de algum tipo de TM nessa faixa etária( 11. Stoppelbein L, Greening L, Jordan SS, Elkin TD, Moll G, Pullen J. Factor analysis of the Pediatric Symptom Checklist with a chronically ill pediatric population. J Dev Behav Pediatr 2005;26:349-55. , 22. Reijneveld SA, Vogels AG, Hoekstra F, Crone MR. Use of the Pediatric Sympton Checklist for the detection of psychosocial problems in preventive child healthcare. BMC Public Health 2006;6:197. ). Em Taubaté, São Paulo, uma pesquisa encontrou prevalência de 12,5% de jovens com pelo menos um TM, sendo que, nas áreas urbanas carentes, onde havia fatores socioculturais de risco, o índice foi de 13,7%( 33. Goodman R, Neves dos Santos D, Robatto Nunes AP, Pereira de Miranda D, Fleitlich-Bilyk B, Almeida Filho N. The Ilha de Maré study: a survey of child mental health problems in a predominantly African-Brazilian rural community. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol 2005;40:11-7. ).

O reconhecimento, a intervenção e os cuidados preventivos de TM em crianças e/ou adolescentes ajudam a delimitar e a reduzir os efeitos na personalidade, ainda não completamente formada, contribuindo para um desenvolvimento saudável. A falta de reconhecimento precoce, a persistência e o agravamento dos sintomas nos estágios posteriores do desenvolvimento podem causar prejuízos não só à vida diária, como à família e à sociedade.

A relação entre fatores genéticos e ambientais na origem dos TM é dinâmica e cumulativa na capacidade de influenciar o desenvolvimento e alterar suas condições futuras. O resultado negativo de situações vividas na infância, os fatores de risco genético, biológico, psicológico e ambiental, além das complexas interações entre eles, podem trazer como consequência o surgimento de um ou mais TM. Entre os mais prevalentes, encontram-se o transtorno depressivo (TD), o transtorno de ansiedade (TA), o transtorno opositivo-desafiador (TOD) e o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), sendo frequente a presença de mais de um no mesmo indivíduo( 44. Canino G, Shrout PE, Rubio-Stipec M, Bird HR, Bravo M, Ramirez R et al. The DSM-IV rates of child and adolescent disorders in Puerto Rico: prevalence, correlates, service use, and the effects of impairment. Arch Gen Psychiatry 2004;61:85-93. ). Essas inter-relações podem dificultar o diagnóstico e, consequentemente, a intervenção precoce por profissionais da saúde não familiarizados com suas características clínicas. No entanto, o indicativo de um TM na infância e na adolescência não deve ser confundido com características normais da fase de desenvolvimento, que podem apresentar semelhança com sintomas patológicos.

A alta prevalência de TM na infância e na adolescência demanda do profissional da saúde a utilização de técnicas de auxílio para identificar a necessidade de avaliação e tratamento psicológico e/ou psiquiátrico. A maioria desses profissionais, muitos deles pediatras, não se sente adequadamente treinada ou não dispõe de tempo hábil para o diagnóstico e consequente encaminhamento de crianças e/ou adolescentes com indicativo de TM. Uma alternativa é o uso de escalas de avaliação já validadas, como o Child Behavior Checklist (CBCL)( 55. Achenbach TM. Manual for the Child Behavior Checklist/4-18 and 1991 profile. Burlington: University of Vermont; 1991. , 66. Bordin IA, Mari JJ, Caeiro MF. Validação da versão brasileira do Child Behavior Checklist (CBCL) (Inventário de Comportamentos da Infância e Adolescência): dados preliminares. Rev ABP-APAL 1995;17:55-66. ) e o Pediatric Symptom Checklist (PSC)( 77. Altman DG. Practical statistics for medical research. Londres: Chapman & Hall/CRC; 1999. ).

Este estudo avaliou a acurácia da versão brasileira do PSC - a Lista de Sintomas Pediátricos (LSP) - como um instrumento de triagem de problemas emocionais e psicossociais em uma população de escolares de seis a 12 anos, comparando os resultados com os obtidos pela aplicação do CBCL.

Método

Estudo do tipo teste diagnóstico para avaliar a acurácia da LSP no diagnóstico de problemas emocionais e/ou psicossociais, considerando-se como padrão-ouro o CBCL. A LSP é um instrumento de triagem para problemas emocionais e/ou psicossociais para crianças e adolescentes de seis a 16 anos. É um questionário com 35 itens, de rápido preenchimento, que refletem a impressão dos pais sobre o comportamento e desenvolvimento do filho. O ponto de corte para resultado positivo de risco deve ser igual ou superior a 28 pontos( 88. Jellinek MS, Murphy JM, Burns BJ. Brief psychosocial screening in outpatient pediatric practice. J Pediatr 1986;109:371-8. ). O CBCL, por sua vez, é um questionário respondido pelos pais, que avalia problemas emocionais e de comportamento, sendo considerado um instrumento padrão em Psicologia infantil e do adolescente.

Inicialmente, convidaram-se todos os pais e/ou responsáveis por escolares de ambos os gêneros, de seis a 12 anos de idade, matriculados em uma escola pública de Curitiba, Paraná (n=601). Um total de 415 concordou em participar do estudo e respondeu ao primeiro instrumento de avaliação, a LSP, informando-se os resultados aos participantes. Esses 415 pais e/ou responsáveis foram convidados a responder a um segundo instrumento de avaliação, o CBCL. Destes, 145 concordaram, constituindo, assim, a amostra do estudo. Comparam-se os resultados da aplicação dos dois instrumentos nesta amostra, considerando-se como padrão-ouro os estabelecidos pelo CBCL. Buscou-se ainda avaliar a consistência interna da LSP, assim como sua sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de triagem de problemas emocionais e/ou psicossociais.

A LSP é um instrumento de triagem para identificação de crianças ou adolescentes com problemas emocionais e/ou psicossociais. É de fácil aplicação, entendimento e interpretação dos resultados. A pontuação atribuída pelo avaliando, que indica a frequência em que a situação proposta na questão ocorre, é de zero para "nunca", de um para "às vezes" e de dois para "frequentemente". O ponto de corte estabelecido para a pontuação americana é igual ou superior a 28 pontos, situação em que o resultado é considerado positivo, ou seja, a criança ou o adolescente teria indicação de ser referido para avaliar sua saúde mental (Quadro 1).

Quadro 1
Lista de Sintomas Pediátricos

O CBCL foi adaptado e validado para a língua portuguesa por Bordin, Mari e Caeiro, em 1995( 66. Bordin IA, Mari JJ, Caeiro MF. Validação da versão brasileira do Child Behavior Checklist (CBCL) (Inventário de Comportamentos da Infância e Adolescência): dados preliminares. Rev ABP-APAL 1995;17:55-66. ). É um instrumento amplo considerado como padrão-ouro, respondido pelos pais. Reporta as competências e problemas em crianças ou adolescentes entre seis e 18 anos e fornece uma análise do perfil emocional, social e comportamental do avaliado, dividindo-se em duas partes. A primeira refere-se à Competência Social, isto é, envolvimento e desempenho da criança/adolescente em atividades de esporte, brincadeiras, jogos, passatempos, trabalhos e tarefas diárias, cujos escores crescem de acordo com a maior competência social do paciente. A segunda parte refere-se à avaliação da existência de Problemas Emocionais e de Comportamento. É composta de 118 itens e respostas para "não é verdadeiro/ausente" (equivalente a escore 0); "algumas vezes/um pouco verdadeiro" (equivalente a escore 1) e "frequentemente verdadeiro" (equivalente a escore 2). A somatória dos escores é convertida em escores T, de acordo com análises apropriadas para gênero e idade. Neste caso, apresenta-se em escala e síndromes, isto é, problemas que costumam ocorrer juntos. Um escore T igual ou acima de 70 é considerado clínico; entre 64-69 é limítrofe e abaixo de 63 é considerado normal. Para as escalas de Problemas Internalizantes e Externalizantes, um escore T menor e/ou igual a 60 é considerado normal, entre 60â€'63 é limítrofe e acima de 63 é considerado clínico.

Na análise estatística, aplicaram-se: a) teste do qui-quadrado de Pearson com correção de Yates, para avaliar a frequência de respostas obtidas em cada categoria (normal, limítrofe e clínico) nos dois instrumentos de avaliação; b) coeficiente de Cronbach, para avaliar a consistência interna da LSP; c) coeficiente de concordância de Kappa, para estimar o grau de concordância dos resultados dos dois instrumentos de avaliação e d) curva ROC, para avaliar o desempenho da LSP como instrumento de triagem para o diagnóstico de problemas emocionais e/ou psicossociais e o ponto de corte, ou seja, o valor do escore com maior sensibilidade e especificidade( 77. Altman DG. Practical statistics for medical research. Londres: Chapman & Hall/CRC; 1999. ). Calculou-se a amostra a fim de verificar o grau de concordância entre os dois instrumentos de avaliação para o diagnóstico de triagem para problemas emocionais e/ou psicossociais e comparar a frequência obtida na amostra estudada com a prevalência estimada de transtornos mentais na população (13â€'27%)( 11. Stoppelbein L, Greening L, Jordan SS, Elkin TD, Moll G, Pullen J. Factor analysis of the Pediatric Symptom Checklist with a chronically ill pediatric population. J Dev Behav Pediatr 2005;26:349-55.

2. Reijneveld SA, Vogels AG, Hoekstra F, Crone MR. Use of the Pediatric Sympton Checklist for the detection of psychosocial problems in preventive child healthcare. BMC Public Health 2006;6:197.
- 33. Goodman R, Neves dos Santos D, Robatto Nunes AP, Pereira de Miranda D, Fleitlich-Bilyk B, Almeida Filho N. The Ilha de Maré study: a survey of child mental health problems in a predominantly African-Brazilian rural community. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol 2005;40:11-7. ). Fixando-se o nível de significância em 5%, o erro do tipo II em 10% e o poder de teste em 90%, obteve-se um cálculo mínimo de 120 sujeitos( 77. Altman DG. Practical statistics for medical research. Londres: Chapman & Hall/CRC; 1999. ).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Os pais ou responsáveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

Na análise de consistência interna da LSP, obteve-se elevado coeficiente de Cronbach (0,89), o que evidenciou sua qualidade e confiabilidade.

Dos 415 pais e/ou responsáveis que responderam somente à LSP, 58 (14,0%) apresentaram resultado positivo, evidenciando risco para problemas emocionais e/ou psicossociais. Nos 145 casos em que se realizou a avaliação pela LSP e pelo CBCL, a frequência foi de 33,8% (49 casos). A frequência de LSP ≥28 foi maior no gênero masculino (p<0,01) e semelhante entre as faixas etárias (p=0,49).

No CBCL, observou-se que 62 crianças/adolescentes (42,7%) apresentaram escore superior a 70; 23 (15,9%), entre 65â€'69, e 60 (41,4%) mostraram escore menor que 60. Ao se estudar detalhadamente as 62 crianças (42,7%) com escore classificado como clínico pelo CBCL, observou-se que, entre as síndromes mais frequentes, constavam Ansiedade/Depressão, Queixas Somáticas e Comportamento Agressivo (Tabela 1). Destes, 29 apresentaram problemas Externalizantes e Internalizantes; 17, apenas Externalizantes; 13, apenas Internalizantes; e três Outros Problemas.

Tabela 1
Distribuição da frequência de síndromes apresentadas pelo Child Behavior Checklist

Houve boa concordância entre as respostas da LSP e do CBCL para resultados classificados como normal e clínico (Kappa=0,69). Excluíram-se os casos limítrofes desta análise (Tabela 2).

Tabela 2
Concordância entre os valores da Lista de Sintomas Pediátricos e do Child Behavior Checklist, para os resultados "normal" e "clínico"

Considerando-se as frequências obtidas, o resultado da LSP apresentou sensibilidade de 64,5%, especificidade de 100,0%, valor preditivo positivo (VPP) de 100,0%, valor preditivo negativo (VPN) de 75,5%, acurácia de 84,4%, índice de falso positivo (FP) nulo e falso negativo (FN) de 24,0% para o diagnóstico de problemas emocionais e psicossociais estabelecidos pelo CBCL, com o ponto de corte estabelecido pela literatura ≥28 pontos. Houve forte correlação entre o escore total da LSP e do CBCL (r=0,84), sem diferença significativa quanto ao gênero ou faixa etária.

Ao se observar a distribuição por gênero na amostra verificou-se, no masculino, média dos escores de Problemas Externalizantes maior do que no feminino (p<0,01). Essa diferença ocorreu devido à síndrome Quebrar Regras e Comportamento Agressivo, mais comum no gênero masculino.

Na construção da curva ROC, considerando-se como variável dependente o total de problemas clínicos versus normais e, como variável independente, a pontuação da LSP, obteve-se 21 como ponto de corte do escore, com sensibilidade de 96,8% e especificidade de 86,7%. A área abaixo da curva foi de 0,96, indicando elevados índices de sensibilidade e especificidade para identificar problemas emocionais e psicossociais (Gráfico 1).

Gráfico 1
Curva ROC, considerando-se o total de problemas clínicos e normais

Discussão

Em países desenvolvidos, uma em cada dez crianças apresenta pelo menos um TM. Os pediatras devem estar preparados e atentos para detectar problemas emocionais e/ou psicossociais, já que intervenções e tratamentos precoces podem melhorar a evolução e o prognóstico, além de reduzir o prejuízo causado à criança, à família e à sociedade( 88. Jellinek MS, Murphy JM, Burns BJ. Brief psychosocial screening in outpatient pediatric practice. J Pediatr 1986;109:371-8. , 99. Hacker KA, Myagmarjav E, Harris V, Suglia SF, Weidner D, Link D. Mental health screening in pediatric practice: factors related to positive screens and the contribution of parental/personal concern. Pediatrics 2006;118:1896-906. ). Um estudo demonstrou que mais de 50% de crianças com TM na idade escolar já demonstravam características dos problemas no período pré-escolar( 1010. Lavigne JV, Arend R, Rosenbaum D, Binns HJ, Christoffel KK, Burns A et al. Mental health service use among young children receiving pediatric primary care. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998;37:1175-83. ). Similarmente, em uma pesquisa retrospectiva sobre comportamento antissocial na adolescência( 1111. Moffitt TE, Caspi A. Childhood predictors differentiate life-course persistent and adolescence-limited antisocial pathways among males and females. Dev Psychopathol 2001;13:355-75. ), notou-se que aqueles com problemas já apresentavam sinais patológicos aos dois a três anos de idade, demonstrando, dessa forma, que sintomas característicos de problemas internalizantes e externalizantes podem ser muitas vezes preditivos( 1212. Williams J, Klinepeter K, Palmes G, Pulley A, Foy JM. Diagnosis and treatment of behavioral health disorders in pediatric practice. Pediatrics 2004;114:601-6. , 1313. Mesman J, Koot HM. Early preschool predictors of preadolescent internalizing and externalizing DSM-IV diagnoses. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2001;40:1029-36. ). Um aumento nos encaminhamentos para profissionais da saúde mental mostrou-se eficaz na diminuição e melhora de sintomas patológicos, bem como na pontuação da LSP em uma segunda reavaliação( 1414. Bird HR, Canino G, Rubio-Stipec M, Gould MS, Ribera J, Sesman M et al. Estimates of the prevalence of child maladjustment in a community survey in Puerto Rico. The use of combined measures. Arch Gen Psychiatry 1988;45:1120-6. ).

Dos 415 pais e/ou responsáveis que responderam somente ao primeiro instrumento de avaliação (LSP), 58 (14,0%) apresentaram resultado positivo de risco para problemas emocionais e/ou psicossociais. Na avaliação das 145 crianças e/ou adolescentes, observou-se que a LSP foi positiva em 33,8%. Dos 270 que não concordaram em responder ao CBCL, somente nove (3,3%) apresentaram escore da LSP ≥28 pontos, ou seja, de risco para problemas emocionais e/ou psicossociais. Os 261 restantes apresentaram escore <28 pontos (97,7%). A frequência de 14,0% obtida entre os 415 participantes parece refletir com mais fidelidade a prevalência de problemas emocionais e/ou psicossociais apontada pela literatura, já que a frequência de 33,8% obtida entre os 145 pais que concordaram em responder também ao CBCL pode estar superestimada em razão da maior adesão à segunda etapa do estudo, decorrente do resultado positivo da LSP aplicada previamente.

A frequência observada neste estudo assemelha-se à da população americana( 1515. Jellinek MS, Murphy JM, Little M, Pagano ME, Comer DM, Kelleher KJ. Use of the Pediatric Symptom Checklist to screen for psychosocial problems in pediatric primary care: a national feasibility study. Arch Pediatr Adolesc Med 1999;153:254-60. ), de 13,0%, em uma abordagem ampla da população pediátrica de 44 estados americanos, Porto Rico e de quatro províncias canadenses. Em uma amostra hispânica( 1616. Leiner MA, Balcazar H, Straus DC, Shirsat P, Handal G. Screening Mexicans for psychosocial and behavioral problems during pediatric consultation. Rev Invest Clin 2007;59:116-23. ) residente no estado do Texas, encontrou-se prevalência semelhante: 16,5% de LSP positiva. Os resultados da LSP que indicam o grau de confiabilidade e a validade em relação ao CBCL, utilizado neste estudo como padrão-ouro, são similares aos encontrados em estudos de outros países( 22. Reijneveld SA, Vogels AG, Hoekstra F, Crone MR. Use of the Pediatric Sympton Checklist for the detection of psychosocial problems in preventive child healthcare. BMC Public Health 2006;6:197. , 1515. Jellinek MS, Murphy JM, Little M, Pagano ME, Comer DM, Kelleher KJ. Use of the Pediatric Symptom Checklist to screen for psychosocial problems in pediatric primary care: a national feasibility study. Arch Pediatr Adolesc Med 1999;153:254-60.

16. Leiner MA, Balcazar H, Straus DC, Shirsat P, Handal G. Screening Mexicans for psychosocial and behavioral problems during pediatric consultation. Rev Invest Clin 2007;59:116-23.
- 1717. Thun-Hohenstein L, Herzog S. The predictive value of the pediatric symptom checklist in 5-year-old Austrian children. Eur J Pediatr 2008:167:323-9. ).

As questões escolhidas para compor a LSP refletem características emocionais e de comportamento importantes para identificar problemas em escolares( 1616. Leiner MA, Balcazar H, Straus DC, Shirsat P, Handal G. Screening Mexicans for psychosocial and behavioral problems during pediatric consultation. Rev Invest Clin 2007;59:116-23. ). Ao observar a frequência de respostas ao agrupamento de questões (1â€'3, 10, 11, 13, 15, 19, 20-22, 27 e 30; Quadro 1), o pediatra deverá considerar, em sua avaliação, características para Problemas Internalizantes, isto é, crianças ou adolescentes com sinais de ansiedade, isolamento, queixas somáticas e depressão. Considerando-se que crianças menores possuem maior dificuldade para identificar, descrever e demonstrar seus sentimentos, em razão da imaturidade emocional, a atenção do pediatra deverá ser redobrada nessa faixa etária.

As questões 12, 16, 17, 25, 26, 29, 31, 32â€'35 (Quadro 1) são características de Problemas Externalizantes, como quebrar regras e agressividade. Não obedecer a regras é um comportamento que faz parte do desenvolvimento da criança, principalmente dos dois aos três anos de idade e na adolescência. No entanto, ao ocorrer frequentemente, de maneira consistente e com prejuízo ao funcionamento adaptativo, pode-se indicar transtorno opositivo desafiador.

Tanto nos 415 participantes que responderam somente à LSP quanto nos 145 que responderam a ambos os instrumentos, observou-se predomínio de positividade no gênero masculino. Outro estudo avaliou uma população de 21.065 crianças e adolescentes e mostrou escores para respostas positivas no gênero masculino significativamente maiores do que no feminino (17 e 9% para os escolares e 12 e 9% para os pré-escolares)( 1515. Jellinek MS, Murphy JM, Little M, Pagano ME, Comer DM, Kelleher KJ. Use of the Pediatric Symptom Checklist to screen for psychosocial problems in pediatric primary care: a national feasibility study. Arch Pediatr Adolesc Med 1999;153:254-60. ).

Os resultados da LSP revelaram boa consistência interna e fidedignidade de mensuração. Considerando-se como desfecho o risco de problemas emocionais e psicossociais estabelecidos pelo CBCL, a curva ROC mostrou que o ponto de corte para essa população foi de 21,0 pontos, com sensibilidade de 96,8% e especificidade de 86,7%. Ao observar como se comportaria a curva com o ponto de corte proposto para a população americana( 88. Jellinek MS, Murphy JM, Burns BJ. Brief psychosocial screening in outpatient pediatric practice. J Pediatr 1986;109:371-8. , 1515. Jellinek MS, Murphy JM, Little M, Pagano ME, Comer DM, Kelleher KJ. Use of the Pediatric Symptom Checklist to screen for psychosocial problems in pediatric primary care: a national feasibility study. Arch Pediatr Adolesc Med 1999;153:254-60. , 1818. Murphy JM, Arnett HL, Bishop SJ, Jellinek MS, Reede JY. Screening for psychosocial dysfunction in pediatric practice. A naturalistic study of the Pediatric Symptom Checklist. Clin Pediatr (Phila) 1992;31:660-7. ) (28 pontos), constatou-se sensibilidade de 64,5% e especificidade de 100%. Isso revela que a amostra brasileira comporta-se de forma semelhante à americana, quando se considera o ponto de corte de 28 pontos. Já em estudo na Holanda( 22. Reijneveld SA, Vogels AG, Hoekstra F, Crone MR. Use of the Pediatric Sympton Checklist for the detection of psychosocial problems in preventive child healthcare. BMC Public Health 2006;6:197. ), propôs-se ponto de corte de 22 pontos, com sensibilidade de 71,7% e especificidade de 93,0% para o desfecho risco de problemas emocionais e psicossociais. A escolha do melhor ponto de corte na LSP( 1818. Murphy JM, Arnett HL, Bishop SJ, Jellinek MS, Reede JY. Screening for psychosocial dysfunction in pediatric practice. A naturalistic study of the Pediatric Symptom Checklist. Clin Pediatr (Phila) 1992;31:660-7. ) considera a capacidade de detectar o maior número de crianças e indivíduos com indicativos de TM, de forma a identificar os que de fato necessitam de avaliação e/ou tratamento de profissionais da saúde mental. Pontos de corte altos selecionam um menor número de pessoas, provavelmente abrangendo as mais comprometidas, que, de fato, necessitam de avaliação especializada. Pontos de corte mais baixos selecionam um maior número de indivíduos, dentre esses, os com pouco ou nenhum comprometimento real, gerando uma grande demanda de avaliações especializadas e uma preocupação talvez desnecessária para a família.

Assim, a identificação de crianças e adolescentes com TM não pode se restringir a um único instrumento de avaliação e a uma precisão numérica. Não se deve simplificar demasiadamente essa tarefa complexa. A função do pediatra é indispensável, tanto na avaliação clínica quanto na avaliação dos resultados de um instrumento de triagem, neste caso, a LSP. Essa avaliação pode ajudar o profissional a decidir pela orientação da família e reavaliação próxima ou, se não se sentir seguro e capacitado, encaminhar a família para consulta com um especialista. Nesta amostra, uma LSP com pontuação de 28 ou mais apresentou especificidade de 100,0% para problemas emocionais e/ou psicossociais, sendo obrigatório o encaminhamento para avaliação especializada. Entre 21 e 27 pontos, encontram-se casos em que a avaliação clínica é fundamental para se decidir pelo encaminhamento ou observação próxima pelo pediatra.

Cabe ao pediatra, profissional que possui grande vínculo com as famílias, saber reconhecer os diferentes TM para realizar intervenções precocemente. A crescente ênfase na produtividade e na rentabilidade adiciona mais uma pressão para esse profissional, limitando ainda mais a atenção sobre os problemas emocionais e psicossociais. O uso de instrumentos de triagem para TM como parte da rotina dos cuidados médicos de saúde da criança e do adolescente pode facilitar o reconhecimento e o encaminhamento precoce, da mesma forma que as informações sobre os sintomas clínicos, de ordem física e orgânica. A LSP é um teste de triagem para crianças e adolescentes de seis a 16 anos, de fácil administração, entendimento e interpretação, além do excelente grau de relação, confiabilidade e validade em relação ao CBCL (padrão-ouro). O pediatra que já utiliza outros instrumentos de triagem em seus procedimentos terá facilidade em manuseá-la. Ela pode ser respondida pelos pais enquanto aguardam a consulta pediátrica de seu filho. A LSP é um primeiro passo para a triagem de indicação de TM na infância.

Agradecimentos

À Direção, Coordenação, Corpo Docente e, em especial, aos pais e familiares dos alunos da Escola Estadual Aline Picheth, Curitiba, Paraná.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2013

Histórico

  • Recebido
    09 Out 2012
  • Aceito
    29 Abr 2013
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