PARTICIPAÇÃO DO PAI NA UNIDADE NEONATAL: UM PROCESSO EM CONSTRUÇÃO

O cuidado com recém-nascidos pré-termo internados em Unidade Neonatal, durante muito tempo, foi restrito à equipe hospitalar. Pai e mãe eram visitas, com horários restritos e nenhuma autonomia junto ao filho. Nas últimas décadas, com a maior sobrevivência desses recém-nascidos, foi sendo identificado o impacto negativo desse cenário no estabelecimento do vínculo entre pais e filhos e suas consequências, como abandono, maus-tratos e negligência.¹

Diante dessas evidências, mudanças foram sendo delineadas e as Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) do mundo começaram a abrir suas portas para os pais. No entanto, efetivamente, o estímulo foi, principalmente, centrado na participação da mãe. Historicamente, os homens têm sido excluídos dos ambientes de parto e nascimento e, até mesmo, dos cuidados com os filhos e da paternidade fortemente vinculada ao sustento da família. No entanto, dois movimentos interligados têm relativizado essa questão: novos arranjos familiares e de gênero, com uma demanda social para que os pais contemporâneos exerçam uma paternidade mais implicada e ativa no que se refere à convivência e aos cuidados com os filhos, e mudanças nos serviços de saúde.²

No Brasil, nos últimos anos, a participação do pai tem sido estimulada. Como exemplos, cita-se a Lei do Acompanhante, que, embora não seja específica para o pai, abriu a possibilidade de sua presença junto à mulher, no pré-parto, no parto e no puerpério;² a Portaria GM nº 930, que regulamenta a internação neonatal no Brasil e incluiu a participação e o protagonismo do pai e da mãe nos cuidados com o filho internado, com garantia de livre acesso e permanência;³ o pré-natal do parceiro, estratégia essencial para qualificar a atenção à gestação, ao parto e ao nascimento;⁴ a licença-paternidade, que tem sido rediscutida e ampliada; e o Método Canguru, que inclui estratégias voltadas para o casal grávido e para a efetiva participação do pai na internação do filho, incluindo a posição canguru, com evidências de vantagens na melhoria dos resultados neonatais.⁵

Diante da internação neonatal, o pai, em geral, é o primeiro que entra em busca de notícias e nem sempre a equipe o acolhe e estimula sua participação. Neste número da Revista Paulista de Pediatria, Soares et al.⁶ discutem essa questão. Este importante artigo apresenta a percepção da equipe multiprofissional e demonstra que ainda existem divergências a respeito. Enquanto, para alguns, o papel do pai é de provedor e o cuidado de crianças não faz parte de suas atribuições, para outros, sua participação deve envolver colocar o filho em posição canguru, trocar fralda, participar do banho e apoiar a mãe no aleitamento. Dar voz a esses profissionais possibilita reflexões relativas às práticas das UTIN e denota que mudanças urgentes precisam acontecer. É necessário que equipes comprometidas com a boa prática clínica incluam efetivamente o pai nos cuidados neonatais como um direito do homem, não apenas como uma vantagem para o filho e para a mulher.

REFERENCES

• ¹
  Brazil - Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Atenção humanizada ao recém-nascido: método canguru. 3^rd ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2017.
• ²
  Gomes R, Albernaz L, Ribeiro CR, Moreira MC, Nascimento M. Linhas de cuidados masculinos voltados para a saúde sexual, a reprodução e a paternidade. Cienc Saude Coletiva. 2016;21:1545-52. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015215.26842015
  » http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015215.26842015
• ³
  Brazil - Ministério da Saúde. Portaria n^o 930, de 10 de maio de 2012. Define as diretrizes e objetivos para a organização da atenção integral e humanizada ao recém-nascido grave ou potencialmente grave e os critérios de classificação e habilitação de leitos de Unidade Neonatal no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: Ministério da Saúde ; 2012.
• ⁴
  Brazil - Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Guia do pré-natal do parceiro para profissionais de saúde. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2016.
• ⁵
  Conde-Agudelo A, Belizán JM, Díaz-Rossello JL. Kangaroo mother care to reduce morbidity and mortality in low birthweight infants. Cochrane Database Syst Rev. 2016;23:CD002771. https://doi.org/10.1002/14651858.CD002771.pub2
  » https://doi.org/10.1002/14651858.CD002771.pub2
• ⁶
  Soares NC, Bernardino MP, Zani AV. Insertion of the father in the care of the hospitalized preterm infant: perception of the multiprofessional team. Rev Paul Pediatr. In press 2019. Epub June 19, 2019

Financiamento

• O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  10 Out 2019
• Data do Fascículo
  Jul-Sep 2019

Histórico

• Recebido
  05 Jul 2019