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Trabalhadores rurais, Igreja Católica e Reforma Agrária: conquista de terras no Vale do Rio Doce de Minas Gerais durante a década de 1980

Rural Workers, Catholic Church and Agrarian Reform: land conquest in the Vale do Rio Doce (Minas Gerais/Brazil) in the 1980s

Resumos

Resumo: O objetivo deste texto é analisar uma mobilização de luta pela terra no Vale do Rio Doce de Minas Gerais durante a década de 1980, descortinando especificidades importantes em relação às militâncias pela reforma agrária naquele contexto. Tratou-se de uma mobilização coletiva de trabalhadores rurais, mediada por um longo processo de formação que envolveu cursos, reuniões e participação em outras atividades promovidas e/ou legitimadas por agentes da Igreja Católica. Para a realização dessa pesquisa, utilizamos entrevistas de história oral e análise de documentos eclesiásticos e particulares. Evidenciou-se uma conquista de terras efetivada com a combinação híbrida de ideias políticas e concepções religiosas que foram decisivas em todo o processo social.

Palavras-chaves:
Reforma Agrária; Movimentos Sociais; Igreja Católica


Abstract: This text intends to analyze a specific mobilization for land possession at Vale do Rio Doce (state of Minas Gerais, Brazil) during the 1980s, by pointing out to important singularities about land reform militancy in that context. It was a collective action of rural workers mediated by a long process involving courses, meetings, and other activities organized and/or legitimized by agents linked to the Catholic Church. This research relies on the analysis of interviews guided by an oral history approach as well as the scrutiny of ecclesiastical and individual documents. As a result, it is noticeable that such group was successful in obtaining land tenure with actions based on a medley of political and religious conceptions.

Keywords:
Agrarian Reform; Social Movements; Catholic Church


Introdução1 1 Este artigo é um desdobramento da tese de doutorado. Naquele contexto, alguns dados não puderam ser devidamente trabalhados, e novas leituras e reflexões inspiraram a escrita deste artigo.

A década de 1980 foi marcada pelos processos de redemocratização e ascensão de movimentos sociais no Brasil, período em que a demanda por Reforma Agrária adquiriu grande visibilidade e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) se tornou importante referência de militância.

Na conjuntura da redemocratização, foram abertas possibilidades de demandas aos trabalhadores, de forma mais ampla, e à questão das terras, de modo mais particular. Mesmo que os efeitos desse contexto tenham sido limitados, ficou evidente que “determinadas conjunturas criam espaços políticos para novas práticas e até mesmo inovações institucionais” (Medeiros e Esterci 1994MEDEIROS, Leonilde Servolo de; ESTERCI, Neide. (1994), “Introdução”. In: L. Medeiros et al. (org.). Assentamentos Rurais: uma visão multidisciplinar. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista.:16).

Durante a vigência da Ditadura Militar (1964-1985), os Sindicatos de Trabalhadores Rurais, partidos políticos e grupos correlatos entusiastas da reforma agrária, embora continuassem a se articular, tinham suas atividades públicas limitadas pelo contexto político. Ao passo que a “abertura política” favorecia que as demandas e discursos em favor da reforma agrária viessem à tona.

Neste cenário, houve a ascensão do MST, um dos movimentos sociais mais duradouros da história do Brasil. Este irrompeu com maior vultuosidade na região sul e expandiu-se para todo o país, apoiado por grupos progressistas religiosos e assistido por uma rede de sindicatos de trabalhadores rurais, cujas atividades eram potencializadas pela redemocratização em curso.

Vale destacar que o surgimento da figura do “sem-terra” está relacionado ao MASTER (Movimento dos Agricultores Sem Terra) que se desenvolveu no Rio Grande do Sul do final dos anos de 1950 a meados da década de 1960, com forte ligação com lideranças do Partido Trabalhista (PTB) e do Partido Comunista (PCB), realizando ocupações de terra e pressionando o poder público pela reforma agrária. Sigaud, Rosa e Macedo (2008SIGAUD, Lygia; ROSA, Marcelo; MACEDO, Marcelo Ernandez. (2008), “Ocupações de Terra, Acampamentos e Demandas ao Estado: Uma Análise em Perspectiva Comparada”. DADOS - Revista de Ciências Sociais, vol. 51, nº 1: 107-142.) realizaram uma comparação entre as ocupações de terra no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, no início dos anos de 1960, e as ocupações em Pernambuco na década de 1980, apontando a existência de uma mesma linguagem, pois “ocupar para forçar a distribuição de terras era, naqueles idos anos 1960, uma ideia que se esboçava no horizonte dos possíveis” (Sigaud, Rosa e Macedo 2008:120-121). Apesar de não atingirem o volume e a amplitude das mobilizações desencadeadas na década de 1980, essas ocupações conquistaram o reconhecimento do Estado, indicando que se tratava de uma linguagem que se difundia. Esses canais de interlocução em construção foram praticamente impedidos durante o regime civil-militar.

No processo de redemocratização, a forma acampamento (Sigaud 2000SIGAUD, Lygia. (2000), “A Forma Acampamento: Notas a Partir da Versão Pernambucana”. Novos Estudos Cebrap, no 58: 73-92.) apresentou-se como inflexão nos processos de luta pela terra, ou seja, uma forma de enfrentamento que fortaleceu as possibilidades de interação com o poder público e redimensionou práticas de vários movimentos e organizações no meio rural, relacionando-se com o surgimento de novas identidades políticas. Como afirma Sigaud (2005:255), “ocupar terras e nelas montar acampamentos tornou-se, nos últimos vinte anos, a forma apropriada para reivindicar a reforma agrária no Brasil”.

Há, então, a difusão de uma forma de atuar em face da antiga demanda pela reforma agrária, absorvida por uma grande diversidade de atores. As “ocupações, os acampamentos e as desapropriações a eles associadas indicam, portanto, uma inflexão no modo de proceder das diversas organizações no mundo rural e do Estado” (Sigaud 2005SIGAUD, Lygia. (2005), “As condições de possibilidade das ocupações de terra”. Tempo Social, vol. 17, nº 1: 255-280.:256). Logo, trata-se de “uma linguagem, um modo de fazer afirmações por meio de atos, destinada a fundar pretensões à legitimidade” (Sigaud, Rosa e Macedo 2008:108), que transcendeu os limites dos seus movimentos de origem.

Assim, nos anos de 1980, as ocupações massificam-se, ao mobilizarem milhares de famílias, e generalizam-se, pois são incorporadas como estratégia de conquista de terras por diversos movimentos, dentre eles, segmentos religiosos e o movimento sindical. Nesse quadro, pudemos compreender como a mobilização em Miraflores2 2 Utilizamos um codinome da cidade como tentativa de preservar a identidade das pessoas que lá habitam. Esta é uma maneira de evitar que antigos conflitos venham à tona. No mesmo sentido, preservamos os nomes das pessoas que gentilmente contribuíram com seus relatos, a quem agradecemos e dedicamos este artigo. Os nomes de Durval Ângelo e Raul Messias são verdadeiros e citados como atores políticos importantes, mas não há relato deles. Nomes reais do Bispo e dos Padres também não são mencionados por representarem agentes da Igreja Católica que viveram situações conflituosas naquele contexto. , ao colocar a ocupação de terra no horizonte dos trabalhadores, foi influenciada por essa linguagem que, utilizada nas décadas de 1950 e 1960, foi difundida, massificada e generalizada principalmente pelo MST nos anos de 1980, apesar de essa relação ser indireta e, como vimos, negada pelos atores locais.

Neste artigo, defendemos que, para além do MST e dos grupos que obtiveram maior visibilidade política, diversas militâncias ocorreram em várias regiões pelo interior do país. Esses processos possuem raízes históricas que merecem destaque, especialmente na região do Vale do Rio Doce de Minas Gerais, onde a militância pela reforma agrária foi incisiva, desde a década de 1950, e as organizações e grupos engajados foram sistematicamente investigados e perseguidos por fazendeiros e forças policiais, inclusive pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), principalmente durante a Ditadura Militar (Starling 1986STARLING, Heloisa M. M. (1986), Os Senhores das Gerais: os novos inconfidentes e o golpe de 1964. Petrópolis: Vozes.; Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

Uma das características mais marcantes dos conflitos por terra, nessa região, era a utilização sistemática da violência pelos proprietários rurais diante das organizações camponesas. No período pré-ditadura, tratou-se da consolidação de organizações paramilitares em defesa das propriedades e campanhas político-ideológicas legitimadoras do uso da violência, como a utilizada por um pároco de outra região de Minas Gerais, que se tornara slogan dos latifundiários, “Armai-vos uns aos outros” (Starling 1986STARLING, Heloisa M. M. (1986), Os Senhores das Gerais: os novos inconfidentes e o golpe de 1964. Petrópolis: Vozes.:261). Significava a sacralização da propriedade privada por parte do clero conservador (Starling 1986), o que respaldava o uso da violência em sua defesa.

Os conflitos mais explícitos foram sufocados pelo regime militar, mas as organizações camponesas ganharam força em meados da década de 1970, boa parte disso se devendo à atuação do clero progressista, seja pelas organizações locais das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), seja pela articulação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT) (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

Neste contexto, aproximava-se da redemocratização, e a atuação em prol da reforma agrária tornava-se mais efetiva e contundente, momento em que surgiram diversas mobilizações populares pressionando o Estado para promover a Reforma Agrária (Carter 2010CARTER, Miguel. (2010), “Desigualdade social, democracia e reforma agrária no Brasil”. In: M. Carter (org.). Combatendo a desigualdade social: o MST e a reforma agrária no Brasil. Tradução de Cristina Yamagami. São Paulo: Editora UNESP.).

No Vale do Rio Doce de Minas Gerais, ocupações de terra e organizações camponesas estabeleciam-se em municípios da região. Por outro lado, grandes proprietários locais articularam-se em torno da União Democrática Ruralista (UDR) (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.), organização que teve como uma de suas principais facetas o uso da violência na defesa das propriedades, especialmente em face das ocupações de terra que avançavam pelo país (Bruno 1996BRUNO, Regina. (1996), “Revisitando a UDR: ação política, ideologia e representação”. Revista Instituto Estudos Brasileiros, nº 40: 69-90.).

A utilização da violência era justificada pela defesa das propriedades privadas que estariam sendo violadas pelas ocupações. Além disso, ações da UDR estiveram fortemente voltadas para a delimitação e a desqualificação de seus principais adversários: setores progressistas da Igreja Católica, o PT e, principalmente, o MST (Bruno 1996BRUNO, Regina. (1996), “Revisitando a UDR: ação política, ideologia e representação”. Revista Instituto Estudos Brasileiros, nº 40: 69-90.).

A Igreja Católica foi fundamental para os movimentos sociais naquele contexto. Diversos bispos, padres e lideranças religiosas leigas atuaram, não apenas na legitimação dos movimentos, mas participaram pessoalmente de ocupações e eventos públicos. Vários recursos do fazer político e dos movimentos sociais são provenientes do campo religioso, e não há como negar que os símbolos religiosos têm se inserido em todas as questões humanas com desdobramentos políticos (Novaes 1997NOVAES, Regina Reys. (1997), De corpo e alma: catolicismo, classes sociais e conflitos no campo. Rio de Janeiro: Editora Graphia., 2002). Sabe-se que a religião justifica condutas, formas de agir e de existir (Bourdieu 2005BOURDIEU, Pierre. (2005), A Economia das Trocas Simbólicas. Organização de Sérgio Miceli. São Paulo: Editora Perspectiva, 6ª ed.; Coutrot 1996COUTROT, Aline. (1996), “Religião e Política”. In: R. Rémond (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ.; Novaes 1997, 2002), e não se pode subestimar como a socialização dos agentes católicos nas CEBs foi basilar para a construção de projetos políticos e de movimentos sociais (Casanova 1994CASANOVA, José. (1994), Public Religions in the Modern World. Chicago and London: The University of Chicago Press.).

Assim, é fundamental que, ao se fazer reflexão sobre conquista de terras por agentes religiosos, se atente à necessidade de não se perder de vista o religioso, pois se trata de uma religiosidade arraigada na formação daqueles agentes sociais desde a década de 1970 e as motivações, os símbolos e as alianças mobilizadas estão diretamente imbricados com a religião.

O objetivo deste texto é analisar uma mobilização de luta pela terra, mediada por concepções e sociabilidades religiosas, no município de codinome Miraflores no Vale do Rio Doce, descortinando especificidades importantes em relação às militâncias por terra que contam com maior reconhecimento político e acadêmico. Metodologicamente, utilizamo-nos de entrevistas de história oral e análise documental, eclesiásticas e particulares, tais como anotações sobre cursos feitos, convites de reuniões e recortes de jornais sobre os “sem-terra”.

O artigo encontra-se organizado na seguinte configuração: na primeira parte, será apresentado o contexto de formação dos agentes sociais religiosamente engajados que se empenharam na luta pela terra. Em um segundo momento, tratar-se-á mais especificamente da ocupação das terras e seus dedobramentos. Por último, serão feitas as considerações finais.

A formação religiosa em Miraflores

Miraflores é pseudônimo de um município que se localiza no Vale do Rio Doce de Minas Gerais, atualmente com população aproximada de 14 mil habitantes. A principal atividade econômica é a agropecuária e, apesar de todo o cenário de êxodo rural das últimas décadas, bem como as especificidades regionais que estimularam a migração para os Estados Unidos, cerca de 6 mil habitantes vivem no meio rural3 3 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. .

Esse município possui uma paróquia, circunscrita à Diocese de Caratinga/MG, que tem extensas dimensões territoriais (731,753 Km²). Possui distritos a mais de cinquenta quilômetros do centro da cidade, onde fica a sede paroquial. A organização da Igreja Católica no município, até a década de 1960, era frágil e com uma formação religiosa distanciada daquela compartilhada pelo “corpo de especialistas religiosos”. O catolicismo não tinha efetiva organização, e a presença institucional era precária. As poucas organizações leigas existentes eram centradas em orações coletivas, como o Apostolado da Oração (Oliveira 2012OLIVEIRA, Fabrício Roberto Costa. (2012), Religião, Política e Comunidade: emergência e politização do Movimento da Boa Nova. Rio de Janeiro: Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

As organizações católicas locais iniciaram um processo de transformações a partir da década de 1970, com a chegada do Padre Ernesto. Ele retrata a paróquia em que chegara como não sendo muito atuante e de pouca instrução religiosa: “Encontrei na sede4 4 A sede a que se refere o Padre é a principal igreja da paróquia, localizada na principal praça do município. poucos membros de Apostolado da oração e vicentinos. Não têm atuação nenhuma. São pessoas que fazem questão de comparecer às reuniões, mas vida cristã de participação nos sacramentos muito pouca. Instrução religiosa muito pouca”5 5 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 7. . Na concepção do Padre, a organização do catolicismo e a formação de “base” eram frágeis. Ele objetivava dar dinâmica ao catolicismo por meios dos cursos do Movimento da Boa Nova (Mobon), do qual era participativo e entusiasta.

O Mobon6 6 O nome do movimento é oriundo de um curso ministrado na comunidade, denominado Boa Nova do Evangelho, que representaria “a chegada do Reino, Reino de Libertação e de Esperança” (Kerandel e Del Canto 1977:26). é uma organização católica que se intitula um movimento religioso, cuja dinâmica se centra na promoção de cursos para leigos, com o objetivo de fornecer-lhes conhecimentos bíblico-religiosos, estimulando-os a viverem organizados em comunidades. Estas seriam grupos católicos de vizinhança que participavam de atividades católicas e cursos do Mobon vinculados à capela da comunidade (Oliveira 2012OLIVEIRA, Fabrício Roberto Costa. (2012), Religião, Política e Comunidade: emergência e politização do Movimento da Boa Nova. Rio de Janeiro: Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

O movimento foi formado em fins da década de 1960, na Diocese de Caratinga/MG, e seus propósitos estavam embasados em desdobramentos das concepções advindas das resoluções do Concílio Vaticano II (1962-1965), que destacava a valorização da formação dos leigos na Igreja Católica. Ele foi instituído com o intuito de valorizar e estimular a participação dos leigos nas atividades religiosas de suas paróquias e comunidades que estavam em processo de formação.

Os espaços com maior atuação do Mobon eram localidades rurais7 7 As principais regiões de atuação do Mobon eram a Zona da Mata, em localidades próximas ao município de Muriaé/MG, e a região do Vale do Rio Doce, em localidades entre os municípios de Caratinga/MG e Governador Valadares/MG. , onde a presença institucional da Igreja Católica encontrava limitações. Assim, as principais paróquias de influência do Mobon tinham amplas dimensões territoriais e contavam com apenas um padre, que encontrava dificuldades em atendê-las. Os leigos que participavam dos cursos eram instigados a ministrar concepções apreendidas para novos públicos, tornando-se agentes do movimento, numa prática de “leigo evangelizando leigo”. Era uma espécie de catequese para adultos em que se estimulava a organização em comunidades religiosas católicas, formando esses agentes do catolicismo em suas respectivas localidades, colaborando com os párocos e constituindo-se como lideranças religiosas leigas (Oliveira 2012OLIVEIRA, Fabrício Roberto Costa. (2012), Religião, Política e Comunidade: emergência e politização do Movimento da Boa Nova. Rio de Janeiro: Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

Na primeira fase de atuação do pároco, a formação de comunidades junto ao Mobon era considerada importante, bem como a construção de capelas que fossem referências para os grupos que se constituíam: “Comunidades Novas: - As primeiras missas que celebrei nestas novas comunidades 1) Córrego […] numa casa da escola, a pedido de Antônio, celebrei a santa missa, às 3 da tarde. Muita gente. Falamos da necessidade de se construir uma igreja neste córrego - 11 de janeiro de 1971”8 8 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 7. .

A partir da missa, as pessoas deveriam escolher um local, geralmente doado por um pequeno proprietário de terras com fortes vínculos ao catolicismo, e se organizar para a construção da capela, em torno da qual se agregariam atividades religiosas e sociais. As lideranças religiosas leigas, moradoras dessas comunidades, eram agentes essenciais para a dinâmica da comunidade religiosa.

O Mobon ministrava cursos a essas pessoas com o propósito de transmitir concepções sobre formas de agir na comunidade. Tais cursos se expandiram por diversas regiões da paróquia9 9 “Movimento da Boa Nova do Evangelho - Em toda a Paróquia (sede e igrejas filiais) estão sendo ministrados cursos de: Base, Boa Nova, O Evangelho na Vida, Fidelidade ao Evangelho, Treinamento e Aprofundamento, Curso de Bíblia, cursos de: Natal e Semana Santa, cursos sobre Apocalipse - todos estão sendo ministrados ininterruptamente. Todos estes cursos são encerrados, tanto na sede como na capela, filiais, com a celebração da Semana Santa.” (Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 6). . Um deles, de formação de lideranças, era o Curso de Coordenador de Comunidade. Na edição ministrada em 1982, foram passadas instruções para as lideranças religiosas:

  1. 1. Seja você mesmo.

  2. 2. Não seja covarde.

  3. 3. Não atrapalhe a Comunidade.

  4. 4. Vendo que não dá, peça para sair.

  5. 5. Não esconde seu dom.

  6. 6. Não seja comodista.

  7. 7. Procure não cansar a Comunidade.

  8. 8. Seja prudente no falar.

  9. 9. Não dê ouvidos à fofoca10 10 Material de Cora Furtado de Melo. .

As características apontadas como importantes para as lideranças comunitárias constituíam-se como princípios de ação política e civilidade. Características como ser “prudente na fala” e “não dar ouvidos a fofocas” são válidas para uma série de cargos públicos e mesmo para a vivência comunitária. Não ser comodista, não atrapalhar e não cansar a comunidade são fundamentais para que lideranças se sustentem como tais, pois a legitimidade do exercício de suas funções é alvo de frequente avaliação do grupo em que estão inseridos, conforme já apontara Melucci (1996MELUCCI, Alberto. (1996), Challenging Codes: collective action in the information age. Cambridge: Cambridge University Press.) no estudo sobre lideranças.

Lideranças precisavam mostrar potencialidade e coerência de atuação tanto aos moradores da comunidade como aos párocos e missionários do Mobon. Estes últimos eram agentes externos ao cotidiano do espaço comunitário, mas nem por isso menos influentes em sua dinâmica. Tratava-se de um processo de aprendizado em coletividade que muito se aproxima das perspectivas de Melucci:

[…] a existência de uma rede de associações ou comunidade facilita a emergência de uma liderança. Porque uma rede de filiações e socialização pode prover um treinamento onde as habilidades necessárias para a emergência de uma liderança podem ser aprendidas, e porque essa rede pode lhe fornecer recompensas na forma de solidariedade e valores, o que encoraja o líder a assumir os riscos associados com sua posição (Melucci 1996MELUCCI, Alberto. (1996), Challenging Codes: collective action in the information age. Cambridge: Cambridge University Press.:335).

Nos cursos do Mobon, havia motivações para falas, os atores viam-se sociabilizados nos estudos religiosos, o que estimulava o desenvolvimento das habilidades de convencimento. Nesta conjuntura, houve organização de comunidades e lideranças que marcaram uma relativa descentralização da paróquia e transmissão de poder às lideranças religiosas leigas em âmbito local11 11 A descentralização da paróquia era limitada, já que a sede principal continuava sendo a referência, bem como o poder das lideranças era restrito, dependente da legitimidade do pároco, mas nem por isso esse processo deixava de ter profunda importância. A adesão aos propósitos do Mobon também encontrava limitações, de modo que o sucesso dessa atuação era sempre relativo (Oliveira 2012). .

A formação católica proporcionada pelos cursos do Mobon e a legitimidade de atuação leiga contribuíam para a emergência de novos atores em contexto local. Embora a política não emergisse como algo relevante, a organização estabelecida era um cenário que favorecia tal propósito.

Em fins dos anos de 1970, os cursos apontavam para uma proposta de engajamento das lideranças comunitárias nas causas sociais. Durante aquela década, o Mobon consolidou-se como formador de lideranças e comunidades - já que havia um grupo relevante de leigos formados e comunidades rurais organizadas. Os agentes religiosos das comunidades reuniam-se e organizavam-se coletivamente para suas atividades religiosas. O período do final da década é destacado como um momento em que os agentes do Mobon se empenharam para uma maior organização política:

[…] a intimidade com a Palavra de Deus foi despertando seus participantes para uma visão mais crítica da realidade. Começava-se, naturalmente uma maior ligação entre Fé e Vida. Lideranças vão criando grupos de compra e venda que depois se transformaram em pequenas cooperativas. Vai surgindo uma maior valorização e consequente engajamento na luta sindical12 12 Disponível em: http://www.mobon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=54&Itemid=42. Acesso em: 15/04/2011. .

No contexto de redemocratização e de articulação de movimentos sociais populares, na década de 1980, leigos participantes e agentes do Mobon engajaram-se no Partido dos Trabalhadores - com atuação efetiva em disputas político-partidárias. A participação dos leigos nos processos de formação de lideranças foi muito importante para a militância no PT. José Maria é um interessante exemplo dentre as lideranças religiosas que se engajaram na política partidária. Ele não tinha vínculos políticos antes da atuação junto ao Mobon:

Não, nem gostava. Eu nem gostava nem de política antes do Mobon. Porque na verdade eu via, a gente andava percebendo que a política era muito suja, muito suja, meu Deus do céu, eu quase nem votava. Eu nem sei se eu votei não, eu ia lá e riscava aquilo tudo lá, eu falava assim, esse cá não merece meu voto, esse aqui não merece meu voto, este aqui também não merece. Não sei se votei antes do Mobon não. Eu acho que não, eu riscava aquilo lá. Era muito sujo (entrevista com José Maria, 10/2009)13 13 Entrevista concedida por José Maria, em outubro de 2009. José Maria participa dos cursos do Mobon desde o início da década de 1970. Coordenou comunidades, foi coordenador geral da paróquia, membro fundador do PT e exerceu cargo de vereador entre 1996 e 2000. .

Era uma concepção de política partidária identificada a algo sujo, enquanto o Mobon-PT era visto como porta-voz de uma política ética e limpa. Ele justifica seu engajamento em função dos aprendizados no Mobon no processo de formação como liderança. As mudanças em suas concepções seriam consequências das transformações do movimento:

O nosso Deus, Jesus é nosso Deus libertador, né. O nosso Deus é Cristo libertador, não é passivo diante da vida. Então, o Mobon ajudou a gente ler Bíblia e ver esse lado da Bíblia e esse lado do nosso Deus. Até então, antes do Mobon, o nosso Deus parecia que era só o Deus que queria a salvação das almas, do lado religioso, né. E o lado da vida não tinha valor, e o Mobon ajudou a gente ler este lado da Bíblia, do valor da vida né. Não é só salvar a alma, mas também salvar a vida toda, valorizador a vida toda, então ele ajudou muito a gente nisso, a ler com a gente esse lado da Bíblia que a gente não via. Até o Mobon, a gente via só o outro lado da Bíblia. O lado só do religioso. Mas o lado social, político, ele ajudou muito neste lado, muito mesmo (entrevista com José Maria, 10/2009).

O Mobon foi importante na mudança de postura em relação à política, apontando para um novo posicionamento político-religioso que não se limitava a salvar a alma, “mas também a vida toda” - o que inclui responsabilidades políticas e sociais. Nesse sentido, a fala a respeito da descoberta de outra política, mais cristã e com olhar mais social, é bastante elucidativa:

O Mobon ajudou muito, neste sentido de despertar a gente, ensinar a gente, como fazer também uma política diferente, uma política cristã. Foi muito bom, porque a gente até então viu isso mesmo. Eu digo para o vereador que eu não falhei um milímetro no meu lado religioso durante o meu tempo de político. Tenho consciência disso. Fiz uma política de cristão mesmo, do bem, da honestidade, da verdade, da libertação, tenho consciência disso mesmo. Então ajudou muito o Mobon. […] Estimularam, despertaram, mostraram o lado. E esse lado bíblico também, o lado político da Bíblia (entrevista com José Maria, 10/2009).

A frase “o lado político da Bíblia” revela uma leitura diferente da realidade. Busca-se legitimar a sua atuação como vereador afirmando não ter tido falha no “lado religioso”. No exercício da política, o compromisso moral religioso estava presente, as expressões “política de cristão” e “da libertação” são representativas disso. Estas e outras como “caminhada” e “companheiro” são comuns entre as lideranças do Mobon. São expressões que adentraram o campo político e avigoram a nossa concepção de que a formação religiosa foi fundamental para a militância política.

Na cidade, o diretório do Partido dos Trabalhadores foi formado, basicamente, pelas lideranças religiosas das comunidades rurais. Dos 21 membros que constituíram o diretório do PT local, dezesseis eram homens, sendo quinze lavradores e lideranças de comunidades rurais. Um homem era cabeleireiro que vivia no centro do município e, das cinco mulheres, quatro eram professoras e uma estudante14 14 Informações baseadas no livro de atas do diretório municipal do PT, 5 de abril de 1987, nº 1, p. 2. . Todos eram participantes das comunidades de base e atuaram na formação do diretório local do PT.

Havia um predomínio masculino, reproduzindo a desigualdade de gênero no meio rural daquele contexto. As mulheres escolarizadas tinham o papel fundamental de zelar por toda a parte burocrática e organizacional do partido, além das contribuições decisórias, já que a maioria dos homens era analfabeta e tinha grandes dificuldades nesses trâmites. Não obstante as desigualdades, homens e mulheres daquele grupo político eram pessoas religiosas católicas muito atuantes.

Novaes (2002NOVAES, Regina Reys. (2002), “Crenças religiosas e concepções políticas: fronteiras e passagens. In: C. Fridman. Política e Cultura: século XXI. Rio de Janeiro: Editora Relume Dumará.) afirma que, no final dos anos 1980, agentes de pastorais se tornaram quadros de partidos, associações e sindicatos. Nos partidos políticos, destaca-se o PT, no qual se encontram muitas lideranças que vieram de CEBs. Muitas cartilhas e informações propaladas por agentes da Igreja Católica enfatizam o “voto consciente”; essa concepção fortalecia “representações e práticas presentes no Partido dos Trabalhadores (o PT), mas, ao mesmo tempo, não podem se identificar totalmente com um partido” (Novaes 2002:91).

Neste contexto, trabalhadores rurais pobres de Miraflores, atuantes no Mobon e com relação de proximidade ao diretório local do Partido dos Trabalhadores, protagonizaram uma situação de conflito pela posse de terras de uma fazenda do município. Tratava-se de uma fazenda da Campanha Nacional das Escolas da Comunidade (CNEC) e que era conhecida como Escola Agrícola. Refere-se a uma organização que se assume entre o público e o privado:

[…] assume o discurso de uma via entre o público e o privado, entre o Estado o Mercado, embasando-se, para tanto, no mecanismo e no discurso do tema da comunidade. Na realidade, ela se constitui, historicamente, em uma via de privatização adotada pelo Estado, sobrevivendo há 56 anos com recursos advindos dos poderes públicos e, nos últimos anos, sofrendo modificações internas para se adaptar às exigências da política educacional (Silva 2001SILVA, Ronalda Barreto. (2001), Educação Comunitária: Além do Estado e do Mercado? A Experiência da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade-CNEC (1985-1998). Tese de Doutorado em Educação, UNICAMP.:32).

Segundo a tese de Silva (2001SILVA, Ronalda Barreto. (2001), Educação Comunitária: Além do Estado e do Mercado? A Experiência da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade-CNEC (1985-1998). Tese de Doutorado em Educação, UNICAMP.), a fazenda de Miraflores possuía 120 hectares. Os trabalhadores pagavam parcela daquilo que produziam à CNEC, que, por vezes, tinha que prestar favores aos políticos eleitos do município, havendo uma relação direta entre a escola e agentes políticos locais. O prefeito, antigo proprietário, desejava, inclusive, que as terras fossem entregues à prefeitura. Os trabalhadores tinham receio de que ele quisesse voltar a ser o proprietário das terras que havia vendido. Todo o debate da década de 1980, atrelado aos debates acerca dos direitos de acesso à terra e às organizações sociais estabelecidas no município, potencializou uma postura política perante as questões que envolviam a fazenda.

A luta pela terra e seus desdobramentos

Formas tradicionais de acesso à terra, como a condição de posseiro, agregado e parceiro diminuíram fortemente, em especial durante o regime militar, momento em que a concentração fundiária foi intensificada violentamente. Projetos modernizadores para o campo, baseados em alianças entre grandes proprietários rurais, empresas e poder público, também trouxeram a valorização fundiária e um comércio de terras mais intenso, diante do qual a presença dessas relações tradicionais era vista como obstáculo para o desenvolvimento na região. Dessa forma, as alternativas de acesso à terra para os trabalhadores rurais do Vale do Rio Doce fechavam-se. Em seu horizonte, estava o assalariamento em condições precárias, a tentativa de compra de terra, algo inacessível para a maioria, e a incerteza da migração para as grandes cidades, que já acumulavam inúmeros problemas15 15 Para mais informações sobre esse processo na região, ver Espindola (2010), Muls (1989) e Ribeiro (1996, 2010). . Assim, a ocupação de terras estimulada pelos movimentos surgiu como alternativa para esses trabalhadores em sua busca por melhores condições de vida e trabalho.

Essas dificuldades estavam presentes no cotidiano dos trabalhadores rurais de Miraflores. A escola gerida pela CNEC, conhecida como Escola Agrícola, não estava em funcionamento e, como não era uma escola claramente pública nem privada, o prefeito local e agentes políticos dominantes cobravam de trabalhadores que plantavam naquelas terras uma parcela da produção. Alguns vereadores do PT e pequenos produtores rurais apoiavam que trabalhadores rurais que não tivessem terras pudessem ter posse daquele terreno.

Essas ideias começaram a ser gestadas localmente pelos trabalhadores, que, por vezes, eram também lideranças do Mobon, pelo pároco local (Padre Ernesto que atuara junto ao Mobon desde 1970) e pelos primeiros vereadores petistas. Para além dos agentes locais, agentes externos com importante capital político como Durval Ângelo (já atuante no Mobon e, até então, agente da CPT, que depois se tornaria deputado estadual pelo PT) e Raul Messias (deputado estadual pelo PT que teve a maior parte de sua votação em locais de forte influência do Mobon) atuaram numa articulação junto aos trabalhadores para que conseguissem o terreno.

Os trabalhadores rurais viviam na periferia da cidade ou moravam no terreno de outras pessoas, trabalhando como meeiros ou empregados. Plantavam no terreno da escola como forma de melhorar suas condições de vida. As articulações, locais e externas ao município, solidárias à causa da ocupação do terreno contribuíam para que se iniciasse um processo de reflexão sobre a legitimidade de terem posse daquela propriedade.

Era um grupo de trabalhadores cuja militância política começara pelos aprendizados religiosos, um grupo de amplo conhecimento das lógicas do campo religioso e internalização de um habitus condizente com esse campo (Bourdieu 2005BOURDIEU, Pierre. (2005), A Economia das Trocas Simbólicas. Organização de Sérgio Miceli. São Paulo: Editora Perspectiva, 6ª ed.). Eram pessoas que queriam suas terras, mas não prejudicar direitos de ninguém. Apesar de suas mobilizações não considerarem correto ocupar propriedades privadas, o faziam na escola por considerá-la pública e sem utilização correta. Eram “Sem-Terra” em suas próprias especificidades sem uma direta vinculação com o MST, embora o próprio nome de identificação do grupo e o contexto de atuação denotem um processo que estava para além das práticas locais.

A jovem Maria Antônia, filha de uma das principais lideranças do Mobon, e sua amiga Tânia Maria Silveira estimularam aquele grupo de pessoas que passariam a se autointitular “Sem-Terra”16 16 Eles não tinham vínculo com o nacional Movimento dos Sem Terra (MST). Há fotos de notícias de jornal e de uma liderança, na figura 4, página 289, em Oliveira (2012). : “Eles já trabalhavam ali naquela área, propriedade federal, era de uma escola chamada CNEC, da comunidade, que tinha seus diretores que tomavam conta, e esses sem-terra trabalhavam lá pra eles, na verdade trabalhavam como terceiros desses homens que não eram donos da terra” (entrevista com Maria Antônia, 01/2011)17 17 Entrevista concedida por Maria Antônia, em janeiro de 2011. Maria Antônia foi atuante na formação do PT, atuando na militância e parte burocrática do partido. É filha do primeiro presidente do diretório do PT. .

O grupo dos “Sem-Terra” organizou-se para ocupar as terras; desde 1981, as ocupações vinham acontecendo em Minas Gerais e acabavam por estimular novas outras à medida que obtinham sucesso (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.). A avaliação política era de que só conseguiriam as terras se lá estivessem estabelecidos. A programação era ocupar a terra no dia 25 de dezembro de 1985:

Na verdade, ia ocupar a terra pra pedir, porque se pedir primeiro não consegue, não ia dar. Eles foram pra lá, mas não teve ocupação como o Movimento Sem Terra, o pessoal descobriu e chamou todo o batalhão em peso pra cá, e foi que a FETAEMG entrou no processo todo de negociação com o Governo Federal, na verdade com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a CPT e lutaram para eles continuarem trabalhando lá, foi feita a documentação e foi muita luta e perseverança mesmo (entrevista com Maria Antônia, 01/2011).

Antes da data, a notícia espalhou-se pela cidade, e a polícia chegou com grande contingente a partir do dia 22 de dezembro. A possibilidade de um conflito era iminente, e a ocupação não ocorreu. Fazendeiros temiam que as ocupações se tornassem uma constante na região18 18 Como já dissemos, havia um histórico de conflitos por terra na região de Governador Valadares, onde se localiza o município de Miraflores. .

Neste contexto, o policiamento no município foi reforçado, como disse uma liderança do grupo: “é tanto moço, que tinha um sargento aqui, que chegou em mim e falou assim: senhor Pedrinho, nós temos que agradecer você muito, porque se não fosse você, nós não tinha carro aqui até hoje” (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011)19 19 Entrevista concedida por Pedrinho Mariano, em janeiro de 2011. Destacada liderança religiosa do município, participava dos cursos do Mobon desde a década de 1970 e era uma referência na luta pela terra. . O carro da polícia só teria chegado pela necessidade de vigiar as terras.

A atuação dos militares de fora e dos fazendeiros conhecidos pela violência é que deixava as lideranças da mobilização preocupadas: “surgiu um boato aí que eu não podia ficar andando pra rua, porque ia ser perigoso pra mim, mexer com negócio de terra, ia ser perigoso pra mim” (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011). Eram pessoas que ministravam cursos católicos e muito capazes de dialogar e negociar, conforme ilustra a fala seguinte: “e lá a polícia chegou pra poder até me prender naquela época, aí eu falei, vou pedir vocês pra ter paciência comigo, tem aqui oitenta pessoas na minha frente e eu não posso sair daqui hoje, mas eu assino um compromisso e segunda-feira eu tô lá, quando foi segunda-feira eu tava lá pra atender ele, atendi direitinho né, aí também eles pegou e falou você tá livre, e pronto” (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011).

O apoio da CPT e da FETAEMG, num processo de negociação, contribuiu enormemente para a legitimidade da organização junto à população. No cenário local, o apoio da Igreja Católica, representada pelo Padre Ernesto e os missionários do Mobon, foi fundamental para a grande intensidade do engajamento e o sentimento de que era uma luta justa e legitimada pela Igreja.

Neste sentido, o Padre Ernesto foi muito importante nessa mobilização: “e o Padre Ernesto entrou nisso pra ajudar, por isso tiraram ele daqui, porque ele entrou de corpo e alma porque ele não tinha medo de nada nem de ninguém e organizou-se o grupo e até hoje moram ali” (entrevista com Maria Antônia, 01/2011). Essa representação do Padre Ernesto como corajoso é muito comum entre os católicos no município; e, ao estimular leigos a se mobilizarem, circulavam informações sobre o fato de que o principal mentor era Padre Ernesto, que seria o principal incentivador da “invasão” das terras da Escola Agrícola.

Isso era algo com que o padre não queria ter seu nome vinculado, pois representava custo de credibilidade junto ao bispo e outros padres, bem como rompimento com elites regionais, que, vez por outra, colaboram com a Igreja Católica. Segundo Padre Ernesto, o motivo da reunião no salão de uma Igreja Católica do município era conscientizar sobre o direito de cultivar a terra:

[…] conscientizar as pessoas sobre o direito que todos possuem de cultivar a terra e de poder assim, tirar dela o sagrado alimento. Não interessavam receber terra, mas sim ter o direito de plantar, para viver dignamente, para não ver os filhos passar fome. Pensaram nas terras da Escola Agrícola de Miraflores - 48 alqueires improdutivos. Por várias vezes, alguns do grupo me perguntaram se eu os apoiaria a cultivar as ditas terras da Escola. Eu respondi que sem saber dos encarregados, não convinha realizar tal projeto. Um dia, o grupo dos ‘Sem Terra’ fez a reunião no salão paroquial da igreja-matriz - eu estava presente. Vi o clamor de todos os sem terra - sem lugar de plantar, sem saber onde arranjar alimento para os filhos. Depois de os ouvir e sentir seus problemas angustiados, respondi que eles estavam certos, naquelas condições mencionadas acima, isto é, utilizar as terras para plantar, cultivar e até dispostos a entregar a terça das produções a que fosse de direito, eu mesmo apoiaria20 20 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 15. .

Padre Ernesto escreveu esse texto no final de 1985, apresentando seu posicionamento junto ao grupo de trabalhadores. Ele procurou legitimar a organização em função da pobreza e das dificuldades pelas quais passavam os trabalhadores. Não obstante, assim como na política partidária, não queria ver seu nome divulgado como se estivesse à frente do movimento ou mesmo tivesse um papel fundamental.

Esse agente se via em dois campos distintos (Bourdieu 2005BOURDIEU, Pierre. (2005), A Economia das Trocas Simbólicas. Organização de Sérgio Miceli. São Paulo: Editora Perspectiva, 6ª ed.), o religioso e o político. No campo religioso, deveria assumir uma função própria de agente clerical de agregar e agradar a todos como forma de acúmulo de capitais. No campo político, a disputa e a divisão são aceitas por fazer parte de sua lógica, algo com que o padre não gostaria de se ver vinculado. Esta seria uma forma de manter seu capital religioso, capaz de fornecer-lhe influência junto à população local, ao corpo eclesiástico da Diocese, mas, sobretudo, junto ao Bispo.

Segundo Padre Ernesto, o jornal Diário do Rio Doce o coloca num papel que não era real: “continuou dando notícias falsas. O dia 5 de janeiro, além da pessoa do padre e das referidas jovens, implicou o Sr. Durval Andrade, da CPT regional de Belo Horizonte; Pe. Jerônimo de Poté e Belo Horizonte, Frei Jaime, de Ipatinga e Epaminondas, da FETAEMG, de Belo Horizonte e outros”21 21 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. . Uma das principais lideranças do Mobon, ele foi ao jornal fazer esclarecimentos e passar outra versão dos fatos. Afirmou ao jornal que não havia um grande clima de tensão no município, que o padre e as jovens não tinham programado “invadir” aquelas terras e que a cidade continuava tranquila como sempre foi: “Sua presença na redação, segundo disse, era para esclarecer tais fatos tirando da cabeça de seus conterrâneos o pesadelo de um possível conflito armado conforme alguns fazendeiros andaram comentando. Concluindo disse que o fato somente tomou maiores proporções devido à falta de conhecimento da população de Miraflores sobre a Reforma Agrária”22 22 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. .

Certamente o tema da Reforma Agrária era conhecido, mas era controverso e o cenário nacional de ocupações e disputas políticas influenciava nas questões locais. Os conflitos por terra na região do Vale do Rio Doce propiciavam que não só os trabalhadores rurais tivessem acesso a aliados externos, mas que os fazendeiros do município buscassem aliados.

O clima no município não era dos mais tranquilos. Havia pressão por parte dos fazendeiros e boatos de que homens armados estariam prontos para reagir caso fosse necessário. Não foi gratuita a afirmação do Padre Ernesto de que: “neste fim de ano, surpresas e cruzes estavam me esperando”23 23 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. . Depois da dificuldade em relação à questão dos “Sem-Terra”, na noite de 28 de janeiro de 1986, já era quase meia-noite quando Ambrósio e Zé Antônio24 24 Zé Antônio era uma das principais lideranças de toda a região e residia numa cidade muito próxima a Miraflores. chegaram à casa paroquial de Miraflores.

O delegado e um detetive da cidade vizinha, Engenheiro Caldas, teriam dito a Zé Antônio: “você é amigo deste padre e querem que ele continue vivo, tirem este padre de Miraflores”25 25 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. . Achavam prudente que ele deixasse a cidade; o boato também já corria entre as lideranças religiosas que teriam identificado um homem contratado para matá-lo. Em seguida, o Padre ligou para o seminário e pediu que fossem buscá-lo na cidade no outro dia, pela manhã.

Às 9:30 horas, saí no volkswagem do Mons. Raul, seu reemo. Eu mesmo não sabia o meu endereço. Na casa paroquial, deixei minha irmã e as pessoas que trabalhavam comigo chorando. Eu também estava triste, pensando que, depois de quase 16 anos de trabalho bem dedicado à Paróquia, eu saía daquela maneira. Somente uma esperança eu possuía: Deus. Viajei com Mons. Raul até Taruassu. Aqui o Sr. Bispo, Dom Hélio estava me aguardando, para viajarmos para Governador Valadares a fim de conversarmos com o Sr. Comandante do 6º Batalhão de Polícia Militar e com o Sr. Delegado Regional de polícia26 26 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. .

Ele foi com o Bispo, a principal autoridade religiosa da região, ao Batalhão e à Delegacia para que ficassem cientes da situação, bem como para denunciar a possibilidade do crime e ainda convencê-los de que o Padre era inocente em relação aos “Sem-Terra”. O Bispo escreveu uma nota de esclarecimento para o jornal Diário do Rio Doce falando da importância do padre:

O Bispo Diocesano de Caratinga, a cuja Diocese pertence a Paróquia de Miraflores, sente-se na obrigação moral de prestar os seguintes esclarecimentos através do Diário do Rio Doce: Um dos sinais da vida da Igreja de Miraflores são os numerosos e variados cursos de formação, promovidos ou na Casa Central do Mobon, em Dom Cavati, ou no Salão paroquial de Miraflores e nos diversos salões das Comunidades. A Equipe de Evangelização da Diocese de Caratinga, com a presença e assistência constante de Padre Ernesto tem uma gama variada de diversos cursos de formação para líderes de Igreja, como: A Boa Nova de Evangelho, livros da Bíblia, os Dez Mandamentos, Catequese infantil, Orientações para o casamento, Cooperativismo, café de terra quente, cultivo da terra, etc. É meu dever esclarecer que todo o seu trabalho pastoral, como de toda a Igreja, visa atingir seus objetivos de promoção espiritual e material do Povo por vias pacíficas, à luz da palavra de Deus e do amor e nunca com armas da violência e do ódio. No caso concreto das denúncias de possível invasão de terras da União em Miraflores, após ouvir várias pessoas fidedignas, inclusive o próprio Padre Ernesto podemos afirmar que o Padre Ernesto não incentivou qualquer planejamento de invasão. A bem da verdade por trás de todas as acusações contra o Padre Ernesto, estão algumas pessoas incomodadas com seu trabalho pastoral e por isso interessados em desmoralizá-lo. Assinado: Bispo Diocesano de Caratinga. Esta nota está com a data de 29 de janeiro de 198627 27 Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16. .

Há uma expressa tentativa de tratar mais do trabalho pastoral e vincular a ele os problemas que o padre encontrava no município. Ao afastar o nome do pároco da “invasão”, o Bispo assume o seu papel institucional de proteger o pároco e a Diocese de acusações políticas ou mesmo judiciais. Havia uma tentativa dele de mostrar o quanto era grandioso e importante o trabalho do pároco na formação de leigos naquele município. A nota de esclarecimento buscava ressaltar esse aspecto do trabalho religioso de Padre Ernesto; um indicativo de que não valorizava articulações políticas como fator positivo da sua atuação, pelo menos com a mesma intensidade que a atuação religiosa. A procura era por ressaltar ganhos no campo religioso e mostrar distanciamento do campo político.

A legitimidade do pároco se faz no campo religioso e na sociedade de forma mais ampla, pelo trabalho realizado junto aos leigos. Ele deixou a cidade naquele dia e, mais do que saber se realmente iriam matá-lo ou não, é interessante perceber o grau de tensão que estava o município - onde a violência era iminente. Essa perseguição se apresenta na memória das lideranças religiosas locais; todas falam do momento tenso em que o Padre Ernesto deixou o município, da capacidade de perseguição dos fazendeiros e do grupo adversário ao PT.

A situação no município só ficou mais tranquila quando o senhor Pedrinho Mariano, liderança dos “Sem-Terra” que ministrava cursos pelo Mobon, acostumado a falar em público, convidou os fazendeiros do município com o intuito de tranquilizá-los, afirmando que não tinham nenhum interesse de ocupar as terras deles. Para chegar a tal propósito, teria contado com conselhos do Padre Luiz, que chegou para substituir Ernesto. Os dois padres tinham uma relação de proximidade pastoral, conduziam os trabalhos de maneira semelhante e eram próximos do Mobon. A substituição se dera pelo risco de morte que sofria Ernesto e não por diferenças de concepções religiosas e pastorais.

Sr. Pedrinho Mariano enviou um convite aos fazendeiros e proprietários de terras, incluindo as lideranças do Mobon que possuíam pequenos sítios e um que possuía porções maiores de terra, legitimando a atuação do grupo para que fossem à reunião em que seriam esclarecidos os objetivos dos “sem-terra”. Logo no início da reunião, um fazendeiro teria pedido ao Padre Luiz, que substituiu Ernesto, para fazer uma oração. Algo significativo, pois a religiosidade era ponto de aproximação entre os dois grupos que estavam distanciados nas concepções e práticas políticas:

“Padre Luiz, você podia começar com a oração porque acho que já chegou todo mundo”. Aí ele falou: “Eu também sou convidado da reunião!” Aí eles assustaram né [risos], o negócio foi bem organizado bobo, aí eu falei “padre Luiz, faz a oração inicial pra nós começar”, feito, eu comecei a explicar para eles a história minha o que era, quando eu estava no meio da reunião, levantou todos os fazendeiros e me deram um abraço, falaram “oh Nelsinho, a partir de hoje nós somos seus companheiros, e o que você precisar é com nós mesmo, e nós estamos aí pro que der e vier, estamos junto com você”, então todo trabalho que você vai fazer, você tem que ter um tipo de jeito pra fazer, tem que ser tudo na paz, na tranquilidade, e foi o que eu fiz, aí moço (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011).

A presença do Padre na reunião alterava o cenário local, e ele passava a ser o centro das atenções. O pároco legitimar o encontro era muito representativo para os dois grupos e uma garantia de maior tranquilidade ao evento. O padre abriu mão da prerrogativa de conduzir a reunião, o que levou a liderança dos “Sem-Terra” a um maior destaque. As disputas e tensões eram minimizadas pela presença do novo pároco, respeitado e visto como agente importante para ambos os grupos. Se no campo político estavam distantes, no campo religioso eram agentes que tinham proximidades e crenças comuns que facilitaram a aproximação. Se fazendeiros possuíam capital econômico maior, naquele contexto obter capitais religiosos pelo reconhecimento do pároco não era algo dispensável, uma vez que, apesar de o trânsito de capitais de um campo ao outro não ser automático, ele é possível (Bourdieu 2005BOURDIEU, Pierre. (2005), A Economia das Trocas Simbólicas. Organização de Sérgio Miceli. São Paulo: Editora Perspectiva, 6ª ed.).

O relato da liderança passou por questões morais religiosas, e sua narrativa era de tranquilidade após a reunião, pois teriam estabelecido parcerias:

Eu disse pra eles que eu tava correndo atrás de uma terra que não tava beneficiando a ninguém, então que ela ia beneficiar dezesseis famílias e que ia beneficiar eles também, aí abaixaram a cabeça, de fato vai ajudar nós mesmo, por resto eles já tava buscando a cana pra tratar do gado, que nós vendia pra eles, milho, nós vendia pra eles né… por resto até trator deles eles mandava pra fazer serviço de graça pra nós aqui, então é por aí que a gente toca as coisas (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011).

Uma questão que chama atenção é o fato de ser um movimento articulado para além das fronteiras do município, mas que procurava não ser associado ao MST. Tratava-se dos “Sem-Terra” de Miraflores: “que foi o ‘SEM TERRA’, não era um movimento que foi criado com o MST, foi uma associação criada junto com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, junto com a FETAEMG né, e junto também com a igreja do jeito que a gente fez ela, aí resultado, foi criada aqui a ‘Associação Agrícola dos Sem Terra de Miraflores’” (entrevista com Pedrinho Mariano, 01/2011).

Em termos de interação com organizações externas, destacam-se as menções às entidades sindicais. Integrantes da Federação de Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (FETAEMG), entidade sindical filiada à Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), acentuaram seu envolvimento nas ações de luta pela terra nesse período, especialmente a partir de 1981 com a retomada do conflito de Cachoeirinha (Varzelândia/MG), organizando e apoiando uma série de ocupações de terra em várias regiões do estado (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.). É possível que a atuação da FETAEMG tenha contribuído para a constituição de novas significações nesse contexto local, possibilitando que os trabalhadores rurais articulassem suas demandas por terras específicas com bandeiras mais amplas, ascendentes nesse período, como a reforma agrária, o combate à desigualdade social, a democratização política etc.

O processo vivido em Miraflores foi pautado também por questões religiosas, numa lógica organizacional e moral muito própria aos agentes religiosos. Os párocos sempre entravam em cena nos momentos de tensão e negociação. As reflexões de Novaes (2002NOVAES, Regina Reys. (2002), “Crenças religiosas e concepções políticas: fronteiras e passagens. In: C. Fridman. Política e Cultura: século XXI. Rio de Janeiro: Editora Relume Dumará.), sobre as disputas por terra no Nordeste, mostram que quando bispos e párocos intervinham, dando legitimidade aos trabalhadores, estes ganhavam maior respeito junto aos governantes, contribuindo para a não utilização de violência pelos fazendeiros. Nesse sentido, ela afirma que se pode dizer que há uma “cultura brasileira católica”, em que uma de suas expressões se dá no “reconhecimento social da autoridade moral do clero católico” (Novaes 1997:5).

A religiosidade, que, em certa medida, aproximava os adversários (sem-terra e fazendeiros), possibilitou certa segurança às lideranças perante as perseguições e a violência habituais, mas também pode ter amortecido suas possibilidades de radicalização do enfrentamento contra as relações de poder locais.

Mesmo entre as próprias mobilizações do MST encontramos relatos que apontam como a religiosidade, estimulada principalmente pelos agentes das CEBs e da CPT, em certo momento se tornou um obstáculo para os anseios de radicalização desse movimento (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.). Outros estudos apontam no mesmo sentido:

No entanto, por outro lado, há que constar também as limitações das CEBs e da CPT como “intelectuais orgânicos das classes trabalhadoras do campo”, constituindo-se como organismos da Igreja que trazem no seu bojo, as suas contradições e seus limites. Estes estão, fundamentalmente, na visão de sociedade que tem a Igreja: visão essa que nega o conflito e se assenta na harmonia, na comunhão entre irmãos, na sociedade como comunidade eclesial. E se reforçam no caráter universalista da missão da Igreja, que lhe impede de levar até as últimas consequências a sua “opção pelos pobres”, e a sua identificação radical com as classes oprimidas (Muls 1989MULS, Nair Costa. (1989), Trabalho, Consciência e Luta: a formação do proletariado rural em Minas Gerais. São Paulo: Tese de Doutorado em Sociologia, PUC-SP.:166).

Ainda entre os setores mais progressistas da Igreja Católica podemos identificar essa tensão. Apesar de a Teologia da Libertação trazer uma postura crítica em relação ao acúmulo desproporcional de riqueza, sendo um pensamento fortemente mobilizador para os grupos subalternos, outros valores católicos - como, por exemplo, o de fraternidade - colocam limites aos embates mais radicais. A concepção de que não “invadiriam terra dos outros”, mas iriam trabalhar naquelas terras e até fazer parcerias com fazendeiros, como vender cana e ter cooperação, tranquilizou os ânimos no município.

Considerações Finais

Este texto contribui para o debate sobre as dimensões de relações entre religião e política, uma vez que a religião teve papel importante nos processos de mobilizações sociais e houve uma politização de eventos religiosos. Neste sentido, nos coadunamos com a concepção de que as fronteiras entre religião e política não são estanques e impermeáveis, e que é fundamental reconhecer as especializações de cada uma sem reificar o político como lócus da razão e o religioso como lócus do simbólico: “Trata-se, antes, de aprender os efeitos da religião sobre a política e vice-versa” (Novaes 2002NOVAES, Regina Reys. (2002), “Crenças religiosas e concepções políticas: fronteiras e passagens. In: C. Fridman. Política e Cultura: século XXI. Rio de Janeiro: Editora Relume Dumará.:63).

Neste estudo, percebeu-se que a formação de lideranças religiosas com o propósito de que organizassem suas comunidades potencializou a emergência de lideranças políticas que carregavam consigo linguagens, rituais e concepções próprias do universo religioso para suas disputas. O convite de fazendeiros para fazerem reunião junto ao pároco era uma dimensão de como o simbolismo religioso se adentrava nas dimensões políticas e como a política estava sendo introduzida em lugares religiosos. Tratava-se de uma relação complexa em que as fronteiras entre os campos religiosos e políticos eram de difícil delimitação.

Pelo menos desde a década de 1980, muitos atores religiosos entraram em cena na política partidária, e, em todas as eleições, é recorrente a necessidade de diálogos com instituições e atores religiosos. Alguns estudos, como o de Vital da Cunha, Lopes e Lui (2017VITAL DA CUNHA, Christina; LOPES, Paulo Victor Leite; LUI, Janayna. (2017), Religião e Política: medos sociais, extremismo religioso e as eleições de 2014. Rio de Janeiro: Henrich Böll: Instituto de Estudos de Religião.) e Mariano e Gerardi (2019MARIANO, Ricardo; GERARDI, Dirceu André. (2019), “Eleições Presidenciais na América Latina em 2018 e ativismo político de evangélicos conservadores”. Revista USP, nº 120: 61-76.), têm mostrado a importância do conservadorismo religioso nas eleições mais recentes. Esta pesquisa contribui para a visibilidade de que as relações entre religião e política se deram de forma contundente na constituição de Movimentos Sociais de esquerda que tiveram, necessariamente, que negociar pautas com agentes religiosos.

Isso foi intensificado com o processo de redemocratização que abriu novas oportunidades de mobilização. Porém, suas possibilidades de efetivação variaram de acordo com as relações de poder em cada contexto específico. Numa região marcada por intensos conflitos pela terra, nos quais a violência extrema de fazendeiros e policiais contra trabalhadores rurais se destaca, ocupar terras na década de 1980 ainda era um grande risco. Mesmo nos anos 1990, quando o MST já havia construído maior legitimidade e reconhecimento nacional e internacional, esse movimento teve dificuldades para realizar suas primeiras ocupações de terra no Vale do Rio Doce, em vista da força dos fazendeiros e da apreensão dos trabalhadores rurais, que tinham em suas memórias a opressão de décadas (Zangelmi 2014ZANGELMI, Arnaldo J. (2014), Traduções e Bricolagens: mediações em ocupações de terra no Nordeste Mineiro nas décadas de 1980 e 1990. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, CPDA/UFRRJ.).

Vale destacar o importante papel do movimento sindical, que buscava atuar para além de suas atribuições assistencialistas, tornando-se mais diversificado e aderindo à luta pela reforma agrária de modo mais intenso. Também merecem destaque setores da Igreja Católica que, mesmo em contextos adversos, impulsionaram uma série de mobilizações, estando na origem de grande parte dos movimentos populares da década de 1970 até a atualidade.

Especialmente a dinâmica do Mobon, originário do campo religioso, impulsionou a conquista de conhecimentos próprios do campo político, principalmente concernentes às habilidades de liderança, propiciando que esses atores tivessem mais possibilidades de mobilização. Como vimos, apesar de relativa autonomia, os capitais de cada campo podem ter influência mútua, assim como os limites de cada campo são objeto de disputa. Vários agentes sociais, a rigor excluídos, visam exercer influência no campo político, colocando em constante tensão a definição de suas fronteiras (Bourdieu 2005BOURDIEU, Pierre. (2005), A Economia das Trocas Simbólicas. Organização de Sérgio Miceli. São Paulo: Editora Perspectiva, 6ª ed., 2007BOURDIEU, Pierre. (2007), O poder simbólico. Tradução Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 11ª ed.).

Em Miraflores, a religiosidade foi elemento fundamental, tanto para a legitimação das novas formas de luta quanto para possibilitar uma pequena margem de segurança para as lideranças. Por outro lado, ao aproximar trabalhadores e fazendeiros em torno de valores como os de fraternidade, comunhão etc., pode ter também colocado limites para que os trabalhadores rurais realizassem um enfrentamento mais intenso e desencadeassem um fluxo de ocupações na região.

No entanto, a mobilização em Miraflores trouxe conquistas sociais e políticas significativas. Os trabalhadores não ocuparam as terras pelo contingente policial que lá estava, mas conseguiram a sua legalização por vias institucionais e atuação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Eles só viveram naquelas terras e construíram suas casas com a documentação legalizada. A pressão e a intenção de ocupação dos “Sem-Terra” foram importantes ingredientes de estímulo à organização político-partidária no município.

Quando o Padre Ernesto saiu, já tinha lançado “as bases” políticas para a formação do diretório do PT. Este foi estruturado, basicamente, por lideranças religiosas de comunidades rurais do município, em 1986. Essas lideranças religiosas se constituíram politicamente, de forma mais explícita, a partir da fundação do diretório do partido. Tratou-se de um processo advindo de organização religiosa, em que os argumentos, articulações, legitimidade e mecanismos de mobilização passavam pela Igreja Católica. Foi um processo que teve início potencializado em reuniões e ensinamentos de um pároco, Padre Ernesto, e que tiveram desfecho na reunião com fazendeiros com outro pároco, Padre Luiz, ambos considerados progressistas da Igreja Católica.

O ocorrido foi uma importante conquista de trabalhadores rurais do município, que conseguiram terras para plantar e criar suas famílias. O distanciamento do MST foi sentido em algumas conversas informais em que se destacava que não se estava ocupando terras de “ninguém”. Tratava-se um discurso mais fácil de ser aceito pelos fazendeiros que não veriam suas terras em “risco”, bem como era tido como demandas mais justas para as famílias mobilizadas. Isso também contribuiu para que tivessem maior legitimidade junto à população do município.

Essas são formas de luta pela terra com pouca evidência, por não serem emblemáticas para os principais movimentos que demandam reforma agrária, fugindo de suas ações típicas e, muitas vezes, das que desejam estimular. Movimentos como o MST acabaram por influenciar lutas muito além de seu conhecimento e controle, diversidade importante e que ainda carece de estudos, em vista dos diversos processos que, em muitos casos, são negligenciados por não terem seus impactos reconhecidos no processo mais amplo de luta pela terra.

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    » http://www.mobon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=54&Itemid=42
  • Entrevista com José Maria, outubro de 2009.
  • Entrevista com Maria Antônia, janeiro de 2011.
  • Entrevista com Pedrinho Mariano, janeiro de 2011.

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    Este artigo é um desdobramento da tese de doutorado. Naquele contexto, alguns dados não puderam ser devidamente trabalhados, e novas leituras e reflexões inspiraram a escrita deste artigo.

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    Utilizamos um codinome da cidade como tentativa de preservar a identidade das pessoas que lá habitam. Esta é uma maneira de evitar que antigos conflitos venham à tona. No mesmo sentido, preservamos os nomes das pessoas que gentilmente contribuíram com seus relatos, a quem agradecemos e dedicamos este artigo. Os nomes de Durval Ângelo e Raul Messias são verdadeiros e citados como atores políticos importantes, mas não há relato deles. Nomes reais do Bispo e dos Padres também não são mencionados por representarem agentes da Igreja Católica que viveram situações conflituosas naquele contexto.

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    Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

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  • 4
    A sede a que se refere o Padre é a principal igreja da paróquia, localizada na principal praça do município.

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  • 5
    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 7.

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  • 6
    O nome do movimento é oriundo de um curso ministrado na comunidade, denominado Boa Nova do Evangelho, que representaria “a chegada do Reino, Reino de Libertação e de Esperança” (Kerandel e Del Canto 1977:26KERANDEL, Jean; DEL CANTO, Luis Mario. (1977), Evangelizacion y promocion en Comunidades Eclesiales de Base (medio rural), Brasil. Medellín: Instituto Pastoral del CELAM.).

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  • 7
    As principais regiões de atuação do Mobon eram a Zona da Mata, em localidades próximas ao município de Muriaé/MG, e a região do Vale do Rio Doce, em localidades entre os municípios de Caratinga/MG e Governador Valadares/MG.

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  • 8
    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 7.

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  • 9
    “Movimento da Boa Nova do Evangelho - Em toda a Paróquia (sede e igrejas filiais) estão sendo ministrados cursos de: Base, Boa Nova, O Evangelho na Vida, Fidelidade ao Evangelho, Treinamento e Aprofundamento, Curso de Bíblia, cursos de: Natal e Semana Santa, cursos sobre Apocalipse - todos estão sendo ministrados ininterruptamente. Todos estes cursos são encerrados, tanto na sede como na capela, filiais, com a celebração da Semana Santa.” (Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 6).

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  • 10
    Material de Cora Furtado de Melo.

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  • 11
    A descentralização da paróquia era limitada, já que a sede principal continuava sendo a referência, bem como o poder das lideranças era restrito, dependente da legitimidade do pároco, mas nem por isso esse processo deixava de ter profunda importância. A adesão aos propósitos do Mobon também encontrava limitações, de modo que o sucesso dessa atuação era sempre relativo (Oliveira 2012).

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  • 12
    Disponível em: http://www.mobon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=54&Itemid=42MOBON. Mobon Movimento Boa Nova. Disponível em: Disponível em: http://www.mobon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=54&Itemid=42 . Acesso em: 15/04/2011.
    http://www.mobon.org.br/index.php?option...
    . Acesso em: 15/04/2011.

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  • 13
    Entrevista concedida por José Maria, em outubro de 2009Entrevista com José Maria, outubro de 2009.. José Maria participa dos cursos do Mobon desde o início da década de 1970. Coordenou comunidades, foi coordenador geral da paróquia, membro fundador do PT e exerceu cargo de vereador entre 1996 e 2000.

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  • 14
    Informações baseadas no livro de atas do diretório municipal do PT, 5 de abril de 1987, nº 1, p. 2.

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  • 15
    Para mais informações sobre esse processo na região, ver Espindola (2010ESPINDOLA, Haruf S. (2010), “Apropriação de Terras Devolutas e Organização Territorial no Vale do Rio Doce: 1891-1960”. In: J. L. N. Abreu; H. S. Espindola. Território, sociedade e modernidade. Governador Valadares: Ed. Univale. ), Muls (1989) e Ribeiro (1996RIBEIRO, Eduardo Magalhães. (1996), Lembranças da terra: histórias do Mucuri e Jequitinhonha. Contagem: CEDEFS., 2010RIBEIRO, Eduardo Magalhães. (2010), “Agregados e fazendas no nordeste de Minas Gerais”. Estudos Sociedade e Agricultura, vol. 18, nº 2: 393-433. ).

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  • 16
    Eles não tinham vínculo com o nacional Movimento dos Sem Terra (MST). Há fotos de notícias de jornal e de uma liderança, na figura 4, página 289, em Oliveira (2012).

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  • 17
    Entrevista concedida por Maria Antônia, em janeiro de 2011Entrevista com Maria Antônia, janeiro de 2011.. Maria Antônia foi atuante na formação do PT, atuando na militância e parte burocrática do partido. É filha do primeiro presidente do diretório do PT.

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  • 18
    Como já dissemos, havia um histórico de conflitos por terra na região de Governador Valadares, onde se localiza o município de Miraflores.

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  • 19
    Entrevista concedida por Pedrinho Mariano, em janeiro de 2011Entrevista com Pedrinho Mariano, janeiro de 2011.. Destacada liderança religiosa do município, participava dos cursos do Mobon desde a década de 1970 e era uma referência na luta pela terra.

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  • 20
    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 15.

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  • 21
    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

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    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

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    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

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    Zé Antônio era uma das principais lideranças de toda a região e residia numa cidade muito próxima a Miraflores.

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    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

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    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

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  • 27
    Livro do Tombo da Paróquia de Miraflores, nº 3, p. 16.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2018
  • Aceito
    08 Abr 2020
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