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Estratégias de preservação do patrimônio religioso cristão edificado em dois contextos europeus

Strategies of endangered religious heritage buildings

Resumo

Este artigo discute estratégias de preservação do patrimônio religioso cristão, especificamente protestante e católico, em um cenário marcado pela secularização e desinstitucionalização religiosa. O retraimento das congregações e o consequente esvaziamento de igrejas protestantes e católicas acarretam uma necessidade de repensar os usos das edificações, por se tornarem dispendiosas e obsoletas. Privilegia-se a análise da reutilização dos espaços. A demolição, que consiste em ação mais radical, integra o horizonte de muitas delas. A discussão está baseada em documentos elaborados por instituições religiosas e laicas, na produção acadêmica disponível e no trabalho de campo realizado, particularmente, na Inglaterra e na Holanda.

Palavras-chave
patrimônio religioso; preservação; novos usos

Abstract

This article discusses strategies for the preservation of Christian religious heritage, specifically Catholic and Protestant, in a context marked by secularization and religious deinstitutionalization. The retraction of congregations and the consequent emptying of churches come out with the need of rethinking the uses of such buildings, which become expensive and obsolete. We put emphasis on the analysis of their different uses, not just focus on demolition, the most radical action. The argument is based on documents from lay and religious institutions, available academic literature and fieldwork in two European countries, specifically England and The Netherlands.

Keywords
religious heritage; preservation; new uses

Se o sentido de tempo vivido está sendo renegociado nas nossas culturas de memória contemporâneas, não devemos esquecer de que o tempo não é apenas o passado, sua preservação e transmissão. Se nós estamos, de fato sofrendo de um excesso de memória, devemos fazer um esforço para distinguir os passados usáveis dos passados dispensáveis (Huyssen 2000HUYSSEN, Andreas. (2000), Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos e mídia. São Paulo: Aeroplano.:37).

Notícias de vendas, demolições e novos usos para edificações religiosas cristãs em vários países europeus visibilizam o processo de secularização, já vastamente discutido nas ciências sociais1 1 No Brasil, tal movimento não é relevante, ao menos não em termos de visibilidade. Ao contrário, vemos um acelerado processo de construção de edificações religiosas ou a transformação de espaços laicos em igrejas (cinemas e supermercados, mais permanentemente), assim como cada vez mais identificamos a presença do religioso em equipamentos urbanos, como parques, praias e estádios (Gomes 2011, 2009). . As chamadas “redundant churches” pelas instituições abordadas neste artigo, aquelass dispensáveis e obsoletas, estão na paisagem e ocupam lugares centrais nas cidades. Em grande parte, são suntuosas, datadas de várias décadas ou séculos, detentoras de diferentes estilos arquitetônicos. Estas não evidenciam, imediatamente, aos que por elas passam, o processo de esvaziamento e desuso, que pode provocar até seu descarte2 2 Este artigo resulta do projeto de pesquisa “Arquitetura e objetos: “novos” espaços e versões do sagrado”, desenvolvido por Edlaine de Campos Gomes, com bolsa de pós-doutorado júnior, CAPES, 2012/2013, no Centro de Estudos Latino-americanos (CLAS - University of Cambridge), sob a supervisão de David Lehmann. A pesquisa continuou após esse período em parceria entre as autoras .

É esse processo que está em pleno andamento, sobretudo em países europeus, no que tange ao patrimônio religioso edificado cristão. Movimentos civis de preservação são organizados para combater o avanço da perda, vista como irreparável, de um vasto número de edificações religiosas, de distintas épocas. Portanto, é também um processo que abarca variados interesses, que podem ou não envolver controvérsias e conflitos. Quais construções devem ser preservadas e em que termos? Quais são dispensáveis, preservadas ou demolidas? Quais os atores e as disputas que emergem nesses processos? Estas são perguntas que não escapam a esse debate.

O retraimento das congregações e o consequente esvaziamento das igrejas acarretam uma necessidade de repensar os usos das edificações, que se tornam dispendiosas3 3 O processo de secularização, a laicização e o desencantamento (Weber 1992) inferem novos contornos à configuração e inserção das instituições religiosas no espaço público – inclusive se considerada a imprecisão da fronteira entre religioso e não religioso no ocidente moderno (Asad 1993), e os processos concomitantes de secularização e dessecularização (Berger 1999). . Este artigo discute estratégias de preservação do patrimônio religioso cristão, particularmente protestante e católico, em dois contextos europeus: o inglês e o holandês. Ambos marcados pela secularização e desinstitucionalização religiosa. A análise foi desenvolvida com base em documentos elaborados por instituições religiosas e laicas, pela produção acadêmica disponível e pelo trabalho de campo empreendido nesses países. Foram realizadas visitas a igrejas, escolhidas previamente a partir dos dados coletados na pesquisa documental, incluindo acesso aos sites das instituições e por meio de notícias na imprensa. A opção metodológica foi a observação do funcionamento de espaços, que já haviam sofrido processo de incorporação de novos usos, mesmo que também funcionassem para fins religiosos originais, alguns destes sendo apresentados no decorrer de nossa argumentação. Em algumas situações, foi possível realizar conversas informais com representantes dos locais visitados e frequentadores, o que serviu de complementação à observação. Neste artigo, o enfoque será nos casos que apresentam como estratégia de preservação o compartilhamento dos espaços das edificações identificadas, em Cambridge, Inglaterra, e, como contraponto ao caráter já consolidado do reuso, o caso de uma igreja em Haia, na Holanda, cujo tenso processo de dispensabilidade se encontra em andamento.

Patrimônio religioso edificado em questão: reuso, memória e jogos de interpretações

Qualificar a dinâmica uso-desuso-descarte, por um grupo específico, e reuso-adaptação-ressignificação, por outro grupo ou indivíduos, é útil para compreender o amplo processo que leva à reconfiguração das novas funções incorporadas às edificações religiosas. Estas não necessariamente apagam o chamado espírito do lugar, termo adotado por agências de preservação4 4 Documentos oficiais da Unesco e outras entidades, direta ou indiretamente, trazem a noção de “espírito do lugar”, o que significa a vida, a natureza espiritual e social do patrimônio religioso. Cerca de 20% da lista das propriedades inscritas como patrimônio mundial está relacionada, de alguma maneira, ao aspecto religioso ou espiritual (http://whc.unesco.org/en/religious-sacred-heritage/#Kyiv; acesso em: 10/06/2017). O documento observa que: “o espírito do lugar é constituído de elementos materiais (sítios, paisagens, edificações, objetos) e imateriais (memórias, depoimentos orais, documentos escritos, rituais, festivais, ofícios, técnicas, valores, odores), que servem todos de maneira significativa para marcar um lugar e lhe dar um espírito” (ICOMOS 2008:3). , pois as lembranças permanecem vivas, rememoradas e transmitidas pelos que ali construíram suas memórias. Além disto, os lugares podem também se transformar em sujeitos (Assmann 2011ASSMANN, Aleida. (2011),Espaços da recordação: formas e transformações da memória cultural. Campinas: Editora da Unicamp.:317), como marcos referenciais do entorno e de grupos. Assim, uma igreja considerada redundante, que passa a ter novas funções, mesmo que tenha passado por um rito de dessacralização oficial, pode continuar a ser percebida como sagrada por determinados grupos, que se fixarão em suas lembranças, ainda que materialmente existam apenas vestígios e ruínas do que foi anteriormente. Neste sentido, o valor do lugar como “espaço de recordação”, ou mesmo como “lugar traumático” (Assmann 2011:361), está relacionado à ressonância e relevância que a preservação dessa memória tem para o grupo, ou grupos, e seus integrantes. No entanto, Assmann (2011:360), ao discutir a aura em Walter Benjamin, observa que:

[…] um local dotado de aura não traz promessa de algo imediato; mais que isso, é um local em que se podem perceber sensorialmente o afastamento e a distância irrecuperável do passado. O local da recordação é de fato uma “tecitura incomum de espaço e tempo”, que entretece presença e ausência, presente sensorial e o passado histórico. Se a marca da autenticidade é a ligação entre o aqui e o agora, então o local da recordação como aqui sem um agora, não passa de autenticidade parcial. Longe de unir as duas metades, o local da recordação insiste em mantê-las separadas como aqui e outrora.

Pessoas sentem diferentemente a experiência no e com o lugar. Em se tratando de templos religiosos em desuso, por diferentes motivos, por exemplo, em restaurantes, hotéis, condomínios de apartamento, entre outros, há que se refletir sobre que tipos de vínculos existem antes e após a transformação, que podem ser históricos, afetivos, econômicos, políticos. No enfrentamento do processo de obsolescência ocorre, ainda, a necessidade de considerar diversos aspectos, para além do mais instrumental, sua mera manutenção material. É neste sentido que a centralidade decisória das congregações sobre o patrimônio religioso local é apontada em vários documentos. No entanto, como será abordado posteriormente neste artigo, as negociações e interpretações sobre patrimônio e preservação dos diversos atores envolvidos não prescindem de tensões e conflitos. Perda e risco emergem como noções importantes no debate, conforme sugere Gonçalves (2005______. (2005), “Ressonância, materialidade e subjetividade: as culturas como patrimônios”. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 11, nº 23: 15-36.). Essa dinâmica que pressupõe escolha, classificação e preservação ou não dos bens está intimamente associada a quem detém o poder de nomear o que deve ou não ser preservado ou lembrado.

Existem concepções e regimes distintos, que orientam as ações concernentes ao chamado patrimônio religioso5 5 Estudos e análises relativos ao patrimônio religioso e aos locais sagrados foram realizados pelas organizações consultivas – International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property (ICCROM), International Council on Monuments and Sites (ICOMOS) e International Union for Conservation of Nature (IUCN). Ocorreram fóruns e seminários para discutir especificamente esse tema, marcadamente, o fórum realizado em 2003, organizado pelo ICCROM, e o Seminário de Kyiv, promovido pela UNESCO, em 2010. Estas instâncias elaboraram ações e recomendações sobre o patrimônio religioso e sagrado. : instituições governamentais, não governamentais, religiosas, laicas, associações de bairro, comunidades, congregações, entre outras. Estão em vigência diretrizes internacionais, reconhecidas pelos países signatários, que visam à preservação de bens materiais e imateriais desse tipo. No entanto, há níveis de impactos e ressonâncias distintas, que são sentidas e ressignificadas localmente. Ocorrem tensões entre as perspectivas adotadas por cada uma dessas instâncias de deliberação. As instituições e comunidades religiosas são vistas pelas diretrizes e recomendações oficiais como responsáveis imediatas pela preservação de seu patrimônio, como apontam as resoluções e recomendações dos organismos de patrimonialização. A responsabilidade recai, assim, naqueles que o vivenciam e compartilham os dissabores de vê-lo esvaziado, sem recursos e tornando-se redundante em relação às suas funções originais. As lideranças eclesiásticas responsáveis pela formulação interna sobre o reordenamento do patrimônio em desuso também reconhecem o papel das congregações de membros locais. Porém, parece que estas se constituem como a parte mais frágil de toda essa cadeia de relações e ações, que envolve o poder decisório sobre a preservação de seu espaço de culto. Apesar disso, devem se submeter às regras oficiais, além do fato de ocorrer um processo de negociação interno, que evidencia disputas de sentido sobre o patrimônio religioso. Preservar para quem, por quê e de que maneira?

O dever de memória é um componente central nas ações e discursos veiculados pelos atores sociais envolvidos nos debates sobre patrimonialização, sobretudo referente ao campo religioso. Leva-se em conta que “os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não há memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são naturais” (Nora 1993NORA, Pierre. (1993), “Entre memória e história: a problemática dos lugares”. Projeto História, São Paulo, nº 10: 7-28.:13). Os templos são lugares de memória, arquivos compostos pelas memórias materiais e imateriais de suas respectivas comunidades ou congregações. Constituem a paisagem e, muitas vezes, extrapolam os limites do grupo, compondo a memória local, regional ou até nacional. É no momento da decisão do que é redundante ou não que os diversos significados do patrimônio religioso entram em disputa, em nosso artigo particularmente o edificado. Nota-se que também ocorrem estratégias de preservação, nas quais o importante é preservar o prédio, como bem material, seja pela instituição e comunidade religiosa, seja pelo interesse social mais amplo, como patrimônio histórico, por exemplo, mas não com sua função original (embora para alguns o sagrado permaneça inscrito no local).

Nestes termos, observa-se uma convergência com o que Gonçalves (2005______. (2005), “Ressonância, materialidade e subjetividade: as culturas como patrimônios”. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 11, nº 23: 15-36.:30) ressalta: “o sentido fundamental dos ‘patrimônios’ consiste talvez em sua natureza total e em sua função eminentemente mediadora”. Nessa relação, cabe incluir, como categoria fundamental, a autenticidade. No que se refere ao patrimônio comum, tangível e intangível, são indissociáveis. Tal implicação constitui o suporte identitário para as respectivas comunidades religiosas.

Considera-se que a utilização de edificações religiosas para outros fins não é novidade, a história mostra que seus usos foram múltiplos e impulsionaram o debate sobre preservação do patrimônio edificado. Ao analisar os discursos sobre o patrimônio em sua concepção moderna, Choay (2001CHOAY, Françoise. (2001), A alegoria do patrimônio. São Paulo: Unesp.) identifica a Revolução Francesa como período paradigmático, notadamente no que se refere às edificações religiosas. Pergunta: “o que fazer com as igrejas?”. À época, o gótico e as edificações religiosas representavam o que deveria ser superado ou laicizado6 6 Duby (1988) indica que, entre os séculos XI e XIV, houve um investimento significativo na construção de catedrais por toda a Europa, promovendo uma junção entre arte e sociedade, para analisar o que nomeia como “tempo das catedrais”. De acordo com Choay (2001:105), com a Revolução Francesa “as catedrais e as igrejas que, em muitos casos, haviam perdido seus telhados foram antes convertidas em depósitos de munição, de salitre ou de sal e, dependendo do caso, também em mercados, enquanto os conventos e abadias eram transformados em prisões, como Fontevrault, em casernas”. . Demolir? Reutilizar? Preservar?

Em tempos atuais, nos quais há uma espécie de aceleração desse processo, com um aumento do número de edificações consideradas redundantes, obsoletas ou em risco, abre-se de novo na história a necessidade de discussões sobre essa temática, desde as internas, empreendidas pelas instituições religiosas, às mais gerais, realizadas por órgãos governamentais e não governamentais ligados a esse campo. Porém, apesar de o chamado patrimônio religioso edificado, marcadamente as igrejas (católicas e protestantes), permanecer na paisagem de diferentes cidades, ele nem sempre é mais do que parece ser. Esse jogo de perspectivas ou interpretações sobre a natureza do lugar gera estranhamento e curiosidade midiática. Em setembro de 2011, por exemplo, uma notícia trouxe a seguinte chamada: “Antigas catedrais abrigam hotéis, livrarias e até discotecas na Europa”7 7 Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/09/antigas-catedrais-abrigam-hoteis-livrarias-e-ate-discotecas-na-europa.html. Acesso em: 5/10/2013. . O fato ilustra como se opera o jogo de interpretações: “As fachadas são conservadas, mas no coração das velhas igrejas batem os martelos da modernidade. Os templos são convertidos em condomínios de apartamentos, discotecas e hotéis”. Nota-se que a prática de transformar os usos de templos religiosos é disseminada em distintos países e chama a atenção de pesquisadores, principalmente aqueles ligados ao setor do planejamento urbano e preservação. Trabalhos como os de Powell e De La Hey (1987POWELL, Ken e DE LA HEY, Celia. (1987), Churches: a question of conversion. London: Save Britain’s Heritage.), Kiley (2004KILEY, Christopher John. (2004), Convert The Adaptive Reuse of Churches. Ithaca, NY: Master Degree, B. S. Urban and Regional Planning, Cornell University.) e Lueg (2011LUEG, Rebecca. (2011), Houses of God... or Not?! Approaches to the adaptive reuse of churches in Germany and United States. College Park, MD: Master of Historic Preservation, University of Maryland.) apresentam o cenário dos novos usos para as edificações religiosas, diante de sua “redundância”.

Há que se considerar vários aspectos, para além do religioso. Esses “lugares de memória” religiosa estão no registro da especulação imobiliária, mas também no contexto da secularização, da desinstitucionalização, do trânsito religioso, da perda de fiéis. Novos usos ou demolições estão no horizonte de várias dessas edificações, dependendo de certos fatores, como localização, condições estruturais, representatividade e autenticidade. Preservar algumas delas pode estar diretamente vinculado à sua ocupação por atividades distintas da religiosa, já que se torna dispendiosa para a comunidade a manutenção de sua funcionalidade, principalmente pela queda significativa do número de membros. As negociações em relação à preservação desses espaços consideram algumas possibilidades: manutenção das funções religiosas originais, compartilhamento do espaço com outras instituições religiosas, ou mesmo com instituições não religiosas, vender ou alugar para atividades diversas, e até indicar a demolição. Todos esses possíveis caminhos foram identificados durante a pesquisa. Vale referir que cada tipo de uso ou reuso possui particularidades que, por si só, merecem estudos específicos.

O formato é de “igreja”, mas o conteúdo pode ser preenchido por skatistas, escaladores, estudantes de artes circenses, consumidores de restaurantes, moradores, entre outros. “A igreja não é somente o lugar onde se reúnem os fiéis e o recinto no interior do qual não penetram mais as influências dos meios profanos” (Halbwachs 1990HALBWACHS, Maurice. (1990), Memória Coletiva. São Paulo: Vértice.:156). Mesmo que esta inferência de Halbwachs esteja inserida em outra época e contexto, serve para o atual panorama do patrimônio religioso edificado em alguns países europeus, em particular, pela necessidade de reordenamento, desmonte e, até, de descarte. A estabilidade e o equilíbrio manifestados nesses lugares de memória (Halbwachs 1994), e, consequentemente, a sensação de segurança e unidade do grupo religioso, já não se mostram tão certos quando ocorre o processo de obsolescência.

Preservação, regras e dispensabilidade: o caso da Igreja Anglicana no Reino Unido

Diante de igrejas e outras edificações que se tornam redundantes ou dispensáveis, por diversos motivos, instituições religiosas como a Igreja Anglicana (da Inglaterra, Escócia, País de Gales, Irlanda do Norte) e a Igreja Católica (Holanda), por exemplo, estabelecem diretrizes e critérios que orientam o processo de identificação do que é dispensável e do que é indispensável. No que tange ao chamado Reino Unido, é central o documento “Pastoral Measure” (1983) da Igreja Anglicana8 8 Disponível em:http://www.legislation.gov.uk/ukcm/1983/1. Acesso em: 05/01/2017. , no qual constam orientações e resoluções sobre medidas a serem adotadas em caso de perda da utilidade original de igrejas. Reconhece, portanto, que um templo religioso pode deixar de sê-lo e, assim, assumir novas funções. Trata-se de um processo organizado e orientado por decisões institucionais, por meio de debates, estabelecimento de comissões, até que se chegue à “declaração de redundância” do bem imóvel em questão. Tal procedimento na Igreja Católica da Holanda é semelhante ao da Igreja Anglicana no Reino Unido em algumas etapas, especialmente no que se refere à uma reflexão coletiva e cuidadosa da manutenção ou fechamento de igrejas. Porém, dado o caráter hierárquico e centralizado no interior da Igreja Católica, cabe ao bispo assinar o documento decisório de “dessacralização” das futuras igrejas em descarte, tornando-as disponíveis para fins profanos9 9 Ver www.raadvankerken.nl/pagina/1894/kerkverkoop_is_maatwerk. Acesso em: 16/01/2018. .

O debate da situação no Reino Unido segue com outros documentos. O estudo elaborado pela Scottish Civic Trust (“New uses for former church buildings”)10 10 O estudo foi realizado pela Associação Cívica Escocesa de Proteção do Patrimônio, intitulado “Novos usos para antigas igrejas”. parte do panorama de que as mudanças são dramáticas, no qual é lugar comum a dispensabilidade das edificações religiosas e as demolições (2006THE SCOTTISH CIVIC TRUST. (2006), New uses for former church buildings: a study of inspirations and hope. Disponível em: Disponível em: https://www.buildingsatrisk.org.uk/sites/default/files/publications/Churches.pdf . Acesso em: 11/10/2014.
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:2). A publicação tem como objetivo demonstrar a diversidade de possibilidades de novos usos do patrimônio religioso edificado, que em grande parte se encontra em risco. Entre outros dados importantes constantes na publicação, destaca-se que, entre 1978 e 1991, 148 igrejas foram vendidas pela Igreja Anglicana da Escócia, uma média de doze por ano. Somente para exemplificar, em outubro de 2014, esta instituição oferecia para venda cerca de dezoito igrejas em seu site11 11 Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/about_us/property_and_church_buildings/properties_for_sale?property_type=15794. Acesso em: 11/10/2014. . Os valores giravam em torno de £25.000 a £475.000. Para cada propriedade à venda, há folhetos explicativos com fotografias, principais características, orientações sobre regras de patrimonialização, localização, entre outros. Em um dos casos, havia uma especificação de que os vitrais não estavam incluídos na venda e seriam retirados, assim como outros itens12 12 Ver http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0016/23083/BARONY-ST-JOHNS-CHURCH-and-HALLS.pdf. Acesso em: 11/10/2014. . O prédio, construído em 1844, é listado como categoria B13 13 No que diz respeito à preservação do patrimônio, é seguida, basicamente, a seguinte regra de classificação: categoria A - edifícios de importância nacional ou internacional, em termos arquitetônicos ou históricos, com poucas alterações em sua estrutura; categoria B - Edifícios de importância regional ou local, identificado a um determinado período, estilo ou tipo particular, que pode ter sido alterado; categoria C - edifícios de importância local, moderadamente alterados (conferir em: http://www.historic-scotland.gov.uk/index/heritage/historicandlistedbuildings/altering-a-listed-building.htm; acesso em: 20/02/2013). nas regras de proteção do patrimônio escocês. Ao menos uma dessas igrejas possuía autorização para ser demolida, informação especificada no anúncio. Não há dados sobre ela, nem o ano de sua fundação. A leitura do folder de venda suscitava a impressão de que seu passado deveria ser esquecido, diante da possibilidade de demolição.

Não são muito diferentes as orientações produzidas pela Igreja Anglicana da Inglaterra. O documento “New uses for closed church buildings: guidance from the church commissioners for purchasers and lessees” (2012______. (2012), New uses for closed church buildings: guidance from the church commissioners for purchasers and lessees. Disponível em: http://andrewgranger.co.uk/wp-content/uploads/2014/07/494721302789287_New_Uses_for_Closed_Churches.pdf. Acesso em 12/08/2013.
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)14 14 “Novos usos para igrejas fechadas: guia para compradores e inquilinos”. indica que os conteúdos das igrejas postas à venda, ou seja, os objetos que as compõem, só podem ser retirados ou mantidos conforme especificação que consta nos respectivos contratos. Observa-se uma preocupação em afirmar a atenção quanto às possibilidades e regras sobre reformas e utilização, assim como o acompanhamento das autoridades da igreja posteriormente à venda ou ao arrendamento do prédio. As regras consideram, de certa maneira, a preservação do patrimônio. Referem-se principalmente a garantias, concernentes ao respeito dos limites de uso da propriedade, às alterações e demolições, de acordo com o que for autorizado. Vale referir que, em outubro de 2014, o site oficial da igreja15 15 Ver: https://www.churchofengland.org/clergy-office-holders/pastoralandclosedchurches/closedchurches/closed-churches-available.aspx. Acesso em: 13/10/2014. apresentava dezesseis ofertas de igrejas à venda, construídas entre os séculos XII e XX. Em maio de 2016, o mesmo site apresenta 24 propriedades16 16 Ver: https://www.churchofengland.org/clergy-office-holders/pastoralandclosedchurches/closedchurches/closed-churches-available.aspx. Acesso em: 20/05/2017. , anunciadas para venda e aluguel17 17 Em alguns casos, não é só o prédio que está em questão nos processos de desmonte e descarte. Igrejas muito antigas contam com cemitérios, dado relevante, que faz uma conexão entre instituição-descarte-comunidade. Os laços afetivos emergem, nesse contexto particularmente dramático. A orientação é de realização de acordos que permitam acesso público aos que desejarem visitar as sepulturas, além de promover o cuidado dos restos mortais, lápides, monumentos e memoriais. .

Assim, como definir a dispensabilidade ou não do imóvel? Por que salvar uma igreja? Esta é a pergunta feita no documento mencionado da Scottish Civic Trust, que apresenta justificativas e características especiais, como o significado histórico, arquitetônico e cultural, para além das fronteiras institucionais particulares. A autenticidade conferida à construção é evidenciada pela constatação de que, por vezes, é insubstituível na paisagem. Seu significado extrapola o caráter puramente religioso, cravando sua marca, consistindo em referência urbana e rural.

Uma instituição importante nesse âmbito é a organização The Churches Conservation Trust18 18 Associação para a Conservação de Igrejas. (CCT), criada em 1968, inicialmente como Redundant Churches Fund19 19 Fundo para Igrejas em Desuso. , a partir de parceria entre Igreja (Anglicana inglesa), Estado e o setor filantrópico, e aprovada pelo Parlamento. O propulsor, de acordo com os documentos do CCT, foi o apelo de um grupo de entusiastas da proteção do patrimônio religioso, ainda nos anos 1960. Localiza-se neste período o momento de inflexão na Igreja Anglicana inglesa. Muitas de suas edificações passaram a não ser mais usadas, tornaram-se obsoletas, com risco de deterioração e demolição, fato reconhecido pelo documento “Pastoral Measure”, de 1983. Nesse mesmo processo, foi criada a associação Friends of Friendless Churches20 20 Amigos de Igrejas sem Amigos. , atuante na preservação das igrejas do País de Gales. A atuação das comunidades locais também é ressaltada para a “salvação” das igrejas históricas no Reino Unido. O objetivo das ações empreendidas por essas instituições é proteger o patrimônio edificado para as gerações futuras, o que não é tarefa fácil. A coleção de igrejas preservadas da CCT conta com 340 igrejas históricas, classificadas pelo período de fundação, desde o século XI ao XIX, conforme consta em seu site oficial21 21 Ver: https://www.visitchurches.org.uk/ .

Nesse processo de luta pela conservação, evidencia-se uma tipologia para os novos usos de edificações religiosas, conforme as avaliações das instituições religiosas. Nesse âmbito, tempo e negociações de interesses entre os atores envolvidos têm um peso na definição dos novos usos. Uma primeira tentativa de classificação é necessária, para compreensão da reconfiguração dessa coleção22 22 Pomian (1984:53) define coleção como “qualquer conjunto de objetos naturais ou artificiais, mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito das atividades econômicas, sujeitos a uma proteção especial num local fechado preparado para esse fim, e expostos ao olhar do público”. É necessário estar atento às formas específicas das práticas de colecionamento das diferentes sociedades. A categoria coleção é “boa para pensar” não só os objetos, mas também as edificações, como itens colecionáveis, sem perder de vista a complexidade do processo de circulação e as características do que é móvel e imóvel, na chamada sociedade ocidental (cf. Gonçalves 2007; Clifford 1995). de prédios religiosos. Cabe enfatizar que esta pode ser desmembrada e reestruturada, diante da complexidade do fenômeno. Há um conjunto de edificações intocáveis, uma coleção de bens inalienáveis (Weiner 1992WEINER, Annette. (1992),Inalienable possessions: the paradox of keeping-while-giving. Berkeley: University of California Press.) protegida da possibilidade de descarte, por conta da efetiva continuidade das atividades e da própria congregação religiosa e, também, por seu significado e valor arquitetônico e histórico. Nota-se, ainda, aquele que, pelos mesmos motivos, recebe ou compartilha atividades religiosas e/ou laicas para sua preservação. Outro grupo é categorizado como descartável, vendável ou arrendável, o que possibilita sua preservação, ainda que prescindindo do aspecto religioso, em grande parte das vezes. Por fim, o conjunto destinado à demolição, que pode também ser classificado como integrante do grupo anterior.

Privilegiamos a apresentação das possibilidades de usos do espaço, em detrimento da ação mais radical: a demolição. No entanto, para ilustrar, pode ser citado o caso da igreja de Saint-Jacques d’Abbeville, em Paris, que gerou intensa controvérsia em torno de sua demolição, em 2013. Embora não esteja no âmbito dos países pesquisados, o caso ocorreu justamente no período em que a pesquisa estava sendo desenvolvida na Inglaterra, tendo grande repercussão. De acordo com informações do Observatoire du Patrimoine Religieux23 23 Observatório do Patrimônio Religioso. , a demolição teve início em 11 de fevereiro e foi concluída em abril do mesmo ano, apesar dos esforços para reverter a decisão que promoveu seu desaparecimento24 24 A edificação foi construída no lugar de uma igreja mais antiga (datada de 1136). Houve uma reconstrução em 1482, que foi demolida em 1838, provavelmente em decorrência da deterioração pelo tempo. Novamente foi reconstruída, entre 1868-1876, em estilo neogótico, e sua consagração ocorreu em 1875. Observa-se que o histórico apresentado pelo observatório pode ser interpretado como meio de evidenciar a falta de sensibilidade dos agentes que promoveram a destruição deste patrimônio, com “sua arquitetura, suas linhas finas fazem dela uma das mais belas igrejas do Somme. Mas ela foi ‘esquecida’ e não foi classificada nem indexada” (tradução livre de “son architecture, ses lignes fines en font une des plus belles églises de la Somme. Mais elle fut "oubliée" et ne fut ni classée ni répertoriée”; Disponível em: http://www.patrimoine-religieux.fr/rubriques/gauche/edifice-menace/edifices-menaces/ffger">, acesso em 14/10/2014). As imagens da demolição podem ser repetidamente vistas, pois estão disponíveis no próprio site do observatório e, também, no Youtube (uma variedade significativa de imagens de igrejas sendo demolidas ou deterioradas podem ser acionadas com facilidade pela internet). Neste sentido, além do imaginário nostálgico da igreja demolida, o que se preserva é a memória da demolição. O sentimento de perda presente na retórica materializa-se na destruição efetiva. .

A destruição promove uma mudança da paisagem urbana, pelo vazio ou pelos novos equipamentos construídos. Mas não necessariamente recai no esquecimento, já que a cidade pode tornar-se uma “hospedaria de fantasmas, devido às transformações decorridas com o tempo e às novas urgências urbanas, políticas ou estéticas” (Goyena 2009GOYENA, Alberto. (2009), “Colecionando fantasmas urbanos: o lugar de edifícios demolidos no imaginário carioca”. In: ANPOCS. 33º Encontro Anual da ANPOCS, 2009, Caxambu. São Paulo: ANPOCS. :55). Tal noção explicita que determinadas edificações, mesmo após seu desaparecimento concreto, por meio de demolições, permanecem sendo lembradas e, ainda, são “vivificadas após seu desaparecimento”. Assim, existem edificações que se perpetuam como sujeitos (Asmann 2011) referenciais do passado e da memória urbana, principalmente no que toca aos grupos que as identificavam como “lugares de memória”. No caso mencionado, a igreja de Saint-Jacques foi descartada, mas com potencial de se tornar um “fantasma”, presente no imaginário da sociedade que a perdeu.

De toda maneira, o risco de desaparecimento é o que move o ímpeto pela preservação, fortemente fundada pela “retórica da perda” (Gonçalves 1996GONÇALVES, José Reginaldo Santos. (1996), A retórica da perda: os discursos do patrimônio cultural no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ /IPHAN.)25 25 A sedução da demolição parece ir de encontro à sedução da ruína, marcada pela materialidade do desgaste promovido pelo tempo, pela vitória da natureza sobre uma produção humana (Simmel 1998). . Nota-se a importância de refletir e implementar novos usos para esses espaços, com propostas sendo elaboradas pelas próprias instituições religiosas que as detêm e por outras, voltadas à preservação do patrimônio. Os guias organizados com esse objetivo listam diferentes modalidades de uso e apresentam casos exemplares. As edificações disponíveis podem ser destinadas a atividades nas seguintes áreas, por exemplo: comercial, educacional, recreativa, residencial e multiuso. Preservar a edificação pode tanto significar manter seu caráter religioso, como retirar dela sua função original.

Estratégias institucionais de preservação: o compartilhamento do espaço

O livro Converted Churches (2007)26 26 “Igrejas convertidas em novos usos”. , em edição trilíngue, traz em suas páginas uma extensa galeria de fotografias de igrejas convertidas, na Europa, divididas em seis categorias: hotéis, residências, cultura, prédios multifuncionais, lazer e espaços comerciais e escritórios. A nomeação “igrejas convertidas” está diretamente associada aos novos usos, o que inclui o aspecto religioso em um complexo quadro de possibilidades e estratégias de preservação do patrimônio religioso edificado. Algumas destas transformações serão apresentadas a seguir, com ênfase sobre intervenções que privilegiam o compartilhamento do espaço, entre atividades religiosas e laicas, em Cambridge, Inglaterra. A estratégia aqui é compartilhar para preservar27 27 Existem outras formas de preservar igrejas, como as transformar para usos integralmente laicos, mas não é possível aprofundar neste artigo. .

O conjunto de fotos28 28 Todas as fotos apresentadas no artigo foram capturadas pelas autoras. mostra o exterior e o interior do Michaelhouse Centre, localizado no centro de Cambridge, que ocupa a igreja anglicana de St. Michael. Uma placa explicita a apresentação da igreja como único exemplar no país, construída em 1327. Ela passou por processos de consagração e dessacralização em diferentes momentos (Alavedra 2007ALAVEDRA, Inma. (2007), Converted Churches. Antwerp: Tectum Publishers.). Em sua história, o espaço da igreja foi utilizado de diferentes maneiras, e seu uso contemporâneo comporta atividades religiosas, comerciais e culturais.

Michaelhouse oferece descontração ou relaxamento para o corpo e alma, tem fácil acesso para cadeiras de roda e carrinhos de bebês. É um espaço com restaurante reconhecido, onde são servidos pratos criados por produtores locais. Michaelhouse também tem exposição de artes e é um espaço para encontrar amigos, realizar casamentos ou organizar festas com amigos e familiares29 29 Tradução livre do original: “Michaelhouse offers refreshment for body and soul, has easy access for wheelchairs and buggies and is home to an award-winning café serving dishes created from local produce. Michaelhouse also hosts art exhibitions and is a place to meet friends, hold meetings, or have your own private party”. Disponível em: http://www.gsm.cam.ac.uk/michael-house/. Acesso em: 10/10/2013. .

Os serviços religiosos acontecem no local diariamente, “quando todos são bem-vindos”. Outro cartaz lista o cardápio do café ali existente, integrante do centro multiuso, inaugurado em 2002, como parte de uma remodelação da St. Michael30 30 Ver: http://www.michaelhousecafe.co.uk/. Acesso em: 10/10/2013. .

Foto 1
Vista externa da igreja

Foto 2
Interior do café; ao fundo, o espaço de culto

Foto 3
Interior da nave da Igreja de St. Michael

Foto 4
Cardápio do café e programação da Igreja

O compartilhamento é uma estratégia adotada em outros espaços, como na St. Paul’s, também pertencente à Igreja Anglicana. É, concomitantemente, igreja e centro comunitário, o chamado The Centre at St Paul’s, no qual ocorrem diferentes atividades, como aulas de dança, música, yoga e eventos, como festas de aniversário. A igreja de St. Paul foi construída em 1841. O edifício foi ampliado em 1864, e transeptos foram adicionados em 1893. The Centre at St. Paul’s foi criado em 1996. A nave foi reconfigurada, não contém assentos fixos, o que possibilita a realização de eventos não religiosos (Hobohm 2008HOBOHM, Alexander. (2008), Changes & Chances in church use. Shared Use of Churches as an Alternative to Redundancy and Total Conversion. Oxford: University of Oxford.). O site oficial apresenta detalhadamente as possibilidades de utilização do local, que conta com salão principal e outras salas, que também são usadas para diferentes fins. É possível o acesso a fotografias do espaço e dos eventos ali realizados, podendo-se fazer reservas e obter informações sobre os preços do aluguel pela internet.

Foto 5
Igreja de St. Paul’s

Foto 6
Igreja de St. Paul’s

Outra estratégia de preservação (tanto do patrimônio edificado quanto das próprias instituições) é o compartilhamento do espaço por distintas instituições religiosas. Na mesma cidade há dois exemplos desse tipo de estratégia. A paróquia anglicana de St. Clement convive com a St. Athanasius e St. Clement, da Igreja Ortodoxa Grega.

Foto 7
St. Clement e St. Athanasius

Foto 8
St. Clement e St. Athanasius

A pesquisa realizada na Inglaterra não identificou, naquele momento, um caso de igreja em que o processo de reconhecimento de sua dispensabilidade para demolição estivesse em andamento, somente os casos em que já havia algum tipo de mudança concreta na forma de usar os espaços e atividades realizadas no local, assim como exemplos de igrejas que poderiam ser demolidas após a venda31 31 Um caso interessante é o de uma igreja posta à venda no site da Igreja Anglicana (Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0004/13666/West_Church.pdf. Acesso em: 20/01/2018), que fica em Aberdeenshire, na Escócia. Diferentemente de outras edificações da instituição colocadas à venda, mas com restrições nas possíveis intervenções arquitetônicas, o anúncio com os detalhes da negociação de venda aponta a liberação para a demolição do prédio da igreja, caso seja do interesse do comprador. Vale referir que, da mesma forma, há uma diferença na apresentação da trajetória dessas igrejas: embora todas sejam dispensáveis pela instituição, aquelas que possuem algum tipo de patrimonialização, que são protegidas por agências de preservação, recebem uma descrição detalhada, com histórico, data de fundação, por exemplo; por outro lado, notou-se que não há nenhum tipo de menção à história das que podem ser destinadas à demolição. Tal distinção evoca novamente o debate sobre objetificação e coisificação (Ingold 2012), e requer aprofundamento. . Na Holanda, foi possível identificar casos parecidos com os encontrados no outro campo, mas o processo da Igreja Católica do Sagrado Sacramento, em Haia, estava em plena efervescência.

O contexto holandês: usáveis, preserváveis ou descartáveis

O Guidelines on Ways of Dealing with Religious Objects (Beyer e Takke 2012BEYER, Marc de; TAKKE, Jacoline. (2012), Guidelines on Ways of Dealing with Religious Objects. Utretch: Museum Catharijneconvent.)32 32 “Guia para cuidar de objetos religiosos”. é um exemplo da busca de atribuição de sentido ao processo de classificação de bens “redundantes”, edificações e objetos provenientes deles. O documento foi produzido pela equipe do Museu Catharijneconvent (Utrecht, Holanda) e parceiros, e contém orientações sobre modos de lidar com os objetos em contexto de desmonte de edificações religiosas. Conforme a epígrafe, “não é possível manter tudo, escolhas precisam ser feitas”. O próprio museu está localizado em um antigo monastério medieval, e a história do cristianismo constitui o principal foco de suas coleções. O texto ressalta que as orientações podem ser utilizadas por diferentes confissões religiosas (2012:12), e não apenas a católica e as protestantes.

Entre os dados constantes na fundamentação do Guia, há uma tabela com informações sobre as edificações religiosas que não permanecem com suas funções originais, na Holanda. Informa que, entre 2008 e 2011, 696 templos de distintas religiões deixaram de ser espaços religiosos e tornaram-se redundantes, obsoletos. Esses números condizem com as estatísticas referentes ao número de pessoas que deixam suas respectivas igrejas. Estas perdem 170 mil membros por ano, somando católicos e protestantes. Estratégias de reordenamento, diante da perda de fiéis comprometidos com as instituições, são requeridas: paróquias católicas são reduzidas e congregações protestantes estão se fundindo. Em movimento oposto, o guia aponta o aumento do número de templos muçulmanos, judaicos e orientais, com mais edificações. No caso muçulmano, houve crescimento considerável, de 399 para 440 no período.

O reuso ou descarte do patrimônio religioso recai principalmente nas mãos das associações voluntárias, que estão por trás do gerenciamento das edificações ou templos religiosos. Essa responsabilidade corresponde ao tipo de arranjo desenvolvido entre Estado e igrejas na Holanda, no qual se aspira seguir os princípios de liberdade religiosa, neutralidade e separação entre essas duas instâncias. No entanto, como demostraremos na discussão posterior do caso da Igreja do Sacramento em Haia, a discussão sobre liberdade religiosa envolve um campo de disputa forte entre secularistas, aqueles que querem impor os princípios da secularização e os defensores do respeito à pluralidade religiosa existente no país.

No debate holandês, Bijsterveld (2006BIJSTERVELD, Sophie. (2006), “Scheiding van kerk en staat: een klassieke norm in een moderne tijd”. In: W. B. H. J. van de Donk et al. Geloven in het publieke domein - Verkenningen van een dubbele Transformatie. Amsterdam: Amsterdam University Press. :239) assinala que, na questão da secularização, se trata historicamente sobretudo da demanda das igrejas em se distanciarem do Estado. Seguindo esses princípios, as instituições religiosas assumem um caráter cívico e, portanto, no ponto aqui em discussão, desenvolvem medidas próprias para preservação ou descarte de seus respectivos patrimônios. Porém, dependendo da natureza ou do tipo de relação que o patrimônio religioso possa ter em relação ao bem público comum, a mesma autora assinala que o Estado estende a ajuda financeira, o que configura exceções, diferenciações ou nuances. Essas flexibilizações representam que, em questões de preservação do patrimônio cultural e histórico do país, a separação Estado e igreja sofre adaptação. Tal adaptação sobrepõe o princípio rígido de separação e sugere a abertura para um trabalho conjunto entre o Estado e as associações cívicas, representativas de certos patrimônios religiosos (Bijsterveld 2006BIJSTERVELD, Sophie. (2006), “Scheiding van kerk en staat: een klassieke norm in een moderne tijd”. In: W. B. H. J. van de Donk et al. Geloven in het publieke domein - Verkenningen van een dubbele Transformatie. Amsterdam: Amsterdam University Press. ), sobretudo cristãos. Portanto, a preservação não está apenas restrita ao patrimônio religioso edificado, inclui-se também a preocupação com os acervos de objetos (sagrados, históricos ou não) das igrejas em desuso. Dois instrumentos foram elaborados: um roteiro para a reutilização e deaccessioning (termo utilizado em processos museológicos de descarte, venda ou troca de objetos que não mais se adequam às coleções) de objetos religiosos; e um guia de avaliação, que ajuda a identificar o valor cultural dos objetos.

O guia chama a atenção para a possível invisibilidade dos objetos religiosos, no contexto em que tais edificações se tornam obsoletas33 33 De acordo com o documento, até meados de 2012, os estoques de igrejas, mosteiros e conventos foram mapeados pela Heritage Art Church Foundation (Stichting Kunst Kerkelijk bezit in Nederland). A partir de 2013, a responsabilidade de documentar e avaliar o valor da arte eclesiástica na Holanda passou a ser do Museu Catharijneconvent. . A discussão apresenta questões sugestivas sobre a identificação, seleção e classificação dos objetos religiosos. Um aspecto interessante é o reconhecimento do que se configura como “bem móvel” e “imóvel”, quando objetos efetivamente fazem parte do edifício. Alguns objetos são facilmente identificados como móveis; por exemplo, vestes, quadros, castiçais. Outros tantos requerem tipo diverso de classificação, pois estão situados em uma espécie de “zona cinzenta”, entre bens móveis e parte do edifício. São altares, bancos, vitrais, estações da via-crúcis, bacias batismais, órgãos, murais, mosaicos, pedras fundamentais, confessionários, entre outros.

A distinção utilizada por Ingold (2012INGOLD, Tim. (2012), “Trazendo as coisas de volta à vida: emaranhados criativos num mundo de materiais”.Horizontes Antropológicos , vol. 18, nº 37: 25-44. :29) entre objeto e coisa é de utilidade neste contexto: “O objeto coloca-se diante de nós como um fato consumado, oferecendo para nossa inspeção suas superfícies externas e congeladas. […] A coisa, por sua vez, é um ‘acontecer’, ou melhor, um lugar onde vários aconteceres se entrelaçam”. Tanto as edificações religiosas que se tornaram redundantes como os bens móveis que integram suas coleções passam por processos de seleção e classificação que podem considerá-los objetos ou coisas, nos termos de Ingold. Coisas podem ser tidas como objetos e vice-versa, dependendo da época, dos atores, das disputas, contextos sociais e simbólicos. Assim como a demolição está situada no horizonte de algumas igrejas redundantes, a destruição de objetos também consiste em uma ação a ser considerada, até como último recurso. Nesse caso, o esforço é no sentido de descoisificar os bens móveis e imóveis, tornando-os objetos, entendidos como “fatos consumados”. Há que se estar atento ao processo de avaliação desses objetos, que podem ser mantidos, removidos ou dispensados, complexificando a afirmação de que “na maioria das culturas conhecidas no mundo, há certas coisas que não podem ser vendidas ou compradas” (Douglas e Isherwood 2004DOUGLAS, Mary e ISHERWOOD, Baron. (2004), O mundo dos bens: para uma antropologia do consumo. Rio de Janeiro: Editora UFRJ.:103).

Com o argumento de que não pode ser evitado, já que é impossível preservar tudo, formula-se um roteiro de identificação, com critérios para essa escolha: estado de conservação, valor histórico (para a igreja e/ou geral) e artístico, e raridade. Para identificá-los e qualificá-los como merecedores não só de descarte, mas de destruição, sugere-se a consulta a um especialista em patrimônio, antes que se defina tal destino. O objeto pode novamente se coisificar, inserindo-se em outros contextos, ainda que aos pedaços, como entulho ou resíduo. Conforme Goyena (2014______. (2014), “Espólio Arquitetônico: notas sobre a partilha, circulação e retorno do patrimônio demolido”. Pontourbe, nº 15. Disponível em: http://journals.openedition.org/pontourbe/2034. Acesso em: 22/10/2017.
http://journals.openedition.org/pontourb...
:25), “conquanto o entulho possa ser associado a um apagamento dos rastros construtivos, ele é portador de metonímias em potencial, de partes que revelam ausências e são capazes de alimentar os mecanismos mnemônicos de coletividades urbanas”.

Os argumentos constantes no guia, a princípio dedicado aos objetos, são também passíveis de serem aplicados às edificações. A pergunta fundamental é quem define a redundância, o descarte, a conservação, o reuso? Neste sentido, o caso da Igreja Católica do Sagrado Sacramento em Haia é sugestivo, pelo fato de apresentar-se em andamento, com as linhas de força ainda atuantes no processo decisório.

Das disputas e controvérsias do reuso: Igreja Católica do Sagrado Sacramento em Haia

É impossível manter (preservar) todas as coisas, escolhas devem ser feitas (Beyer e Takke 2012BEYER, Marc de; TAKKE, Jacoline. (2012), Guidelines on Ways of Dealing with Religious Objects. Utretch: Museum Catharijneconvent.:3)34 34 Tradução livre do original: “it is impossible to keep everything, and choices will have to be made” (Beyer e Takke 2012:3). .

Na pesquisa realizada na Holanda, foram visitadas duas igrejas já convertidas para novos usos e uma em processo de disputa pela edificação, como será exposto adiante. A primeira está localizada na cidade de Haarlem, antes dedicada a St. Martin, hoje recebe a Jopenkerk, cervejaria dedicada à produção de cervejas artesanais, que também dispõe de comidas e bebidas. Em seu logo, está desenhada a igreja em seu formato original sendo rodeada pela frase “Cerveja artesanal divina”35 35 Tradução livre do original “Crafting Divine Beer”. e pela data de sua primeira fabricação, 1407. Os materiais de divulgação do local apresentam a correlação do espaço sacralizado, com a autenticidade e singularidade da cerveja produzida, cuja receita é datada em centenas de anos. O outro empreendimento visitado, localizado em Haia, é o Planet Jump, que ocupa o espaço interno da igreja, com 32 trampolins. Os interessados podem realizar atividades físicas e recreativas, incluindo festas de aniversário. Trata-se de uma concessão feita pela diocese de Rotterdam, proprietária do prédio onde funcionou a Igreja Martellaars van Gorcum. A diocese ofereceu um contrato à empresa de entretenimento Planet Jump para o uso do local por cinco anos36 36 Ver: https://toekomstreligieuserfgoed.nl/artikelen/planet-jump-rk-kerk-den-haag. Acesso em: 08/01/2018. . Para a presente reflexão, vamos nos ater à Igreja Católica do Sagrado Sacramento (Allerheiligst Sacramentkerk), em Haia. Este caso permite analisar de que maneira ocorrem as tensões, disputas e narrativas dos diversos atores sociais envolvidos no processo de decisão sobre o que fazer com uma igreja considerada oficialmente redundante. As notícias e pesquisas realizadas sobre tais edificações evidenciam o fato já consumado. Ao contrário, este ainda está em andamento e sem conclusão. Trata-se de um exemplo do que vem ocorrendo no país, o que moveu a produção de documentos de avaliação e recomendações sobre ações necessárias para orientar esse processo, como o guia mencionado anteriormente.

Foi possível identificar controvérsias e negociações entre atores, que visibilizam tais relações a partir da redefinição do uso dessa igreja. O caso é também ilustrativo da intercessão entre transformações urbanas e redefinição da memória social do bairro. Pretende-se, assim, indicar como o contexto social e político determinado reverbera nos processos de reorientação do uso do patrimônio religioso. O patrimônio imobiliário da Igreja do Sagrado Sacramento (Sacraement Kerk) é exemplar, pela gama de interesses em disputa, entre os setores público e privado da cidade. Acrescente-se a conexão com questões socioconjunturais, como é a situação dos refugiados na Europa. Esse conjunto de articulações são influenciadas pelo dinamismo social e apresenta aspectos dinâmicos da regulação do patrimônio religioso em Haia, em suas dimensões simbólicas, materiais, políticas e econômicas.

A edificação da Igreja Católica do Sagrado Sacramento ocorreu em 1925. Está situada na região sudeste da cidade de Haia. Trata-se de um bairro nobre e tradicional, que se desenvolveu entre 1910 e 1960. Algumas características do bairro são particulares, como: em 1944, a população aí residente foi deslocada, para depois da linha de proteção alemã, denominada Atlantic Wall (1942-1944). A ocupação alemã no território holandês ocorreu a partir de 1940. Como estratégia de defesa, os alemães construíram uma linha de proteção, na costa da Dinamarca até o sul da Espanha.

Como o Vogelwijk (Bairro dos Pássaros) era um bairro localizado na costa de Haia, os moradores foram forçados a retirar-se para novas residências, depois da linha do Atlantic Wall. O território antes dessa linha e toda a costa tornaram-se área militar, sob o domínio dos alemães. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, muitos moradores retornaram às suas residências. Foram edificadas casas duplex, em áreas destruídas durante a ocupação, estabelecendo um novo perfil arquitetônico para o bairro. Essa reconstrução urbana agregou maior valor histórico, permitindo que, desde 2002, o bairro fosse inserido na lei municipal de proteção de paisagem urbana. A associação de moradores Vogelwijk mantém papel ativo na conservação e proteção desse status37 37 Ver cartas e documentos da associação de moradores apresentados a planos da prefeitura, nos quais fica explícito o papel ativo de defesa do perfil do bairro: http://vogelwijkdenhaag.nl/wp-content/uploads/2016/05/Brief-bestemmingsplan-Vogelwijk-april-2016-2-2.pdf. Acesso em: 22/05/2017. . Portanto, na reorientação do uso do imóvel da Igreja do Sagrado Sacramento, um dos argumentos foi a manutenção do status do bairro, tema de grande interesse e defesa dos moradores.

Foto 9
Igreja do Sagrado Sacramento

O processo de fechamento da Igreja do Sagrado Sacramento foi aberto quando a diocese de Roterdã propôs, em 2005, desativar suas atividades religiosas, uma vez que o número de fiéis caiu drasticamente e não havia mais condição econômica de manter ali seu funcionamento. Concretamente, em 2008, o templo é desconsagrado (“ontrokken aan de erendienst”), e o reuso do espaço entrou em questão. O plano inicial da diocese foi propor a venda da igreja para o empreiteiro e construtor imobiliário Karel Vastgoed, que viria a construir 37 apartamentos no terreno. O objetivo da venda era a maximização dos lucros, para oferecer sustentação ao trabalho da igreja em outras partes da diocese. Na negociação do contrato, o objetivo era alcançar a maior exploração possível do terreno, proporcionando maior lucro nessa transação38 38 Ver notícia sobre o desenvolvimento das negociações sobre o prédio: http://vogelwijkdenhaag.nl/?p=4624. (“Ontwikkeling rond de Sacrament Kerk”, 01/12/2015); acesso em: 22/05/2017. . A demolição e a aprovação do plano de construção da imobiliária foram aceitas sem resistências. Para a diocese, não se cogitava a preservação do prédio como patrimônio, uma vez perdidas suas funções religiosas39 39 Vale inferir que, para analisar a relação do fechamento da igreja com o impacto religioso provocado na comunidade, é necessário realizar entrevistas com seus integrantes, que estiveram envolvidos nesse processo. Em termos documentais, a pesquisa nos arquivos da diocese pode também compor a análise dos argumentos da comissão implantada para este fim. Houve um percurso de mudança de discurso, no qual a igreja deixou de ser uma “questão religiosa” para passar a ser uma preocupação local com o uso daquele “espaço público”, disponibilizado pela futura demolição. E é isso que atualmente preocupa os moradores. No entanto, a disputa aqui também se encontra no âmbito das estratégias de preservação do patrimônio material. .

A crise do capital financeiro deflagrada em 2008, a partir dos Estados Unidos, que afetou outros países no mundo, dificulta o prosseguimento imediato dos planos da empreiteira Karel. Com o mercado imobiliário em recessão, posterga-se a construção rápida dos apartamentos. O mercado para venda e compra entra em completa retração, e o prédio, vazio, sem uso, começa a sofrer deterioração.

Nesse ínterim, a associação de moradores de Vogelwijk volta a se mobilizar, percebendo que talvez houvesse oportunidade para comprar o prédio e preservá-lo. Essa intencionalidade está expressa nas atas e documentos da assembleia geral da associação, em 2011. Neles, a primeira meta passou a ser acompanhar o reuso, com preservação do prédio-igreja, porque a torre da igreja representa um ponto de referência importante na paisagem local. A destruição da torre, principalmente, propicia descaracterizar a paisagem do bairro. Nesse sentido, a associação de moradores empenha-se em acompanhar sistematicamente as conversações entre representantes da diocese e da empreiteira, sobre o futuro do prédio. Mas, antes de se ajustarem a esse papel, houve tentativas de modificar os planos previamente estabelecidos, de duas maneiras. A primeira foi procurar levantar fundos, através de crowdfunding, para a recompra do prédio. Embora a ação tenha sido considerada com simpatia também pelo conjunto de moradores aí residentes, não foi possível mobilizar os recursos necessários para a compra da igreja junto ao novo proprietário, ou seja, a empreiteira Karel Vastgoed. A segunda foi reivindicar junto à prefeitura local o status de patrimônio cultural, pelo porte monumental da Igreja e seu significado para a memória do bairro. Contudo, essa apelação não foi considerada relevante pela prefeitura, a ponto de integrar a lista de monumentos da cidade.

Outro episódio ocorrido durante o abandono do prédio foi a ocupação realizada em 2013, por refugiados sem status legal, que provocou reação contrária à política imigratória restritiva do Estado holandês. Os refugiados abrigaram-se na Igreja do Sagrado Sacramento por quase dois anos, em condições precárias. Contando com o apoio da associação de moradores e de organizações humanitárias, foram desenvolvidas ações caritativas e educacionais, como forma de apoio40 40 Ver: http://haagsallerlei.nl/persconferentie-uitgeprocedeerde-asielzoekers-in-sacramentskerk-sportlaan. Acesso em: 03/05/2017. . Nesse processo, diferentes vereadores, representando dois grupos políticos (Mos e Stadpartij41 41 Ver: http://www.omroepwest.nl/nieuws/2791138/Asielzoekerskerk-in-Haagse-Vogelwijk-mag-worden-gesloopt-komt-niet-op-gemeentelijke-monumentenlijst. Acesso em: 20/05/2017. ), participaram da ocupação como mediadores e atores em uma resolução definitiva para os refugiados.

Depois de quase dois anos de ocupação e diante da inércia das autoridades locais, a associação de moradores Vogelwijk pressionou a câmara municipal e o prefeito, em prol de uma solução mais adequada e permanente de acolhimento ao grupo de refugiados da igreja. Condições sanitárias e riscos de incêndio no prédio são usados como argumentos para acelerar a remoção. De fato, a igreja volta a ser desocupada em outubro de 2014. Os refugiados são realocados em centros de acolhimento locais.

Na retomada do investimento imobiliário em 2015, evidencia-se uma disputa por modelos de preservação entre os diferentes atores envolvidos no debate sobre a preservação da edificação42 42 Os croquis das duas propostas foram publicados pela associação Vogelwijk em seu website www.vogelwijk.nl em dezembro de 2015. Acesso em: 29/05/2017. . O projeto arquitetônico proposto pela construtora Karel à diocese de Roterdã prevê que, após a demolição, serão construídos apartamentos, seguindo parcialmente o gabarito local. Nesse projeto, desaparece toda e qualquer referência ao passado. Dificilmente no futuro um transeunte desconhecedor da história local poderá imaginar que ali existia uma igreja. Ao demolir completamente a edificação, a memória e a paisagem do bairro são afetadas, já que a igreja é referência central (espacial, comunitária e afetiva).

Figura 1
Croqui dos prédios que devem ocupar o terreno após a demolição da igreja

Contrapondo-se ao modelo da empreiteira Karel, o segundo projeto apresentado pela associação de moradores Vogelwijk, em parceria com o escritório de arquitetura pro-en-bakel-oudekerk, compatibiliza mudança e memória social. Neste modelo de reuso, a torre da igreja permanece como símbolo do passado, enquanto que a área restante se transforma em apartamentos adaptados.

Figura 2
Projeto defendido pela Associação de Moradores Vogelwijk

Em 2017, a controvérsia permanece. Em pesquisa no website da associação de moradores43 43 Disponível em: www.vogelwijkdenhaag.nl. Acesso em: 15/05/2017. , nota-se que ainda não se estabeleceu uma escolha do modelo de reconstrução do espaço. Nas negociações em curso, a prefeitura adotou uma postura de neutralidade, deixando as partes mais interessadas, ou seja, a diocese e a empreiteira Karel versus a associação de moradores, definirem o melhor plano. O argumento utilizado pela prefeitura é de que o terreno é de origem privada. Podemos concluir a partir da argumentação utilizada que se retirar da mesa de negociações é um posicionamento técnico e político, que não torna visível qual é a agenda de preservação adotada na cidade. A análise realizada até o momento evidencia que a Igreja do Sagrado Sacramento se tornou espaço de disputa entre interesses do mercado imobiliário e o movimento social, representado pela associação de moradores. Esta última insiste em ações de monitoramento, na intenção de impedir que a prefeitura e o empreiteiro imponham o seu plano e modelo de reuso. O desfecho dessa querela só poderá ser explorado em trabalhos posteriores.

Goyena (2009GOYENA, Alberto. (2009), “Colecionando fantasmas urbanos: o lugar de edifícios demolidos no imaginário carioca”. In: ANPOCS. 33º Encontro Anual da ANPOCS, 2009, Caxambu. São Paulo: ANPOCS. :7) reflete sobre construções que foram demolidas para “dar lugar a novas urgências urbanas, políticas ou estéticas”, mas que, surpreendentemente, se mantêm no imaginário urbano e podem até assumir lugar de destaque, após seu desaparecimento concreto. Os “fantasmas” permanecem presentes. Assim, a demolição por si só não impõe o esquecimento do “espírito do lugar”, no qual os “vínculos de identidade [são] tão demoradamente construídos. Podendo inclusive, e paradoxalmente, vir a reforçá-los”. Emerge em relatos, contos, romances, fotografias, evidenciando a existência de fatores que extrapolam o componente puramente material do edifício. Além disso, há também ressignificações e adaptações produzidas pela arquitetura, em negociação com as diferentes vozes em questão, no sentido de preservar determinados aspectos, tidos como relevantes, considerando tratar-se de um campo tenso, marcado por disputas de sentido.

Considerações sobre desuso, descarte e preservação do patrimônio religioso

O panorama religioso europeu apresenta mudanças, que promovem novas configurações urbanas e institucionais. Sistematicamente, assiste-se, por um lado, a emergência de comunidades religiosas diversas, enquanto, por outro, um declínio da vida cristã tradicional. As consequências abrangem desde a desinstitucionalização ao trânsito religioso, da conformação de novas instituições religiosas ao desmanche do patrimônio religioso, sobretudo cristão. Indaga-se o que fazer com os objetos das igrejas que estão sendo vendidas, seja para novos usos, seja para demolição ou descarte. A constatação desse processo propicia uma produção de guias, que objetivam orientar como proceder com bens religiosos (móveis e imóveis), presentes nas paisagens rurais e urbanas dos vários países, que perderam suas funções originais. Embora a comunidade religiosa, aquela para a qual a afetação diante do desmonte do patrimônio é direta, seja convocada a participar desse processo, há pouco espaço para reações contrárias, efetivas, para reverter a situação. O papel da comunidade nas negociações, como visto no caso da igreja de Haia, serviu para evidenciar o descontentamento e a ligação afetiva do grupo em relação ao lugar, ao espaço consagrado por ritos e práticas do grupo.

Como espaço de recordação, o patrimônio religioso cristão está na paisagem para acionar a memória do grupo. O processo de encerramento de uma igreja pode ser entendido como uma mudança, na qual há que se investigar o passado, por intermédio do contato com os objetos colecionados no decorrer da vida. O que será ou não conduzido à nova moradia? Além de não levar tudo, o que deve ser descartado, doado, vendido? Não se trata de um trabalho puramente mecânico, de rasgar contas antigas. Cartas, diários, bilhetes, fotografias, presentes são encontrados, lidos e lembrados - os contextos, pessoas, sons e cheiros relacionados a eles. Quando o mesmo ocorre em um templo religioso, indissociável da “comunidade afetiva” que o constitui e se constitui nesse “lugar de memória”, há muito que refletir. Templos e objetos religiosos “não só desempenham funções identitárias, expressando simbolicamente nossas identidades individuais e sociais, mas na verdade organizam (na medida em que são categorias materializadas) a percepção que temos de nós mesmos” (Gonçalves 2007______. (2007), Antropologia dos objetos: coleções, museus e patrimônios. Rio de Janeiro: IPHAN.:27).

A situação de desmanche de coleções de objetos religiosos das igrejas obsoletas ultrapassa os limites mandatários das respectivas instituições. É provocada pela dispersão e perda de milhares de membros, mas impacta diretamente a congregação, aqueles que permanecem e carregam a responsabilidade da transmissão religiosa. A perda desses lugares de memória, como espaços de recordação (Assmann 2011ASSMANN, Aleida. (2011),Espaços da recordação: formas e transformações da memória cultural. Campinas: Editora da Unicamp.), pode tornar mais difícil a efetivação dessa função, considerando-se o papel das edificações para a manutenção da identidade dos grupos sociais. O espaço e as práticas dos grupos são indissociáveis, entendidos como suportes para sua sobrevivência. Embora a construção de novas igrejas evidencie a consolidação institucional, quando uma ou várias fecham suas portas, por diferentes motivos, pode significar decadência, retraimento, dispensabilidade, como sugere a própria designação “igrejas redundantes”, adotada pelas instituições religiosas. As religiões expressam-se sob formas simbólicas, que ocorrem nos espaços, no material; segundo Halbwachs (1990HALBWACHS, Maurice. (1990), Memória Coletiva. São Paulo: Vértice.:157), “por isso é preciso derrubar os altares dos antigos deuses e destruir seu templo se quisermos apagar da memória dos homens a lembrança dos cultos ultrapassados”.

O que dizer sobre o processo de desmonte em que são as próprias instituições religiosas e seus membros os responsáveis por sua efetivação? O descarte na forma de venda, demolição ou destruição de bens e objetos afeta o grupo religioso, seja este entendido como instituição, seja como membresia. De certa forma, trata-se de um processo de pacificação da relação entre as instituições religiosas e seus patrimônios e a congregação religiosa. O espaço religioso é, ao mesmo tempo, ator e portador de experiências pessoais e comunitárias. Embora a sensação de estabilidade e imutabilidade seja uma ilusão, conforme sugere Halbwachs (1994______. (1994), Les Cadres Sociaux de la Mémoire. Paris: Albin Michel.)44 44 O autor evidencia nessa obra a importância dos lugares físicos para a fixação da memória coletiva (da tradição); no entanto, observa que não é necessário realizar a peregrinação aos locais na “terra santa” indicados nos Evangelhos, ou para saber que eles existem, porque eles podem ser imaginados. Tal indicação pode ser associada ao que Goyena (2009) observa sobre os “fantasmas” urbanos. , a ruptura, por vezes radical, como no complexo processo que propicia escolhas por demolições e destruições, produz efeitos desestabilizadores nas comunidades afetadas pela iminência da perda de importantes suportes de memória do grupo. Não é por acaso que as políticas de patrimônio (externas e internas às instituições religiosas) consideram fundamental a participação das “comunidades religiosas” nas discussões sobre preservação.

Ressaltou-se o não ineditismo dos projetos de reutilização desses espaços, prática que pode ser nomeada de “reciclagem de usos” (Gorski 2003GORSKI, Joel. (2003), Reciclagem de uso e preservação arquitetônica. Porto Alegre: Dissertação de Mestrado em Arquitetura, UFRGS. ). Essa prática é corrente e estende-se para outras edificações. Estações de trem, fábricas e castelos estão no horizonte das práticas de reutilização em combinação à preservação, mas também sendo incorporados na dinâmica urbana, com reformas mais ou menos conservadoras ou modernizantes (Almeida 2009ALMEIDA, Eneida. (2009), O construir no construído na produção contemporânea: relações entre teoria e prática. São Paulo: Tese de Doutorado em Arquitetura e Urbanismo, USP.).

Em visitas a países como Inglaterra e Holanda, detentores de um patrimônio religioso arquitetônico de centenas de anos, é possível uma surpresa, pela diversificação dos usos contemporâneos das edificações religiosas. Igrejas por fora, por dentro restaurantes, residências, escola de circo, salão de cabelereiro, entre outras possibilidades. Combinações também são possíveis, como instituições religiosas dividindo o espaço, ou com atividades menos convencionais. O mesmo pode ser afirmado quando se apresenta o drama gerado pela expectativa, diante da possibilidade de descarte ou destruição. As respectivas biografias e “histórias de vida” dos objetos e edificações religiosas são acionadas, na retórica das agências de preservação (Kopytoff 2010KOPYTOFF, Igor. (2010), “A biografia cultural das coisas”. In: A. Appadurai.A vida social das coisas: as mercadorias sob uma perspectiva cultural. Niterói: Editora UFF. ). O vínculo com o passado, em termos históricos e arquitetônicos, não se refere apenas ao aspecto religioso. Trata-se da transformação de algo, que para grupos religiosos seria detentor de um atributo singular, em mercadoria. Em outros termos, tornar bens concebidos e, por que não, sentidos como inalienáveis em alienáveis (Weiner 1992WEINER, Annette. (1992),Inalienable possessions: the paradox of keeping-while-giving. Berkeley: University of California Press.)45 45 Há uma vasta tradição na literatura antropológica relativa à temática da reciprocidade e circulação de objetos, que está presente na discussão realizada neste artigo, apesar de não terem sido utilizadas diretamente no texto, como o clássico “Ensaio sobre a dádiva”, de Marcel Mauss (2003). .

Não foi possível aqui explorar os impactos diretos nas comunidades religiosas, em seus frequentadores, afetados por esse complexo processo. O caso da Igreja do Sagrado Sacramento, em Haia, apresenta a dinâmica constante na trajetória das chamadas “redundant churches”, possível de ser aferida principalmente por meio de análise de documentos e da controvérsia pública, explorada pelos meios de comunicação.

Neste artigo, o que vimos é que o processo que leva às decisões sobre a dispensabilidade das edificações religiosas, seja em virtude do seu descarte, seja do reuso, implica na abertura de processos de negociação da memória local. Ela é, assim, reconstruída, através de estabelecimentos de orientações, guias ou documentos, que a formaliza e institucionaliza uma narrativa do lugar para a posteridade. De outra maneira, essa memória tende a ser renegociada em uma dinâmica específica, caracterizada pela inclusão de novos atores, seja pelas novas reinterpretações feitas do uso do lugar, tema que não exploramos neste artigo e que demanda mais pesquisa, pois envolve a escuta de usuários e atores envolvidos com o local, seja pela ação coletiva de luta pela defesa da preservação. Por esse viés, apresentam-se novas controvérsias. As tensões, disputas e negociações emergem, no entanto, nas próprias formulações das políticas, provenientes de instituições religiosas ou laicas. Os discursos pautam-se na emergência da preservação desse patrimônio. Embora todos ressaltem sua importância, para a sociedade em geral e para a comunidade de fiéis em particular, a impressão é que há pouca visibilidade dessa voz específica, no quadro polifônico do debate/embate, composto por representantes dos Estados, sociedade civil, organismos internacionais, instituições religiosas, acadêmicos, entre outros.

Vale enfatizar que nosso objetivo é provocar o debate sobre os processos, estratégias e atores no campo do patrimônio religioso considerado em desuso, observando o volume de edificações que passam por tal processo de mudanças em suas estruturas, por vezes amenas, em outras, radicais. A discussão não se esgota aqui, são vários os níveis de disputa, negociações, interesses e perspectivas de diferentes atores a serem considerados: instituições religiosas, membresia, vizinhança, representações políticas, setor imobiliário, agências de patrimônio (governamentais e não governamentais), entre outros.

Os impactos são sentidos na paisagem urbana e na vida cotidiana. Para aqueles que possuem vínculos afetivo-religiosos, em particular, ou outros, com as edificações, para além dos esforços pela preservação do passado, está em disputa como se posicionar diante do presente, sempre fugidio, e de um futuro que se apresenta em risco. Na exploração que fizemos do caso da Igreja do Sacramento, é visível que os interesses afetivos-pessoais da comunidade religiosa anteriormente existente e dos moradores preocupados com a preservação se chocam com os interesses imobiliários e econômicos, ligados tanto aos empreiteiros urbanos quanto à prefeitura. É sugestivo o que diz Huyssen (2000HUYSSEN, Andreas. (2000), Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos e mídia. São Paulo: Aeroplano.:37) sobre a necessidade de “distinguir os passados usáveis dos passados dispensáveis”, já que “o tempo não é apenas o passado, sua preservação e transmissão”. Estamos diante do que chamamos anteriormente de níveis de impactos e ressonâncias desses processos, nos quais estão em tensão linhas de força que se sobrepõem às expectativas, vivências e vínculos afetivos existentes em relação a esses espaços. A dispensabilidade do aspecto material do patrimônio, em especial do religioso, pode enfraquecer, mas não encerra seu potencial como detentor de um “espírito”, de uma aura ou mana.

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    » http://journals.openedition.org/pontourbe/2034
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  • WEINER, Annette. (1992),Inalienable possessions: the paradox of keeping-while-giving Berkeley: University of California Press.

Sites consultados

Notas

  • 1
    No Brasil, tal movimento não é relevante, ao menos não em termos de visibilidade. Ao contrário, vemos um acelerado processo de construção de edificações religiosas ou a transformação de espaços laicos em igrejas (cinemas e supermercados, mais permanentemente), assim como cada vez mais identificamos a presença do religioso em equipamentos urbanos, como parques, praias e estádios (Gomes 2011GOMES, Edlaine de Campos. (2011), A era das catedrais: uma etnografia. Rio de Janeiro: Garamond., 2009______. (2009), “Um poder mais forte: reflexões sobre grandes eventos neopentecostais e cidade”. Os Urbanitas (São Paulo), vol. 5/8: 0-0.).
  • 2
    Este artigo resulta do projeto de pesquisa “Arquitetura e objetos: “novos” espaços e versões do sagrado”, desenvolvido por Edlaine de Campos Gomes, com bolsa de pós-doutorado júnior, CAPES, 2012/2013, no Centro de Estudos Latino-americanos (CLAS - University of Cambridge), sob a supervisão de David Lehmann. A pesquisa continuou após esse período em parceria entre as autoras
  • 3
    O processo de secularização, a laicização e o desencantamento (Weber 1992WEBER, Max. (1992), A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Biblioteca Pioneira das Ciências Sociais.) inferem novos contornos à configuração e inserção das instituições religiosas no espaço público – inclusive se considerada a imprecisão da fronteira entre religioso e não religioso no ocidente moderno (Asad 1993ASAD, Talal. (1993),Genealogies of religion. Discipline and Reasons of Power in Christianity and Islam. Baltimore: The Johns Hopkins University Press.), e os processos concomitantes de secularização e dessecularização (Berger 1999BERGER, Peter L. (1999), “The Desecularization of the World; A global overview” In: P. Berger (org.). The Desecularizaton of the World: Resurgent Religion and World Politics. Grand Rapids, MI: Ethic and Politic Policy Center and W. B. Eerdmans Publishing Company.).
  • 4
    Documentos oficiais da Unesco e outras entidades, direta ou indiretamente, trazem a noção de “espírito do lugar”, o que significa a vida, a natureza espiritual e social do patrimônio religioso. Cerca de 20% da lista das propriedades inscritas como patrimônio mundial está relacionada, de alguma maneira, ao aspecto religioso ou espiritual (http://whc.unesco.org/en/religious-sacred-heritage/#KyivUNESCO. Heritage of Religious Interest. Disponível em: http://whc.unesco.org/en/religious-sacred-heritage/#Kyiv. Acesso em: 02/10/2016.
    http://whc.unesco.org/en/religious-sacre...
    ; acesso em: 10/06/2017). O documento observa que: “o espírito do lugar é constituído de elementos materiais (sítios, paisagens, edificações, objetos) e imateriais (memórias, depoimentos orais, documentos escritos, rituais, festivais, ofícios, técnicas, valores, odores), que servem todos de maneira significativa para marcar um lugar e lhe dar um espírito” (ICOMOS 2008ICOMOS. (2008), Declaração de Quebec. Disponível em: Disponível em: https://www.icomos.org/quebec2008/quebec_declaration/pdf/GA16_Quebec_Declaration_Final_PT.pdf . Acesso em: 02/10/2016.
    https://www.icomos.org/quebec2008/quebec...
    :3).
  • 5
    Estudos e análises relativos ao patrimônio religioso e aos locais sagrados foram realizados pelas organizações consultivas – International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property (ICCROM), International Council on Monuments and Sites (ICOMOS) e International Union for Conservation of Nature (IUCN). Ocorreram fóruns e seminários para discutir especificamente esse tema, marcadamente, o fórum realizado em 2003, organizado pelo ICCROM, e o Seminário de Kyiv, promovido pela UNESCO, em 2010. Estas instâncias elaboraram ações e recomendações sobre o patrimônio religioso e sagrado.
  • 6
    Duby (1988DUBY, Georges. (1988), O tempo das catedrais: a arte e a sociedade. Lisboa: Estampa.) indica que, entre os séculos XI e XIV, houve um investimento significativo na construção de catedrais por toda a Europa, promovendo uma junção entre arte e sociedade, para analisar o que nomeia como “tempo das catedrais”. De acordo com Choay (2001:105), com a Revolução Francesa “as catedrais e as igrejas que, em muitos casos, haviam perdido seus telhados foram antes convertidas em depósitos de munição, de salitre ou de sal e, dependendo do caso, também em mercados, enquanto os conventos e abadias eram transformados em prisões, como Fontevrault, em casernas”.
  • 7
    Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/09/antigas-catedrais-abrigam-hoteis-livrarias-e-ate-discotecas-na-europa.htmlLOSEKANN, Marcos. (2011), “Antigas catedrais abrigam hotéis, livrarias e até discotecas na Europa”. G1. Disponível em: Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/09/antigas-catedrais-abrigam-hoteis-livrarias-e-ate-discotecas-na-europa.html . Acesso em: 05/10/2013.
    http://g1.globo.com/jornal-nacional/noti...
    . Acesso em: 5/10/2013.
  • 8
    Disponível em:http://www.legislation.gov.uk/ukcm/1983/1THE CHURCH OF ENGLAND. (1983), Pastoral Measure 1983. Disponível em: Disponível em: http://www.legislation.gov.uk/ukcm/1983/1 . Acesso em: 05/01/2017.
    http://www.legislation.gov.uk/ukcm/1983/...
    . Acesso em: 05/01/2017.
  • 9
    Ver www.raadvankerken.nl/pagina/1894/kerkverkoop_is_maatwerk. Acesso em: 16/01/2018.
  • 10
    O estudo foi realizado pela Associação Cívica Escocesa de Proteção do Patrimônio, intitulado “Novos usos para antigas igrejas”.
  • 11
    Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/about_us/property_and_church_buildings/properties_for_sale?property_type=15794______. Properties for sale. Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/about_us/property_and_church_buildings/properties_for_sale?property_type=15794. Acesso em: 11/10/2014.
    http://www.churchofscotland.org.uk/about...
    . Acesso em: 11/10/2014.
  • 12
    Ver http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0016/23083/BARONY-ST-JOHNS-CHURCH-and-HALLS.pdfTHE CHURCH OF SCOTLAND. Barony St. John’s Church. Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0016/23083/BARONY-ST-JOHNS-CHURCH-and-HALLS.pdf. Acesso em: 11/10/2014.
    http://www.churchofscotland.org.uk/__dat...
    . Acesso em: 11/10/2014.
  • 13
    No que diz respeito à preservação do patrimônio, é seguida, basicamente, a seguinte regra de classificação: categoria A - edifícios de importância nacional ou internacional, em termos arquitetônicos ou históricos, com poucas alterações em sua estrutura; categoria B - Edifícios de importância regional ou local, identificado a um determinado período, estilo ou tipo particular, que pode ter sido alterado; categoria C - edifícios de importância local, moderadamente alterados (conferir em: http://www.historic-scotland.gov.uk/index/heritage/historicandlistedbuildings/altering-a-listed-building.htmHISTORIC SCOTLAND. Historic and listed buildings. Disponível em: Disponível em: http://www.historic-scotland.gov.uk/index/heritage/historicandlistedbuildings/altering-a-listed-building.htm . Acesso em: 20/02/2013.
    http://www.historic-scotland.gov.uk/inde...
    ; acesso em: 20/02/2013).
  • 14
    “Novos usos para igrejas fechadas: guia para compradores e inquilinos”.
  • 15
    Ver: https://www.churchofengland.org/clergy-office-holders/pastoralandclosedchurches/closedchurches/closed-churches-available.aspx______. Closed church available. Disponível em: https://www.churchofengland.org/clergy-office-holders/pastoralandclosedchurches/closedchurches/closed-churches-available.aspx. Acesso em: 13/10/2014 e 20/05/2017.
    https://www.churchofengland.org/clergy-o...
    . Acesso em: 13/10/2014.
  • 16
  • 17
    Em alguns casos, não é só o prédio que está em questão nos processos de desmonte e descarte. Igrejas muito antigas contam com cemitérios, dado relevante, que faz uma conexão entre instituição-descarte-comunidade. Os laços afetivos emergem, nesse contexto particularmente dramático. A orientação é de realização de acordos que permitam acesso público aos que desejarem visitar as sepulturas, além de promover o cuidado dos restos mortais, lápides, monumentos e memoriais.
  • 18
    Associação para a Conservação de Igrejas.
  • 19
    Fundo para Igrejas em Desuso.
  • 20
    Amigos de Igrejas sem Amigos.
  • 21
  • 22
    Pomian (1984POMIAN, Krzystof. (1984), “Coleção”. In: F. Gil (org.). Memória-História. Porto: Imprensa Nacional/Casa da Moeda.:53) define coleção como “qualquer conjunto de objetos naturais ou artificiais, mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito das atividades econômicas, sujeitos a uma proteção especial num local fechado preparado para esse fim, e expostos ao olhar do público”. É necessário estar atento às formas específicas das práticas de colecionamento das diferentes sociedades. A categoria coleção é “boa para pensar” não só os objetos, mas também as edificações, como itens colecionáveis, sem perder de vista a complexidade do processo de circulação e as características do que é móvel e imóvel, na chamada sociedade ocidental (cf. Gonçalves 2007______. (2007), Antropologia dos objetos: coleções, museus e patrimônios. Rio de Janeiro: IPHAN.; Clifford 1995CLIFFORD, James. (1995), “Colecionando arte e cultura”. Revista do Patrimônio Histórico Nacional.).
  • 23
    Observatório do Patrimônio Religioso.
  • 24
    A edificação foi construída no lugar de uma igreja mais antiga (datada de 1136). Houve uma reconstrução em 1482, que foi demolida em 1838, provavelmente em decorrência da deterioração pelo tempo. Novamente foi reconstruída, entre 1868-1876, em estilo neogótico, e sua consagração ocorreu em 1875. Observa-se que o histórico apresentado pelo observatório pode ser interpretado como meio de evidenciar a falta de sensibilidade dos agentes que promoveram a destruição deste patrimônio, com “sua arquitetura, suas linhas finas fazem dela uma das mais belas igrejas do Somme. Mas ela foi ‘esquecida’ e não foi classificada nem indexada” (tradução livre de “son architecture, ses lignes fines en font une des plus belles églises de la Somme. Mais elle fut "oubliée" et ne fut ni classée ni répertoriée”; Disponível em: http://www.patrimoine-religieux.fr/rubriques/gauche/edifice-menace/edifices-menaces/ffgerOBSERVATOIRE DU PATRIMOINE RELIGIEUX. (2013), Saint-Jacques d'Abbeville: la destruction est terminée!. Disponível em: Disponível em: http://www.patrimoine-religieux.fr/rubriques/gauche/edifice-menace/edifices-menaces/ffger . Acesso em: 14/10/2014.
    http://www.patrimoine-religieux.fr/rubri...
    ">, acesso em 14/10/2014). As imagens da demolição podem ser repetidamente vistas, pois estão disponíveis no próprio site do observatório e, também, no Youtube (uma variedade significativa de imagens de igrejas sendo demolidas ou deterioradas podem ser acionadas com facilidade pela internet). Neste sentido, além do imaginário nostálgico da igreja demolida, o que se preserva é a memória da demolição. O sentimento de perda presente na retórica materializa-se na destruição efetiva.
  • 25
    A sedução da demolição parece ir de encontro à sedução da ruína, marcada pela materialidade do desgaste promovido pelo tempo, pela vitória da natureza sobre uma produção humana (Simmel 1998SIMMEL, Georg. (1998), “A Ruína”. In: J. Souza e B. Öelze (orgs.). Simmel e a modernidade. Brasília: UNB.).
  • 26
    “Igrejas convertidas em novos usos”.
  • 27
    Existem outras formas de preservar igrejas, como as transformar para usos integralmente laicos, mas não é possível aprofundar neste artigo.
  • 28
    Todas as fotos apresentadas no artigo foram capturadas pelas autoras.
  • 29
    Tradução livre do original: “Michaelhouse offers refreshment for body and soul, has easy access for wheelchairs and buggies and is home to an award-winning café serving dishes created from local produce. Michaelhouse also hosts art exhibitions and is a place to meet friends, hold meetings, or have your own private party”. Disponível em: http://www.gsm.cam.ac.uk/michael-house/GREAT ST. MARY’S. Michaelhouse. Disponível em: Disponível em: http://www.gsm.cam.ac.uk/michael-house/ . Acesso em: 10/10/2013.
    http://www.gsm.cam.ac.uk/michael-house/...
    . Acesso em: 10/10/2013.
  • 30
    Ver: http://www.michaelhousecafe.co.uk/MICHAELHOUSE CAFÉ. Michaelhouse Café. Disponível em: Disponível em: http://www.michaelhousecafe.co.uk/ . Acesso em: 10/10/2013.
    http://www.michaelhousecafe.co.uk/...
    . Acesso em: 10/10/2013.
  • 31
    Um caso interessante é o de uma igreja posta à venda no site da Igreja Anglicana (Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0004/13666/West_Church.pdf______. The West Church, main street, Hatton AB42 0QQ. Disponível em: http://www.churchofscotland.org.uk/__data/assets/pdf_file/0004/13666/West_Church.pdf. Acesso em: 20/01/2018.
    http://www.churchofscotland.org.uk/__dat...
    . Acesso em: 20/01/2018), que fica em Aberdeenshire, na Escócia. Diferentemente de outras edificações da instituição colocadas à venda, mas com restrições nas possíveis intervenções arquitetônicas, o anúncio com os detalhes da negociação de venda aponta a liberação para a demolição do prédio da igreja, caso seja do interesse do comprador. Vale referir que, da mesma forma, há uma diferença na apresentação da trajetória dessas igrejas: embora todas sejam dispensáveis pela instituição, aquelas que possuem algum tipo de patrimonialização, que são protegidas por agências de preservação, recebem uma descrição detalhada, com histórico, data de fundação, por exemplo; por outro lado, notou-se que não há nenhum tipo de menção à história das que podem ser destinadas à demolição. Tal distinção evoca novamente o debate sobre objetificação e coisificação (Ingold 2012), e requer aprofundamento.
  • 32
    “Guia para cuidar de objetos religiosos”.
  • 33
    De acordo com o documento, até meados de 2012, os estoques de igrejas, mosteiros e conventos foram mapeados pela Heritage Art Church Foundation (Stichting Kunst Kerkelijk bezit in Nederland). A partir de 2013, a responsabilidade de documentar e avaliar o valor da arte eclesiástica na Holanda passou a ser do Museu Catharijneconvent.
  • 34
    Tradução livre do original: “it is impossible to keep everything, and choices will have to be made” (Beyer e Takke 2012BEYER, Marc de; TAKKE, Jacoline. (2012), Guidelines on Ways of Dealing with Religious Objects. Utretch: Museum Catharijneconvent.:3).
  • 35
    Tradução livre do original “Crafting Divine Beer”.
  • 36
    Ver: https://toekomstreligieuserfgoed.nl/artikelen/planet-jump-rk-kerk-den-haagTOEKOMST RELIGIEUS ERFGOED. Planet Jump in RK-kerk in Den Haag. Disponível em: Disponível em: https://toekomstreligieuserfgoed.nl/artikelen/planet-jump-rk-kerk-den-haag . Acesso em: 08/01/2018.
    https://toekomstreligieuserfgoed.nl/arti...
    . Acesso em: 08/01/2018.
  • 37
    Ver cartas e documentos da associação de moradores apresentados a planos da prefeitura, nos quais fica explícito o papel ativo de defesa do perfil do bairro: http://vogelwijkdenhaag.nl/wp-content/uploads/2016/05/Brief-bestemmingsplan-Vogelwijk-april-2016-2-2.pdf______. Brief naar gemeente mbt bestemmingsplan. Disponível em: http://vogelwijkdenhaag.nl/wp-content/uploads/2016/05/Brief-bestemmingsplan-Vogelwijk-april-2016-2-2.pdf. Acesso em: 22/05/2017
    http://vogelwijkdenhaag.nl/wp-content/up...
    . Acesso em: 22/05/2017.
  • 38
    Ver notícia sobre o desenvolvimento das negociações sobre o prédio: http://vogelwijkdenhaag.nl/?p=4624______. (2015), Ontwikkelingen rond de Sacramentskerk. Disponível em: http://vogelwijkdenhaag.nl/?p=4624. Acesso em: 22/05/2017.
    http://vogelwijkdenhaag.nl/?p=4624...
    . (“Ontwikkeling rond de Sacrament Kerk”, 01/12/2015); acesso em: 22/05/2017.
  • 39
    Vale inferir que, para analisar a relação do fechamento da igreja com o impacto religioso provocado na comunidade, é necessário realizar entrevistas com seus integrantes, que estiveram envolvidos nesse processo. Em termos documentais, a pesquisa nos arquivos da diocese pode também compor a análise dos argumentos da comissão implantada para este fim. Houve um percurso de mudança de discurso, no qual a igreja deixou de ser uma “questão religiosa” para passar a ser uma preocupação local com o uso daquele “espaço público”, disponibilizado pela futura demolição. E é isso que atualmente preocupa os moradores. No entanto, a disputa aqui também se encontra no âmbito das estratégias de preservação do patrimônio material.
  • 40
    Ver: http://haagsallerlei.nl/persconferentie-uitgeprocedeerde-asielzoekers-in-sacramentskerk-sportlaanHAAGSALLERLEI. (2013), Persconferentie uitgeprocedeerde asielzoekers in Sacramentskerk Sportlaan. Disponível em: Disponível em: http://haagsallerlei.nl/persconferentie-uitgeprocedeerde-asielzoekers-in-sacramentskerk-sportlaan . Acesso em: 03/05/2017.
    http://haagsallerlei.nl/persconferentie-...
    . Acesso em: 03/05/2017.
  • 41
    Ver: http://www.omroepwest.nl/nieuws/2791138/Asielzoekerskerk-in-Haagse-Vogelwijk-mag-worden-gesloopt-komt-niet-op-gemeentelijke-monumentenlijstOMROEP WEST . (2015), ‘Asielzoekerskerk’ in Haagse Vogelwijk mag worden gesloopt, komt niet op gemeentelijke monumentenlijst. Disponível em: Disponível em: http://www.omroepwest.nl/nieuws/2791138/Asielzoekerskerk-in-Haagse-Vogelwijk-mag-worden-gesloopt-komt-niet-op-gemeentelijke-monumentenlijst . Acesso em: 20/05/2017.
    http://www.omroepwest.nl/nieuws/2791138/...
    . Acesso em: 20/05/2017.
  • 42
    Os croquis das duas propostas foram publicados pela associação Vogelwijk em seu website www.vogelwijk.nlSPEELTUIN VOGELENWIJK. Speeltuin Vogelenwijk. Disponível em: Disponível em: https://vogelwijk.nl/ . Acesso em: 29/05/2017.
    https://vogelwijk.nl/...
    em dezembro de 2015. Acesso em: 29/05/2017.
  • 43
    Disponível em: www.vogelwijkdenhaag.nlDE VOGELWIJK. De Vogelwijk. Disponível em: Disponível em: http://vogelwijkdenhaag.nl/ . Acesso em: 15/05/2017.
    http://vogelwijkdenhaag.nl/...
    . Acesso em: 15/05/2017.
  • 44
    O autor evidencia nessa obra a importância dos lugares físicos para a fixação da memória coletiva (da tradição); no entanto, observa que não é necessário realizar a peregrinação aos locais na “terra santa” indicados nos Evangelhos, ou para saber que eles existem, porque eles podem ser imaginados. Tal indicação pode ser associada ao que Goyena (2009) observa sobre os “fantasmas” urbanos.
  • 45
    Há uma vasta tradição na literatura antropológica relativa à temática da reciprocidade e circulação de objetos, que está presente na discussão realizada neste artigo, apesar de não terem sido utilizadas diretamente no texto, como o clássico “Ensaio sobre a dádiva”, de Marcel Mauss (2003MAUSS, Marcel. (2003), “O ensaio sobre a dádiva”. In: ______. Sociologia e Antropologia. São Paulo: Cosac & Naify.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2017
  • Aceito
    09 Mar 2018
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