Acessibilidade / Reportar erro

Segmento tardio do desempenho em linguagem de crianças com desvio fonológico após terapia fonológica

Late follow-up of language performance of children with phonological disorders after speech therapy

Resumos

OBJETIVO: Realizar um acompanhamento tardio do desempenho em habilidades de linguagem de um grupo de estudo com histórico de desvio fonológico (após ter realizado terapia fonológica), comparando-o com um grupo controle. MÉTODOS: Dezoito sujeitos, nove do grupo de estudo e nove do controle, participaram do estudo e foram avaliados quanto à linguagem escrita a partir da aplicação de atividades de compreensão de texto, complementação de sentenças, formação de sentenças, sequencialização de parágrafos e combinação de sentenças que fazem parte do Exame de Linguagem TIPITI. RESULTADOS: Os resultados da pesquisa mostraram correlações estatísticas significantes, positivas e fortes, nas habilidades de linguagem, entre os grupos estudados e, também, diferenças estatisticamente significantes entre o grupo experimental e o grupo controle, na análise do teste Kruskal-Wallis. CONCLUSÃO: Verificou-se que, mesmo após a realização de terapia fonológica e a superação dos desvios, o grupo de estudo apresentou desempenho inferior ao do grupo controle.

Transtornos da articulação; Fonoterapia; Linguagem infantil; Linguagem; Desenvolvimento da linguagem


PURPOSE: To carry out a late follow-up of the performance on language abilities of a study group with history of phonological disorders (after speech therapy), compared to a control group with normal phonological development. METHODS: Eighteen subjects, nine from the study group and nine from the control group, participated in the study and were evaluated on written language, carrying out tasks of text comprehension, sentences complementation, sentences formation, paragraph continuation, and sentences combination, which are part of the TIPITI Language Assessment. RESULTS: The results showed positive and strong statistically significant correlation between the groups regarding the language abilities. Statistically significant differences were also found between study and control groups on the Kruskal-Wallis test. CONCLUSION: It was verified that, even after speech therapy and overcoming speech disorders, the study group showed lower performance on language tasks when compared to the control group.

Articulation disorders; Speech therapy; Child language; Language; Language development


ARTIGO ORIGINAL

Segmento tardio do desempenho em linguagem de crianças com desvio fonológico após terapia fonológica

Late follow-up of language performance of children with phonological disorders after speech therapy

Helena Bolli MotaI; Maria das Graças de Campos Melo FilhaII

IDoutora, Professora Adjunto do Curso de Fonoaudiologia e do Mestrado em Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM – Santa Maria (RS), Brasil

IIPós-graduanda (Mestrado) em Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM – Santa Maria (RS), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria das Graças de Campos Melo Filha R. Marechal Deodoro, 1038/302, Centro Santa Cruz do Sul (RS), Brasil, CEP: 96810-110 E-mail: camposmelograca@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Realizar um acompanhamento tardio do desempenho em habilidades de linguagem de um grupo de estudo com histórico de desvio fonológico (após ter realizado terapia fonológica), comparando-o com um grupo controle.

MÉTODOS: Dezoito sujeitos, nove do grupo de estudo e nove do controle, participaram do estudo e foram avaliados quanto à linguagem escrita a partir da aplicação de atividades de compreensão de texto, complementação de sentenças, formação de sentenças, sequencialização de parágrafos e combinação de sentenças que fazem parte do Exame de Linguagem TIPITI.

RESULTADOS: Os resultados da pesquisa mostraram correlações estatísticas significantes, positivas e fortes, nas habilidades de linguagem, entre os grupos estudados e, também, diferenças estatisticamente significantes entre o grupo experimental e o grupo controle, na análise do teste Kruskal-Wallis.

CONCLUSÃO: Verificou-se que, mesmo após a realização de terapia fonológica e a superação dos desvios, o grupo de estudo apresentou desempenho inferior ao do grupo controle.

Descritores: Transtornos da articulação; Fonoterapia; Linguagem infantil; Linguagem; Desenvolvimento da linguagem

ABSTRACT

PURPOSE: To carry out a late follow-up of the performance on language abilities of a study group with history of phonological disorders (after speech therapy), compared to a control group with normal phonological development.

METHODS: Eighteen subjects, nine from the study group and nine from the control group, participated in the study and were evaluated on written language, carrying out tasks of text comprehension, sentences complementation, sentences formation, paragraph continuation, and sentences combination, which are part of the TIPITI Language Assessment.

RESULTS: The results showed positive and strong statistically significant correlation between the groups regarding the language abilities. Statistically significant differences were also found between study and control groups on the Kruskal-Wallis test.

CONCLUSION: It was verified that, even after speech therapy and overcoming speech disorders, the study group showed lower performance on language tasks when compared to the control group.

Keywords: Articulation disorders; Speech therapy; Child language; Language; Language development

INTRODUÇÃO

As capacidades fonológicas de crianças em idade pré-escolar são consideradas preditivas do posterior sucesso no aprendizado da leitura e da escrita; crianças que apresentam dificuldades na linguagem oral, podem apresentar dificuldades no desenvolvimento da leitura(1). Autores indicam que a memória fonológica está relacionada positivamente com o grau de severidade do desvio fonológico(2). De acordo com a literatura, existe uma relação de previsibilidade entre os desvios fonológicos e a sua presença na escrita(3).

As alterações no sistema fonológico de crianças em fase pré-escolar podem influenciar a percepção da fala e, também, a organização e a compreensão das regras fonológicas(4-6).

A literatura acima citada nos possibilita pensar que crianças que apresentam histórico de desvio fonológico possam apresentar posteriores dificuldades no desenvolvimento da linguagem, pois os transtornos fonológicos podem acarretar déficits em habilidades de consciência fonológica e, consequentemente, levar a dificuldades de aprendizagem. Estudos de acompanhamento de crianças com desvios fonológicos mostraram que estas apresentaram melhoras significativas com a idade; entretanto, mesmo durante a adolescência e a idade adulta, esses indivíduos têm performances mais baixas do que grupos controle em várias tarefas de fala, leitura, soletragem e de consciência de fonemas(7).

A presente pesquisa tem como objetivo realizar um acompanhamento tardio do desempenho em habilidades de linguagem de um grupo de estudo com histórico de desvio fonológico (após ter realizado terapia fonológica), comparando-o com um grupo controle.

MÉTODOS

Este trabalho é um estudo de acompanhamento tardio e faz parte de projeto de pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição sob processo de número 23081.007151/2006-35.

O grupo que participou da pesquisa foi constituído por 18 sujeitos, sendo oito do sexo masculino e dez do feminino, que cursavam entre a 4ª e 8ª séries do ensino fundamental de escolas públicas, com idades entre nove e 15 anos (grupo controle) e 10 e 14 anos (grupo de estudo), no ano de 2006.

Destes participantes, nove constituíram o grupo de estudo, sendo cinco do sexo feminino e quatro do sexo masculino, que realizaram fonoterapia na clínica-escola, no período de 1998 a 2002. Os sujeitos do grupo de estudo tinham entre quatro anos e oito meses e seis anos e oito meses quando iniciaram a terapia fonológica. Um dos sujeitos apresentava desvio fonológico de grau moderado-severo; seis, desvio médio e dois, médio-moderado, de acordo com o Percentual de Consoantes Corretas(8-9) (PCC). Os demais participantes fizeram parte do grupo controle.

Para constituir o grupo controle foram selecionados sujeitos sem histórico de desvio fonológico ou de qualquer outro comprometimento de fala, linguagem ou orgânico. Essa seleção foi feita a partir da anamnese, realizada com os pais ou responsáveis, da avaliação informal (observação) da fala do sujeito e, também, de informações coletadas com os professores, nas escolas em que cada sujeito frequentava. O pareamento para o grupo controle foi realizado no momento do acompanhamento, considerando o grau de escolaridade dos sujeitos do grupo de estudo, ou seja, para cada sujeito do grupo de estudo, foi selecionado outro, com o mesmo grau de escolaridade.

Os sujeitos foram localizados a partir de seus endereços e telefones, registrados nos arquivos do Centro de Estudos de Linguagem e Fala da UFSM (CELF). Assim, foram convidados a participar da pesquisa. Os critérios de inclusão para compor o grupo de estudo foram: ter apresentado diagnóstico de desvio fonológico no período em que ingressaram no Serviço de Atendimento Fonoaudiológico (SAF) da instituição; ter sido submetido à fonoterapia, recebido alta do serviço fonoaudiológico e obter a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos pais ou responsáveis. Dos participantes da pesquisa que fizeram parte do grupo de estudo, quatro foram tratados pelo Modelo de Terapia Fonológica de Ciclos Modificado, três pelo Modelo ABAB-Retirada e Provas Múltiplas e dois pelo Modelo de Oposições Máximas. O tempo médio de terapia fonológica realizada foi de 20 sessões para cada sujeito. Após a realização da terapia os sujeitos receberam alta, pois haviam superado as alterações na fala e foram localizados novamente em 2006 para participar deste estudo, quando foram avaliados na linguagem escrita.

A avaliação da linguagem escrita foi realizada a partir da aplicação das provas de compreensão de texto, na qual foi apresentado um texto em que os sujeitos deveriam ler e após responder questões sobre o mesmo; complementação de sentenças, em que os sujeitos deveriam completar sentenças utilizando o complemento adequado, de acordo com a frase apresentada; formação de sentenças, em que eram apresentadas palavras para os sujeitos formarem frases; sequencialização de parágrafos, em que os sujeitos deveriam ordenar os parágrafos de acordo com a ordem dos acontecimentos e combinação de sentenças, em que os sujeitos deveriam combinar as sentenças dadas, formando uma única frase, sem alterar o sentido, o significado das sentenças e utilizando termos de ligação adequados. Estas provas, que fazem parte do Exame de Linguagem TIPITI(10), são diferenciadas e adequadas a cada nível de escolaridade. No caso deste estudo, foram aplicadas as provas que correspondiam aos níveis de escolaridade dos participantes da pesquisa, ou seja, da 4ª série até a 8ª série do ensino fundamental. Na prova de compreensão de texto, a porcentagem de acertos foi calculada considerando que o total de questões sobre o texto equivalia a 100%. Os valores de cada questão foram atribuídos de acordo com o número total de questões. No caso da prova aplicada para a 4ª série, o número total de questões foi cinco; logo, a cada questão foi atribuído o valor de 20%. Para o cálculo da média de acertos dos grupos controle e estudo foram somadas as porcentagens de cada prova e este total foi dividido pelo número de sujeitos. Isso foi feito separadamente para cada grupo. Para as demais provas, foi utilizado o mesmo procedimento para o cálculo da porcentagem de acertos e, também, para o cálculo das médias. Observa-se que os itens de cada prova foram julgados corretos ou errados de acordo com a exigência da prova em questão. As questões de compreensão de texto, por exemplo, foram julgadas levando-se em consideração a coerência das respostas, se estavam de acordo com o texto, desconsiderando-se os erros ortográficos. Nas provas de complementação, formação e combinação de sentenças, foi considerado o uso de conetivos adequados e a distorção, ou não, do sentido das frases. Nas provas de sequencialização de parágrafos, foi considerada a noção temporal, o entendimento da sequência de acontecimentos da estória apresentada no texto.

Para a análise dos dados foi utilizado teste de correlação r de Pearson e, também, o teste Kruskal-Wallis. O nível de confiança considerado foi de 5% (p<0,05). O teste Kruskal-Wallis foi utilizado para verificar diferenças significantes entre o desempenho do GE e GC nas habilidades de linguagem escrita. O teste r de Pearson foi utilizado para verificar se houve correlação entre as habilidades de linguagem escrita dos dois grupos estudados.

RESULTADOS

Na Tabela 1, são apresentados os dados utilizados na análise estatística de correlação dos grupos experimental e controle.

Na Tabela 2, são apresentados os resultados da análise estatística de correlação dos grupos experimental e de controle nas atividades de linguagem pesquisadas.

De acordo com a Tabela 2, é possível observar que houve correlação estatisticamente significante (p<0,05) entre as atividades de compreensão de texto e formação de sentenças (p=0,0162), complementação de sentenças e formação de sentenças (p=0,0092), compreensão de textos e sequencialização de parágrafos (0,0273), compreensão de texto e combinação de sentenças (p=0,0018), compreensão de texto e total das atividades de linguagem (p<0,0001), complementação e combinação de sentenças (p<0,0001), complementação de sentenças e total das atividades de linguagem (p=0,0002), formação de sentenças e combinação de sentenças (p<0,0001), formação de sentenças e total das atividades de linguagem (p=0,0002), sequencialização de parágrafos e total das atividades de linguagem (p=0,0111) e combinação de sentenças e total das atividades de linguagem (p<0,0001).

Os resultados da pesquisa mostram correlações estatísticas significantes, positivas e fortes entre os grupos estudados e, também, que há diferenças estatisticamente significantes entre o grupo estudo e o grupo controle, quanto ao resultado da análise realizada utilizando o teste Kruskal-Wallis.

Na Tabela 3, são apresentados os resultados da análise estatística de correlação do grupo controle.

Conforme a Tabela 3 é possível observar que houve correlações significantes entre as atividades de compreensão de texto e o total das atividades de linguagem; complementação de sentenças e combinação de sentenças; complementação de sentenças e o total das atividades; formação de sentenças e combinação de sentenças; formação de sentenças e o total das atividades; e combinação de sentenças e o total das atividades.

Na Tabela 4, são apresentados os resultados da análise estatística de correlação do grupo de estudo.

De acordo com a Tabela 4, pode-se observar que houve correlação significante entre as atividades de compreensão de texto e o total das atividades; formação de sentenças e combinação de sentenças; e combinação de sentenças e o total das atividades.

Na Tabela 5, são apresentados os resultados da análise estatística Kruskal-Wallis evidenciando as diferenças de desempenho entre os grupos de estudo e controle.

Entre os grupos (Tabela 5), as diferenças estatisticamente significantes (p<0,05) foram observadas nas atividades de complementação de sentenças (p=0,0010), formação de sentenças (p=0,0016), combinação de sentenças (p=0,0034) e no total das atividades de linguagem (p=0,0017). Todas as atividades em questão são atividades que solicitam dos sujeitos a integração de informações, entendimento das frases, noção de termos de ligação (que, porque, quando), capacidade de extrair significados das frases, noção da estrutura de frases, ou seja, habilidades de linguagem que envolvem todos os seus níveis, dentre os quais, a consciência morfossintática.

DISCUSSÃO

A consciência morfossintática se refere à capacidade de pensar sobre as palavras como categorias gramaticais e sobre sua posição nas frases (parte sintática) e também sobre a flexão e derivação das palavras (parte morfológica)(11). A mesma autora sugere que a aprendizagem da leitura e da escrita possa ser influenciada tanto pela consciência fonológica como pela consciência morfossintática, pois esta última possibilita o entendimento da palavra como categoria gramatical e sua adequada posição na construção das frases, aumentando a capacidade de produção da linguagem escrita. Para escrever é necessária a capacidade de pensar sobre a estrutura das palavras e sua posição na frase(12).

Um estudo de acompanhamento de crianças que apresentaram dificuldades fonológicas, em idade pré-escolar, avaliou a linguagem destes sujeitos na idade adulta. De acordo com os resultados desta pesquisa, adultos com histórico de dificuldades fonológicas continuaram a apresentar resultados inferiores, nos testes envolvendo habilidades de linguagem, quando comparados a um grupo controle(13), corroborando os achados do presente estudo.

A relação entre as habilidades na produção sintática e fonológica de crianças com alterações fonológicas severas e moderadamente severas foi estudada. De acordo com os resultados da pesquisa, a boa performance das crianças nestas tarefas parece estar relacionada a fatores como idade e nível de severidade das alterações morfossintáticas e fonológicas. Nesta pesquisa, crianças com desvio fonológico moderado e uma boa habilidade de produção morfossintática apresentaram melhora na realização de tarefas metafonológicas após, somente, a intervenção fonológica. Já, as crianças com desvio fonológico e alterações morfossintáticas apresentaram melhora na performance destas tarefas, após a intervenção fonológica e metafonológica(14).

Um estudo de acompanhamento de crianças em idade pré-escolar e com dificuldades de fala e linguagem foi realizado até a idade da adolescência. Foi aplicada uma bateria de testes de fala e de habilidades de leitura. Este estudo revelou que as crianças que superaram as dificuldades de linguagem não diferiram do grupo controle, nos testes de vocabulário e de compreensão da linguagem. Entretanto, apresentaram déficits nos testes envolvendo processamento fonológico e habilidades de leitura(15), o que concorda com os resultados encontrados na presente pesquisa.

As consequências do desvio fonológico para o desenvolvimento da linguagem foram relatadas em um estudo que avaliou crianças com histórico de desvio fonológico em idade pré-escolar. Foram testadas habilidades fonológicas, leitura e soletração, durante os períodos de pré-escola, escolar, adolescência e, também, na idade adulta. Os resultados mostraram que os sujeitos com desvio fonológico apresentaram performances mais pobres quando comparados a um grupo controle. Também foi constatada a melhora na performance desses sujeitos, da pré-escola para a idade escolar e da adolescência para a idade adulta. Sujeitos que apresentavam outros problemas de linguagem, somados ao desvio fonológico, mostraram resultados ainda mais pobres nas habilidades de leitura e soletração. De acordo com as autoras, as consequências dos desvios fonológicos, manifestados em idade pré-escolar, podem ser constatadas, mais adiante, em idade escolar persistindo até a idade adulta(16). Os resultados encontrados na presente pesquisa estão em conformidade com o estudo acima descrito, pois o grupo com histórico de desvio fonológico apresentou performance mais baixa que o grupo controle nas atividades de linguagem, sendo que os sujeitos que constituíram o grupo estudo, atualmente, se encontram com idades entre 10 e 14 anos.

Testes envolvendo habilidades fonológicas, semânticas e sintáticas foram aplicados em crianças em idade pré-escolar (quatro a seis anos) e com desvio fonológico. As pesquisadoras verificaram que, mais adiante, em idade escolar (oito a 11 anos), as crianças que apresentavam déficits na linguagem, haviam apresentado uma baixa performance nos testes pré-escolares envolvendo sintaxe e repetição de pseudopalavras. Já as crianças que apresentavam déficits na leitura, em idade escolar, haviam apresentado uma baixa performance em todos os testes pré-escolares, ou seja, fonologia, semântica e sintaxe(17).

Um programa de intervenção fonológica e metafonológica foi aplicado a crianças com déficits fonológicos. Os resultados da pesquisa salientaram que a intervenção fonológica e metafonológica podem promover melhora no desenvolvimento da fala e, também, no desenvolvimento das habilidades de leitura. O risco para a presença de dificuldades futuras, tanto na fala como na leitura, pode ser reduzido a partir da intervenção(18). Os resultados do presente estudo evidenciaram que, mesmo após a realização de terapia fonológica, houve diferenças estatisticamente significantes entre o desempenho dos grupos com e sem histórico de desvios fonológicos. Se o grupo em estudo não tivesse realizado terapia fonológica, provavelmente, a diferença do desempenho entre os grupos seria maior.

Crianças com alterações na fala e na linguagem, com idades entre cinco anos e dez meses, seis anos e sete meses e sete anos e oito meses foram comparadas a um grupo controle, quanto a habilidades de consciência fonológica e leitura. As crianças com dificuldades fonológicas apresentaram desempenho inferior nas habilidades de consciência fonológica e de leitura, independente de apresentar ou não, dificuldades adicionais de linguagem(19).

Outro estudo também evidenciou a importância das habilidades metalinguísticas como a consciência fonológica e a consciência sintática para a aquisição da leitura e da escrita(20). A relação entre as habilidades metalinguísticas de consciência fonológica, consciência sintática, consciência da palavra e o desempenho ortográfico foi observada em pesquisa com crianças de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental. A autora também observou que as habilidades e o desempenho ortográfico evoluíram com o avanço na escolarização(21).

Também foi constatado por meio de pesquisa que um grupo de maus leitores de 1ª série apresentaram discriminação fonológica pobre, baixa velocidade de processamento e memória fonológica pobre quando comparados com um grupo de bons leitores(22).

O presente estudo confirma os achados da pesquisa que verificou a reincidência dos desvios fonológicos na escrita de crianças, com idade entre sete e dez anos, que já haviam superado as alterações na fala(23). Este estudo comparou o desempenho de sujeitos com histórico de desvios fonológicos, após a realização de terapia fonoaudiológica, com um grupo controle. Os sujeitos foram avaliados quanto à linguagem e pôde-se constatar que mesmo tendo superado as alterações na fala, o grupo com desvios, obteve performance mais baixa do que o grupo controle nas atividades envolvendo a linguagem.

A literatura mostra a relação entre desvios fonológicos e consciência fonológica e memória de trabalho e severidade do desvio fonológico(2,24-26). Talvez a diferença estatística no resultado do presente estudo possa ser explicada a partir dessas relações, tendo como fator causal os transtornos fonológicos que dificultam o desenvolvimento das capacidades linguísticas posteriores.

CONCLUSÃO

Verificou-se que, mesmo após a realização de terapia fonológica e a superação dos desvios fonológicos, o grupo estudo apresentou desempenho inferior nas habilidades de linguagem avaliadas. Nesse caso, pode-se suspeitar que as alterações fonológicas tenham influenciado o desenvolvimento da linguagem. Deve-se dar atenção a aspectos que podem ser mais bem avaliados ou tratados, durante a terapia, no caso de diagnóstico de desvio fonológico, como o processamento e a memória fonológicos. Sugere-se a realização de mais estudos nessa área para conhecer melhor a relação entre as habilidades fonológicas e as outras áreas da linguagem.

Recebido em: 22/7/2008; Aceito em: 31/3/2009

Trabalho realizado na Universidade Federal de Santa Maria – UFSM – Santa Maria (RS), Brasil.

  • 1. Nathan L, Stackhouse J, Goulandris N, Snowling MJ. The development of early literacy skills among children with speech difficulties: a test of the "critical age hypothesis". J speech Lang Hear Res. 2004;47(2):377-91.
  • 2. Linassi LZ, Keske-Soares M, Mota HB. Habilidades de memória de trabalho e o grau de severidade do desvio fonológico. Pró-Fono. 2005;17(3):383-92.
  • 3. Freitas GCM, Santos RM. Desvios fonológicos na fala e na escrita: uma relação previsível? Fono Atual. 2003;6(23):26-32.
  • 4. Gillon GT. Facilitating phoneme awareness development in 3- and 4- year-old children with speech impairment. Lang Speech Hear Serv Sch. 2005;36(4):308-24.
  • 5. Rvachew S, Grawburg M. Correlates of phonological awareness in preschoolers with speech sound disorders. J Speech Lang Res. 2006;49(1):74-87. Comment in: J Speech Lang Hear Res. 2008;51(5):1215-8; author reply 219-26.
  • 6. Rvachew S, Chiang PY, Evans N. Characteristics of speech errors produced by children with and without delayed phonological awareness skills. Lang Speech Hear Serv Sch. 2007;38(1):60-71.
  • 7. Mota HB. Terapia fonoaudiológica para os desvios fonológicos. Rio de Janeiro: Revinter; 2001.
  • 8. Shriberg LD, Kwiatkowski J. Phonological disorders I: a diagnostic classification system. J Speech Hear Disord. 1982;47(3):226-41.
  • 9. Wertzner HF, Galea DES. Porcentagem de consoantes corretas - Revisada (PCC-R) e índice de densidade fonológica (PDI) na aquisição fonológica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2002;7(1):44-50.
  • 10. Braz HA, Pellicciotti THF. Exame de linguagem TIPITI. São Paulo: MJN; 1981.
  • 11. Guimarães SRK. Influência da variação linguística e da consciência morfossintática no desempenho em leitura e escrita. Interação Psicol. 2005;9(2):261-71.
  • 12. Correa J. A avaliação da consciência morfossintática na criança. Psicol Reflex Crit. 2005;18(1):91-7.
  • 13. Felsenfeld S, Broen PA, McGue M. A 28-year follow-up of adults with a history of moderate phonological disorder: linguistic and personality results. J Speech Hear Res. 1992;35(5):1114-25.
  • 14. Major EM, Bernhardt BH. Metaphonological skills of children with phonological disorders before and after phonological and metaphonological intervention. Int J Lang Commun Disord. 1998;33(4):413-44. Comment in: Int J Lang Commun Disord. 2001;36(2):265-9, author reply 271-6.
  • 15. Stothard SE, Snowling MJ, Bishop DV, Chipchase BB, Kaplan CA. Language-impaired preschoolers: a follow-up into adolescence. J Speech Lang Hear Res. 1998;41(2):407-18.
  • 16. Lewis BA, Freebairn L. Residual effects of preschool phonology disorders in grade school, adolescence, and adulthood. J Speech Hear Res. 1992;35(4):819-31.
  • 17. Lewis BA, Freebairn LA, Taylor HG. Academic outcomes in children with histories of speech sound disorders. J Commun Disord. 2000;33(1):11-30.
  • 18. Bernhardt B, Major E. Speech, language and literacy skills 3 years later: a follow-up study of early phonological and metaphonological intervention. Int J Lang Commun Disord. 2005;40(1):1-27.
  • 19. Bird J, Bishop DV, Freeman NH. Phonological awareness and literacy development in children with expressive phonological impairments. J Speech Hear Res. 1995;38(2):446-62.
  • 20. Capovilla AGS, Capovilla FC, Soares JVT. Consciência sintática no ensino fundamental: correlações com a consciência fonológica, vocabulário, leitura e escrita. Psico USF. 2004;9(1):39-47.
  • 21. Queiroga BAM, Borba DM, Vogeley ACE. Habilidades metalinguísticas e a apropriação do sistema ortográfico. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2004;9(2):73-80.
  • 22. Capovilla FC, Capovilla AGS. Problemas de aquisição de leitura e escrita: efeitos de déficit de discriminação fonológica, velocidade de processamento e memória fonológica. Est Pesqui Psicol. 2002;2(1):26-50.
  • 23. Santos RM. Reincidência de desvios fonológicos na escrita de crianças. In: Marchesan IQ, Zorzi JL, Gomes ICD. Tópicos em fonoaudiologia:1997-1998. Sao Paulo: CEFAC: Lovise;1997-199898. v. 4. p. 33-47.
  • 24. Mota HB, Melo Filha MGC, Lasch SS. A consciência fonológica e o desempenho na escrita sob ditado de crianças com desvio fonológico após realização de terapia fonoaudiológica. Rev CEFAC. 2007;9(4):477-82.
  • 25. Morales MV, Mota HB, Keske-Soares M. Consciência fonológica: desempenho de crianças com e sem desvios fonológicos evolutivos. Pró-Fono. 2002;14(2):153-64.
  • 26. Vieira MG, Mota HB, Keske-Soares M. Relação entre idade, grau de severidade do desvio fonológico e consciência fonológica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2004;9(3):144-50.
  • Endereço para correspondência:

    Maria das Graças de Campos Melo Filha
    R. Marechal Deodoro, 1038/302, Centro
    Santa Cruz do Sul (RS), Brasil, CEP: 96810-110
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Recebido
      22 Jul 2008
    • Aceito
      31 Mar 2009
    Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia Al. Jaú, 684 - 7º andar, 01420-001 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (55 11) 3873-4211 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@sbfa.org.br