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Análise das modificações vocais de repórteres na situação de ruído

Resumos

OBJETIVO: Verificar e comparar a ocorrência das modificações vocais de repórteres e não-repórteres na presença de ruído mascarante. MÉTODOS:Participaram 46 sujeitos, sendo 23 repórteres e 23 não-repórteres (grupo controle), todos com audição normal. Os participantes deveriam ler um trecho de uma matéria de telejornal em três situações de escuta: sem ruído mascarante, com ruído de 50 dB, e com ruído de 90 dB. As narrações foram gravadas e submetidas à avaliação perceptivo-auditiva (realizada por uma fonoaudióloga especialista em voz) e análise acústica (medidas extraídas por meio do Software Voxmetria - CTS Informática). RESULTADOS: Com 50 dB de mascaramento, houve maior aumento nos parâmetros pitch (82,6%), loudness (91,3%) e tensão (82,6%) no grupo controle, quando este foi comparado ao grupo dos repórteres. O mesmo ocorreu com ruído de 90 dB para os parâmetros pitch (95,7%), loudness (100%) e tensão (91,3%). CONCLUSÃO: As consequências negativas do efeito Lombard ocorrem em ambos os grupos, porém, pelas respostas apresentadas, os repórteres demonstram conseguir inibir parcialmente o impacto negativo das situações de ruído, por provável estabilidade da emissão profissional e ativação de outras vias de monitoramento.

Voz; Qualidade da voz; Mascaramento perceptivo; Efeitos do ruído; Treinamento da voz; Percepção sonora


PURPOSE: To investigate and compare the occurrence of vocal changes in the presence of masking noise between reporters and other professionals. METHODS: Participants were 46 subjects with normal hearing, 23 reporters (study group) and 23 non-reporters (control group). Participants read an excerpt from a TV news broadcast in three listening situations: without masking noise, with 50 dB white noise, and with 90 dB white noise. The narrations were recorded and then submitted to auditory-perceptual and acoustic analyses. The auditory-perceptual analysis was performed by a speech-language pathologist specialized in voice. The acoustic analysis used the software Voxmetria (CTS Informática) to perform the acoustic measurements. RESULTS: In the situation with 50 dB masking noise, individuals in the control group had higher increase of the following parameters, when compared to the group of reporters: pitch (82.6%), loudness (91.3%), and strain (82.6%). The same occurred in the situation with 90 dB masking noise for the same parameters: pitch (95.7%), loudness (100%) and strain (91.3%). CONCLUSION: The negative consequences of the Lombard effect occur in both groups; however, reporters showed the ability to partially inhibit the negative impact of noise situations, probably due to the stability of the professional speech production and activation of other feedback pathways.

Voice; Voice quality; Perceptual masking; Voice training; Noise effects; Loudness perception


ARTIGO ORIGINAL

Análise das modificações vocais de repórteres na situação de ruído

Cristina Ribeiro Paiva Caldeira; Vanessa Pedrosa Vieira; Mara Behlau

Centro de Estudos da Voz – CEV – São Paulo (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Cristina Ribeiro Paiva Caldeira. R. Pilar 530/502, Grajaú Belo Horizonte (MG), Brasil, CEP: 30431-225. E-mail: paiva.tina@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Verificar e comparar a ocorrência das modificações vocais de repórteres e não-repórteres na presença de ruído mascarante.

MÉTODOS:Participaram 46 sujeitos, sendo 23 repórteres e 23 não-repórteres (grupo controle), todos com audição normal. Os participantes deveriam ler um trecho de uma matéria de telejornal em três situações de escuta: sem ruído mascarante, com ruído de 50 dB, e com ruído de 90 dB. As narrações foram gravadas e submetidas à avaliação perceptivo-auditiva (realizada por uma fonoaudióloga especialista em voz) e análise acústica (medidas extraídas por meio do Software Voxmetria – CTS Informática).

RESULTADOS: Com 50 dB de mascaramento, houve maior aumento nos parâmetros pitch (82,6%), loudness (91,3%) e tensão (82,6%) no grupo controle, quando este foi comparado ao grupo dos repórteres. O mesmo ocorreu com ruído de 90 dB para os parâmetros pitch (95,7%), loudness (100%) e tensão (91,3%).

CONCLUSÃO: As consequências negativas do efeito Lombard ocorrem em ambos os grupos, porém, pelas respostas apresentadas, os repórteres demonstram conseguir inibir parcialmente o impacto negativo das situações de ruído, por provável estabilidade da emissão profissional e ativação de outras vias de monitoramento.

Descritores: Voz; Qualidade da voz; Mascaramento perceptivo; Efeitos do ruído; Treinamento da voz; Percepção sonora

INTRODUÇÃO

O monitoramento auditivo desempenha importante papel no controle da voz pela regulação dos processos respiratórios e fonatórios(1,2). Além disso, o monitoramento é considerado um recurso importante no controle dos parâmetros de frequência, intensidade e qualidade da voz(3,4,5). Diversos estudos reforçam a relevância do monitoramento auditivo no processo fonatório e afirmam que o sistema de controle auditivo é crucial para a organização da produção vocal, pois é através dele que o indivíduo monitora e confirma a efetividade de sua comunicação(6).

Alguns parâmetros da produção vocal sofrem mudanças quando há impedimento ou interrupção do controle auditivo. A presença de ruído ambiental é uma condição que pode dificultar o monitoramento auditivo da voz, comprometendo a comunicação. Como efeito da presença de ruído, ocorre um fenômeno descrito por Etiene Lombard em 1911(7), conhecido como Reflexo ou Efeito Lombard, que consiste em uma resposta automática de aumento da intensidade vocal.

A atuação do repórter depende da utilização da voz, e um pequeno desvio vocal pode prejudicar a carreira deste profissional(8). Os fatores quantidade e qualidade de uso da voz associados a algumas situações de gravação, como a presença de ruído ambiental, inserem estes profissionais em um grupo de risco para desenvolvimento de problemas na voz(9,10). Isso ocorre porque o aumento da intensidade fonatória é um tipo de abuso que pode contribuir para o desenvolvimento de distúrbios vocais(11,12).

Além de boa qualidade vocal, o repórter deve ser capaz de manter a atenção do telespectador e transmitir a mensagem com clareza. Muitas vezes as situações de gravação de uma mesma matéria são diferentes. O off (parte da reportagem em que se escuta a voz do repórter enquanto são vistas as imagens sobre o tema) pode ser gravado em uma cabina ou em ambiente silencioso (quando o repórter está fora da emissora), e a passagem (parte da reportagem em que o repórter aparece no vídeo no local da notícia) ser realizada em local ruidoso. No entanto, grandes discrepâncias na voz do repórter nessas duas situações (off e passagem) não devem acontecer, pois elas farão parte de uma mesma reportagem. Tal fato nos conduz à hipótese de que, além da via auditiva, os repórteres utilizam outras vias de monitoramento da voz.

Estudos realizados com cantores treinados sugerem a existência de um segundo circuito de controle fonatório baseado em pistas cinestésicas(3). A hipótese do monitoramento cinestésico surgiu baseada na evidência de que cantores conseguem manter a acurácia da fonação mesmo quando não ouvem suas próprias vozes. Desta forma, dois sistemas de controle neuromuscular parecem agir durante a fonação, os circuitos de monitoramento auditivo e cinestésico. Achados sugerem que o monitoramento cinestésico age de forma mais eficiente em cantores do que em não cantores quando há uma interrupção do monitoramento auditivo(13,14).

Considerando que os repórteres enfrentam condições ambientais ruidosas no trabalho e necessitam manter uma boa qualidade vocal e desempenho comunicativo com grande demanda do uso da voz, é relevante à prática clínica conhecer o comportamento vocal deste grupo frente às situações de ruído(10). Embora se conheça a importância do monitoramento auditivo no controle da fonação, observa-se que mesmo nas situações ruidosas alguns repórteres modificam pouco o padrão vocal. Desta forma, este estudo teve o objetivo de verificar e comparar a ocorrência das modificações vocais na de repórteres e não-repórteres na presença de ruído, além de caracterizar a natureza desses desvios e estabelecer um paralelo entre as modificações ocorridas na voz dos repórteres com o tempo de atuação e realização de treinamento auditivo anterior.

MÉTODOS

O presente estudo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Estudos da Voz, sob o número 716/08, foi realizado com repórteres de uma emissora de televisão brasileira. Participaram 46 sujeitos, sendo 23 repórteres (Grupo Caso) e 23 não-repórteres (Grupo Controle). Todos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

No grupo de repórteres, havia 10 sujeitos do gênero masculino (43,5%) com média etária de 33,7anos (±7,77) e 13 sujeitos do gênero feminino (56,5%) com média etária de 27,6 anos (±7,77). Para o grupo controle, foram selecionados funcionários da mesma emissora, não-repórteres, que não faziam uso profissional da voz e não tinham sido submetidos a treinamento vocal ou auditivo prévios. Neste grupo, 12 eram do gênero masculino (52,1%) com média de idade de 30,5 anos (±3,39) e 11 eram do gênero feminino (47,9%) com média de idade de 31 anos (±5,60). A quantidade de homens e mulheres nas duas amostras foi equilibrada. Todos os participantes foram submetidos à audiometria, com resultados dentro dos padrões de normalidade.

Foi coletada uma amostra de fala do seguinte trecho de uma matéria de telejornal: "A fila só não ficou maior e os preços não subiram ainda mais, porque nunca houve tanto financiamento para a casa própria. Como mais gente consegue comprar um imóvel aumenta a oferta no mercado de locação".

Os indivíduos puderam fazer uma primeira leitura do texto anteriormente à gravação, para se familiarizarem com o conteúdo. Não foram fornecidas quaisquer informações quanto ao controle da voz durante as gravações. Os dois grupos leram a mesma passagem em três momentos: o primeiro sem ruído mascarante e os dois subsequentes com ruído de 50 e 90 dB, respectivamente. As gravações foram realizadas em sala silenciosa, com o indivíduo em pé, e microfone posicionado a 45º e 5 cm de distância da boca do participante.

Os equipamentos utilizados foram: laptop HP Pavillion®; microfone Shure® SM58; fone Sony® MDR-7506 profissional. Para introduzir o ruído e fazer o registro da gravação foi utilizada a ferramenta de mascaramento do programa Fonotools 1.5 (CTS informática).

As amostras de fala coletadas foram submetidas à análise perceptivo-auditiva e acústica. Uma fonoaudióloga especialista em voz, sem conhecimento prévio sobre a situação de gravação (com ou sem ruído), analisou perceptivo-auditivamente os parâmetros loudness, pitch, tensão, velocidade e articulação da fala. As gravações foram comparadas duas a duas, por sujeito, sem identificação e apresentadas em ordem casual. O avaliador deveria identificar se os parâmetros vocais aumentaram, diminuíram ou se mantiveram, comparando uma gravação com a outra. Desta forma, as gravações foram confrontadas seguindo o seguinte agrupamento: 50 dB em relação a 0, 90 dB em relação a 50 dB e a 90 dB em relação a 0. A extração das medidas acústicas foi realizada por meio do programa VoxMetria 3.0 (CTS), sendo selecionados os seguintes parâmetros: frequência média em Hz, frequência mínima e máxima em Hz, duração do segmento em segundos, média intensidade em dB, variabilidade em Hz.

Todas as análises com o Grupo Caso foram feitas levando em consideração o tempo de atuação e relato de treinamento auditivo anterior. A classificação tempo de atuação foi dividida em três subgrupos: 0-5 anos (n=9), 6-10 anos (n=8), e >11 anos (n=6). Em relação ao treinamento auditivo anterior, o grupo de repórteres foi dividido em dois subgrupos: treinados (n=7) e não treinados (n=16).

Os testes estatísticos utilizados para análise dos dados perceptivo-auditivos e acústicos foram os não-paramétricos (Igualdade de Duas Proporções, Mann Whitney e Kruskal-Wallis). O nível de significância definido foi de 0,05 (5%). Os cálculos realizados por meio do software Minitab demonstraram que a amostragem de 23 sujeitos para cada grupo possui um poder alto com valor de 78,31% (0,7831).

RESULTADOS

Na análise dos resultados perceptivo-auditivos, foi utilizado o teste de Igualdade de Duas Proporções. Na presença de 50 dB, o Grupo Caso teve uma maior manutenção dos parâmetros loudness, pitch e tensão quando comparado ao Grupo Controle. O mesmo ocorreu com 90 dB de mascaramento. Nas duas situações, os parâmetros mais desviados no Grupo Controle foram: loudness aumentada, pitch mais agudo e maior tensão. Além disso, com mascaramento de 90 dB, houve tendência estatística de aumento da velocidade e da precisão articulatória. Os parâmetros perceptivo-auditivos sofreram aumento em ambos os grupos, porém um número maior de sujeitos do Grupo Caso manteve os parâmetros loudness, pitch e tensão quando inseridos 50 dB e 90 dB de mascaramento, mesmo sem instrução (Tabela 1).

Não houve variações nos parâmetros perceptivo-auditivos na presença de 50 dB e 90 dB de mascaramento. Desta forma, pôde-se observar que independentemente da quantidade de mascaramento acrescida, houve uniformidade nas respostas, que são mais evidentes no grupo controle (Tabela 2).

O resultado da análise acústica mostrou que, na presença de 90 dB de mascaramento, a frequência fundamental mínima foi mais aguda no grupo controle, já a variabilidade de fre­quência fundamental em Hz se manteve maior no grupo caso. Essa diferença manteve-se constante mesmo quando houve o aumento da intensidade do mascaramento (Tabela 3). Os dois grupos demonstraram aumento da média de intensidade e da frequência média quando foram inseridos 50 dB e 90 dB de mascaramento.

Com intuito de caracterizar e compreender melhor o Grupo Caso foi realizada a análise dos dados acústicos e perceptivo-auditivos relacionando o tempo de atuação e a realização de treinamento auditivo anterior. A análise estatística demonstrou que, nas comparações relacionadas ao treinamento auditivo prévio, houve diferenças nos parâmetros articulação e velocidade com 50 dB de mascaramento e nos parâmetros loudness, pitch, tensão e velocidade com 90 dB. Porém, o mesmo não ocorreu para o tempo de atuação. Desta forma, foi averiguado que houve um maior aumento dos parâmetros precisão articulatória, loudness e pitch na presença de 50 dB e 90 dB de mascaramento no grupo sem treinamento. O grupo treinado apresentou pouca variação de loudness , pitch , tensão e velocidade de fala na presença de 90 dB de mascaramento em relação a 50 dB (Tabela 4).

Os dados acústicos também revelaram diferenças entre os sujeitos do Grupo Caso relacionadas ao treinamento auditivo. Na presença de 50 dB e 90 dB os valores dos parâmetros intensidade máxima e média foram maiores no grupo não treinado do que no grupo com treinamento anterior. Os sujeitos não treinados tiveram valores de intensidade máxima (78,6 dB) superiores aos valores dos sujeitos treinados (76,1dB) quando expostos a 50 dB de mascaramento. O mesmo ocorreu com 90 dB de mascaramento entre não treinados (80,3 dB) e treinados (76,8 dB). O parâmetro acústico média de intensidade também foi superior no grupo não treinado em ambas as situações, da seguinte forma: em 50 dB os sujeitos treinados mantiveram média de 58,1 dB e os não treinados 60,8 dB; em 90 dB, treinados apresentaram 59,3 dB e os não-treinados 62,6 dB.

DISCUSSÃO

O aumento da intensidade vocal pode ser considerado um dos abusos vocais que mais compromete e põe em risco a saúde da voz. O ruído é considerado um dos principais fatores que contribuem para a elevação da intensidade vocal, pois interrompe o monitoramento auditivo e compromete o controle da fonação. Diversos estudos buscaram compreender melhor o comportamento vocal dos indivíduos em situações ruidosas(2,7,11,12,15,16). Os resultados obtidos na presente pesquisa respondem aos questionamentos que nortearam o estudo.

De acordo com os resultados obtidos, ambos os grupos avaliados sofreram modificações na voz caracterizadas por aumento dos parâmetros loudness, tensão e pitch. De modo semelhante, uma pesquisa realizada com indivíduos portadores de doença de Parkinson observou melhora na qualidade vocal destes na presença de ruído, provavelmente por aumento da loudness, tensão e articulação mais precisa(17) Esses dados corroboram os achados de pesquisas que explicam o efeito Lombard(7,18-21). Ramig et al.(22), por meio do método LSVT®, observaram que o aumento da intensidade vocal tem associação direta com uma articulação mais precisa. Assim como no método LSVT®, a fala mascarada dispara o ajuste de aumento da intensidade e ocorre melhora em outros subsistemas da fala, que trabalham em ação conjunta. Portanto, esta afirmação explica o fato do grupo controle ter aumentado a precisão articulatória na presença de 90 dB de mascaramento.

Ambos os grupos apresentaram aumento da média de intensidade e frequência média quando foram inseridos 50 dB e 90 dB de mascaramento. Este resultado já foi observado na literatura, que afirma que a ausência de monitoramento auditivo gera mudanças caracterizadas principalmente por descontrole na intensidade e deslocamento da frequência fundamental(12,15). Na presente pesquisa, os valores acústicos de variabilidade de frequência em Hz foram maiores na presença de ruído mascarante. Este dado corrobora os achados de um estudo que teve por objetivo caracterizar a capacidade vocal de 252 universitários e concluiu que o aumento da intensidade vocal gerou deslocamento da frequência fundamental(23).

Os resultados desse estudo demonstram que um número maior de sujeitos do Grupo Caso manteve os parâmetros loudness, pitch e tensão na presença de 50 dB e 90 dB de mascaramento. Esse achado nos leva a refletir sobre outras formas de controle e monitoramento da voz, pois mesmo com o impedimento e interrupção do monitoramento auditivo, alguns profissionais conseguiram manter parâmetros vocais intactos. Uma pesquisa realizada com 28 estudantes de canto estimou a significância do monitoramento auditivo e cinestésico no controle da frequência vocal. Os resultados mostraram que a acurácia da entonação ficou reduzida com o impedimento do monitoramento auditivo e, nessas condições, os cantores deveriam invocar os circuitos de monitoramento cinestésico(13).

Diversos estudos buscaram compreender melhor o comportamento vocal de indivíduos normais(2,6,14), com distúrbios na comunicação(12,17) e profissionais da voz(13,16) na presença de ruído. Outros abordaram o treinamento vocal e capacidade de inibição do efeito Lombard. Nesse sentido, experimentos foram realizados para testar e inibir o efeito Lombard por meio de instrução e/ou treinamento com monitoramento visual(16,20). De acordo com um experimento realizado, no qual se separou os participantes em dois grupos (grupo com experiência em falar sob o ruído e grupo inexperiente), concluiu-se que, quando foi dada a instrução, os sujeitos experientes tiveram maior capacidade de aproximar a intensidade vocal a uma constante, apesar do ruído. Entretanto, nenhum dos grupos foi capaz de suprimir o efeito Lombard completamente, mesmo quando as instruções foram combinadas ao monitoramento visual(20). Seguindo a mesma linha de pesquisa, outro estudo realizado com 27 cantores de coral, avaliou o efeito da instrução na inibição do efeito Lombard(16). O autor concluiu que as instruções foram efetivas para suprimir o efeito Lombard. Sendo assim, os cantores podem aprender a resistir e conscientemente regular a resposta automática de aumentar a intensidade da voz no ruído. Desta forma, na presente pesquisa, os achados de maior controle vocal no ruído pelo Grupo Caso e principalmente por aqueles que passaram por um treinamento anterior, corroboram com os dados expostos na literatura, uma vez que os repórteres, assim como os cantores, sofreram a interrupção do monitoramento auditivo pelo ruído e necessitaram utilizar outras vias de monitoramento da voz.

No presente estudo, não houve diferença entre o tempo de atuação dos repórteres e as mudanças nos parâmetros vocais tanto acústicos quanto perceptivo-auditivos. Porém, pôde-se concluir que o treinamento auditivo anterior contribuiu de alguma forma para inibir as consequências negativas do efeito Lombard(16,20). Apesar de não haver informações sobre tipo, frequência e duração do treinamento realizado por estes repórteres, observa-se que este recurso pode ajudar no controle dos parâmetros vocais no ruído. Desta forma, conclui-se que há a necessidade de realização de novas pesquisas que busquem identificar as técnicas ideais para inibir ou minimizar o efeito Lombard. Estes estudos podem beneficiar profissionais que utilizam a voz em ambientes ruidosos como os repórteres, e em consequência, ajudar a prevenir desordens vocais decorrentes do uso da voz nestes ambientes.

CONCLUSÃO

Na presença de ruído mascarante, repórteres e não repórteres sofrem modificações na voz caracterizadas por aumento da loudness, pitch, tensão e precisão articulatória, com maiores deslocamentos no grupo de não repórteres. Desta forma, os profissionais da voz conseguem minimizar as consequências negativas do efeito Lombard e manter a estabilidade da emissão quando expostos a situação de ruído, por provável ativação das vias de monitoramento cinestésico.

Os repórteres com treinamento auditivo anterior demonstram maior habilidade em inibir o efeito Lombard, apresentando menores modificações nos parâmetros vocais na presença de ruído. O tempo de atuação do profissional não é um fator determinante para manutenção de parâmetros vocais em situações ruidosas.

Recebido em: 20/9/2010

Aceito em:31/8/2011

Conflito de interesses: Não

Trabalho realizado no Centro de Estudos da Voz – CEV – São Paulo (SP), Brasil.

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  • Endereço para correspondência:

    Cristina Ribeiro Paiva Caldeira.
    R. Pilar 530/502, Grajaú
    Belo Horizonte (MG), Brasil, CEP: 30431-225.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Set 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      20 Set 2010
    • Aceito
      31 Ago 2011
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