Primeira evidência de Trypanosoma rangeli no sudeste do Brasil, região endêmica para doença de Chagas

First evidence of Trypanosoma rangeli in the southeast of Brazil, an endemic region to Chagas' disease

NOTA PRÉVIA

Primeira evidência de Trypanosoma rangeli no sudeste do Brasil, região endêmica para doença de Chagas

First evidence of Trypanosoma rangeli in the southeast of Brazil, an endemic region to Chagas' disease

Luis Eduardo Ramirez, Maria Inês Machado, Paula G. Maywald, Aldo Matos, Egler Chiari e Eliane Lages Silva

Resumo Informa-se, pela primeira vez, os achados de Trypanosoma rangeli no Triângulo Mineiro, Sudeste do Brasil, área altamente endêmica para doença de Chagas, assim como a infecção natural da espécie Didelphis albiventris .com este mesmo tripanosoma. Estes foram demonstrados por esfregaços sangüíneos, xenodiagnóstico, hemocultura, microhematócrito e PCR. A PCR foi realizada nas fezes e hemolinfa de Triatoma infestans , usando como controle cepas de T. rangeli provenientes da Colômbia.

Palavras-chaves: Trypanosoma rangeli . Didelphis albiventris . Doença de Chagas.

Abstract This short communication informs the discovery of Trypanosoma rangeli for the first time at Triângulo Mineiro region, South-east of Brazil, a highly endemic area of Chagas'disease and also the natural infection of Didelphis albiventris with the same trypanosome. Both the findings were demonstrated through blood smears, xenodiagnosis, microhematocrit technics and PCR. The last one was realized in faeces and hemolymph of Triatoma infestans utilizing as controls strains of T. rangeli from Colombia.

Key-words: Tripanosoma rangeli. Didelphis albiventris . Chagas' disease.

Trypanosoma rangeli é um parasita hemoflagelado que infecta diversas espécies de hemipteros hematófagos e mamíferos, inclusive o homem. Este protozoário não é considerado patogênico para hospedeiros vertebrados que são infectados pela picada do vetor, principalmente por triatomíneos do gênero Rhodnius ⁶. No homem e reservatórios domésticos ou silvestres a parasitemia é baixa e de curta duração, existindo controvérsias relacionadas com sua reprodução. Nos hospedeiros invertebrados naturais invade o hemocele e multiplica-se na hemolinfa, nos hemócitos e posteriormente nas glândulas salivares, podendo lesar o intestino, os túbulos de Malpiglhi, cutícula, traquéia, glândulas salivares e sistema nervoso^{10 13 17 23}.

A presença simultânea de T. rangeli e T. cruzi em uma mesma região geográfica possibilita a ocorrência de infecções únicas ou mistas, tanto nos hospedeiros vertebrados como invertebrados¹⁴ dificultando o diagnóstico diferencial das mesmas. Atualmente, recomenda-se a utilização de diversas metodologias laboratoriais para identificar e caracterizar os isolados primários de T. rangeli, bem como para diferencia-lo do T. cruzi, já que podem apresentar reações sorológicas cruzadas¹². São sugeridos estudos morfológicos dos parasitas, teste de sensibilidade à lise pelo complemento humano e de cobaio, teste de aglutinação com lectina germe de trigo (WGA), imunofluorescência indireta com anticorpos monoclonais, perfil de isoenzimas e reação em cadeia da polimerase (PCR)^{1 4 9 11 15 16 18 19 21 22}.

Embora as prevalências humana e animal pelo T. rangeli não estejam bem estabelecidas, considera-se ampla a sua distribuição geográfica nas Américas Central e do Sul. No Brasil, foi reportado pela primeira vez por Deane⁷ em Didelphis marsupialis no Estado do Pará. Posteriormente, Barrett e Oliveira³ o encontraram em ninfas de Rhodnius domesticus na Bahia; Miles e cols¹⁴ reconheceram 46 cepas provenientes de diferentes mamíferos e vetores da bacia Amazônica; D'Alessandro⁵ encontrou o parasita em macacos Saguinus mistax no Estado de Amazonas e Steindel e cols²⁰ informaram sua presença em roedores Echimys dasythrix no Estado de Santa Catarina. Mais recentemente, foi encontrado em ninfas de R. neglectus no Estado de Tocantins⁸.

Na presente comunicação relatamos pela primeira vez o achado de T. rangeli na região sudeste do Brasil, denominada Triângulo Mineiro, área altamente endêmica para doença de Chagas, assim como a infecção natural de marsupiais da espécie Didelphis albiventris com este mesmo tripanosoma.

Dentre a mastofauna resgatada na construção da Usina Hidrelétrica de Miranda (UHM), CEMIG, situada no município de Uberlândia, Minas.Gerais, foram capturados 19 espécimes adultos de D. albiventris, dos quais 14 eram fêmeas, três machos e dois mais jovens não tiveram o sexo determinado. Os animais foram transferidos para o Centro de Triagem da UHM, acomodados em gaiolas de madeira grandes e alimentados com ração balanceada. Mais tarde, foram submetidos a exames clínicos, biométricos e, após anestesia, sangrados da veia jugular. Em cada animal foram realizados: exame direto, esfregaço e hemocultura (LIT). Os resultados mostraram 7 (36,8%) hemoculturas positivas e 3 (15,7%) esfregaços positivos apresentando tripomastigotas morfologicamente semelhantes a T. cruzi. Seis dos 7 animais positivos para tripanosomatídeos, cinco fêmeas e um macho, foram posteriormente encaminhados à Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (FMTM) em Uberaba, onde foram realizados exames complementares, tais como: xenodiagnóstico com ninfas de 3º estágio de Triatoma infestans, hemocultura, microhematócrito e PCR. A PCR foi realizada nas fezes e hemolinfa dos triatomíneos com os iniciadores S-35 e S-362 de acordo com as especificações propostas por Vallejo²², utilizando como controle positivo as cepas de T. rangeli CH (Choachi) e P19, ambas isoladas de glândulas salivares de R. prolixus na Colômbia e três cepas de T. cruzi isoladas de pacientes chagásicos crônicos na região do Triângulo Mineiro.

Os resultados demonstraram parasitemia patente em 100% dos animais como evidenciado pelo microhematócrito, hemocultura e xenodiagnóstico. O exame da hemolinfa e fezes dos triatomíneos mostraram dois animais com xenodiagnóstico positivo na hemolinfa, três na hemolinfa e fezes e um somente nas fezes. Destes triatomíneos, foram selecionados exemplares de um xenodiagnóstico positivo em fezes e hemolinfa para a realização do PCR, o qual demonstrou amplificação dos fragmentos da região variável de 330pb do minicírculo do kDNA do T. cruzi, um conjunto de fragmentos de 300 a 450pb e um fragmento específico de 760 pb derivados da região variável do T. rangeli, evidenciados nos géis de agarose e acrilamida. Estes resultados permitiram concluir que o tripanosoma presente na hemolinfa e fezes dos triatomíneos alimentados em Didelphis albiventris corresponde a T. rangeli segundo as especificações de Vallejo²².

Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Universidade Federal de Uberlândia,Uberlândia, MG, Departamento de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG e Companhia Energética de Minas Gerais

Apoio: Companhia Energética de Minas Gerais.

Endereço para correspondência: Dr. Luis Eduardo Ramirez. Disciplina de Parasitologia Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro. Praça Manoel Terra 330, 380015-050 Uberaba, MG .Tel. [phone].

Recebido para publicação em 21/11/97.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  13 Jun 2000
• Data do Fascículo
  Fev 1998

Histórico

• Recebido
  21 Nov 1997