Acessibilidade / Reportar erro

Achados audiológicos em indivíduos pós-meningite

Hearing findings in subjects after meningitis

Resumos

INTRODUÇÃO: Realizou-se estudo para verificar a ocorrência de indivíduos que apresentam perda auditiva por terem contraído meningite, bem como caracterizar a perda diagnosticada quanto ao tipo, ao grau e à configuração audiométrica. MATERIAL E MÉTODO: Foram levantados 949 prontuários de pacientes atendidos em um centro de distúrbios da audição, selecionados os que indicaram perda auditiva pós- meningite e realizada avaliação audiológica a que foram submetidos os pacientes. RESULTADOS E CONCLUSÃO: Os resultados indicaram 6,2% de ocorrência de perda auditiva devido à meningite. A característica dessa perda auditiva foi do tipo predominantemente neurossensorial, simétrica, linear e de grau profundo.

Perda auditiva bilateral; Meningite


INTRODUCTION: It was proposed to ascertain the occurrence of individuals who present hearing loss, due to contracting meningitis, as well as to characterize the diagnosed loss as far as the type, degree and the audiometric configuration are concerned. MATERIAL AND METHOD: The methodology used comprised a survey of 949 references of patients attended at the Hearing Disturbance Center of the HPRLLP/USP, in order to select those who presented hearing loss after meningitis and, from the analysis of the hearing evaluation to which they were submitted, achieve the proposed goal. RESULTS AND CONCLUSION: The results indicated a 6.2 percent occurrence as regards hearing loss due to meningitis in relation to other causes and the characteristic of this hearing loss was predominantly sensorineural, symmetrical, al linear and to a profound degree.

Hearing loss, bilatera; Meningitis


Notas e Informações

Notes and Information

Achados audiológicos em indivíduos pós-meningite** Edição subvencionada pela FAPESP. Processo 96/5999-9. Edição subvencionada pela FAPESP. Processo 96/5999-9.

Hearing findings in subjects after meningitis

Juliana H. Romero** ** Alunas do 4º ano do Curso de Fonoaudiologia da FOB-USP (1996) , Marina S. Carvalho** ** Alunas do 4º ano do Curso de Fonoaudiologia da FOB-USP (1996) e Mariza R. Feniman

Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP). Bauru, SP - Brasil (M. R. F.)

Resumo

Introdução Realizou-se estudo para verificar a ocorrência de indivíduos que apresentam perda auditiva por terem contraído meningite, bem como caracterizar a perda diagnosticada quanto ao tipo, ao grau e à configuração audiométrica. Material e Método Foram levantados 949 prontuários de pacientes atendidos em um centro de distúrbios da audição, selecionados os que indicaram perda auditiva pós- meningite e realizada avaliação audiológica a que foram submetidos os pacientes. Resultados e Conclusão Os resultados indicaram 6,2% de ocorrência de perda auditiva devido à meningite. A característica dessa perda auditiva foi do tipo predominantemente neurossensorial, simétrica, linear e de grau profundo. Perda auditiva bilateral, etiologia. Meningite, complicações. Abstract Introduction It was proposed to ascertain the occurrence of individuals who present hearing loss, due to contracting meningitis, as well as to characterize the diagnosed loss as far as the type, degree and the audiometric configuration are concerned. Material and Method The methodology used comprised a survey of 949 references of patients attended at the Hearing Disturbance Center of the HPRLLP/USP, in order to select those who presented hearing loss after meningitis and, from the analysis of the hearing evaluation to which they were submitted, achieve the proposed goal. Results and Conclusion

The results indicated a 6.2 percent occurrence as regards hearing loss due to meningitis in relation to other causes and the characteristic of this hearing loss was predominantly sensorineural, symmetrical, al linear and to a profound degree.

Hearing loss, bilatera, etiology. Meningitis, complications.

INTRODUÇÃO

A meningite está freqüentemente associada a elevado número de mortalidade. Daqueles que sobrevivem, uma grande parte apresentam seqüelas da doença, entre elas, a perda auditiva1, 2, 4, 5, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 15, 18, 19, 20, além de retardo mental, hidrocefalia, ataxia, convulsões, entre outras.

Apontada como uma das principais causas responsáveis pela deficiência auditiva adquirida pós-natal, dados da literatura indicam uma faixa variada de ocorrência de perda auditiva, de todo tipo, condutiva2 e mista10, oriunda de seus efeitos prejudiciais sobre o órgão da audição, alcançando os mais diversos graus. Porém, uma perda auditiva do tipo neurosensorial4, 10, 18, 21 de grau severo a profundo mostra-se com maior freqüência.

A maioria dos casos de meningite ocorrem nas crianças, nas quais uma perda auditiva pode afetar criticamente seu desenvolvimento global.

Tais fatos levou à indagação, sobre a importância do estudo da meningite, visto que pode comprometer a função auditiva, ocasionando grave distúrbio neurológico sensorial, que afeta a capacidade de comunicação oral e de aprendizagem nos homens.

Os objetivos do presente estudo preliminar são: verificar a ocorrência de indivíduos que apresentam perda auditiva, devido terem contraído meningite e caracterizar a perda auditiva diagnosticada, quanto ao tipo, ao grau e a configuração audiométrica.

METODOLOGIA

De um total de 6.000 prontuários dos pacientes regularmente matriculados em um centro de distúrbios da audição (CDA) de hospital especializado, foram selecionados 949, escolhidos aleatoriamente, a fim de se verificar os que apresentaram na anamnese história de meningite. Destes permaneceram 59 prontuários de pacientes de ambos os sexos e idade variando de 3 a 15 anos, e que preencheram os critérios estabelecidos.

Foi analisado o processo de avaliação audiológica (audiometria tonal liminar) a que os pacientes foram submetidos e verificada a presença de perda auditiva. Essa foi classificada quanto ao tipo, grau e configuração da curva audimétrica.

Quanto ao tipo, as perdas auditivas foram classificadas em condutiva, mista e neurosensorial, segundo Katz12, 1989, que considera perda auditiva de origem condutiva aquela determinada por desordens que ocorrem na orelha externa e/ou orelha média e apresentam limiares audio-métricos tonais aéreos piores ou iguais a 25dBNA, limiares ósseos normais e presença de gap aéreo-ósseo. As perdas auditivas que atingem o órgão coclear e/ou nervo acústico (nervo vestíbulo-coclear-8º par) foram classificadas em perda auditiva neurosensorial e apresentam limiares tonais aéreos e ósseos piores ou iguais a 25dBNA, sem gap aéreo-ósseo. Na perda auditiva mista, há envolvimento de um problema condutivo juntamente a um problema neurosensorial, refletindo em limiares audiométricos tonais aéreos e ósseos piores ou iguais a 25dBNA e presença de gap aéreo-ósseo.

Quanto ao grau, as perdas auditivas foram classificadas em leve (L), leve-profundo (L-P), moderado (M), moderado-severo (M-S), moderado-profundo (M-P), severo (S), severo-profundo (S-P), profundo (P) e anacusia (A).

Foi considerada perda auditiva de grau leve, quando os limiares tonais audiométricos aéreos variaram de 25 a 40dBNA; moderado, quando apresentaram valores de 45 a 70 dBNA; severo, para os limiares na faixa de 75 a 90dBNA; profundo, quando os limiares se mostraram piores ou iguais a 95dBNA e anacusia, quando nenhuma resposta se mostrava presente em toda a faixa de freqüência testada. Ainda, quando em uma mesma orelha, os limiares apresentaram graus diferentes nas freqüências testadas, foi feita classificação do grau do melhor e do pior limiar encontrado na perda auditiva: leve-profundo; moderado-severo; moderado-profundo; severo-profundo.

RESULTADOS

Com base na análise da avaliação audiológica de 59 prontuários selecionados, a distribuição da ocorrência de indivíduos diagnosticados com perda auditiva devido terem contraído meningite (PM), e dos indivíduos com perda auditiva por outras causas (OC), foi, respectivamente, de 6% e 94%.

Analisando os resultados obtidos verificou-se que das 118 orelhas avaliadas foram encontradas 115 (97%) com perda auditiva neurosensorial (NEURO), uma (1%) com perda auditiva condutiva (COND.) e duas (2%) com perda auditiva (MISTA).

A Figura mostra a ocorrência em percentagem dos graus das perdas auditivas pós-meningite.\


Figura - Distribuição da ocorrência em percentagem, dos graus de perda auditiva encontrados na avaliação audiológica dos individuos pós-meningite (PM).

Figure - Distribution of occurrence in percentages of degrees of hearing loss found in the audiologic examination after meningitis.

Ao se analisar a configuração da curva audiométrica, verificou-se que 91 orelhas apresentaram configuração linear, correspondendo a 77,13%, 25 orelhas (21,18%) mostraram configuração descendente; e 1,69% apresentou configuração ascendente, correspondendo a duas orelhas. Foi possível verificar que 43 (72,89%) das curvas audiométricas se mostraram simétricas e 16 (27,11%) assimétricas.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

A literatura registra percentuais variados de perda auditiva pós-meningite, provavelmente refletindo diferenças entre estudos, no que diz respeito à definição de perda auditiva, à época da realização da avaliação audiológica, assim como, ao tipo do organismo causador da meningite10. A presença desta perda de audição tem sido mais freqüentemente documentada após meningite bacteriana pelo Haemophilus meningitis14, 22. Já em outro estudo17, a meningite por Streptococcus pneumoniae foi a mencionada, seguida pelo Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae meningitis. No presente estudo não foi estudado o tipo de agente causador da meningite, nem o tempo decorrido da meningite em relação à avaliação audiológica, no entanto, observou-se na anamnese que 57,6% dos pacientes adquiriram a doença com idade inferior a 2 anos.

Uma abrangente faixa, compreendida entre 2 e 35%, é relatada na literatura no que se refere à ocorrência de perda de audição pós-meningite1, 2, 4, 5, 7, 10, 11, 15, 18. Do total de 949 indivíduos selecionados com perda de audição, uma percentagem de 6,2 (59 casos) de perda auditiva pós-meningite foi verificada no presente estudo.

Invasão direta da bactéria na cóclea e labirinto, lesão do oitavo par do nervo crânico pelas toxinas, bloqueio de pequenos vasos e atuação ototóxica dos antibióticos ministrados, foram descritos como os possíveis mecanismos patogênicos da ocorrência da perda auditiva pós-meningite14. Outro estudo8 relatou ausência de qualquer dano auditivo, em seus pacientes pós-meningite, devido a precocidade na instauração do tratamento com antibióticos.

Quanto ao tipo da perda auditiva, observada no presente estudo quanto ao predomínio de perda auditiva neurossensorial, este achado está em concordância com o relatado em outros trabalhos4, 10, 18, 21.

Nota-se que a perda auditiva é uma importante complicação da meningite, mas o local da lesão não está ainda bem estabelecido, visto que não existe estudo sistemático examinando a relação entre a histopatologia e a função auditiva na meningite bacteriana. No entanto, estudos que foram realizados visando a investigar a correlação entre a perda auditiva e alterações na orelha interna na meningite bacteriana, concluíram que a meningite apenas, sem envolvimento coclear, não afetaria a audição, sendo a cóclea o provável local da lesão13, justificando a perda ser neurossensorial.

Problemas condutivos e mistos em pacientes pós-meningite foram relatados na literatura2,10. No presente estudo, foram encontrados uma orelha com perda condutiva e 2 com perda do tipo mista.

Em relação ao grau, o presente trabalho evi-denciou uma alta percentagem de perda auditiva profunda (66,95%). Porém, perda auditiva de todos os graus (leve à anacusia) foi observada na literatura com menor ocorrência3, 4, 10, 11, 16, 18, 21.

Nenhum relato na literatura consultada foi encontrado quanto à configuração da curva audiométrica, obsevada no presente estudo. Observou-se 100% de comprometimento bilateral, o que está em concordância com outros estudos4, 11, 19. Por outro lado, a perda unilateral, embora não encontrada no presente trabalho, é relatada na literatura15, 18, 21.

Motivados com os resultado deste estudo preliminar, acredita-se que estudos posteriores, mais completos, serão necessários, devendo abordar toda a casuística dos pacientes, observando o tipo do agente caudador da meningite, o tempo decorrido da doença em relação ao exame auditivo, bem como a evolução da audição nesses pacientes que contraíram tal doença.

Subvencionado pelo Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica (PIBIC)/Universidade de São Paulo/Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Apresentado na II Jornada Fonoaudiológica do Curso de Fonodiaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, 1995.

Correspondência para/Correspondence to: Mariza Ribeiro Feniman - Al. Dr. Octávio Pinheiro Brisola, 9-75 - 17043-101 Bauru, SP - Brasil. E-mail: mikrook@usp.br

Recebido em 1.3.1996. Reapresentado em 18.11.1996. Aprovado em 29.1.1997.

  • 1. BOHR, V.; RASMUSSEN, N.; HANSEN, B.; GADE, A.; KJERSEM, H.; JOHNSEN, N.; PAULSON, O. Pneumococcal meningitis: an evaluation of prognostic factors in 164 cases based on mortality and on a study of lasting sequelae. J. Infect., 10:143-57, 1985.
  • 2. CARROLL, K.J. & CARROLL, C. A prospective investigation of the long-term auditory-neurological sequelae associated with bacterial meningitis: a study from Vanuatu. J. Trop. Med. Hyg., 97:145-50, 1994.
  • 3. CHANDALIA, M.S.; ASGAONKAR, D.S.; SARALAYA, R.N.; ANAND, J.; PAI DHUNGAT, J.V.; VANJANI, C.V.; MEHTALIA, S.D. Deafness: an unusual presentation of pyogenic meningitis. J. Indian. Med. Assoc., 90:128-9, 1992.
  • 4. CHARUVANIJ, A.; CHIEMCHANYA, S.; VISUDHIPHAN, P.; TAWIN, C. Sensorineural hearing loss in children at Ramathibodi hospital. J. Med. Assoc. Thai.,73:253-7, 1990.
  • 5. CHAURASIA, M.K. & GEDDES, N.K. An analysis of the aetiology of early childhood deafness. Clin. Otolaryngol, 16:280-4, 1991.
  • 6. CHRISTIE, C.D.C. Chronic meningococcaemia with sensorineural deafness childhood. W. Indian. Med. J., 37:41-2, 1988.
  • 7. COOPER III, R.F.; BAGWELL, C.; SMITH, T.B. Hearing loss in pediatric meningitis. Amer. Fam. Phycn., 35:133-8, 1987.
  • 8. DE LA VEGA, J.A.B.; MADUEŃO, A.P.; CARMONA, A.M.R.; HACHERO, J.G. Enfermedad meningocócica aguda: investigación de secuelas auditivas. An. Esp. Pediatr., 37:387-90, 1992.
  • 9. DODGE, P.R. Sequelae of bacterial meningitis. Pediatr. Infect. Dis., 5:618-20, 1986.
  • 10. FORTNUM, H.; DAVIS, A. Hearing impariment in children after bacterial meningitis: incidence and resource implications. Br. J. Audiol., 27:43-52,1993.
  • 11 GUPTA, V. Hearing evaluation in children with bacterial meningitis. Indian. Pediatr., 30:1175-9,1993.
  • 12. KATZ, J. Tratado de audiologia clínica 3ed., Săo Paulo, Manole, 1989.
  • 13. KAY, R. The side of the side lesion causing hearing loss in bacterial meningitis: a study of experimental streptococcal meningitis in piguinea-pigs. Neuropath. App. Neurobiol.,17:485-93, 1991.
  • 14. LÜTSCHG, J. Hearing disorders in meningitis. Bacterial Meningitis, 45:218-25, 1992.
  • 15. MAYATEPEK, E.; GRAUER, M.; HÄNSCH, G.M.; SONNTAG, H.G. Deafness, complement deficiencies and immunoglobulin status in patients with meningococcal diseases due to uncommon serogroups. Pediatr. Infect.Dis. J., 12:808-11, 1993.
  • 16. NELSON, J.D. Management problems in bacterial meningitis. Pediatr. Infect. Dis., 4:41-4,1985.
  • 17. SALIH, M.A.M.; KHALEEFA, O.H.; BUSHARA, M.; TAHA, Z.B.; MUSA, Z.A; KAMIL, I.; HOFVANDER, Y.; OLCÉN, P. Long term sequelae of childhood acute bacterial meningitis in a developing country. Scand. J. Infect. Dis., 23:175-82, 1991.
  • 18. SALWEN, K.M.; VIKERFORS, T.; OLCEN, P. Incread incidence of childhood bacterial meningitis. Scand. J. Infect. Dis, 19:1-11, 1987.
  • 19. SANTOS, T.M.M. & FUKUDA, Y. Evoluçăo da audiçăo em crianças deficientes auditivas por meningite bacteriana. In: Encontro Internacional de Audiologia,10o, Bauru, 1995. Anais Bauru, HPRLLP-USP, 1995. p.57.
  • 20. SILKES, E.D. & CHABOT, J. Progressive hearing loss following Haemophlilus influenzae meningitis. Int. J. Pediatr. Otorhinolaryngol, 9:249-56, 1985.
  • 21. SMITH, A.W.; BRADLEY, A.K.; WALL, R.A.; McPHERSON, B.; SECKA, A.; DUNN, D. T.; GREENWOOD, B.M. Sequelae of epidemic meningococcal menigitis in Africa. Trans. R. Soc. Trop. Med. Hyg., 82:312-20, 1988.
  • 22. THOMAS, D. Outcome of paediatric bacterial meningitis 1979-1989. Med. J. Aust., 157:519-20, 1992.
  • * Edição subvencionada pela FAPESP. Processo 96/5999-9.
    Edição subvencionada pela FAPESP. Processo 96/5999-9.
  • **
    Alunas do 4º ano do Curso de Fonoaudiologia da FOB-USP (1996)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Ago 2001
    • Data do Fascículo
      Ago 1997

    Histórico

    • Aceito
      29 Jan 1997
    • Recebido
      1996
    • Revisado
      18 Nov 1996
    Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Avenida Dr. Arnaldo, 715, 01246-904 São Paulo SP Brazil, Tel./Fax: +55 11 3061-7985 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revsp@usp.br