Acessibilidade / Reportar erro

Comparação entre duas técnicas sorológicas aplicados ao estudo do sangue ingerido por triatomíneos

Comparison between two serological technique used in the study of bloon sucked by arthropods

Resumos

Comparou-se a técnica de reação de precipitina em tubos capilares com a de imunodifusão em gel de agar, em papéis contendo sangue de aves (galos) ingerido por triatomíneos. Usaram-se 360 T. infestans e 270 P. megistus, estudando-se também a mortalidade comparativa das duas espécies. Os resultados sugerem que o método capilar apresenta ligeira vantagem. Quanto à mortalidade, a resistência ao jejum do T. infestans foi uniforme durante todo o tempo de observação, enquanto que, para o P. megistus a força de mortalidade foi pequena até o 50° dia de jejum, aumentando acentuadamente a seguir.

Técnicas sorológicas; Tripanossomíase americana; Triatomíneos


The techniques of precipitin in capilar tubes and imunodifusion in agar jelly, for human blood sucked by arthropods were compared. 360 T. infestans and 270 P. megistus were observed, and the comparative mortality of both species was also studied. The results suggest that the capilar method is slightly better. As regards mortality, the resistance to fasting by the T. infestans was uniform during the whole period of observation, while for the P. megistus mortality was low until the 50th day of fasting, increasing markedly from then onwards.

Sorological techniques; Trypanosomiases; Triatomids


NOTAS E INFORMAÇÕES NOTES AND INFORMATION

Comparação entre duas técnicas sorológicas aplicados ao estudo do sangue ingerido por triatomíneos

Comparison between two serological technique used in the study of bloon sucked by arthropods

José Carlos Rehder de AndradeI; Eduardo Olavo da Rocha e SilvaII; José Maria Pacheco de SouzaIII

IDa Superintendência de Controle de Endemias da Secretaria da Saúde de São Paulo (SUCEN) – Rua Tamandaré, 649 – São Paulo, SP – Brasil

IIDa SUCEN e do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP – Av. Dr. Arnaldo, 715 – São Paulo, SP – Brasil

IIIDo Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP – Av. Dr. Arnaldo, 715 – São Paulo, SP – Brasil

RESUMO

Comparou-se a técnica de reação de precipitina em tubos capilares com a de imunodifusão em gel de agar, em papéis contendo sangue de aves (galos) ingerido por triatomíneos. Usaram-se 360 T. infestans e 270 P. megistus, estudando-se também a mortalidade comparativa das duas espécies. Os resultados sugerem que o método capilar apresenta ligeira vantagem. Quanto à mortalidade, a resistência ao jejum do T. infestans foi uniforme durante todo o tempo de observação, enquanto que, para o P. megistus a força de mortalidade foi pequena até o 50° dia de jejum, aumentando acentuadamente a seguir.

Unitermos: Técnicas sorológicas. Tripanossomíase americana. Triatomíneos.

SUMMARY

The techniques of precipitin in capilar tubes and imunodifusion in agar jelly, for human blood sucked by arthropods were compared. 360 T. infestans and 270 P. megistus were observed, and the comparative mortality of both species was also studied. The results suggest that the capilar method is slightly better. As regards mortality, the resistance to fasting by the T. infestans was uniform during the whole period of observation, while for the P. megistus mortality was low until the 50th day of fasting, increasing markedly from then onwards.

Uniterms: Sorological techniques. Trypanosomiases, South American. Triatomids.

1 – INTRODUÇÃO

Tendo em vista a importância epidemiológica do levantamento dos índices médios de sangue humano ingerido pelos triatomíneos, capturados no intradomicílio em diferentes áreas do Estado de São Paulo, a Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN), há algum tempo1, 2 vem utilizando, como rotina, a reação de precipitina em tubos capilares5, com as modificações propostas por Siqueira 4. No entanto, após os estudos de Ricciardi e Mello 3 mostrando as vantagens de imunodifusão em gel de agar (Ouchterlony), surgiram dúvidas sobre qual das técnicas utilizar como padrão, pois que somente através dos trabalhos de rotina, não pareceu possível uma conclusão segura. Realizou-se, então, um experimento comparativo entre as citadas técnicas, utilizando-se, para tanto, o conteúdo do intestino de triatomíneos, alimentados somente em aves, testado frente ao respectivo anti-soro, de dez em dez dias, a partir da data da última alimentação. Paralelamente, procurou-se observar a mortalidade em função do tempo de jejum.

2 – MATERIAL E MÉTODOS

2.1 – Amostragem e colheita do material

Foram selecionados 630 exemplares de triatomíneos no 5.° estádio, sendo 360 ninfas do Triatoma infestans e as 270 ninfas restantes, do Panstrongylus megistus. Todas procedentes do Insetário da SUCEN (Moji-Guaçu) e alimentadas somente em aves (galos). Após o último repasto, os exemplares visivelmente alimentados foram sorteados, formando 24 grupos de 15 para T. infestans e 27 grupos de 10 para o P. megistus. A seguir foram colocados em caixas circulares de papelão, com diâmetro de 8 cm e altura de 3,5 cm, fechadas com filó de algodão, elástico e esparadrapo. Após numeradas, as caixas retornaram ao citado Insetário.

As datas previamente estabelecidas para exame do material contido no intestino desses triatomíneos, foram fixadas para intervalos de dez em dez dias, contados a partir da data da última alimentação. Foram submetidos aos testes, de cada vez, os exemplares contidos em 2 caixas contendo T. infestans (30 exemplares) e 3 caixas com P. megistus (30 exemplares), previamente sorteadas, do total geral de 24 e 27 caixas, respectivamente.

Aos 120 dias (12 sessões de exames) completaram-se todos os exames para o T. infestans e aos 90 dias. para o P. megistus (9 sessões).

Em cada uma das datas aprazadas para os exames (1.a sessão), as caixas previamente sorteadas eram abertas e o material do conteúdo intestinal de cada um dos "barbeiros", transferido por expressão para papel de filtro, com o auxílio da pinça e lâmina de microscopia. No próprio papel de filtro (qualitativo Klabin), eram anotados o estádio evolutivo e aquilo que se convencionou chamar de "estado" em que se apresentava o exemplar, ou seja, morto seco (triatomíneo morto, sem material para teste) ; morto (triatomíneo morto, com material ainda em condições de teste) ; triatomíneo vivo seco (sem material para teste) e vivo (com material no intestino).

2.2 – Reação de precipitina

Vinte e quatro horas após a coleta, o papel de filtro contendo a amostra era recortado e imediatamente transferido para tubo de ensaio, ao qual era acrescentado 1,5 ml de solução salina a 0,85%. O eluato permanecia por 24 horas em geladeira, para em seguida ser examinado, inicialmente pela técnica de imunodifusão em gel de agar, utilizando-se para isso, 1,2% de Agar Oxoid para imunoeletroforese em salina que, após fundido, era colocado na proporção de 4 ml por lâmina de microscopia. As etapas seguintes seguiram o utilizado por Ricciardi e Mello 3. Quanto à técnica dos tubos capilares, seguiu-se Siqueira4, com modificações apenas no referente à espessura do capilar utilizado.

As leituras foram, obrigatoriamente, realizadas após 24 e 48 horas para a técnica de imunodifusão, e até completarem as 2 horas, para a técnica dos tubos capilares.

Os anti-soros utilizados, obtidos de coelhos através de inoculação subcutânea do antígeno, foram preparados segundo a técnica descrita por Weitz5, modificada por Siqueira 4.

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

As Tabelas 1 e 3 dão informação geral sobre o comportamento dos insetos, quanto à sobrevivência em cada sessão e respectivo estado, se seco ou normal; deve-se chamar a atenção para o fato de que somente os animais "normais" permitem comparação entre as duas técnicas.

3.1 – Comparação das técnicas de diagnóstico

As Tabelas 2 e 4 mostram que houve um comportamento diferente entre os triatomíneos. Para o P. megistus as percentagens de positividade acusadas pelos dois métodos em cada uma das nove sessões, foram sempre iguais (100%), com a única exceção da 6.a, discrepância esta que pode ser perfeitamente desprezada.

Os T. infestans puderam ser seguidos por doze sessões; até a 5.a sessão as técnicas apresentaram resultados absolutamente iguais, indicando sempre 100% de positividade dos insetos em condições de exame (não secos). A partir da 6.a sessão, porém, passa a haver uma discretíssima, contudo constante, diferença em favor do método capilar, que sempre indicou um maior número de insetos positivos do que o método de imunodifusão. Os resumos dos resultados, divididos em dois períodos (arbitrariamente em função dos resultados observados), são apresentados nas Tabelas 5 e 6.

A Tabela 6 mostra que, nos 15 insetos em que houve discordância de diagnóstico quanto à presença de sangue, o método capilar foi aquele que acusou a devida positividade.

Parece, portanto, que o método capilar tem pequena vantagem na detecção de sangue, no T. infestans, à medida que o tempo de jejum aumenta e há maior dificuldade de diagnóstico positivo, pela escassez de alimento residual.

Assim, o presente trabalho sugere que o método capilar pode ser o escolhido como de rotina, quando apenas o problema de diagnóstico é considerado, excluindo-se, por exemplo, considerações de custo. Todavia, se uma confirmação dos resultados se fizer necessária, aconselha-se que no novo projeto se trabalhe apenas com o T. infestans, com observações sendo feitas a partir de 60 dias de jejum, em intervalos de 15 dias, e com maior número de insetos em cada sessão.

3.2 – Mortalidade

A Fig. 1 mostra a mortalidade das duas espécies, através de curvas de sobrevivência. Deve-se lembrar que em cada sessão o conjunto de insetos observados era independente do anterior, não se tendo, portanto, a curva clássica de sobrevivência (ou mortalidade) acumulada, que exigiria, em cada sessão, observação de todas as caixas de papelão, procedimento que se julgou inconveniente para a presente pesquisa. Assim, procedeu-se a uma correção, ajustando-se, à mão livre, curvas contínuas decrescentes de sobrevivência, aos dados observados.


Vê-se que a força da mortalidade para o T. infestans é razoavelmente constante durante todo o período de observação enquanto que, para o P. megistus, essa força de mortalidade é menor no começo do jejum, aumentando acentuadamente a cada sessão, a partir do 50.° dia (5.a sessão), o que poderia estar indicando diferentes processos de metabolização do sangue.

4 – CONCLUSÕES

Os resultados do experimento sugerem que a técnica padrão a ser utilizada como rotina deva ser a dos tubos capilares. Quanto à mortalidade, parece que o P. megistus tem uma resistência inicial maior ao jejum, enquanto que para o T. infestans, a força de mortalidade mostrou-se constante.

AGRADECIMENTO

Ao Sr. Antenor N. Ferraz Filho, pela colaboração na parte de laboratório.

Recebido para publicação em 28/08/1975

Aprovado para publicação em 22/09/1975

  • 1. CORREA, R. R. & AGUIAR, A. A. O teste de precipitina na identificação da fonte alimentar do Triatoma infestans (Hemiptera, Reduviidae). Arq. Hig. Saúde públ., 17:3-7, 1952.
  • 2. FREITAS, J. L. P. et al. Investigações epidemiológicas sobre triatomíneos de hábitos domiciliários e silvestres, com o auxílio da reação de precipitina. Rev. Inst. Med. trop., São Paulo, 2: 90-9, 1960.
  • 3. RICCIARDI, I. D. & MELLO, M. T. Identificação de hábitos alimentares de artrópodes hematófagos, principalmente "barbeiros", por meio de provas de imunodifusão em gel de agar (Ouchterlony). Rev. bras. Malar., 3: 595-601, 1969.
  • 4. SIQUEIRA, A. F. Estudos sobre a reação de precipitina aplicada à identificação de sangue ingerido por triatomíneos. Rev. Inst. Med. trop., S. Paulo, 2:41-53, 1960.
  • 5. WEITZ, B. The identification of blood meals in blood sucking arthropods by the precipitin test. Bull. Wld. Hlth. Org., 15:473-90, 1953.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Jul 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 1975

    Histórico

    • Aceito
      22 Set 1975
    • Recebido
      28 Ago 1975
    Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Avenida Dr. Arnaldo, 715, 01246-904 São Paulo SP Brazil, Tel./Fax: +55 11 3061-7985 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revsp@usp.br