NOTAS E INFORMAÇÕES
Causas de mortalidade infantil e em crianças de um a quatro anos em São Paulo: resultados provisórios referentes ao primeiro ano da "Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância".
Ruy Laurenti
Do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP São Paulo, S.P., Brasil. Colaborador principal da Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância, em São Paulo
A Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância irá trazer grande contribuição sobre as causas de morte e sôbre os fatôres que as influenciam em áreas da América Latina1. Alguns aspectos específicos para São Paulo, no que se refere a essa pesquisa, já foram anteriormente expostos2.
A medida que se desenvolve a "Investigação" na área de São Paulo, aspectos extremamente interessantes vão sendo conhecidos, os quais, na sua maioria, seriam impossíveis de serem detectados sòmente a partir dos dados oficiais de mortalidade. Êsses aspectos dizem respeito a fatôres que influem na mortalidade das crianças de 0 a 4 anos tais como: assistência pré-natal, ao parto, atenção médica, saneamento do meio além de inúmeras outras, sendo interessante lembrar o estado nutritivo das crianças falecidas.
Tôdas as variáveis estudadas, relacionadas à mortalidade, nesse grupo etário, serão futuramente conhecidas para o conjunto de todas as áreas em que a "Investigação" está sendo realizada. A verificação do que está ocorrendo em cada área e as comparações das diferenças observadas nas diferentes áreas será extremamente importante, pois, poder-se-á oferecer às autoridades competentes e responsáveis, reais subsídios para melhor conhecimento da mortalidade infantil e daquela de crianças de 1 a 4 anos. Será possível estabelecer programas visando, especificamente, fatôres responsáveis pela alta mortalidade.
Um aspecto importante que teremos conhecimento, é o relativo à desnutrição, pois embora se admita que seja um fator ponderável na mortalidade das crianças não se conhece exatamente a sua magnitude. Outras causas de morte que são consideradas importantes, serão melhor mensuradas e relacionadas a condições específicas que influem na sua manutenção em altos níveis. Tôdas as causas de morte, básica e associadas, serão conhecidas e dadas as suas verdadeiras medidas, assim como as relações das mesmas com inúmeros fatôres. Devemos lembrar, também, que será conhecido o que está ocorrendo com as crianças vivas pois, concomitantemente, estão sendo, também, feitos estudos em uma amostra de crianças vivas nas mesmas áreas em que se está desenvolvendo a "Investigação".
Serão dados aqui apenas os resultados preliminares do primeiro ano da pesquisa em São Paulo (Junho 1968 - Maio 1969), evidenciando a importância relativa de algumas causas de morte.
A metodologia da "Investigação" em São Paulo já foi exposta anteriormente 2 e é a mesma observada em tôdas as outras áreas onde está sendo realizada1.
Resultados provisórios observados no 1.° ano da investigação (Junho 1968 Maio 1969).
1) Mortalidade proporcional segundo a idade
Em relação a mortalidade proporcional por idade observa-se o seguinte:
2) Mortalidade proporcional por algumas causas ou grupos de causas
Sòmente serão considerados, nessa apresentação, as causas básicas de morte, sendo que a classificação das mesmas foi feita de acordo com a 8.a Revisão (1965) da Classificação Internacional de Doenças. Os resultados referentes à mortalidade proporcional, que são aqui expostos, referem-se a algumas causas ou grupos de causas e nessa apresentação serão consideradas as seguintes:
002-009 Doenças infecciosas intestinais
010-019 Tuberculose (qualquer localização)
032 Difteria
033 Coqueluche
036 Infeções meningocócicas
037 Tétano
055 Sarampo
090-097 Sífilis
Outras infecciosas classificadas entre 000-136 (não incluídas acima)
140-209 Neoplasias malígnas
267-269 Desnutrição
320 Meningites (excluída tuberculosa-013 e a meningocócica-036)
480-486 Pneumonias e Broncopneumonias
740-759 Malformações congênitas
760-779 Certas causas de mortalidade perinatal
E800-E999 Acidentes.
COMENTÁRIO
No que se refere a mortalidade infantil, observou-se que a mortalidade neonatal e a mortalidade infantil tardia apresentam valores praticamente iguais, com discreta superioridade dessa última (50,15%). Sob êsse ponto de vista, São Paulo está numa transição entre o que se observa em áreas desenvolvidas e naquelas sub-desenvolvidas.
Quanto à importância relativa de algumas causas ou grupos de causas nas idades estudadas, observou-se que as doenças infecciosas (n.°s. 000-136) foram responsáveis, respectivamente, por 31,23% e 32,76% da mortalidade em menores de l ano e em crianças de 1 a 4 anos. Dentre as doenças infecciosas, a "Gastroenterite" (n.°s 002-009) foi o grande grupo responsável, sozinho, por 26,01% dos óbitos por todas as causas em menores de 1 ano.
Já no grupo de 1 a 4 anos, as gastroenterites representaram 5,59% do total de óbitos. Sabendo-se que as gastroenterites dependem, essencialmente, de condições de saneamento do meio, é lamentável o que está ocorrendo em São Paulo, pois a redução dessa causa poderia diminuir grandemente a mortalidade infantil. Ainda em relação as gastroenterites observou-se, nos óbitos de menores de 1 ano, uma variação mensal quanto a proporção de óbitos devidos a essa causa; assim ela é mais importante nos meses mais quentes (Novembro a Março) e menos nos meses mais frios (Junho a Agôsto). Sob êsse aspecto observou-se o que está exposto na Tabela 2.
Outra verificação importante, mas altamente contristadora, é a observada com o sarampo que foi responsável por 17,07% dos óbitos de crianças de 1 a 4 anos, sendo a principal causa de morte nesse grupo etário. Sendo uma doença cuja prevenção é possível por vacinação, é de se lamentar que em São Paulo seja ainda observado êsse valor. Ainda em relação ao sarampo, deve ser assinalado que essa informação obtida na "Investigação" é o que está ocorsendo na realidade e isso não é evidenciável, totalmente, quando se obtém as informações só a partir do atestado de óbito. Assim é que, tendo como fonte de dados só o atestado de óbito para menores de 1 ano, a proporção de óbitos por sarampo seria somente 0,40% e aproximadamente 13% para aquêles de 1 a 4 anos de idade.
Algumas doenças infecciosas preveníveis por vacinação difteria, coqueluche, tétano e sarampo em conjunto foram responsáveis por 2,24% e 21,56% dos óbitos de menores de 1 ano e de 1 a 4 anos, respectivamente.
A desnutrição, que dificilmente aparece nos dados oficiais de mortalidade, na "Investigação", está sendo evidenciada e ao término da pesquisa, poder-se-á ter uma idéia, não só da sua magnitude, mas principalmente daqueles fatôres condicionantes ou inter-relacionados.
Observa-se na Tabela 1 que a desnutrição foi responsável, como causa básica, por 2,80% e 12,19% dos óbitos, respectivamente, de menores de 1 ano e de 1 a 4 anos.
Especìficamente, para aquelas crianças falecidas com 1 ano de idade ela foi responsável por 19,20% dos óbitos!
É interessante assinalar que a desnutrição, como causa associada de morte, apareceu numa freqüência bem maior em todos os grupos etários estudados; êsses dados serão conhecidos posteriormente pois nessa apresentação apenas são feitas referências às causas básicas de morte.
As broncopneumonias constituiram, também, importante causa de morte quer nos menores de 1 ano (16,60%) quer nos óbitos de 1 a 4 anos de idade (12,19%).
Nos óbitos de crianças de 1 a 4 anos os acidentes representam o 3.° grupo de causa em importância (10,15%), vindo depois as neoplasias malignas (5,92%) e as malformações congênitas (5,57%).
Os óbitos de crianças menores de 1 dia e de 1 até 7 dias foram devidos, na sua grande totalidade, às causas perinatais (n.°s 760-779), fazendo com que, para os menores de 1 ano, no conjunto, êsse grupo de causa represente 27,53% dos óbitos ficando assim como a principal causa de morte.
A importância relativa de outras causas pode ser observada na Tabela 1 e em outras apresentações serão analisados outros aspectos específicos da mortalidade. A finalidade dessa apresentação foi apenas apresentar alguns resultados provisórios referentes ao 1.° ano da "Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância" em São Paulo.
Recebido para publicação em 16-3-1970
- 1. PUFFER, R. R. Fases iniciales de Ia investigación interamericana de mortalidad em la niñez. Bol. Ofic. Sanit. panamer., 16:114-26, ago. 1968.
- 2. LAURENTI, R. A investigação interamericana de mortalidade na infância em São Paulo, Brasil Rev. Saúde públ.f S. Paulo, 3:225-29, dez. 1969.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
18 Set 2006 -
Data do Fascículo
Jun 1970