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Representações sociais sobre relações entre vasos de plantas e o vetor da dengue

Resumos

OBJETIVO: Saber como "cuidadores" representam as relações entre vasos de plantas e criadouros de vetores da dengue, para a reformulação da atividade educativa. MÉTODOS: O estudo foi realizado junto a "cuidadores" de vasos de plantas de três municípios do Estado de São Paulo onde há presença da dengue e foi desenvolvida intensa atividade educativa. Selecionaram-se 20 residências de cada município estudado, classificadas em positivas e não positivas para larvas de Aedes aegypti, em vasos de plantas. Os endereços foram retirados dos boletins de avaliação de densidade larvária utilizados pela Superintendência de Controle de Endemias (Sucen). Os participantes da pesquisa, em número de 60, encontravam-se na faixa etária dos 20 aos 65 anos. Foram feitas entrevistas por meio de questionário semi-estruturado, com gravação em fita magnética. Utilizou-se para a tabulação dos dados a técnica do discurso do sujeito coletivo. RESULTADOS: Foram encontradas como representações negativas: informações errôneas no imaginário da população; descrença de que um simples "mosquitinho" possa causar tanto problema; crença na doença apenas quando ela se manifesta concretamente e descrença na atividade educativa de um modo geral. Quanto às representações positivas, verificou-se: entendimento do mecanismo básico de transmissão da doença; valorização do papel e da presença constante da autoridade sanitária; entendimento da parcela de responsabilidade que cabe à população no enfrentamento da doença. CONCLUSÕES: No que diz respeito às ações de controle do vetor da dengue, as mensagens educativas demasiadamente sintéticas emitidas pelas autoridades sanitárias não permitiram a sua assimilação pela população na escala em que seria desejável. Tais atividades educativas devem fazer sentido para as populações às quais se destinam, para que ocorram mudanças de comportamentos.

Educação em saúde; Dengue; Controle de vetores; Insetos vetores; Conhecimentos, atitudes e prática; Aedes; Entrevistas


OBJECTIVE: To investigate how houseplant 'caretakers' represent the relationship between plant vases and breeding sites for the dengue vector, in order to reformulate educational policies. METHODS: The present study was carried out among caretakers from three São Paulo State municipalities in which dengue is known to exist and in which extensive educational activities had been previously conducted. Twenty households from each of the municipalities studied were selected based on larval density evaluation bulletins elaborated by SUCEN (Endemic Disease Control Coordination) and classified as positive or negative for the presence of Aedes aegypti larvae in plant vases. The 60 participants were aged 20-65 years and were directly involved in plant care. Interviews were carried out using a semi-structured questionnaire, and recorded in cassette tapes. Data were tabulated using the collective subject discourse technique. RESULTS: Negative representations found included: erroneous information in the population's imaginary universe; disbelief that a 'tiny little mosquito' could cause such extensive problems; belief in the disease only after its concrete manifestation; and mistrust in educational activities in general. Positive representations included: understanding of the basic mechanism of dengue transmission; appreciation of the role and constant presence of sanitary authorities; understanding of their own share of responsibility in fighting the disease. CONCLUSIONS: With respect to vector control activities, the exceedingly synthetic messages emitted by the sanitary authorities prevent the information from being assimilated by the population to the desirable extent. Educational activities must be understood by the population to which they are destined if any behavioral changes are to take place.

Health education; Dengue; Vector control; Insect vectors; Knowledge, attitudes, practice; Aedes; Interviews


ARTIGOS ORIGINAIS

Representações sociais sobre relações entre vasos de plantas e o vetor da dengue

Fernando LefèvreI; Ana Maria Cavalcanti LefèvreII; Sirle Abdo Salloum ScandarIII; Sueli YassumaroIII

IFaculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IISecretaria Municipal da Saúde São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IIISecretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Superintendência do Controle de Endemias. São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Fernando Lefèvre Faculdade de Saúde Pública da USP Av. Dr. Arnaldo, 715 01246-904 São Paulo, SP, Brasil E-mail: flefevre@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Saber como "cuidadores" representam as relações entre vasos de plantas e criadouros de vetores da dengue, para a reformulação da atividade educativa.

MÉTODOS: O estudo foi realizado junto a "cuidadores" de vasos de plantas de três municípios do Estado de São Paulo onde há presença da dengue e foi desenvolvida intensa atividade educativa. Selecionaram-se 20 residências de cada município estudado, classificadas em positivas e não positivas para larvas de Aedes aegypti, em vasos de plantas. Os endereços foram retirados dos boletins de avaliação de densidade larvária utilizados pela Superintendência de Controle de Endemias (Sucen). Os participantes da pesquisa, em número de 60, encontravam-se na faixa etária dos 20 aos 65 anos. Foram feitas entrevistas por meio de questionário semi-estruturado, com gravação em fita magnética. Utilizou-se para a tabulação dos dados a técnica do discurso do sujeito coletivo.

RESULTADOS: Foram encontradas como representações negativas: informações errôneas no imaginário da população; descrença de que um simples "mosquitinho" possa causar tanto problema; crença na doença apenas quando ela se manifesta concretamente e descrença na atividade educativa de um modo geral. Quanto às representações positivas, verificou-se: entendimento do mecanismo básico de transmissão da doença; valorização do papel e da presença constante da autoridade sanitária; entendimento da parcela de responsabilidade que cabe à população no enfrentamento da doença.

CONCLUSÕES: No que diz respeito às ações de controle do vetor da dengue, as mensagens educativas demasiadamente sintéticas emitidas pelas autoridades sanitárias não permitiram a sua assimilação pela população na escala em que seria desejável. Tais atividades educativas devem fazer sentido para as populações às quais se destinam, para que ocorram mudanças de comportamentos.

Descritores: Educação em saúde. Dengue, prevenção e controle. Controle de vetores. Insetos vetores. Conhecimentos, atitudes e prática. Aedes. Entrevistas.

INTRODUÇÃO

A partir de 1985, verificou-se uma rápida expansão do vetor Aedes aegypti, principalmente nas regiões Norte e Noroeste do Estado de São Paulo. O primeiro surto ocorreu no município de Araçatuba, em 1987, com poucos casos. No final de 1990 e início de 1991, instalou-se uma epidemia no município de Ribeirão Preto, que se estendeu para outros municípios da região. Foram registrados mais de seis mil casos de dengue confirmados laboratorialmente.3

Nos anos seguintes, a transmissão avançou para outras regiões do interior do Estado, com um agravante: além da circulação do sorotipo 1, também foi isolado sorotipo 2.3

A biologia do vetor e os estudos de seu comportamento indicam a presença das formas imaturas do Ae.aegypti em recipientes dos mais diversificados formatos e que contenham um mínimo de coleções de água proporcionadas pelas intempéries e, principalmente, pelo ser humano no seu ambiente de vida. Assim, a manutenção e a dispersão do Ae.aegypti no meio ambiente tem estreita relação com o modo de vida do ser humano.

A sociedade brasileira contemporânea tem convivido com uma urbanização acelerada, poluição, degradação ambiental, deficiências de infra-estrutura urbana, saneamento e educação, advindas de um modelo econômico que dificulta o acesso a uma melhor qualidade de vida para todos. Tudo isso, somado à problemática da dengue, pode gerar conseqüências indesejáveis para a vida urbana moderna. Há, por isso, que engajar toda a sociedade no controle da dengue, não somente o serviço público. Em saúde pública, pouco ou quase nada se consegue sem a participação de todos.5 Essa participação refere-se à incorporação do programa pela população em geral, mas também pelos diversos setores da sociedade responsáveis pela produção e comercialização de produtos que possam se tornar criadouros do mosquito.

Nesse contexto, os programas de controle do vetor da dengue no Estado de São Paulo reafirmaram tal intenção nas metas do componente educativo. Porém, as práticas demonstradas representaram um enfoque maior nas ações de combate ao vetor, alicerçadas no uso de produtos químicos, talvez por se acreditar na sua maior eficácia sobre o manejo ambiental.

As ações educativas implementadas inicialmente foram de caráter mais imediatista, buscando encorajar a população a adotar as instruções dadas como modelo para mudança de comportamento. O componente educativo do programa de controle da dengue acenou para uma efetividade maior a partir do avanço da municipalização do programa, em meados de 97, pressupondo uma execução mais próxima das realidades locais.

As mensagens produzidas, contudo, mantiveram o mesmo enfoque anterior, apenas apresentando nuances que denotavam uma criação mais compartilhada com a comunidade. Privilegiavam as realidades locais e eram emitidas com uma freqüência sistematicamente maior. Porém, a efetividade do componente educativo apresentou tímidos reflexos nos levantamentos entomológicos; além disso, quando analisadas sob a luz da execução, as ações educativas não foram suficientes para promover mudanças de comportamento nem geraram genuína participação comunitária, ainda enfocada em campanhas de limpeza, distribuição de materiais impressos e difusão massiva de informações sobre o vetor, seus criadouros e sobre a doença.9

Uma hipótese levantada na presente pesquisa é a de que as campanhas educativas não funcionaram justamente em função da opção pedagógica adotada. As mensagens veiculadas, baseadas, ainda que nem sempre conscientemente, no enfoque tradicional - que se convencionou chamar de "pedagogia da transmissão" - não permitiram o estabelecimento de uma efetiva relação dialogal de compartilhamento de códigos entre o pensamento sanitário e o do senso comum. Essa era uma condição necessária para que a atividade educativa pudesse impactar a mudança de comportamento. As mensagens educativas tendem a veicular sentidos abstratos que não se vinculam significativamente ao cotidiano dos receptores, tornando difícil a incorporação dos significados desejados pelas autoridades sanitárias.

Assim, na tentativa de melhor entender o impacto das mensagens e a sua (não) incorporação ao longo dos últimos anos pela população, foi desenvolvida pesquisa qualitativa,4 sobre entendimento da dengue pela população por ela afetada.

Foi dado enfoque aos vasos de plantas, porque os estudos da biologia do vetor e dos resultados das avaliações de densidade larvária indicavam que o Ae.aegypti era freqüentemente encontrado em recipientes artificiais mantidos com água pela população, classificados em servíveis e inservíveis (pneus, vasos de plantas, latas, bebedouros de animais, caixa d'água etc.).2 Nas áreas selecionadas, com semelhanças socioeconômicas e demográficas, os indicadores entomológicos por tipo de recipientes analisados apontam alta incidência desse vetor em vasos de plantas. Nessa categoria foram considerados todas as possíveis situações de manutenção delas, tais como: plantas aquáticas ou cultivadas em água, vasos ornamentais, pratos de xaxins, pingadeiras de vasos etc.

MÉTODOS

O estudo baseou-se em representações sociais sobre as relações entre a doença e os vasos de plantas, em três áreas do Estado de São Paulo: município de Votuporanga, localizado na região noroeste, Bebedouro, no centro oeste, e Salto no sudoeste. São áreas mais antigas e mais recentemente infestadas pelo Ae.aegypti.

Foram selecionadas 20 residências de cada município, classificadas em positivas e não positivas para larvas de Ae.aegypti encontradas em vasos de plantas. O endereço dessas casas foram retirados dos boletins de avaliação de densidade larvária utilizados pela Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) para medir a infestação do mosquito.

Os participantes da pesquisa, em número de 60, encontravam-se na faixa etária dos 20 aos 65 anos, eram predominantemente do sexo feminino, e tinham uma relação direta com cuidados dos vasos de plantas.

O campo de estudo foi composto por 60 sujeitos, 20 em cada um dos três municípios. O critério para a escolha do número de sujeitos foi arbitrário, uma vez que se trata de um estudo exploratório. Nesse caso, foi adotada a estratégia de saturação das representações presentes nos depoimentos coletados.

Os depoimentos foram colhidos no período de 1 a 15 de setembro de 2000, através de entrevistas semi-estruturadas que continham sete questões abordando aspectos de interesse da pesquisa. As questões foram pré-testadas e sofreram readequações. Com a concordância dos participantes, a coleta dos depoimentos, gravados em fitas magnéticas, posteriormente transcritas, ocorreu na própria residência.

Para a tabulação dos depoimentos foi usada a técnica de análise do discurso do sujeito coletivo,7 conjunto de procedimentos de tabulação e organização de dados discursivos de natureza verbal.

A técnica consistiu em selecionar, de cada resposta individual a uma questão, as "expressões-chave", que são os trechos mais significativos dessas respostas. A essas "expressões-chave" corresponderam "idéias centrais", que são a síntese do conteúdo discursivo manifestado nas "expressões-chave". Com o material das "expressões-chave" de "idéias centrais" semelhantes, constroem-se discursos-síntese, com número variado de participantes, na primeira pessoa do singular, que são os discursos do sujeito coletivo (DSC). Neles, o pensamento de um grupo ou coletividade aparece como se fosse um discurso individual.

O discurso do sujeito coletivo representa um recurso metodológico destinado a tornar mais claras e expressivas as representações sociais, permitindo que um determinado grupo social possa ser visto como autor e emissor de discursos compartilhados entre os membros do grupo.6 Com o sujeito coletivo, busca-se reconstruir tantos discursos-síntese quantos se julgue necessários para expressar um dado pensamento ou uma representação social sobre um fenômeno.

Decidiu-se tabular os depoimentos das três cidades em conjunto, uma vez que não se detectou diferenças entre elas nas representações sociais sobre o tema em análise.

No que diz respeito à apresentação, decidiu-se mostrar separadamente os resultados da discussão, visto que a técnica do discurso do sujeito coletivo tem entre seus fundamentos a oposição discurso da realidade vs discurso sobre a realidade.8 Assim sendo, a sessão resultados é onde se busca o resgate do discurso da realidade, enquanto que a sessão discussão é o espaço de análise que deve ser ocupado pelo discurso metalingüístico do pesquisador sobre a realidade.

RESULTADOS

As respostas às perguntas foram gravadas, transcritas e analisadas, obtendo-se as "idéias centrais" e os discursos dos sujeitos coletivos. Do total de perguntas, são analisadas as cinco consideradas mais importantes.

Pergunta 1 - "Fale um pouco pra mim sobre a dengue? O que você sabe?"

Idéia central I - A dengue é uma doença transmitida por um mosquito

Discurso do sujeito coletivo I: O que eu sei sobre a dengue é que a dengue é um mosquito que pica e transmite doença. É uma doença contraída ou causada pelo mosquito Aedes aegypti. Então, é a transmissão do mosquito, daquele mosquito, não sei explicar claramente a doença, mas sei que é através desse mosquito que transmite essa doença.

Idéia central II - A dengue é uma doença triste e grave, que pode ser fatal

Discurso do sujeito coletivo II: É uma doença triste. Todo mundo que eu sei que já passou por ela fala que ela é difícil e fatal, porque mata; é coisa grave. Eu não sei muita coisa, sei que é uma doença que, sei lá, até mata; é um mosquito, que transmite doenças gravíssimas. Perigoso.

Idéia central III - Eu me confundo: é uma doença transmitida por um inseto, muito perigosa e que dá febre amarela

Discurso do sujeito coletivo III: É uma doença transmissível pelo mosquitinho e que ela pode matá; tem aquela que mata, eu não sei a outra, existe dois tipo. Não é dengue, é febre amarela. ...eu confundo tudo, acho que é um inseto transmissor de uma doença muito perigosa, a febre amarela, a doença do pernilongo, do Aedes aegypti e que ele gosta de água limpa, parada, é assim, que ele aumenta, não sei falar as palavras, e depois pica, dá febre amarela. É um tipo de uma febre amarela que dá em vasos com água parada.

Idéia central IV - A dengue é uma doença que dá dor de cabeça, febre, vômito, diarréia. Ela é transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, que se encontra em água limpa e parada. Por isso, devemos eliminar os criadouros

Discurso do sujeito coletivo IV: Um pouco o que eu sei sobre a dengue é isso, é que é uma doença transmitida pelo mosquito, quando deixada água no vaso. É uma doença contagiosa, transmitida por um vetor que se prolifera mais em água parada, limpa e em água corrente, ou naqueles vasos, no prato de xaxim; ele fica quase um ano, vivo, em volta do prato, onde não tem água. Então, ele pode cair naquela água e proliferar e transmitir a doença. É uma doença horrível que dá dores no corpo, febre, tontura, mal estar, vômito e aparecem manchas. Se a pessoa contrai a doença é difícil de ser curada, tratada. Por isso tem que cuidar de tudo, deixar os quintal limpo, não deixar água parada em tambores, caixas d'água sem tampa e pneus, que senão o mosquito vai saí da água, pode pega e pica uma criança, um adulto, um idoso e deixa a criança doente. Tem também a dengue hemorrágica que pode ser fatal, nem sei se correndo a tempo tem jeito, mas parece que não. As moças vieram aqui, viram os vasinhos de flor e ai como choveu e entrou água naquele vaso, daí acharam um mosquitinho lá. Aí, veio a rapaziada da vigilância e falou que era realmente o foco da dengue. Só que no mesmo dia que a moça veio joguei na frente dela cum flor e tudo e todos os vasos que eu tenho agora, não tem mais pratinho cum água que fica embaixo, e se tiver tem que por areia. Eles sempre passam aqui com folheto explicativo, pede pra entrá e a gente deixa eles entrá.

Idéia central V - A dengue é uma doença transmitida por um mosquito contaminado que pica as pessoas e as contamina. Nos recipientes que acumulam água pode vir o mosquito. Por isso não se deve deixar água parada

Discurso do sujeito coletivo V: Ah, que eu saiba é um mosquito chamado Aedes aegypicius ou aegypti, não sei, e que se ele picar a gente e se tiver contaminado, então pode passar a doença; quer dizer, se ele criar na água, assim, naquelas vasilhinhas, pneus, garrafas que acumulam água, pode vir o mosquito transmissor da dengue e provocar a dengue. Por isso, a gente tem que ter cuidado, pôr areia grossa, não deixar aquela água parada. A pessoa sendo picada pelo mosquito, ela vai ficar contaminada com a doença, vai sofrer muita febre, dores no corpo, dor de cabeça e pode levar até a morte. Então é isso: o que eu sei é que a dengue é um mosquito contaminado que pica alguém e aquela pessoa fica contaminada. É um vírus transmitido por um mosquito causador desse problema que traz problemas sérios pra saúde e que ele se prolifera na água dentro do meio de coisas abandonadas; é mais ou menos isso e que eu não gostaria de ter no meu quintal.

Pergunta 2 - "Nas campanhas educativas eles falam que não é para deixar água nos vasos de planta. Você sabe por quê?"

Idéia central I - Porque a água parada fica suja e aí se criam os mosquitos

Discurso do sujeito coletivo I: Por causa do mosquito, porque forma uma água parada, ela fica suja e é onde fica os depósitos do mosquito.

Idéia central II - Por que os mosquitos da dengue depositam suas larvas na água

Discurso do sujeito coletivo II: Porque o mosquito vem e deixa as larvinhas lá e vai se reproduzindo. O bichinho da dengue é um mosquito e ele deposita as larvas na água e dali nasce o mosquito que é transmissor da dengue. O vaso de planta é um criadouro do mosquito, fica água e prolifera o mosquito; eles deixam as larvas, daí prolifera a criação de mosquito.

Idéia central III - Para não criar mosquito é preciso trocar a água e colocar sempre o remédio

Discurso do sujeito coletivo III: É na água limpa, como eles falam, acho que na suja os mosquitos da dengue não criam. É aonde aparece muitos focos de dengue, nesses casos porque a turma relaxa e então, se tiver, tem sempre que ta trocando (a água) e colocando remédio ali, pra não prejudicar nossa própria saúde e pra não criar o mosquito da dengue, naquela água, senão vai criar o mosquito.

Idéia central IV - Porque é na água parada que os mosquitos põem os ovos, aí eles se desenvolvem, proliferam, aumentam e dão origem ao mosquito da dengue

Discurso do sujeito coletivo IV: É na água para que eles criam aqueles bichinhos que formam o bichinho da dengue, o mosquito. Porque ele vai pôr os ovinhos ali dentro da água e ele vai procriar, então, a gente não pode deixar água parada para não criar as larvas do mosquito da dengue. Este mosquito, ele se multiplica na água, na água que eles se transformam. Eles vêm, bota os ovinhos e depois progride né, procria. Na água limpa, os mosquito adora, os seus ovos fica latente, até chover ou até realmente ele dar vida a novos mosquitos. O mosquito pode pousa e aí deixa o óvulo dele, pode saí aí... nasce as larvinhas e daí pode saí o mosquito da dengue.

O Aedes fica ali, parado, vivo ali, beirando as bordas, então o dia que coincidir que a água cobrir o prato e derramar a água, aí ele pode criar na água limpa, prolifera, contagia e aí transmite, e aí muita gente vai ser prejudicada com essa falta de cuidados. Em vasos de plantas ocorre as larvas do mosquito. Ali é o lugar de reprodução, vamos supor de aonde o mosquito põe os ovos de preferência nos vasos porque é sempre nos vasos que tem água do jeito que ele gosta, é o ambiente principal dele de reprodução dele, ai nessa água parada, porque a água acumulada nos vasos cria o mosquito. A gente vê isso quando vai virando as latinhas.

Eu aprendi que eu não posso de jeito nenhum deixar água parada e eu ensinei meus filhos também, principalmente a minha menina, que ela molha as flores e já fala: "aí mãe, não pode deixa água aqui" né, isso aí eu aprendi bastante. Então num pode deixa água parada, tem que deixa sempre cum terra, si deixa parada, eles vêm e deixa os ovos deles ali né?

Pergunta 3 - "Como a pessoa pega dengue?"

Idéia central I - Pela picada do mosquito

Discurso do sujeito coletivo I: Sendo picada pelo mosquito da dengue Aedes aegypt. Se o mosquito morde, pica elas, daí elas vão pega dengue, daí vão fica muito doente. Ela não é transmissível é? Tem que ser picada pelo inseto, né? Então, é através do mosquito: ele pica e a pessoa fica doente.

Idéia central II - O mosquito pica uma pessoa doente e depois pica uma sadia e ela fica com dengue

Discurso do sujeito coletivo II: É que os bichinhos pica as pessoas que tá com dengue, ele vem e pica a gente. Então o que eu tô sabendo é isso. Ele pica a pessoa e a pessoa fica doente com febre, um monte de sintoma que os médicos sempre falam que é parecido com a gripe, uma gripe forte. Então, muita gente confunde. Por isso, quando aparece esses sintomas, você já tem que ver logo se é ou não é, porque confunde muito com uma gripe forte.

Idéia central III - Se o mosquito estiver contaminado, ele passa a doença

Discurso do sujeito coletivo III: Com a picada pelo mosquito contaminado. No momento que ela é picada ela contém o vírus da dengue. Eu acho que é se ela é picada por ele (o mosquito) tá contaminado, se ele tá contaminado, pica, então, passa a doença.

Idéia central IV - A dengue pode ser transmitida por pessoas que viajaram e contraíram a doença em outro lugar

Discurso do sujeito coletivo IV: Quando as pessoas viajam, né, pegam também dengue e transmitem pra gente.

Idéia central V - As pessoas pegam dengue porque mantém os criadouros

Discurso do sujeito coletivo V: Pela imprudência do ser humano que não cuida do seu quintal corretamente, deixando pneus velhos, deixando vidros de boca para cima, aí, né, deixando sujeira, vasilha com água no quintal. Se não tiver cuidado com vasilha com água, pneu, qualquer coisa que tiver com água, aí pega.

Pergunta 4 - "Na cidade, tem tido muita campanha, cartaz, atividades educativas sobre a dengue, mas parece que as pessoas não mudaram muito o seu comportamento. Por exemplo, continuam deixando água nos vasos de plantas. Por que você acha que isso acontece?"

Idéia central I - Falta de conscientização das pessoas

Discurso do sujeito coletivo I: Porque o povo não se conscientizou ainda que a sujeira, que as águas paradas é que os bichos procriam lá dentro e é onde aumentam os mosquitos; as pessoas, ainda, muitas, não se educaram para isso, acho; elas não se conscientizaram que isso é um fato; na minha opinião, não viram o resultado que a dengue traz: eu acho que se a pessoa tivesse consciência ela não deixaria (água nos vasos de plantas) o que pode causar uma doença pelos bichinhos, né, Aedes aegypti.

Se as pessoas se conscientizarem de que se elas continuarem deixando água nunca vai acabar, o mosquito vai ter sempre um lugar para colocar os ovos e nós nunca vamos ficar livre da doença. É... o pessoal ainda não se conscientizou que tem que acabar com essa doença e evitar, para erradicar de uma vez.

Idéia central II - Porque acham que não vai acontecer com elas

Discurso do sujeito coletivo II: Porque a pessoa não tomou consciência ainda do perigo que pode ocorrer, porque às vezes acontece com o vizinho, mas ela acha que nunca pode acontecer com ela; a partir do momento em que acontece com ela, com a família dela, ela toma mais consciência do problema. Eu acho que as pessoas têm uma certa, como vou dizer, resistência, né, para aderir às campanhas. Acho que é uma questão de cultura, eu acho que é igual a São Tomé "tem que ver pra crer", enquanto não ver uma coisa de perto, eles não acreditam. Eu acho que é porque não aconteceu nada ainda e eles não viram ninguém ainda com a doença, porque a hora que conscientizar, que vir alguém assim doente com a dengue, aí eu acredito que elas não vão ter jeito; mas as pessoas são muito irredutíveis, elas não acreditam, não acreditam: "imagina que vai acontecer comigo?" E elas podem sim ser afetadas.

É isso que eu digo: as pessoas acham que nunca vai acontecer com elas, ou com alguém da família, só vai ter consciência quando alguém da família pegar, ou um vizinho, ou uma pessoa mais próxima, aí vão ver que realmente é uma doença que tem que ser combatida, combater a doença do mosquito.

A gente, brasileiro só toma consciência das coisas quando acontece consigo mesmo. Então é por isso que continua fazendo, achando que nunca vai acontecer. Então, é isso, o nosso erro é esse. A gente nunca acreditar que vai acontecer com a gente, quando acontecer com a gente, a gente toma consciência e vai se cuidar, se tem aquela água parada, né, e despejando ela e limpando.

As pessoas sempre pensam que não acontece na casa da gente, pensa que só acontece na casa dos outros; quando acontecer na casa da gente, aí a gente vai acreditar, né.

Idéia central III - Falta de responsabilidade, colaboração

Discurso do sujeito coletivo III: Eu acho que é assim e também é falta de responsabilidade, também. Eu acho que, igual no meu caso, tudo que eu pego de papel que é da dengue, que é papel importante eu leio. Acho que muita gente simplesmente pega na mão, olha e amassa e joga fora. Porque eu fazia isso antes. Agora não: vêm da escola os papéis que têm, eu paro, leio e tento seguir, né. Eu acho que é isso e as pessoas não faziam isso. Como eu, ninguém fazia isso. Hoje, eu presto mais atenção.

Acho que há pessoas que não têm responsabilidade também com a sociedade, né. Porque a televisão fala, o rádio fala, as cidades todas fazem essa campanha aí, mas o povo não tem, acho que não tem muita colaboração. Eu acredito que é falta de responsabilidade mesmo.

Idéia central IV - Não acreditam

Discurso do sujeito coletivo IV: O pessoal não tem certeza que é isso e não ligam, acha que é besteira isso, porque não tão acreditando que o mosquitinho pode causar um problema muito grave para a população.

Acho que não acredita muito, né, nas doenças que vêm por aquele fato de tá aquela água parada ali, então a pessoa não... como é que fala assim... ela não capricha, né, de deixar tudo limpinho, deixar tudo arrumadinho.

O povo deixa água porque não levam muito a sério, né, eu acho que é um pouco falta de instrução. Como você falou, tem muitas campanhas, mas ainda têm muitas pessoas que não se importam com isso, pessoas que não acreditam, nem ligam, fazem pouco caso até mesmo das campanhas. É desinteresse ou eles não vêem as pessoas que já estão contaminadas ou muitas vezes não dão crédito à campanha que é feita.

O pessoal não leva a sério, né, porque não tem a doença. Eu acho que eles não acreditam muito que pode acontecer, né.

Então, se os outros deixam, realmente eu não sei. Porque eu, no meu caso, eu não deixo, agora a cabeça dos outros é difícil você saber, né, e ainda não entrou na cabeça deles de que a coisa é séria; então, está levando para outro lado, não está achando que é coisa séria, mas a coisa é grave, né.

Idéia central V - Deixar para os outros o trabalho que lhes compete

Discurso do sujeito coletivo V: Olha, geralmente as pessoas são muito comodistas, como tem, vamos dizer assim, como tem a Sucen, que faz grande parte desse trabalho, ou a Prefeitura, ou campanhas de limpeza no terreno, então, a pessoa ou o dono do terreno, né, ou o morador da residência acaba deixando para terceiros fazer aquilo que lhe competia.

Idéia central VI - Descuido

Discurso do sujeito coletivo VI: Por falta de cuidado, um pouco de descuido mesmo, né. Aqui em casa também, no caso, foi um pouco de descuido, porque antes dessa moça vir, já veio várias; então, já era pra gente está bem conscientizado; daí foi descuido, um pouco de descuido também, relaxo das pessoas mesmo, né: está sabendo que é ruim, então tem que evitar; mas muitos não incomodam...

Idéia central VII - Falta de compreensão, informação

Discurso do sujeito coletivo VII: Porque o povo não compreende, eles ainda não têm na cabeça o que tem pra gente fazer, porque às vezes, às vezes as pessoas não sabem direito. É falta de explicação, é falta de alguém ir lá e avisá-los. As pessoas não têm noção da doença, do que é, né, ainda não tão cientes do problema. É falta de compreensão mesmo.

Pergunta 5 - "Agora eu vou falar uma frase e quero saber se você concorda ou discorda, e por quê. A frase é: o combate à dengue é coisa do governo e dos médicos. A população não tem nada a ver com isso."

Idéia central I - O governo tem trabalhado bastante; função de controle

Discurso do sujeito coletivo I: Eu não acho que o governo está totalmente coberto de razões, que eles conseguem, não, mas ele tem trabalhado bastante neste sentido, muita propaganda, muita campanha e o pessoal da SUCEN tem trabalhado bastante, tem visitado muitas casas, que eu tenho visto, na minha casa mesmo, vai gente e isto é muito importante e eu gosto que vai pra ver se está tudo arrumadinho, que a gente tem que começar por aí.

Idéia central II - Começa de cima mas a população tem que colaborar

Discurso do sujeito coletivo II: Começa de cima, é um trabalho que começa de cima, do governo, da Prefeitura, dos médicos, dos postos de Saúde, mas a população também tem que colaborar na sua parte, principalmente, né, cuidando de tudo aquilo dentro do seu quintal.

Idéia central III - A população é a principal interessada no combate; a responsabilidade maior é dela

Discurso do sujeito coletivo III: Eu acredito que a responsabilidade é maior da população, né. O governo entra com a verba, mas eu acho que a responsabilidade maior é da população.

A população tem tudo a ver com isso. É a população que tem que se cuidar. O governo, acho, que não dá conta de todas as casas. Eu acho que se a população não ajudar, né, eles também não podem virem nos quintais para ver se tem dengue ou não: adianta o governo e os médicos ficarem fazendo campanha se eu não limpo o meu quintal e a minha vizinha não limpa, se eu deixo água parada e todo mundo deixa? Eu acho que eles têm que ajudar, mas quem tem que se ajudar mesmo é o povo. A população tem que ver, porque se eles se cuidassem não ia acontecer o que está acontecendo. A partir do momento em que toda a população começar ajudar na campanha é que vai acabar isto daí, senão, o governo está fazendo de tudo, né. Eu acho que a grande responsabilidade é da população; se a população não contribuir não adianta o governo incentivar e fazer campanha. A população tem que contribuir e muito para a erradicação do mosquito, só o governo não irá acabar nunca.

Então, acho que depende muito mais da população se conscientizar, né. A população é que tem que estar mais consciente, o governo faz a parte dele, faz uma boa parte, agora tem que ter a consciência de ajudar; são muitas residências, que exige muito pessoal, se o pessoal não tiver consciência não tem jeito.

Idéia central IV - Responsabilidade compartilhada

Discurso do sujeito coletivo IV: Cada um faz a sua parte, você faz a sua, eu faço a minha, o governo manda vir na sua casa, vê coisa errada e pede pra você; o que está errado, você tem que obedecer e fazer o que é certo, né, não é o governo, não, é o governo e a população. Os médicos e o governo estão aí para alertar a gente, ajudar, o médico ajuda a cuidar pra que a doença não venha causar uma morte e o governo pra alertar a gente. Só que a gente tem que tomar consciência e né procurar se ajudar, não deixando o que venha a ocasionar o mosquito a picar a gente. A população inteira tem a ver com isso, porque todo mundo tem que se cuidar, né. Os médicos não vão vir na sua casa limpar sua água que está lá parada, né, ou um lixo, ele não vai vir tirar, não. Isso é coisa da gente mesmo. Todo mundo tem que se conscientizar sobre isso. Eu acho que está todo mundo dentro, né; é só através de todos juntos é que pode combater totalmente a dengue, porque se não tiver uma união de todos não tem jeito de combater, se um quer combater e outro não quer, então, não adianta. Ter campanha, ter isso, ter aquilo, todos têm que estar em um propósito; não só os governos têm culpa disso aí, não. Acho que está certo que os governos têm que ajudar a usar veneno nesses terrenos baldios; eles têm de chegar a obrigar as fábricas a fazerem limpeza, não deixar sujeira, as oficinas, mas acho que sem o povo também unindo é impossível, nem que ele vier todo dia. Acho que 50% seria o governo e 50% do pessoal, senão não resolve o problema, não. Cada um tem que fazer a sua parte, como eu deveria ter tirado minhas plantas daqui de dentro já, acho que cada um tem que fazer a sua parte, senão, não tem como.

DISCUSSÃO

Há duas condições necessárias (ainda que talvez não suficientes) para o comportamento preventivo se fazer presente e permanecer, em uma doença complexa como a dengue: que as mensagens sejam formuladas pela autoridade competente e decodificadas pelos indivíduos da maneira a mais correta possível, de modo que façam completo sentido para eles.1

Mensagens adequadamente formuladas pelas autoridades sanitárias, evidentemente, aumentam a probabilidade de serem adequadamente decodificadas pelos indivíduos; conseqüentemente, aumentam, em muito, a chance de se verem transformadas em comportamentos preventivos.

Consideradas essas premissas como referência, a presente pesquisa permite levantar algumas hipóteses interpretativas sobre as representações sociais encontradas:

Mensagens educativas demasiadamente sintéticas emitidas pelas autoridades sanitárias

Muitos discursos dos sujeitos coletivos mostram claramente que uma idéia bastante esquemática acabou se instalando no universo imaginário: é aquela que centraliza e quase reduz a questão da dengue e de seu enfrentamento ao mosquito da dengue.

A necessidade de eliminar o vetor, presente de modo talvez exagerado nas mensagens educativas, produziu, entre outros, um indesejável efeito: levou a população a confundir a dengue com seu vetor, ou seja, que, na definição da doença, se tomasse a parte pelo todo.

Tal confusão não favorece a adoção de comportamentos preventivos, na medida em que deixa obscura ou mesmo incompreensível a relação entre "água" e "mosquito", e. portanto, toda a base da lógica "larvária" do enfrentamento da doença. Favorece ainda, no seio da população, uma compreensão equivocada da enfermidade, na medida em que a reduz a uma relação de causa e efeito equivocada e parcial ("a pessoa fica doente por causa da picada do mosquito da dengue").

Presença de informação errônea no imaginário

Alguns discursos revelam também a presença, entre a população, de informações errôneas, confundindo-se dengue com febre amarela, o que se deve, em parte, ao vetor comum. Da mesma forma, nota-se a presença de idéias equivocadas, como as de que o mosquito deposita diretamente na água suas larvas, equívoco que talvez possa ser atribuído ao fato das larvas, ao contrário dos ovos, serem visíveis a olho nu.

Entendimento do mecanismo básico de transmissão da doença

Por outro lado, outros discursos do sujeito coletivo revelam que idéias basicamente corretas sobre a doença em si, os criadouros e os mecanismos de transmissão também fazem parte do imaginário, mostrando que a população é capaz de entender uma doença relativamente complexa como a dengue.

Entendimento da parcela de responsabilidade que cabe à população no enfrentamento da doença

Da mesma forma, a pesquisa revela a capacidade da população em compreender a sua parte e a de outras instâncias (o governo e os profissionais de saúde) no controle da doença pela via da erradicação do vetor.

Descrença na atividade educativa de um modo geral

Outros discursos sinalizam um importante desafio a ser enfrentado, que diz respeito a uma certa saturação das campanhas educativas de um modo geral e daquelas com temas de saúde, em particular. Tal esgotamento é parte de um fenômeno mais amplo de uma sociedade e uma cultura contemporâneas demasiadamente carregadas de todo tipo de informação, dificultando, em muito, a receptividade e a boa vontade do cidadão frente às mensagens educativas. Compromete-se, com isso, a eficiência e eficácia da atividade educativa.

"Só acreditarão na doença quando acontecer com eles"

A luta contra a dengue e a estratégia adotada de erradicação do vetor pressupõem uma atividade educativa onde está presente o apelo a um comportamento eminentemente preventivo. Isso representa uma grande dificuldade para uma população demasiadamente habituada, no que diz respeito aos eventos de doença, a uma atitude reativa, na qual apenas se toma alguma providência depois do fato instalado. De fato, a presença de idéias como "as pessoas só acreditarão na doença quando acontecer com elas" sinaliza que uma parte da população ainda não se sente suficientemente em risco de contrair a dengue.

Não acreditam que um "mosquitinho" possa causar tanto problema

Há aqui, novamente, a presença no imaginário social de idéias que revelam uma certa dificuldade de situar corretamente o mosquito no processo de complexo da dengue. Sinaliza uma informação educativa ainda insuficiente para o pleno e cabal entendimento da doença pelo conjunto da população, condição necessária para a instalação e permanência dos comportamentos preventivos.

Valorização do papel e da presença constante da autoridade sanitária

Os discursos revelam, também, que a população valoriza muito a presença constante, nos cenários da dengue, da autoridade sanitária, visitando as casas, controlando a presença do vetor, ajudando a população na sua tarefa de controle doméstico do Ae.aegypti. O dado indica que, quando se trata do enfrentamento de doenças como a dengue, é imperiosa a necessidade de uma atividade educativa constante, num "corpo a corpo" com a população.

Recomendações

  • Manutenção da presença constante da autoridade sanitária no cenário da dengue e do trabalho educativo em caráter permanente.

  • Esclarecimento por meio de campanhas e atividades educativas "corpo a corpo" com a população, em escolas, centros comunitários etc. sobre as características básicas da doença e dos mecanismos de transmissão, focalizando especialmente as dúvidas e fontes de equívocos.

  • Mostrar, de maneira clara, sem temor ao pânico, a realidade do rápido alastramento da doença e de que ela pode, sim, atingir a todos.

  • Utilizar nas campanhas e na atividade educativa em geral a linguagem da população, sem perda de conteúdo técnico.

  • Apresentar à população, sob a forma de atividade educativa, os resultados da presente pesquisa.

  • Realização, como atividade de rotina nos serviços, de pesquisas de natureza quantitativa e qualitativa, que propiciem dados para o melhor acompanhamento dos aspectos comportamentais envolvidos na evolução da epidemia.

  • Treinamento de pessoal para atividades educativas, baseado em dados de pesquisa.

  • Elaboração de materiais educativos que não privilegiem na capa imagens do vetor adulto, para que a população não tenha como expectativa que as ações de controle sejam realizadas frente ao mosquito adulto.

  • Elaborar materiais e desenvolver estratégias educativas que privilegiem a ação compartilhada entre a população e governo, visando ao combate ao ovo e à larva do Ae.aegypti.

Recebido em 23/7/2002

Reapresentado em 17/12/2003

Aprovado em 22/12/2003

Subvencionado pelo Ministério da Saúde/ Fundação Giacometti (Processo ASC 00/00177-0).

  • 1. Chiaravalloti VB, Morais MS, Chiaravalloti Neto F, Conversani DT, Fiorin AM, Barbosa AAC, Ferraz AA. Avaliação sobre a adesão às práticas preventivas do dengue: o caso de Catanduva, São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública 2002;18:1321-9.
  • 2. Forattini OP, Brito M. Reservatórios domiciliares de água e controle do Aedes aegypti Rev Saúde Pública 2003;37:676-7.
  • 3. Glasser CM. Estudo da infestação do Estado de São Paulo por Aedes aegypti e Aedes albopictus [tese de mestrado]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da USP; 1997.
  • 4. Goldemberg M. A arte de pesquisar: como fazer uma pesquisa qualitativa em ciências sociais. Rio de Janeiro: Record; 1999.
  • 5. Guedes JS. A dengue e as mazelas da modernidade. O Estado de São Paulo, São Paulo, 7 de maio de 2001; cad. 7:15.
  • 6. Jodelet D. As representações sociais. In: Representações sociais: um domínio em expansão. Rio de Janeiro: EdUERJ; 2001. p. 17-44.
  • 7. Lefevre F, Lefevre AMC, Teixeira JJV, organizadores. O discurso do sujeito coletivo: uma nova abordagem metodológica em pesquisa qualitativa. Caxias do Sul: Educs; 2000.
  • 8. Lefevre F, Lefevre AMC, Teixeira JJV, organizadores. O discurso do sujeito coletivo: um novo enfoque em pesquisa qualitativa (Desdobramentos). Caxias do Sul: Educs; 2003.
  • 9
    Organização Panamericana de la Salud. Nueva generación de programas de prevención y control del dengue en las Américas. Washington (DC); 2001.
  • Endereço para correspondência
    Fernando Lefèvre
    Faculdade de Saúde Pública da USP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Jul 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2004

    Histórico

    • Recebido
      23 Jul 2002
    • Revisado
      17 Dez 2003
    • Aceito
      22 Dez 2003
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