Resumos
Estudo comparativo entre os meios de captação de vapores de mercúrio mais viáveis: absorção em permanganato de potássio em meio ácido, absorção em solução de iodo e iodeto, adsorção em carvão ativo e adorção em hopcalita. É descrito um processo de produção de atmosfera padrão de vapores de mercúrio para testar os diferentes meios, e o que maior acuidade e precisão apresentou foi o que utiliza absorção em permanganato em meio ácido.
Mercúrio; Medicina do trabalho; Saúde ocupacional
This is a comparative study of the most feasible methods of sampling mercury vapour. Absorption in acid permanganate, absorption in iodine and iodide solutions, adsorption in activated charcoal, and in hopcalite. A process to produce a standard atmosphere of mercury vapour to test the different methods is described. The method showing greatest accuracy and precision was found to be absorption in acid permanganate.
Mercury poisoning; Industrial medicine; Occuptional diseases
ARTIGO ORIGINAL
Estudo comparativo entre meios de captação de vapores de mercúrio para avaliação do risco de intoxicação profissional
A comparative study among methods of sampling mercury so as to evaluate occupational intoxication risk
Sérgio Colacioppo
Do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP Av. Dr. Arnaldo, 715 São Paulo, SP Brasil
RESUMO
Estudo comparativo entre os meios de captação de vapores de mercúrio mais viáveis: absorção em permanganato de potássio em meio ácido, absorção em solução de iodo e iodeto, adsorção em carvão ativo e adorção em hopcalita. É descrito um processo de produção de atmosfera padrão de vapores de mercúrio para testar os diferentes meios, e o que maior acuidade e precisão apresentou foi o que utiliza absorção em permanganato em meio ácido.
Unitermos: Mercúrio, toxicologia. Medicina do trabalho. Saúde ocupacional.
ABSTRACT
This is a comparative study of the most feasible methods of sampling mercury vapour. Absorption in acid permanganate, absorption in iodine and iodide solutions, adsorption in activated charcoal, and in hopcalite. A process to produce a standard atmosphere of mercury vapour to test the different methods is described. The method showing greatest accuracy and precision was found to be absorption in acid permanganate.
Uniterms: Mercury poisoning. Industrial medicine. Occuptional diseases.
1. INTRODUÇÃO
O mercúrio em sua forma metálica e líquida encontra grande número de aplicações industriais, porém, os vapores que dele emanam originam risco de intoxicação profissional. De acordo com o que se verifica em estudos a respeito da avaliação do efeito sobre o organismo humano, como o realizado pelo U. S. Department of Health, Education and Welfare15 (1973), existe ainda grande dificuldade de estabelecer um paralelo perfeito entre os achados laboratoriais de análises de material biológico e sinais ou sintomas da intoxicação por mercúrio. Por outro lado, as medidas preventivas de ordem de higiene do trabalho não eliminam totalmente o risco de intoxicação, tornando necessária uma avaliação ambiental dos vapores de mercúrio, que servirá para correlacionar o quadro clínico do trabalhador com a concentração a que possivelmente esteve exposto, ou ainda, para avaliar a eficiência das medidas de controle introduzidas.
Porém, para a realização de tal tarefa, o higienista industrial depara-se com o problema de qual meio de captação deverá utilizar, uma vez que a literatura especializada indica vários deles, não fazendo ainda referência à eficiência de captação 1, 4, 5, 6 , 7, 11, 12, 13.
2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Produção de uma atmosfera de concentração conhecida de vapores de mercúrio
A fim de se realizar um estudo comparativo entre processos de captação de vapores de mercúcio, há necessidade de se estabelecer uma atmosfera padrão onde se conheça exatamente o teor de mercúrio presente. É então proposto um equipamento, descrito a seguir, com a finalidade de produzir uma atmospera padrão que poderá ser amostrada por vários processos. (Figura).
Utiliza-se nitrogênio ou ar comprimido em cilindros a fim de se evitar possíveis contaminações provenientes do laboratório.
O ar é levado a um frasco onde se mantém a uma pressão ligeiramente superior à do meio ambiente, de onde é aspirado, passando por um gerador de vapor de mercúrio; o gerador consta de um frasco borbulhador contendo 75 ml de uma solução padrão de mercúrio à qual é adicionada, em momento oportuno, uma alicota de 5 ml de cloreto estanoso. Essa adição provoca uma redução do mercúrio em solução para mercúrio metálico, que, por borbulhamento, origina uma corrente de vapor de mercúrio que é aspirada para um frasco de 20 1 com a finalidade de diluir os vapores, evitando-se, assim, picos de concentração que poderiam não ser eficientemente coletados.
A seguir acrescenta-se o elemento de captação, tendo, contudo, um desvio que proporciona uma aspiração direta pela bomba, facilitando, assim, a operação de calibração da vazão, sendo fechado o desvio simultaneamente ao início do borbulhamento no gerador e à adição de cloreto estanoso.
Desta maneira, fazendo-se passar um volume total de atmosfera de duas a três vezes o volume do frasco diluidor, teremos passado pelo elemento de captação praticamente todo o mercúrio existente na solução padrão inicial, calculando-se, então, com facilidade, a concentração de vapor de mercúrio que foi produzida.
2.2. Captação de Vapores de Mercúrio
Utilizando o equipamento descrito acima para a produção de vapores de mercúrio, foram realizadas várias captações, utilizando os seguintes meios de captação:
permanganato de potássio em meio ácido
solução de iodo hopcalita
carvão ativo.
Estes meios de captação foram selecionados por serem os que apresentam maior aplicabilidade prática.
As técnicas empregadas foram as seguintes:
Para a captação com permanganato de potássio foram utilizados dois borbulhadores em série, de vidro pyrex e dispersor de vidro sinterizado, com capacidade de 30 ml, contendo cada um 5 ml de solução de permanganato de potássio 0,5 Ne5 ml de ácido sulfúrico 2,0 N. A vazão foi ajustada para 2 litros por minuto. Após a captação, uma alicota propriada da solução do borbulhador, é transferida para um balão de 200 ml, com adaptação para o mesmo tipo de borbulhador utilizado na captação, e feita uma diluição para 100 ml. A este balão são adicionados 5 ml de solução de cloridrato de hidroxilamina a 1,5% para reduzir o excesso de permanganato, e a seguir, com o borbulhador já conectado ao espectrofotômetro, adicionam-se 5 ml de solução de cloreto estanoso a 25% em ácido clorídrico a 50% e faz-se a leitura 15.
A captação com solução de iodo obedeceu basicamente ao mesmo esquema utilizando-se no borbulhador 10 ml de uma solução de iodo a 0,25% e iodeto de potássio a 3% segundo Jacobs.4
A captação com hopcalita foi realizada segundo a técnica descrita por Rathje13 utilizando-se hopcalita fornecida pela Mine Safety Applyancies Co. Foram preenchidas duas secções de tubos de vidro, de diâmetro interno de cerca de 2 mm, com aproximadamente 0,5 g de hopcalita em cada secção, separadas por um tufo de lã de vidro, e estas analisadas separadamente. A eluição foi feita em ácido nítrico a 50% em quatro porções de 10 ml, diluindo-se a seguir em balão volumétrico a 100 ml. Desta solução uma alicota é transferida para um balão de 200 ml provido de borbulhador e conectado ao analisador de mercúrio; adicionam-se 5 ml de solução de cloreto estanoso a 25% em ácido clorídrico a 50% e faz-se a leitura.
A captação com carvão ativo foi realizada por processo semelhante ao descrito acima, utilizando-se, porém, carvão ativo de 20/40 malhas e impregnação de iodo a 5%, conforme Mantell8, utilizando-se uma eluição com ácido nítrico a 10%.
2.3. Análise do Material Captado
As análises de mercúrio foram efetuadas com equipamento Perkin-Elmer/Coleman, modelo MAS-50 Mercury Analyser System, que utiliza basicamente o processo de absorção atômica sem chama, descrito por Hatch e Ott3.
Para cálculo das concentrações de vapores de mercúrio na atmosfera criada no laboratório, foram levadas em conta as diluições feitas durante o processo de captação e análise, a quantidade de solução padrão adicionada no gerador de vapor e o volume de atmosfera captado.
Foi utilizada solução Tritisol Merck solução padrão de mercúrio para espectrofotometria, tanto para calibração do instrumento como para produção de vapores.
3. RESULTADOS
Utilizando 2,64 mg de mercúrio no gerador e passando-se 20 litros de atmosfera a uma vazão de 2 litros por minuto, obteve-se uma concentração de 132 mg de vapores de mercúrio por metro cúbico. Foram realizadas avaliações segundo os quatro processos descritos no item 2 e encontrados os valores constantes da Tabela.
4. DISCUSSÃO
Considerando os resultados obtidos, verifica-se que o equipamento proposto para a produção de vapores de mercúrio funciona satisfatoriamente, uma vez que a média das avaliações utilizando permanganato de potássio atingiu uma eficiência de 97,7% em relação ao padrão adicionado.
Outros processos de produção de uma atmosfera padrão poderiam e foram considerados. Inicialmente poderíamos elaborar uma câmara de vários metros cúbicos, na qual se faz evaporar uma quantidade conhecida de mercúrio metálico, conforme descreve Mays e col.9
Uma câmara deste tipo, porém, apresenta dificuldades de ordem prática, como por exemplo seu tamanho, a limpeza, o dispêndio de muito tempo para a preparação de um ambiente, além de precisarmos ter certeza de que todo mercúrio líquido já tenha sido evaporado e disperso homogeneamente no seu interior.
Stettiner 14 descreve um reservatório para produção de concentrações conhecidas de vapores que, no entanto, não é aplicável à produção de vapores de Hg visto as dificuldades de trabalhar com pequenos volumes, e pesar pequenas quantidades de mercúrio metálico da ordem de 1 mg que seria evaporado pela corrente de ar que entra para um frasco de atmosfera rarefeita.
Quanto aos resultados obtidos, os meios de solução de iodo e carvão ativo apresentaram eficiência bastante baixa, e com hopcalita uma eficiência maior, porém, ainda em cerca de 75%. Tal fato poderia ser atribuído inicialmente à baixa produção de vapores de mercúrio por parte do equipamento gerador. Esta hipótese, porém, não é confirmada tendo em vista os resultados obtidos com a captação em permanganato. Poderíamos ainda imaginar que a eficiência do meio com permanganato estivese acima dos 100%, o que nos levaria a crer que os demais processos estivessem então mais próximos do valor do padrão; porém, com teste em branco com captação e análise exatamente iguais, apenas com ausência de padrão de mercúrio, obteve-se resultado praticamente igual a zero, sendo inclusive o teste em branco realizado periodicamente para efeito de detectar possível contaminação.
Outra hipótese que poderia ser levantada a fim de explicar os baixos resultados obtidos, seria uma possível interferência no processo de análise adotado. As substâncias existentes nos processos e que poderiam estar interferindo são: óxido de manganês, óxido de cobre, iodo, iodeto de potássio e carvão. Segundo Moeller 10 estas substâncias em solução ácida envolvem potenciais de óxido-redução menores que o do cloreto estanoso, o que significa que poderíamos estar perdendo cloreto estanoso reduzindo outras substâncias além do mercúrio, o que nos daria um resultado analítico inferior ao real, devido a uma liberação parcial do mercúrio em solução. O cloreto estanoso, porém, é adicionado em excesso, o que deve por si contornar este problema. Contudo, para testar a hipótese levantada, foram feitas algumas amostragens utilizando maiores quantidades de solução redutora de cloreto estanoso, o que deveria originar resultados analíticos ao menos ligeiramente maiores, o que não foi verificado.
O meio de adsorção em carvão ativo foi o que menor eficiência apresentou, fato que nos chamou a atenção, visto ser o carvão ativo utilizado em vários processos, inclusive como filtros adsorventes em máscaras para proteção individual.
Em uma tentativa de verificarmos se a concentração do ácido nítrico utilizado na eluição de mercúrio do carvão ativo estava interferindo, foram realizadas eluições com ácido clorídrico e com água, não tendo sido detectada grande variação nos resultados, sendo que a eluição com ácido nítrico a 10% apresentou resultados ligeiramente maiores, para uma mesma quantidade de padrão.
Os baixos resultados obtidos com carvão ativo concordam com os obtidos por Rathje e col.13, porém, estes mesmos autores afirmam ter obtido eficiencias de até 99,9% com o processo de adsorção em hopcalita, o que não está de acordo com os resultados obtidos de cerca de 75%.
5. CONCLUSÕES
O sistema proposto para a produção de vapores de mercúrio com a finalidade de aferir métodos diferentes de captação funciona satisfatoriamente.
Dentre os meios de captação estudados, o que utiliza absorção em solução de permanganato de potássio em meio ácido é o de escolha, visto apresentar uma eficiência de aproximadamente 97,7% e um coeficiente de variação de 0,32. Se por uma imposição prática, houver necessidade de utilização de um meio de adsorção em amostragem pessoal contínua, o processo que utiliza hopcalita poderá ser escolhido, apesar de sua eficiência ter sido determinada em cerca de 74,4%.
O processo que utiliza carvão ativo como adsorvente deve merecer maiores estudos quanto à eluição e análise do mercúrio captado, bem como do efeito protetor dos filtros que empregam este material.
Recebido para publicação em 08/12/1976
Aprovado para publicação em 17/12/1976
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-
15U. S. DEPARTMENT OF HEALTH, EDUCATION, AND WELFARE. Criteria for a recommended standard... occupational exposure to inorganic mercury. Washington, D. C., 1973.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
02 Maio 2006 -
Data do Fascículo
Set 1977
Histórico
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Aceito
17 Dez 1976 -
Recebido
08 Dez 1976