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A Violência urbana e suas consequências em um centro de atenção psicossocial na zona norte do município do Rio de Janeiro

Urban violence and its consequences in a psychosocial care centre in the north zone of the city of Rio de Janeiro

Resumos

OBJETIVO: Descrever a interferência da violência urbana e do tráfico de drogas sobre um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) localizado na zona norte do Rio de Janeiro. METODOLOGIA: Pesquisa qualitativa com abordagem teórico-metodológica baseada nos princípios da observação participante e no trabalho de campo. Grande parte dos CAPS da zona norte está inserida em regiões de maior risco social, onde há intensificação da violência. A presença dessa problemática social se reflete na rotina do serviço, que precisa criar estratégias protetivas, realizar visitas domiciliares, atender à demanda de usuários de drogas com precária situação de vida e ainda enfrentar continuamente novos desafios. RESULTADOS: A elevada frequência da percepção de problemas sociais, como as altas taxas de violência e criminalidade, a questão do tráfico de drogas, o aumento da desigualdade social e a consequente sobreposição de exclusões a que estão submetidas essa parcela da população, requer novos estudos que permitam compreender as consequências do impacto da violência na saúde mental dos usuários de serviços em tratamento na comunidade.

Saúde Mental; Centros de Atenção Psicossocial; Violência Urbana e Tráfico de Drogas


OBJECTIVE: To describe the interference of urban violence and drug trafficking in a Centro de Atenção Psicossocial (CAPS - Psychosocial Care Centre) located in the north zone of Rio de Janeiro. METHODOLOGY: Qualitative research with a theoretical-methodological approach based on the principles of participant observation and on fieldwork. Many CAPS of the north zone are situated in areas of high social risk, where there is intensification of violence. The presence of this social issue reflects on the routine of the service, as it needs to create protective strategies, to perform home visits, to assist drug users with precarious life situation and, also, to face new challenges continuously. RESULTS: The high frequency of perception of social problems like the high rates of violence and criminality, the question of drug trafficking, the increase in social inequality and the consequent overlapping of exclusions to which this part of the population is submitted require new studies that allow to understand the consequences of the impact of violence on the mental health of users of treatment services in the community.

Mental Health; Psychosocial Care Centre (CAPS); Urban Violence and Drug Trafficking


PARTE I - ARTIGOS

Flávia Mitkiewicz de SouzaI; Eliecer ValenciaII; Catarina DahlIII; Maria Tavares CavalcantiIV

IPsicóloga. Mestranda do curso de Pós-graduação em Saúde Mental do Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Endereço: Av. Venceslau Brás, 71, Urca, CEP 22290-140, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: fmitkiewicz@terra.com.br

IIPesquisador Sociólogo. Professor Assistente. Departamento de Epidemiologia de Saúde Pública da Escola Mailman da Universidade de Columbia, NY. Endereço: 722 W 168th Street Nova York, NY 10032-3727 Estados Unidos. E-mail: esv1@columbia.edu

IIIPsicóloga. Mestranda do curso de Pós-graduação em Saúde Coletiva da Unicamp. Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Cidade Universitária "Zeferino Vaz", CEP 13083-887, Campinas, SP, Brasil. E-mail: catdahl@hotmail.com

IVPós-doutora na área de epidemiologia psiquiátrica. Professora associada do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da Faculdade de Medicina da UFRJ. Diretora do Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Endereço: Av. Venceslau Brás, 71, Urca, CEP 22290-140, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: mariatavarescavalcanti@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a interferência da violência urbana e do tráfico de drogas sobre um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) localizado na zona norte do Rio de Janeiro.

METODOLOGIA: Pesquisa qualitativa com abordagem teórico-metodológica baseada nos princípios da observação participante e no trabalho de campo. Grande parte dos CAPS da zona norte está inserida em regiões de maior risco social, onde há intensificação da violência. A presença dessa problemática social se reflete na rotina do serviço, que precisa criar estratégias protetivas, realizar visitas domiciliares, atender à demanda de usuários de drogas com precária situação de vida e ainda enfrentar continuamente novos desafios.

RESULTADOS: A elevada frequência da percepção de problemas sociais, como as altas taxas de violência e criminalidade, a questão do tráfico de drogas, o aumento da desigualdade social e a consequente sobreposição de exclusões a que estão submetidas essa parcela da população, requer novos estudos que permitam compreender as consequências do impacto da violência na saúde mental dos usuários de serviços em tratamento na comunidade.

Palavras-chave: Saúde Mental; Centros de Atenção Psicossocial; Violência Urbana e Tráfico de Drogas.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To describe the interference of urban violence and drug trafficking in a Centro de Atenção Psicossocial (CAPS - Psychosocial Care Centre) located in the north zone of Rio de Janeiro.

METHODOLOGY: Qualitative research with a theoretical-methodological approach based on the principles of participant observation and on fieldwork. Many CAPS of the north zone are situated in areas of high social risk, where there is intensification of violence. The presence of this social issue reflects on the routine of the service, as it needs to create protective strategies, to perform home visits, to assist drug users with precarious life situation and, also, to face new challenges continuously.

RESULTS: The high frequency of perception of social problems like the high rates of violence and criminality, the question of drug trafficking, the increase in social inequality and the consequent overlapping of exclusions to which this part of the population is submitted require new studies that allow to understand the consequences of the impact of violence on the mental health of users of treatment services in the community.

Keywords: Mental Health; Psychosocial Care Centre (CAPS); Urban Violence and Drug Trafficking.

Introdução

O estudo no qual este artigo foi baseado foi realizado no CAPS Linda Batista, localizado no bairro de Guadalupe, Zona Norte do Rio de Janeiro, em que são atendidas pessoas portadoras de transtornos mentais severos e persistentes. Esse CAPS foi inaugurado em julho de 2004 e está inserido na área programática (AP 3.3/ eixo Pavuna - Anchieta), sendo referência para nove bairros dessa área, que conta com aproximadamente 370 mil habitantes. Até setembro de 2009, o serviço atendia aproximadamente 400 pacientes matriculados (com prontuário), além daqueles que procuravam atendimento pela primeira vez (pronto-atendimento). O CAPS fornecia apenas o lanche, já que não dispunha de infraestrutura para fornecer almoço aos usuários. Havia no serviço, um total de 21 profissionais, sendo dois médicos, quatro psicólogos, dois terapeutas ocupacionais, um musicoterapeuta, um assistente social, e os demais funcionários de nível médio. A casa é pequena para a quantidade de pacientes que recebe atendimento, localizando-se entre comunidades carentes dominadas pelo tráfico de drogas e com alto de grau de violência. Até o término da primeira fase de pesquisa (dezembro de 2009), não existia Programa de Saúde da Família (PSF) nas proximidades do CAPS, apenas em módulos como: Pedreira, Lagartixa, Fazenda Botafogo, Jorge Turco (bairro de Costa Barros) e Edma Valadão em Acari.

A Área de Planejamento 3.3 foi escolhida para ser objeto desse estudo em função da marcante violência presente na região. O subúrbio da Central e Leopoldina (AP 3.3) é uma das áreas mais distantes do centro urbano da cidade e de maior carência de serviços. O bairro de Guadalupe, onde fica localizado o CAPS Linda Batista, é cortado pela Avenida Brasil, que liga o Centro à Zona Oeste. Por isso, é servido de inúmeras linhas férreas e de ônibus que transitam diariamente de um extremo a outro da cidade. É também nesse bairro que se localiza a sede da Subprefeitura da Zona Norte. A área é considerada uma das mais carentes da cidade e com os piores índices de desenvolvimento humano (IDH)1 1 Fonte: IPP/Armazém de dados - Índices sociodemográficos. Rio de Janeiro, 2008. , tendo seu aspecto estigmatizado pela presença da Favela do Muquiço, popularmente conhecida pelos altos índices de violência causados pela presença constante do tráfico de drogas, conflitos entre comandos rivais pela disputa de território nas comunidades vizinhas e pelas precárias condições de vida população.

Trata-se de um estudo que envolve o conhecimento de uma realidade que não pode ser quantificada e segundo esta abordagem "trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (Minayo, 1998, p. 21-22).

Políticas públicas: saúde e violência no Rio de Janeiro

O Rio de Janeiro é um município de grande porte, com uma área de 1.255,3 km² e conta com 5.941.838 habitantes2 2 Fonte: IPP/Armazém dos Dados. Rio de Janeiro, 2008. . É dividida em 10 Áreas de Planejamento (AP) de Saúde, 32 Regiões Administrativas com 159 bairros. Agrega, ainda, um padrão extremamente heterogêneo no que se refere ao processo de ocupação e à distribuição geográfica da população. Essa composição traz para a cidade uma organização socioeconômica espacial marcada por contrastes. As APs mantêm em comum, além da proximidade geográfica, o perfil socioeconômico e de acesso aos serviços de saúde. A área da AP 3 é dividida em três subáreas, a AP 3.1, AP 3.2 e AP 3.3, que compreendem os subúrbios da Central e Leopoldina, linhas férreas que cruzam a cidade, além da Ilha do Governador.

A Zona Norte do município tem, ao todo, 80 bairros e 2.350.000 habitantes. Os dados oficiais3 3 FONTES: IBGE: Censos 1991/2000; Pesquisa IPEA/PNUD (2001); Instituto Pereira Passos (IPP): Anuário Estatístico da Cidade (1998); Atlas Escolar (2000). indicam que essa região é densamente povoada, com evasão de população em certas localidades e taxas de natalidade altas. Os bairros da Zona Norte apresentam baixos índices de área livre por habitante e é baixo o número de moradores com escolaridade de nível superior. Na região, há pouca oferta de emprego, o acesso aos recursos monetários é difícil, assim como ao conhecimento.

Os CAPS, "dispositivo estratégico da atual política pública de assistência à saúde mental4 4 LEAL, E. M; DELGADO, P. G. G. Clínica e cotidiano: o CAPS como dispositivo de desinstitucionalização. In: PINHEIRO, R.; GULJOR, A. P.; GOMES, A.; MATTOS, R. M. (Org.). Desinstitucionalização na saúde mental: contribuições para estudos avaliativos. Rio de Janeiro: CEPESC: IMS/LAPPIS: ABRASCO, 2007. p. 137-154. ", têm como função organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes; prestar atendimento clínico em regime de atenção diária; promover a inserção social de pessoas com transtornos mentais através de ações intersetoriais; regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental no seu território de atuação e dar suporte à atenção à saúde mental na rede básica; articular os serviços de saúde mental nas APs, além de constituir e capacitar equipes de referência para o cuidado de pessoas com transtorno mental severo e persistente em serviços de base comunitária.

Alguns estudos no país têm mostrado que a violência afeta a população de modo desigual, gerando riscos diferenciados em função de gênero, raça/cor, idade e espaço social (Souza e Lima, 2006). As redes internacionais de tráfico de drogas, que se articulam em torno de atividades ilegais, altamente perigosas e com rotas bem estabelecidas no país, têm se constituído como um processo social potencializador de homicídios. Fatores como o desemprego, a desestruturação familiar, o sentimento de frustração e uma busca desenfreada de padrões sociais apresentados como possíveis em um mundo de consumo se acirram principalmente nos grandes centros urbanos e contribuem para a delinquência e a violência.

De acordo com Minayo e Souza (1999), os problemas no caso brasileiro são, do ponto de vista macroestrutural, as extremas desigualdades, a violência urbana e o desemprego, a exclusão social e a exclusão moral que, nessa etapa do desenvolvimento, têm grande peso na dinâmica da violência. Em termos de conjuntura, o crescimento do crime organizado, nos grandes centros urbanos, sobretudo em torno do narcotráfico (e outras formas de violência geral e difusa), do contrabando de armas de fogo, do desemprego, da impunidade e da ausência de um projeto social que integre o conjunto dos estratos sociais. No nível sociodemográfico, na grande maioria, as vítimas são adolescentes e adultos jovens, do sexo masculino, com características típicas das camadas menos favorecidas da população: residentes em áreas pobres e, às vezes, periféricas das grandes metrópoles, de cor negra ou descendente dessa etnia; com baixa escolaridade e pouca ou nenhuma qualificação profissional.

Segundo Galheigo (2008), outros fatores são igualmente considerados importantes no acirramento da violência contemporânea: vivências de violência e negligência desde a tenra idade; convivência com a desigualdade social; mudanças nos mecanismos de controle social nas sociedades contemporâneas; fortalecimento da violência infrapolítica, tais como as do crime organizado e do tráfico de drogas, e manipulação dos imaginários violentos vista nas guerras étnicas e entre facções criminosas.

Tendo em vista o alarmante crescimento da violência, a Organização Mundial da Saúde (OMS) deflagrou uma Campanha Global para a Prevenção da Violência e, em outubro de 2002, lançou o primeiro Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, cujo objetivo foi descrever a magnitude e o impacto da violência no mundo. O relatório apresenta os fatores de risco para a violência, sumariza tipos de intervenção, políticas que têm sido testadas e sua eficácia e faz recomendações para ações no plano local, nacional e internacional (Krug e col., 2002).

O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde traça recomendações em nove pontos principais. Para o enfoque deste artigo, podemos destacar a sexta recomendação, que aborda a importância da integração das políticas sociais e educacionais e a promoção da igualdade social e de gênero. A desigualdade social tem sido correlacionada à violência e recomenda-se fazer esforços para a redistribuição da riqueza e a manutenção de políticas de proteção social. A recomendação enfatiza que a qualidade das políticas sociais de saúde, educação e assistência social deve ser preservada a todo custo e que pessoas em desvantagem devem receber suporte especial, educacional e econômico.

Esse relatório classifica a violência em três níveis, segundo sua expressão e natureza (física, sexual, psicológica ou decorrente de negligência), que, em geral, se manifesta em uma combinação: 1) interpessoal, que compreende a violência intrafamiliar, pelo cônjuge, e cujas vítimas são mulheres, crianças e adultos, e a violência cometida pela comunidade, nas ruas e em locais públicos, contra indivíduos conhecidos ou, às vezes, desconhecidos; 2) coletiva, por Estados, grupos organizados, crime organizado, podendo também ser social, econômica ou política; e 3) autoinfringida, como o suicídio ou a tentativa de suicídio e outros tipos de autoagressão.

Apesar de existirem publicações recentes relacionadas à importância da abordagem sobre o tema da violência (Galheigo, 2008; Marín-León e col., 2007 a, b; Concha-Eastman e Malo, 2007), ainda são escassos na literatura os trabalhos que envolvem, especificamente, a relação da violência urbana e suas consequências na saúde mental de determinada população (Ribeiro e col., 2009). Diante dessa circunstância, este trabalho se propõe a contribuir para a relevante discussão dessa problemática, tão presente na maior parte dos centros urbanos, reforçando a necessidade de análises teóricas futuras.

Objetivo

Este artigo tem por objetivo descrever a interferência da violência urbana e do tráfico e consumo de drogas sobre o CAPS Linda Batista (CAPS II) localizado no bairro de Guadalupe pertencente a AP 3.3 no município do Rio de Janeiro, a fim de questionar em que medidas esses fenômenos sociais têm potenciais implicações na adesão/continuidade do cuidado em saúde mental.

No primeiro momento da pesquisa, o objetivo era obter maior conhecimento sobre a clientela atendida no CAPS, o território e a comunidade em que se insere cada um desses serviços, para compreender melhor o contexto dos serviços, sua estrutura, características de funcionamento e obstáculos encontrados em relação ao atendimento a pessoas com transtorno mental grave e a continuidade de cuidado. Além dos objetivos descritos, essa primeira aproximação do campo também serviu para detectar os aspectos da comunidade, do contexto e funcionamento dos CAPS e da clientela atendida - como, por exemplo, o uso de drogas, a violência, a pobreza, a gravidade dos transtornos, entre outros - e refletir sobre quais deveriam ser valorizados para focar a intervenção na tentativa de compreender como esses problemas repercutem na adesão e continuidade do tratamento.

Metodologia

Este artigo é o recorte de uma pesquisa em andamento iniciada em março de 2009 nos CAPS do Rio de Janeiro, que foi contemplada pelo edital do CNPq de fomento às atividades de pesquisa científica em saúde mental, sendo uma parceria do Instituto de Psiquiatria da UFRJ (IPUB) com a Universidade de Columbia em Nova York. O objetivo da pesquisa foi adaptar a Critical Time Intervention (CTI), desenvolvida em Nova York, para a realidade brasileira, criando a Intervenção em Saúde Mental para Períodos de Transição (CTI-Br) e testar a sua viabilidade (feasibility) em pessoas portadoras de transtornos do espetro esquizofrênico em tratamento nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do município do Rio de Janeiro. Esta pesquisa foi um desdobramento de um estudo anterior (Edital FAPERJ/SUS 2005) no qual ficou clara a necessidade de um trabalho de articulação dos pacientes no território (Cavalcanti, 2009). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPUB/UFRJ) e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde.

Trata-se de pesquisa qualitativa, com abordagem teórico-metodológica baseada nos princípios da Observação Participante e no trabalho de campo.

Os protagonistas do estudo foram os usuários e os técnicos do serviço, bem como as representações locais. Como critério para participação nas entrevistas, optamos por escolher pessoas que demonstraram interesse e concordância em participar do estudo, garantindo sua autonomia no que diz respeito ao seu consentimento livre e esclarecido.

Foi realizada também revisão bibliográfica de artigos relacionados à violência social/urbana e ao tráfico de drogas em correlação com a saúde/saúde mental da população e determinantes sociais da doença, a fim de lançar luz sobre os dados observados na pesquisa e seus aspectos relacionados.

Como eixos de "coleta de dados", a pesquisa foi conduzida no sentido de evidenciar as diferentes traduções em dois níveis: práticas e discursos. No âmbito das práticas, observações de caráter etnográfico foram empreendidas. Quanto aos discursos, tentamos coletá-los através das mais variadas fontes, tais como participação nas reuniões de equipe e nas demais atividades terapêuticas oferecidas pelo CAPS, bem como a realização de entrevistas semiestruturadas e estruturadas com técnicos e os usuários.

Para a realização deste estudo, foram dedicadas 12 horas semanais para o trabalho de campo, realizado através da Observação Participante nos serviços e a elaboração de relatório semanal, além de duas horas semanais de participação nas reuniões com toda a equipe da pesquisa, discussão do processo de trabalho de campo e leitura de textos. Todas as informações recolhidas foram devidamente registradas em um caderno de campo ao longo da Observação Participante no CAPS. A fase de Observação Participante durou aproximadamente três meses e consistiu basicamente na participação (e observação) em reuniões de equipe e outras atividades, como visitas domiciliares, grupos terapêuticos, grupos de familiares, atendimentos na comunidade, oficinas terapêuticas e de geração de renda, eventos culturais, fórum intersetorial com a presença de profissionais e representantes de serviços de outras áreas (educação, justiça, assistência social e saúde), entre outras. Após a parte qualitativa de Observação Participante durante os três primeiros meses, a pesquisa teve continuidade prolongada por dois anos com Observação Participante regular não intensiva. Durante o primeiro ano, foram realizadas entrevistas informais com todos os técnicos do serviço e cerca de trinta entrevistas formais com os usuários, familiares e técnicos. Essas entrevistas foram estruturadas tendo como base critérios de análise referentes a expectativas quanto ao tratamento (serviço, medicação, atividades), o papel do CAPS e avaliação da violência. Todas as entrevistas foram aplicadas no ambiente do serviço em uma sala reservada com duração média de trinta minutos.

De acordo com a divisão territorial do município, a equipe de pesquisa optou por escolher para o estudo a área de planejamento AP 3, localizada na Zona Norte da cidade, por se tratar de região representativa do ponto de vista populacional, abrangendo cerca de 38% da população do Rio de Janeiro, além de estar concentrado ali o maior número de CAPS (seis no total) em relação às demais regiões. A AP 3 responde por cerca da metade dos habitantes das favelas/setores subnormais5 5 O setor aglomerado subnormal, de acordo com o IBGE, é caracterizado por um "conjunto (favelas e assemelhados) constituído por unidades habitacionais (barracos, casas etc.), ocupando, ou tendo ocupado até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular), dispostas, em geral, de forma desordenada e densa, e carente, em sua maioria, de serviços públicos essenciais". A precisão da estimativa para a população favelada a partir dos setores subnormais varia muito entre os vários municípios, mas, de qualquer forma, os dados do IBGE são os únicos existentes para comparações em nível nacional. IBGE. Censo demográfico 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2004. Disponível: < www.sidra.ibge.gov.br/bda/>. Acesso em: 15 out. 2009. de todo o município. Para a organização do trabalho, uma equipe composta de quatro pesquisadores, cada um referido a um CAPS, ficou responsável pelo trabalho de campo. A área de Planejamento 3.3, onde fica localizado o CAPS Linda Batista, está dividida em dois subsistemas: Eixo Madureira - Irajá com seus respectivos bairros e o Eixo Pavuna-Anchieta: Guadalupe, Anchieta, Parque Anchieta, Ricardo de Albuquerque, Coelho Neto, Acari, Barros Filho, Costa Barros, Pavuna, Honório Gurgel, Marechal Hermes e Parque Columbia. Possui 29 bairros de cobertura. Em 2007, esta região (AP 3.3) era constituída de determinados serviços de saúde conforme figura a seguir. Na área, há grandes disparidades sociais, principalmente na região onde estão os grandes bolsões de pobreza, possui uma grande população na classe média, baixa e pobre, utilizando os serviços públicos em 70%, preconizado pelo SUS.


Discussão Bibliográfica

Para Minayo (2005), a violência é um fenômeno biopsicossocial complexo e dinâmico que acompanha toda a história e as transformações da humanidade, em que o espaço de criação e o desenvolvimento é a vida em sociedade. No entanto, a violência afeta a saúde ao provocar lesões e traumas físicos, agravos mentais e emocionais e diminui a qualidade de vida das pessoas e das coletividades.

Segundo Marín-León e colaboradores (2007b), o aumento da violência ampliou a percepção dos problemas sociais existentes, sua discussão e o impacto que provocam na qualidade de vida e saúde da população. Para os autores, a realidade da violência compõe-se de diversas formas: estar exposto frequentemente a imagens violentas nos meios de comunicação; testemunhar atos violentos na própria comunidade; sentir-se ameaçado pela violência, fazendo surgir sentimento de impotência; e sofrer violência, tanto quanto presenciá-la. Tudo isso tem sido associado a problemas psicológicos e sociais, com o surgimento da síndrome de estresse pós-traumático, com ansiedade, depressão, tristeza profunda e comportamento de afastamento social.

Em análise sobre a desigualdade de renda e a violência com a situação de saúde no município do Rio de Janeiro foi constatado que todos os indicadores de concentração de renda eram significativamente correlacionados (Szwarcwald e col., 1999). Os sinais das correlações mostraram que quanto maior a desigualdade de renda pior é a situação de saúde.

Para os casos de homicídio, além da desigualdade de renda, a concentração de indivíduos residentes em comunidades carentes foi também fator preponderante para a situação de saúde adversa. Além disso, as áreas com maior densidade de moradores em aglomerados subnormais situam-se exatamente no mesmo setor da cidade que apresenta as piores condições de saúde. Esses resultados indicam que a correlação estabelecida entre a situação de saúde e a desigualdade de renda no Município do Rio de Janeiro é decorrente da alta concentração residencial de pobreza em certas áreas da cidade, o que provocaria desequilíbrios nas correspondentes distribuições de renda.

No que se refere aos indicadores de saúde, a taxa de homicídios foi o indicador mais correlacionado aos níveis de desigualdade de renda, demonstrando que a questão da violência urbana entre os jovens brasileiros não teria como ser dissociada da grande disparidade presente na nossa sociedade. A situação de penúria das comunidades carentes, caracterizada neste estudo, reflete o efeito da privação de muitas famílias com um mínimo de poder aquisitivo, evidenciando que não resta a elas outra opção que não a de residir nessas localidades desprovidas de toda infraestrutura. O crescimento dos homicídios nas favelas do Rio de Janeiro estaria reconhecidamente também relacionado ao aumento da criminalidade secundária à expansão do narcotráfico.

De acordo com Lopes e colaboradores (2003), em estudo relacionado a eventos produtores de estresse e transtornos mentais comuns, a maior dificuldade na avaliação do papel dos determinantes sociais sobre o início e curso dos distúrbios psiquiátricos estaria na possibilidade de causas bidirecionais a esses eventos. Segundo essa hipótese, fatores ambientais desfavoráveis estariam associados ao aparecimento e/ou à maior severidade no curso de grande parte dos distúrbios psiquiátricos. Assim, a doença mental poderia provocar uma série de prejuízos sociais na vida do indivíduo, como baixo nível educacional, desemprego, ruptura de relações pessoais, etc. Os autores avaliaram, portanto, que uma distinção entre fatores de risco e efeitos adversos seria um dos grandes desafios da área.

Ademais, os autores analisaram a existência de uma série de fatores que contribuiriam para a elevada prevalência de eventos de vida estressantes e de transtornos mentais na população, tais como processos acelerados de urbanização e industrialização, acesso desigual à rede de saúde, condições inadequadas de moradia, desigualdade na distribuição de renda, desemprego, altas taxas de violência e criminalidade. Referem, ainda, que em populações submetidas a níveis socioeconômicos mais baixos, à instabilidade no emprego ou ao desemprego e, por conseguinte, mais sujeitas a eventos de vida estressantes, esses eventos tenderiam a assumir importância ainda maior na ocorrência de transtornos mentais comuns.

Como no Rio de Janeiro, é notório que a crescente violência nas cidades não só tem levado a danos físicos e índices de mortalidade evitáveis, como também a morbidades de toda ordem, incluindo as da esfera mental. Destacam-se, por exemplo, os resultados obtidos em recente artigo de revisão de literatura (Ribeiro e col., 2009), no Brasil e em outros países, demonstrando que a violência estaria associada a pior saúde física, suicídio, problemas de saúde mental, problemas de saúde reprodutiva, sintomas somáticos e vários estados clínicos graves, seja como disparador ou como fator de risco. Isso, consequentemente, implica dizer que a violência representa um forte impacto na carga global da doença tanto direta quanto indiretamente.

Constatou-se também que a exposição à violência estaria associada a problemas de saúde mental em crianças e adolescentes, especialmente quando combinada a outras desvantagens sociais e familiares, como pobreza e transtornos mentais maternos comuns. Lopes e col. relatam também que homens têm maior propensão a eventos traumáticos do que mulheres. No entanto, ao serem expostas a experiências traumáticas, as mulheres tendem a desenvolver, como conseqüência, mais problemas de saúde mental. Enquanto crianças e mulheres seriam expostas a altos índices de violência doméstica, homens estariam expostos a altos níveis de violência na comunidade.

Entretanto, os autores afirmam que a magnitude e o impacto da exposição à violência na comunidade, especialmente entre os adultos jovens, ainda não foi suficientemente estudada. E, por isso, ainda não seria possível estabelecer uma relação causal entre violência e saúde mental. Assim, não existiria ainda um consenso entre diversos autores: enquanto para alguns a violência é um preditor de transtornos mentais, para outros os problemas de saúde mental podem ser considerados fator de risco para tornar o indivíduo vítima de violência. Dessa forma, concluem que futuros estudos deveriam aplicar desenhos de estudos prospectivos para elucidar a relação temporal entre exposição à violência e o desenvolvimento de problemas de saúde mental e testar se há ou não uma relação bidirecional entre esses dois fenômenos. Sustentam, ademais, a hipótese de que uma parte significativa dos transtornos mentais em países em desenvolvimento poderia ser atribuída à violência.

No que tange à problemática de gênero, também é sabido que a violência contra mulheres grávidas, cometida por seus parceiros, afeta a saúde tanto da mãe quanto do feto; estando, ainda, as crianças filhas de mães espancadas sujeitas a um maior risco de sofrer abusos futuros (Concha-Eastman e Malo, 2007).

Conforme já atestado por Minayo (2005), vários estudiosos da atualidade observaram a grande necessidade de uma epidemiologia da violência, inclusive uma epidemiologia dos problemas psiquiátricos gerados por ela.

Por conseguinte, em artigo recente, Assis e colaboradores (2009) referem que pesquisas internacionais têm indicado a associação entre vivenciar violências e sofrer de problemas de saúde mental ao longo do crescimento e desenvolvimento humano.

Dentre as variadas formas de manifestação da violência, existe aquela voltada especificamente a pessoas portadoras de sofrimento mental e outras minorias sob forma de estigmatização. Em recente artigo referente ao estigma relacionado à "loucura", afirmou-se que apesar do investimento em uma política nacional de saúde mental, as transformações culturais não acontecem na sociedade em resposta imediata a mudanças de legislação e, portanto, os efeitos de novas práticas de saúde mental sobre a vida dos usuários não seriam ainda suficientemente conhecidos (Nunes e Torrenté, 2009). De acordo com este estudo, haveria dificuldades inclusive em delimitar em quais dimensões relacionais dos usuários deveriam ser concentrados os maiores esforços, de maneira a contribuir para desestigmatização dos transtornos mentais e suas consequências.

Como foi ressaltado por Nunes e Torrenté (2009), a "loucura", apesar de certo deslocamento produzido, permanece ainda à margem da sociedade. Ademais, a violência socioeconômica como condição mais ampliada de miséria social, reforçaria a situação de estigma atribuída à família e ao próprio usuário. Reconhecidamente, grande parte dos problemas dos usuários acaba por advir do sofrimento social, gerando sentimentos de impotência na equipe. Apesar da complexidade desses fenômenos, muitas violências frequentemente apareceriam combinadas nas experiências de vida das pessoas, produzindo situações de difícil reversão, já que possuem o efeito de se potencializarem mutuamente.

Apresentação e Discussão do Trabalho de Campo

Grande parte dos CAPS da zona norte está inserida em regiões de maior risco social e intensificação da violência. Como referido anteriormente, a localização desses serviços fica em torno de áreas carentes, dominadas pelo tráfico de drogas, próximo de locais onde atuam comandos rivais na disputa de pontos de venda da droga. Muitas vezes, são áreas em que a livre circulação de pessoas é restringida, especialmente no acesso a essas comunidades em que há barreiras, "pedágio" e toque de recolher impostos pelo tráfico.

O CAPS Linda Batista, em Guadalupe, é um desses exemplos e lida cotidianamente com essa realidade e, justamente por trabalhar com a lógica territorial, atende a população residente nessas áreas de risco. A presença dessa problemática social se reflete na rotina do serviço, que precisa criar estratégias protetivas, realizar visitas domiciliares, atender a demanda de usuários envolvidos com drogas, bem como daqueles marcados pela miséria e com precária situação de vida, enfrentando continuamente novos desafios.

De modo geral, grande parte da população atendida no CAPS vem de camadas menos favorecidas, com baixa renda, vivendo em insuficientes condições de moradia, com nível básico de escolaridade, com idade entre os 18 e 65 anos, portadores de transtornos mentais graves e persistentes, sendo a maioria composta de diagnóstico de esquizofrenia ou do espectro esquizofrênico e transtornos do humor, retardo mental e autismo6 6 De acordo com nosso estudo, em termos quantitativos, a fim de ilustrar melhor uma parcela da população que faz tratamento no CAPS, em uma amostra de 22 usuários (portadores de transtorno do espectro esquizofrênico) matriculados em 2008, 59% eram homens, a faixa etária variava entre 19 a 58 anos (média de 38 anos), 68% eram solteiros, a metade tinha filhos que não moravam com o próprio genitor, 86% tinham ensino fundamental completo ou incompleto e 86% já haviam trabalhado. Em relação ao trabalho atual, 41% estavam desempregados. Metade recebia algum tipo de auxílio, sendo a maioria em forma de pensão ou beneficio do INSS, sendo que 59% recebiam menos de dois salários mínimos. A maioria morava com os pais e/ou outros familiares, porém 18% já estiveram em situação de rua. Cerca da metade (45,5%) dos usuários teve o primeiro atendimento psiquiátrico entre 18 a 28 anos, sendo a maioria levada por familiares. Em relação à internação, 91% já haviam sido internados pelo menos uma vez, sendo que o tempo da internação girou em torno de um a seis meses. Quanto à medicação, a maioria tomava mais de um medicamento, 68% já haviam usado medicação injetável, 41% afirmaram ter descontinuado o uso, tendo como as principais razões os efeitos colaterais ou ter considerado que já estava melhor. Quanto à passagem por outras instituições, 27% afirmaram ter passado por prisão ou detenção. Em relação ao uso de álcool e outras drogas, 41% e 27% referem algum tipo de abuso dessas substâncias, respectivamente. A respeito da violência, quando questionados se tinham alguma internação em hospital geral, dois afirmaram já terem sido baleados. .

A realidade de vida da população que frequenta esse CAPS, devido à extrema pobreza/miséria em que vivem, acaba dificultando contundentemente a adesão ao tratamento, já que muitos não têm sequer o dinheiro para o transporte público. Segundo um técnico, o Riocard, cartão de transporte gratuito conquistado como direito legal do usuário, demora no mínimo três meses para conseguir ser retirado, além de ser necessário ter alguém com disponibilidade e recurso financeiro para ir uma vez ao local para solicitar e outra após para retirar o cartão. Em muitos casos, ocorre que o usuário não consegue aderir ao tratamento porque não tem condições financeiras para conseguir retirar o cartão de transporte, que é de seu direito conforme a legislação determina.

A violência e o tráfico de drogas

A violência oriunda do crescimento do tráfico de drogas presente em grandes cidades, como o Rio de Janeiro, vem sendo amplamente discutida por muitos estudiosos do assunto. É notório que o comércio de drogas tem aumentado e com ele a violência é a forma usualmente adotada para resolver discrepâncias e expandir a participação no mercado.

O domínio das favelas pelo crime organizado cresceu no vácuo das políticas públicas, trazendo dificuldades cada vez maiores para as ações governamentais, seja na melhoria da infraestrutura urbana seja na integração social das comunidades à sociedade como um todo, provocando, cada vez mais, a fragmentação socioespacial da cidade.

Contemporaneamente, o principal representante da violência nessas comunidades é o narcotráfico, que possui características de organização totalitária, impondo pelo terror o seu poder. Em geral, trata-se de uma população privada de direitos básicos e sem expectativas de cidadania (Minayo e Souza, 1999).

A questão da violência e do tráfico de drogas está presente na rotina do serviço como informa um técnico do CAPS:

Trata-se de uma área de grande violência e com um dos piores IDH do estado. Fica em torno da Favela do Muquiço/Acari, área essa conhecida como "pior/mais violenta" do que o Morro do Alemão. O serviço já foi invadido três vezes por traficantes da área, quando ainda não possuía segurança e por isso já esteve fechado e foi transferido provisoriamente para a policlínica em frente.

A presença do tráfico de drogas está permanentemente em discussão nas reuniões de equipe. Para ilustrar a situação, segundo informação de um dos técnicos, como medida preventiva, foi adotado o controle do medicamento clonazepan, que é fornecido aos pacientes apenas em quantidade suficiente para uma semana, uma vez que havia a suspeita de os usuários utilizarem o medicamento como dinheiro em troca cocaína. Isso porque o medicamento pode ser usado com frequencia para se conseguir dormir, após o uso da droga.

A fim de exemplificar as situações pelas quais passa a equipe do serviço, inesperadamente, logo após a primeira reunião de equipe da qual participamos, houve um tiro em frente ao CAPS e logo em seguida soubemos que tinha sido um roubo de carro. Como era dia da reunião e o CAPS estava fechado, os usuários estavam do lado de fora e presenciaram o que aconteceu.

De forma agregada, as histórias de vida dos usuários confirmam a estreita relação entre a violência e o tráfico de drogas, como o caso de uma usuária que teve sua casa invadida por traficantes quando ela estava internada em uma instituição e encontra-se em situação de rua. Outro caso ilustra bem essa situação, como relata uma técnica do CAPS:

Este usuário foi institucionalizado de longa permanência e trata-se de um caso grave. Ele nem consegue ficar no CAPS de tão comprometido que é. Tem histórico de várias internações desde os treze anos. Já ligamos pra casa dele, mas ninguém atende. Já foi feita VD, mas ele mora num lugar todo fechado no alto do morro, precisa subir uma ladeira muito íngreme e passar pelo tráfico que fica armado até os dentes, onde até quem é da comunidade se recusa a subir lá. Não tem PSF na área. A irmã vive com parte do benefiício dele, são extremamente pobres.

A discussão sobre o uso de drogas por aqueles que frequentam o serviço torna-se tema frequente nas reuniões de equipe, justamente pela proximidade do serviço com as comunidades onde existe tráfico de drogas, nas quais, a maioria dos usuários reside. Esse problema é um agravante na adesão ao tratamento, na medida em que grande parte desses usuários está propensa a fazer uso da droga por causa da ampla oferta nos locais onde moram, acarretando consequentemente, entre outros problemas, a descontinuidade do tratamento. A questão da comorbidade dos transtornos psiquiátricos e o uso de drogas parece não se esgotar, e os técnicos sentem-se impotentes diante dessa múltipla interface de problemas para o qual não existem soluções prontas. Assim como esse, outros fenômenos sociais estão implicados nessa problemática, os quais serão apontados posteriormente.

Numa das reuniões, houve um debate sobre o uso de drogas entre muitos pacientes do CAPS. Relatou-se que já foi criada uma "rede" de usuários de drogas que frequentam o serviço e se reúnem, muitas vezes, para fazer uso de drogas lá fora e depois voltam para o serviço.

As estratégicas da equipe para lidar com a violência na região

O convívio com a violência no cotidiano dos serviços expõe os técnicos a situações de risco que podem gerar sentimentos de impotência diante de situações de precariedade, não reconhecimento dos esforços realizados, convívio com situações de violência doméstica e social, medo do risco de exposição, sensação de integridade moral e física ameaçadas. Como consequência, essas situações podem gerar sentimento de vulnerabilidade e sofrimento psíquico na equipe.

Dessa forma, os técnicos desenvolvem estratégias para minimizar o sofrimento, protegem-se psiquicamente e continuam a trabalhar; buscam construir redes de solidariedade e de amizade como melhor forma de enfrentamento dessas situações de vulnerabilidade (Njaine e col., 2006).

Em um estudo realizado com trabalhadores do PSF. Lancmam e colaboradores (2009) citam a questão da violência indireta, na qual o técnico acaba por conviver com situações de miséria intensa, associadas à falta de recursos para resolvê-las e à impotência para propor alternativas. A violência indireta pode decorrer do convívio, da interação e do testemunho de situações de violência externa, o que significa ter contato, presencial ou indireto, com vítimas da violência ou com os agressores (Schraiber, 2006).

Segundo esta pesquisa, os efeitos da exposição à violência na rotina de trabalho da equipe:

[...] Tendem a agravar-se com o tempo, podendo acarretar rompimento de relações interpessoais, absenteísmo, rotatividade, adoecimentos, afastamentos do trabalho e, finalmente, a desestruturação da organização do trabalho. (Lancman e col., 2009, p. 687).

Como referido anteriormente, a presença constante da violência no cotidiano do serviço faz com que a equipe crie estratégias para evitar qualquer tipo de eventualidade, tais como: sair de carro em grupos na hora do almoço, não ficar do lado de fora do serviço por muito tempo antes de entrar, entre outras. Em função de um histórico de assaltos no início do funcionamento do serviço, quando não havia ainda segurança na porta, o diretor ponderou que não consideraria má ideia mudar o serviço de lugar como preconizado pela CAP 3.3, relembrando que a casa já havia sido assaltada três vezes, dois estagiários e um técnico tinham sido sequestrados e, quando a unidade foi invadida, uma médica ficou rendida sob a mira de um revólver no andar de cima. O diretor informou, ainda, a respeito do corte de gastos da prefeitura e concordou que não precisava de porteiro nos finais de semana e à noite, já que o serviço não abria nesse período. Porém, impreterivelmente, o guarda precisava permanecer, senão a casa seria invadida, como ocorreu com a casa ao lado, em que há presença de usuários de drogas e discussões constantes entre os moradores por causa disso.

Em outro episódio, após a saída de uma usuária do serviço recém-desinstitucionalizada, houve uma discussão em torno do fato de o CAPS ser o único em relação aos outros CAPS do município que funcionava com a porta fechada por causa da violência, o que não acontece em outros serviços abertos como esse.

Quanto aos furtos no interior do serviço, na reunião de equipe, discutiu-se o problema da frequente ocorrência desses episódios. Um funcionário da copa havia relatado que utensílios essenciais de cozinha "sumiam" constantemente nos finais de semana e com isso já teve de repor muitos deles, pagando com o próprio dinheiro. Uma das técnicas do CAPS falou da importância de se pensar: "Devido à difícil realidade de vida daqueles que frequentam o serviço, parece que até mesmo o roubo não teria maiores consequências para o entendimento de quem pratica estes atos." A impressão da equipe é a de que os usuários pareciam ter essa visão do serviço ou atuavam com a ideia de que nada mais grave lhes aconteceria ali dentro caso roubassem, justamente porque o CAPS seria um local protegido.

Sugestões foram apresentadas: um técnico contrapôs a ideia de outro de colocar câmeras ao redor do serviço, já que esse tipo de vigilância não era a proposta do CAPS. Ponderou a viabilidade de criação/construção de um espaço tanto político quanto clínico como modo de abrir reflexões sobre os princípios de cidadania; outro sugeriu tratar essas questões apresentando filmes que pudessem abordar essa temática na oficina de cinema; uma técnica também sugeriu usar os espaços coletivos já existentes (oficinas, assembleia) para debater o tema do furto. Pontuaram a importância de deixar esse tema atravessado em todos os espaços.

Exclusão social e desnaturalização da violência

Apesar das críticas de alguns autores7 7 Para melhor entendimento, ver: CASTEL, R. As armadilhas da exclusão. In: Desigualdade e a Questão Social (L. Bógus, M. C. Yazber & M. Belfiore-Wanderley, org.), pp. 15-48, São Paulo: Educ.,1997.E Castel, R. A dinâmica dos processos de marginalização: Da vulnerabilidade à "desfiliação". Cadernos CRH, 26/27:19-40, 1997. sobre o uso do termo exclusão social para designar situações desfavoráveis nas condições sociais e econômicas de indivíduos e grupos sociais, a discussão em torno do termo exclusão social acabou assumindo contornos significativos sobre a realidade social no mundo capitalista contemporâneo.

A principal crítica a essa forma de nominar situações de inserções desfavoráveis na estrutura social, que geram modos diferenciados de acesso aos bens sociais, é que essa denominação cristaliza uma situação, tornando-a estática no tempo e no espaço (Waiselfisz e Leal, 2001; Ludermir, 2008; Meirelles e Gomez, 2009). O objetivo deste artigo não é aprofundar o debate dessa questão, tampouco esgotar as referências sobre o assunto. No entanto, a incidência de um olhar crítico de estudiosos dessa temática é primordial a fim de evitar o uso estigmatizante e generalizado do termo.

De algum modo, a relação entre pobreza e distúrbio mental não parece ser tão descabida, na medida em que a educação deficiente, a baixa renda, as más condições sanitárias, o baixo nível de educação e informação de saúde e a interferência de algumas crenças e práticas culturais afetam negativamente a saúde da população e têm sido objeto de estudos8 8 Lacroix, M. & Shragge, E. "Globalization and Community Mental Health-Introduction". Can J Comm Mental Health, 23(2)5-12, 2004. .

Em um estudo, Cardia e Schiffer (2002) destacam alguns dos problemas nas comunidades carentes que ajudam na compreensão da articulação entre violência e desigualdade social - desemprego, renda familiar baixa, falta de equipamentos de lazer e acesso à cultura, narcotráfico, domicílios densamente ocupados, altas taxas de fertilidade entres jovens, baixa escolaridade, etc. As autoras ressaltam, ainda, que, nesses contextos, a coesão social poderia ser afetada pela violência, já que o medo ou a experiência de vitimização (direta ou indireta) levariam as pessoas a adotar medidas de proteção que as distanciariam umas das outras.

Com isso, o uso de espaços públicos seria reduzido e, consequentemente, o contato com vizinhos e parentes diminuiria de forma tal que esses viveriam como em "confinamento". Além disso, essa condição teria impactos importantes por ser uma forma de controle social não institucionalizado, um dispositivo de poder, uma prática disciplinar exercida sobre as populações desfavorecidas e que resultaria em uma "sobreposição de exclusões": de classe, gênero, etnia e de geração. Tratar-se-ia de um confinamento geográfico, político, cultural e subjetivo, que produziria relações de sociabilidade diferenciadas.

Por outro lado, o convívio cotidiano e intenso com os usuários em condições precárias de vida pode provocar um impacto na equipe. Esse convívio humaniza o trabalho e permite uma visão crítica em relação aos usuários e seu contexto de vida, porém pode provocar um forte impacto psicológico, que se expressa na impotência vivenciada diante de situações de extrema penúria material.

Para ilustrar melhor essa questão, há situações em que o CAPS funciona como lugar social, como no caso de uma mulher que não era usuária do serviço de saúde mental, mãe de quatro filhos, que estava sendo acompanhada por uma assistente social da prefeitura por motivo de agressão aos filhos. Essa mulher vivia com os filhos pequenos em condições extremamente precárias na casa da mãe e do padrasto, que era violento, não tinha emprego, renda ou nível básico de escolaridade. Devido à falta de suprimentos básicos de alimentação e a convivência constante com a violência em casa e na rua, em ato de desespero, ela passou a agredir os filhos e procurou ajuda da secretaria de assistência social do município. Como não tinha para onde encaminhá-la, a assistente social foi ao CAPS com ela pedindo uma avaliação e algum suporte. A equipe consentiu em acolhê-la temporariamente no serviço até que alguma solução pudesse ser dada. Ela passou a frequentar o serviço juntamente com os filhos, fazendo uso do espaço de conivência com os demais e beneficiando-se do lanche fornecido.

Posto isto, faz parte do dilema cotidiano da equipe estabelecer fronteiras entre ações de saúde e ações sociais e procurar encontrar, juntamente com outras instâncias, alguma resolutividade para situações que fogem a seu alcance.

Segundo a opinião de um técnico, a impressão que se tem em muitos casos é que o registro constante da violência na vida dessas pessoas acaba atuando como um modo de funcionar através de atos violentos na convivência diária com os outros. Isso se expressaria de forma "natural" em diferentes contextos de vida através do convívio diário com seus pares. A violência estaria presente constantemente na vida dessas pessoas de modo que elas teriam dificuldade em conseguir se expressar de outra maneira senão através desse registro. Dessa forma, as atitudes violentas seriam, de algum modo, banalizadas ou interpretadas de maneira natural na convivência com outras pessoas.

O depoimento de um usuário na entrevista pode ilustrar melhor a questão: "Ih, todo lugar é violento, não tem essa. Onde você mora não é violento, não? Já teve várias situações. Teve uma que os caras meteram a paulada em mim por causa de droga, mas Jesus tirou eles do meu caminho, morreram todos."

Considerações Finais

Neste artigo, procuramos descrever as apreensões de usuários e equipe no contexto social do CAPS de Guadalupe diante da violência, da pobreza e de tráfico de drogas e de que maneira esses aspectos poderiam repercutir desfavoralmente na adesão ao tratamento e na continuidade do cuidado em saúde mental, tendo em vista tratar-se de questão de alta relevância como objeto de estudos de inúmeras pesquisas, tanto nacionais como internacionais (Cavalcanti e col., 2009; Machado e col., 2007).

A elevada frequência da percepção de problemas sociais como as altas taxas de violência e criminalidade, a questão do tráfico de drogas, o aumento da desigualdade social, a crescente pauperização, a problemática do estigma que incide sobre pessoas acometidas por transtornos mentais e a consequente sobreposição de exclusões a que estão submetidas essa parcela da população requer novos estudos que permitam compreender as consequências do impacto da violência na saúde mental dos usuários de serviços de tratamento na comunidade.

Os achados deste trabalho apontam a necessidade urgente de enfrentar os desafios e implementar medidas e políticas públicas compensatórias e de prevenção para amenizar os efeitos danosos da violência urbana sobre a qualidade de vida da população que frequenta os serviços de saúde mental comunitários. Seria necessário um esforço coletivo para modificar essa complexa situação experimentada por grande parcela das pessoas, nas quais suas condições de saúde e a continuidade do tratamento sugerem estar negativamente afetadas por essa problemática.

Contudo, avaliamos que, apesar de os achados desse estudo apontarem nessa direção, ainda não podem ser considerados conclusivos em função da necessidade de realizar estudos prospectivos que possam elucidar a relação temporal entre exposição à violência e o desenvolvimento de problemas de saúde mental e de que esse impacto ainda não foi estudado de forma suficiente, conforme apontado em estudo anterior de revisão de literatura (Ribeiro e col., 2009).

Dessa forma, esperamos que os resultados deste estudo possam contribuir para a realização de novas pesquisas voltadas para investigação do impacto da violência e de determinantes sociais na saúde mental, na medida em que o entendimento da atuação desses fenômenos adquire importância estratégica, visto tratar-se de ambiente circundante a que estão submetidas parcelas crescentes da população brasileira.

Agradecimentos

Ao Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro; à Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e à equipe do CAPS estudado.

Reapresentado em: 15/09/2010

Aprovado em: 15/10/2010

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  • A violência urbana e suas consequências em um centro de atenção psicossocial na zona norte do município do Rio de Janeiro

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  • 1
    Fonte: IPP/Armazém de dados - Índices sociodemográficos. Rio de Janeiro, 2008.
  • 2
    Fonte: IPP/Armazém dos Dados. Rio de Janeiro, 2008.
  • 3
    FONTES: IBGE: Censos 1991/2000; Pesquisa IPEA/PNUD (2001); Instituto Pereira Passos (IPP): Anuário Estatístico da Cidade (1998); Atlas Escolar (2000).
  • 4
    LEAL, E. M; DELGADO, P. G. G. Clínica e cotidiano: o CAPS como dispositivo de desinstitucionalização. In: PINHEIRO, R.; GULJOR, A. P.; GOMES, A.; MATTOS, R. M. (Org.).
    Desinstitucionalização na saúde mental: contribuições para estudos avaliativos. Rio de Janeiro: CEPESC: IMS/LAPPIS: ABRASCO, 2007. p. 137-154.
  • 5
    O setor aglomerado subnormal, de acordo com o IBGE, é caracterizado por um "conjunto (favelas e assemelhados) constituído por unidades habitacionais (barracos, casas etc.), ocupando, ou tendo ocupado até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular), dispostas, em geral, de forma desordenada e densa, e carente, em sua maioria, de serviços públicos essenciais". A precisão da estimativa para a população favelada a partir dos setores subnormais varia muito entre os vários municípios, mas, de qualquer forma, os dados do IBGE são os únicos existentes para comparações em nível nacional. IBGE. Censo demográfico 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2004. Disponível: <
    www.sidra.ibge.gov.br/bda/>. Acesso em: 15 out. 2009.
  • 6
    De acordo com nosso estudo, em termos quantitativos, a fim de ilustrar melhor uma parcela da população que faz tratamento no CAPS, em uma amostra de 22 usuários (portadores de transtorno do espectro esquizofrênico) matriculados em 2008, 59% eram homens, a faixa etária variava entre 19 a 58 anos (média de 38 anos), 68% eram solteiros, a metade tinha filhos que não moravam com o próprio genitor, 86% tinham ensino fundamental completo ou incompleto e 86% já haviam trabalhado. Em relação ao trabalho atual, 41% estavam desempregados. Metade recebia algum tipo de auxílio, sendo a maioria em forma de pensão ou beneficio do INSS, sendo que 59% recebiam menos de dois salários mínimos. A maioria morava com os pais e/ou outros familiares, porém 18% já estiveram em situação de rua. Cerca da metade (45,5%) dos usuários teve o primeiro atendimento psiquiátrico entre 18 a 28 anos, sendo a maioria levada por familiares. Em relação à internação, 91% já haviam sido internados pelo menos uma vez, sendo que o tempo da internação girou em torno de um a seis meses. Quanto à medicação, a maioria tomava mais de um medicamento, 68% já haviam usado medicação injetável, 41% afirmaram ter descontinuado o uso, tendo como as principais razões os efeitos colaterais ou ter considerado que já estava melhor. Quanto à passagem por outras instituições, 27% afirmaram ter passado por prisão ou detenção. Em relação ao uso de álcool e outras drogas, 41% e 27% referem algum tipo de abuso dessas substâncias, respectivamente. A respeito da violência, quando questionados se tinham alguma internação em hospital geral, dois afirmaram já terem sido baleados.
  • 7
    Para melhor entendimento, ver: CASTEL, R. As armadilhas da exclusão. In: Desigualdade e a Questão Social (L. Bógus, M. C. Yazber & M. Belfiore-Wanderley, org.), pp. 15-48, São Paulo: Educ.,1997.E Castel, R. A dinâmica dos processos de marginalização: Da vulnerabilidade à "desfiliação". Cadernos CRH, 26/27:19-40, 1997.
  • 8
    Lacroix, M. & Shragge, E. "Globalization and Community Mental Health-Introduction". Can J Comm Mental Health, 23(2)5-12, 2004.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011
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