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Análise da produção em auditoria e saúde pública a partir da base de dados da Biblioteca Virtual da Saúde

Analysis of scientific production on audit and public health based on the Virtual Health Library database

Resumos

Trata-se de revisão da literatura de base a partir de pesquisa bibliográfica realizada na plataforma da Biblioteca Virtual em Saúde com o objetivo de caracterizar as pesquisas produzidas sobre auditoria no SUS. O levantamento bibliográfico abrangeu as publicações nacionais em auditoria de 2000 a 2010, sendo identificados quatorze documentos para compor a amostra do estudo. Os achados das pesquisas foram classificados de acordo com o tema investigado e os aspectos metodológicos categorizados. Os resultados ressaltam a insuficiência de estudos voltados para essa temática e a necessidade de divulgação dos relatos como fator de consolidação do processo de trabalho em saúde pública.

Saúde pública; Gestão em saúde; Sistema Único de Saúde


This is a literature review of basis depicted from a broader literature research carried on the platform of the Virtual Library in Health with the aim to characterize the research so far produced on SUS auditing. The survey comprised the national publications on audit for the period 2000-2010 identifying fourteen documents to compose the study sample. The research findings were then classified as for the topic investigated and the categories applied to the methodological aspects. Results showed the dearth of studies focused on this topic and the need for dissemination of reports as a consolidation element for the public health working process.

Public Health; Health Management; Unified Health System


Introdução

A auditoria tem tido destaque diante do processo de trabalho em saúde. A nova saúde pública desenhada no País atualmente incorpora a auditoria como macrofunção e isso tem sido defendido nas bases normativas de apoio à gestão em saúde. Dessa forma, tem possibilitado a formação e desenvolvimento de profissionais com olhar crítico diferenciado quando se trata de gestão, seja na esfera federal, estadual ou municipal (CARVALHO, 2010).

Em meio a essa nova conformação da máquina pública, exige-se, cada vez mais, a atuação constante dos profissionais auditores na área da saúde, na tentativa de adequação a esse desenho político-institucional vivenciado no País nos últimos anos. Assim, cabe aos auditores e técnicos do setor da saúde acompanhar esse desenvolvimento por meio de investigações científicas, principal recurso para a atualização do conhecimento e exercício da profissão.

No contexto do trabalho em saúde pública, o auditor atua em ações de análise crítica do cuidado à saúde, identificando deficiências para propor soluções (PISCOYA, 2000 APUD CASTRO, 2004). Esse tipo de proposição baseia-se, principalmente, na análise minuciosa de registros, relatórios, documentos ou fatos e sua relação com os padrões de conformidade destacados em bases legais e normativas.

No que diz respeito ao processo de trabalho no SUS, a auditoria:

  • [...] consiste no exame sistemático e independente dos fatos obtidos, através da observação, medição, ensaio ou outras técnicas apropriadas, de uma atividade, elemento ou sistema, para verificar a adequação aos requisitos preconizados pelas leis e normas vigentes e determinar se as ações de saúde e seus resultados estão de acordo com as disposições planejadas (BRASIL, 1998, P.6).

Em se tratando da auditoria como ferramenta de controle e fiscalização das ações e serviços de saúde no Brasil, faz-se referência ao Decreto N.º 809 (BRASIL, 1993A). Esse documento aprovou a Estrutura Regimental do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) e definiu, em seu art. 3º, que este Instituto teria em sua estrutura básica órgãos de assistência direta e imediata ao presidente, compostos pela Procuradoria-geral e auditoria. Estabeleceu, ainda, as competências da auditoria no controle e fiscalização da aplicação dos recursos orçamentários e financeiros consignados ao INAMPS.

Contudo, desde o advento do Movimento de Reforma Sanitária (MRS) e a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, as ações de auditoria ganharam conotação diferenciada. Nessa oportunidade, a implantação dos processos de auditoria objetivava resguardar ao usuário e à União, estados e municípios a qualidade dos serviços profissionais e institucionais, além de preservar o uso adequado do dinheiro público (SANTOS, 2009).

A regulação das ações e os serviços de saúde em todo o território nacional apresentada por meio da Lei N.º 8.080, de 19 de setembro de 1990, estabeleceu o Sistema Nacional de Auditoria (SNA) como um mecanismo de controle técnico e financeiro, sob competência do SUS e em cooperação com os estados, Distrito Federal e municípios (BRASIL, 1990). Ficava claro que a avaliação da qualidade na atenção à saúde, por meio do SNA, seria estratégica no processo de construção e manutenção do SUS. No entanto, a instituição desse sistema deu-se apenas em 27 de julho de 1993, pelo art. 6º da Lei N.º 8.689 (BRASIL, 1993B), e sua regulamentação ocorreu pelo Decreto N.º 1.651, de 28 de setembro de 1995 (BRASIL, 1995). Essa base normativa possibilitou o acompanhamento, a fiscalização, o controle e a avaliação técnico-cientifica, contábil, financeira e patrimonial das ações e serviços de saúde.

Vale ressaltar que a proposta de criação estaria relacionada às três esferas de governo, contudo, permaneceria estagnada naquela oportunidade. Isso gerou demanda acerca da identificação de instrumentos de forma a avançar a sua consolidação, bem como do reconhecimento de sua relevância.

Essa realidade foi modificada a partir da reestruturação do Ministério da Saúde (MS). Por meio da Portaria N.º 1.069 / MS, de 19 de agosto de 1999, estabeleceram-se novas formas de organização das atividades do SNA. As atividades de controle e avaliação ficaram sob a responsabilidade da Secretaria de Assistência à Saúde; e as atividades de auditoria, com o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS), representado em todos os estados da federação e no Distrito Federal.

Por meio da Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde (NOB/SUS-96), constituiu-se a descentralização do SNA a partir da estruturação de seus componentes nas três esferas gestoras do SUS (BRASIL, 1996). A partir da Norma Operacional da Assistência à Saúde publicada em 2002 (NOAS-SUS 01/02), estabeleceu-se o componente municipal como requisito para que cada município se habilitasse à condição de gestão plena do sistema municipal (BRASIL, 2002). Assinalava que cabia a esse componente a auditoria aos prestadores dos serviços ambulatoriais e hospitalares localizados em seu território e vinculados ao SUS. Em casos nos quais os municípios não estivessem habilitados, essa função ficaria a cargo da Secretaria Estadual de Saúde.

O Decreto N.º 3.496, de 2000, constituiu um dos primeiros documentos a defender a reestruturação regimental do SNA. Nessa ocasião, ficou configurada como competência do Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS) a determinação das responsabilidades dos órgãos de auditoria, controle e avaliação, bem como a correção de irregularidades praticadas no SUS (BRASIL, 2000).

A proposição do SNA permaneceria complementar às outras instâncias de controle e regulação. A esse sistema caberia: fazer levantamento das principais carências, estimar o impacto das ações de saúde e traçar o perfil de utilização dos serviços para as mudanças necessárias no planejamento, gestão, execução e avaliação das ações de saúde.

Em 2006, a implantação do Pacto pela Saúde surgiu como proposta de superar os impasses vivenciados nas três esferas de gestão do SUS. Essa proposta esteve baseada nos 'Princípios Constitucionais do SUS, com ênfase nas necessidades de Saúde da População', conforme disposto na Portaria N.º 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006.

O pacto, organizado e articulado a partir de três componentes (Pacto pela Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão do SUS), apresentou estratégia para a reorganização do sistema de saúde público no País. Um dos eixos de trabalho baseava-se na auditoria como ferramenta de gestão desse sistema, de caráter educativo e orientador, que propiciasse a detecção das distorções do SUS, propondo correções. A partir dessa ferramenta, poder-se-iam desenvolver análises da qualidade da assistência ao usuário do SUS, bem como a identificação de não conformidades e inadequações às bases normativas.

A partir dessa visão, a auditoria, como ferramenta de gestão, permitiria avaliar a eficiência, eficácia, efetividade e economicidade das ações e serviços de saúde no contexto do sistema de saúde, além de prestar cooperação técnica, propor medidas corretivas, servir de suporte ao controle social, subsidiar o planejamento e o monitoramento com informações validadas e confiáveis, sendo uma marcante contribuição para a saúde pública brasileira (PERON, 2009).

Em 2007, a auditoria passou a ser eixo da Política Nacional de Gestão Estratégica e Participativa no SUS (PARTICIPASUS), aprovada pela Portaria nº 3.027. Essa base normativa orienta as ações de governo na promoção e aperfeiçoamento da gestão estratégica e democrática das políticas públicas no âmbito do SUS. Somadas às ações de auditoria, o objetivo dessa política é garantir maior eficácia e efetividade, por meio de ações que incluem o apoio ao controle social, à educação popular, à mobilização social, à busca da equidade, ao monitoramento e avaliação, à ouvidoria e à gestão da ética nos serviços públicos de saúde (BRASIL, 2009).

Já em 2008, propôs-se o fortalecimento do Sistema Nacional de Auditoria do SUS e a implementação do seu componente municipal por meio do eixo de Qualificação da Gestão do Programa Mais Saúde. O objetivo principal dessa estratégia seria consolidar o modelo de gestão do SUS voltado para os resultados em saúde, além de fortalecer a gestão descentralizada e participativa deste sistema e seus instrumentos de pactuação.

Recentemente, uma nova base normativa contribuiu para a efetivação dessa ferramenta de gestão - o Decreto N.º 7.508, de 2011. A partir disso, a auditoria tem sido encarada como ferramenta eficiente no aprimoramento do sistema de saúde brasileiro. Isso se justifica pelo fato de a auditoria permitir a identificação das conformidades e não conformidades evidenciadas por meio de avaliação e análise constantes das práticas de saúde nos diversos níveis de complexidade.

Ao entender essa trajetória normativa e com vistas a atender as atuais necessidades do SUS, o DENASUS vem passando por um processo de revisão de sua base normativa e processos de trabalho, com significativos investimentos em ações de educação permanente para os auditores do SNA e em ações de cooperação técnica envolvendo gestores, auditores e conselheiros de saúde.

Diante desse contexto de evolução da macrofunção de auditoria, vale destacar que o desenvolvimento de pesquisas em auditoria aplicada à saúde pública contribui essencialmente para gerar a base de conhecimento que fundamentaria a prática diária do auditor do SUS. Essas considerações justificam o interesse destes autores em desenvolver revisão da literatura de base sobre a produção científica em auditoria na literatura brasileira para a interpretação do conhecimento produzido na área e com o propósito de auxiliar o desenvolvimento de futuras investigações.

Sendo assim, estipulou-se como questão de pesquisa: qual o perfil das publicações científicas que têm como ponto fundamental a auditoria em saúde no SUS?

Frente às colocações acima, definiu-se como objetivo geral: caracterizar as publicações disponíveis na literatura sobre a produção científica em auditoria e saúde pública nos últimos dez anos. Além disso, estabeleceu-se como objetivos específicos: a) buscar fontes de informação úteis para o trabalho de pesquisa em auditoria; b) identificar as categorias profissionais que publicam na área; c) oferecer oportunidade para que o profissional de saúde pesquisador veja o próprio estudo numa perspectiva histórica e possa evitar duplicação desnecessária; d) relacionar o próprio estudo com os anteriores e sugerir pesquisas posteriores.

Procedimento metodológico

Para o cumprimento dos objetivos elaborados para este estudo, optou-se, como método, pela revisão de literatura de base a partir de uma pesquisa bibliográfica ampla sobre auditoria em saúde pública. Essa metodologia possibilita a síntese e a análise do conhecimento científico já produzido sobre o tema investigado a partir de uma base de dados secundários. Nesse sentido, a construção do estudo foi fundamentada nos processos que detalham tal método de pesquisa (NORONHA & PIRES, 2000).

A primeira etapa em direção a uma boa revisão de literatura é a pesquisa bibliográfica. Segundo Caldas (1999 APUD MOREIRA 2004, P.25), a pesquisa bibliográfica representa a

coleta e armazenagem de dados de entrada para a revisão, processando-se mediante levantamento das publicações existentes sobre o assunto ou problema em estudo, seleção, leitura e fichamento das informações relevantes.

Assim, é imprescindível conhecer, nesta fase, as bibliotecas disponíveis e suas bases de dados e serviços.

Neste trabalho, percorreram-se as seguintes etapas: definição da pergunta; identificação das bases de dados a serem consultadas; definição dos descritores / palavras-chave e estratégias de busca; estabelecimento de critérios para a seleção dos artigos; condução da busca nas bases de dados escolhidas de acordo com as estratégias definidas; aplicação dos critérios na seleção dos artigos e justificativa das possíveis exclusões; análise e categorização dos estudos incluídos na revisão; preparação de um resumo contendo as informações disponibilizadas pelos artigos que foram incluídos na revisão; e a apresentação de um consolidado geral reunindo o apanhado de informações para esta apresentação.

Para a seleção dos artigos, utilizou-se a base de dados da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS). Em seguida, identificaram-se os descritores para conduzir o processo de busca nessa base. Para isso, consultou-se o sítio referente aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e selecionaram-se palavras relacionadas com auditoria e SUS. No que diz respeito ao descritor 'auditoria', elencaram-se todas as possíveis variações: auditoria administrativa, auditoria financeira, auditoria clínica, auditoria médica, auditoria de enfermagem e auditoria odontológica.

Logo após, definiram-se os critérios de inclusão: publicações nacionais que abordem a temática da auditoria nas áreas de interesse do SUS entre os anos de 2000 e 2010 e disponibilização do documento na íntegra.

Realizou-se a busca de referências no primeiro semestre de 2011. Logo após, os documentos foram selecionados seguindo os critérios de inclusão. Assim, identificaram-se 98 publicações. No entanto, a amostra final compôs-se de 14 artigos científicos produzidos em auditoria aplicada à saúde pública publicados em território nacional. Os artigos presentes em duas fontes de localização só foram contabilizados uma vez.

Em virtude das características específicas para o acesso à base de dados selecionada, a estratégia utilizada para localizar os artigos teve como eixo norteador a pergunta e os critérios de inclusão da revisão de literatura de base previamente estabelecidos, de forma a manter a coerência na busca dos artigos e evitar possíveis vieses.

Para se ter conhecimento da legislação, como portarias, decretos e leis, referentes a essa temática, acessou-se o endereço eletrônico do Ministério da Saúde / Departamento Nacional de Auditoria do SUS. Todas as referências incluídas foram fichadas e avaliadas quanto à relevância para esta revisão.

Para a análise e posterior síntese dos artigos que atenderam aos critérios de inclusão, utilizaram-se quadros sinópticos por tipo de publicação especialmente construídos para esse fim e que contemplaram os seguintes aspectos considerados pertinentes: fonte de localização dos artigos, origem e ano de publicação, objetivos e coerência teórico-metodológica dos objetivos. Vale acrescentar que esse quadro foi adaptado para cada tipo de publicação.

Outras variáveis também foram analisadas como, por exemplo, informações relacionadas aos primeiros autores, local de publicação, tipo de metodologia utilizada e principais conclusões.

Resultados

No que diz respeito à distribuição intelectual, segundo os descritores pré-estabelecidos e ao realizar sua busca isolada, foi possível encontrar 27.575 publicações em diversas áreas científicas sobre auditoria; e 44.307, sobre o SUS. Relativamente ao total de publicações que relacionavam as duas temáticas apresentadas, foram registradas somente 98. Assim, pode-se evidenciar o número reduzido de produções sobre auditoria e SUS quando se avalia o total de publicações nas duas áreas simultaneamente.

Em seguida, analisou-se a distribuição segundo os descritores relacionados a 'Auditoria' e 'SUS', associada à disponibilização de textos na íntegra e ao período de publicação entre 2000 e 2010. A partir dessa análise, pode-se verificar que, dos 98 artigos disponíveis, somente 14 publicações atendiam a todos os critérios pré-definidos para este estudo. Dentre os tipos de produção, identificaram-se manuais e relatórios técnicos (n=4), artigos (n=6) e monografias, dissertações e teses (n=4). Da amostra selecionada, observa-se que a instituição com mais publicações sobre auditoria no SUS foi o Ministério da Saúde, com quatro publicações de manuais técnicos, representando 28,57%. Todos esses documentos apresentavam ano de publicação entre 2004 e 2006.

Na identificação das fontes para localização, os documentos eram provenientes do LILACS ID, com exceção de uma publicação que apresentava citação em duas fontes diferentes, LILACS ID e Medline MPID.

No que se refere à profissão dos autores dos artigos, monografias, dissertações e teses, quatro publicações tinham autoria de profissionais médicos e três, de enfermeiros. Há, ainda, a participação de outros profissionais, como cirurgião-dentista (n=1), psicólogo (n=1) e técnico em radiologia (n=1). Todos os artigos publicados (n=6) apresentam os objetivos do estudo de forma clara, ou seja, possibilitam o fácil entendimento do leitor. Em relação à temática dessas publicações, quatro delas focalizaram revisões de literatura em auditoria de sistemas e serviços de saúde e duas, em estudos de casos múltiplos. Complementando, outras publicações trataram de estudo de corte transversal/retrospectivo, relato de experiência e estudos seccionais e pesquisa avaliativa com um documento para cada tipo.

Os quadros sinópticos referentes aos tipos de publicação em português disponíveis na íntegra no BVS foram divididos em três categorias: Visão sinóptica das monografias, relatórios e manuais técnicos (quadro 1); Visão sinóptica dos artigos (quadro 2); e Visão sinóptica das monografias, dissertações e teses (quadro 3).

Quadro 1.
Visão sinóptica das monografias, relatórios e manuais técnicos disponíveis na BVS entre os anos 2000 e 2010
Quadro 2.
Visão sinóptica dos artigos disponíveis na BVS entre os anos 2000 e 2010.
Quadro 3.
Visão sinóptica das monografias, dissertações e teses disponíveis na BVS entre os anos 2000 e 2010

Discussão

Inicialmente, pode-se observar o número incipiente de publicações acerca dos descritores associados a auditoria no SUS. Em geral, uma pequena parcela de publicações relaciona os dois descritores. Some-se a isso o fato de que poucos textos estão disponibilizados na íntegra em relação à fonte proposta, Biblioteca Virtual da Saúde (BVS).

Segundo Meneghini (1998), existe uma grande dificuldade no Brasil em relação às estratégias de política científica. Isso se deve à falta de bases de dados que permitam perceber a produção científica em um contexto amplo. O mesmo autor observa que há a necessidade constante de avaliação do impacto dessa produção e percepção da dinâmica da circulação de informações. Meneghini (1998) afirma, ainda, que a produção científica brasileira pode ser entendida como um iceberg, uma vez que 80% da produção nacional se mantém submersa e, por isso, pouco visível. Questiona-se a qualidade, o impacto de sua circulação e a falta de visibilidade internacional dessa produção.

Ao perceber a problemática relacionada a esta temática, foram registradas algumas publicações que manifestam interesse da comunidade científica internacional, como o artigo de Gibbs (1995 APUD PELLIZZON 2003, P.493) intitulado Ciência Perdida do Terceiro Mundo. Portanto, há muito que se avançar quando o assunto é produção e socialização do conhecimento científico. Em auditoria, isso não tem sido diferente, principalmente no que diz respeito à produção científica voltada para a saúde pública.

Contudo, a divulgação de trabalhos por si só não é suficiente. São necessários alguns cuidados na socialização das informações. Ressalta-se que o trabalho científico deve obedecer alguns critérios como clareza e rigor e, nesta perspectiva, este trabalho se baseia na pesquisa e análise de publicações que atendam a essas considerações. Partindo deste ponto de vista, enfatiza-se que a disponibilização dos documentos em qualquer fonte de publicação ou, até mesmo, a divulgação dos trabalhos de auditoria em saúde pública tem contribuído, sobremaneira, para a consolidação da atuação do profissional auditor. Além disso, esse recurso possibilita o reconhecimento desta categoria como apoio à gestão.

Para a atuação em auditoria, é válido discutir, ainda, que o processo de trabalho poderá ser orientado de diversas formas. Assim, poderá ser guiado por publicações que orientem a sua rotina de trabalho, evidenciem onde estão as informações em saúde pública, analisem quais os pontos de avaliação e monitoramento e, ainda, demonstrem o impacto de suas ações em saúde. É por meio desse tipo de conhecimento que o auditor irá desenvolver ações e serviços pertinentes à sua atividade profissional e, dessa forma, justificar a tomada de decisões em saúde pública. É neste sentido que se fundamenta a auditoria como ferramenta de gestão.

Em se tratando do SUS, a auditoria tem papel relevante, já que possibilita o apoio à gestão por meio do levantamento de necessidades, identificação das distorções, irregularidades e não conformidades em relação à base normativa, elaboração de recomendações e identificação dos destinatários para a correção ou adequação de cada um dos pontos verificados. Acredita-se que a divulgação de publicações com esta temática possibilitaria a troca de experiências entre os profissionais que atuam na auditoria e, ainda, enriqueceria a dinâmica de trabalho do auditor.

No que diz respeito à fonte de localização de publicações de interesse em saúde, concordou-se que a BVS constitui fonte de evidência relevante. Isso se justifica pelo fato de que essa fonte agrega confiabilidade e acessibilidade às publicações, além de se constituir em uma base de dados diversa. Dentre as principais bases de dados bibliográficas de interesse da área de saúde pública disponíveis para acesso na Biblioteca Virtual em Saúde Pública podem-se citar: LILACS (Sistema BIREME), AdSAÚDE (Rede Nacional de Administração em Saúde), MS (Acervo da Biblioteca do Ministério da Saúde), FSP (Acervo da Biblioteca da Faculdade de Saúde Pública), ENSP (Acervo da Escola Nacional de Saúde Pública), REPIDISCA (Rede Pan-Americana de Informação e Documentação em Engenharia Sanitária e Ciências do Ambiente) e MEDLINE (Literatura internacional em Ciências da Saúde).

A BVS tem sido apresentada como modelo de gestão da informação e intercâmbio de conhecimento em saúde e, ainda, percebida como um espaço comum de convergência do trabalho cooperativo de produtores, intermediários e usuários de informação. Vale acrescentar que essa fonte tem promovido o desenvolvimento de uma rede de fontes de informação científica e técnica com acesso universal na internet (BIREME, 2005). Contudo, ainda não é uma realidade para a divulgação de publicações em auditoria no SUS. No que tange à esta temática, concorda-se que a BVS não constitui fonte de evidência significativa para a prática de auditoria em saúde pública, uma vez que foram identificadas somente 14 publicações com texto acessível na sua íntegra.

Da amostra selecionada, observou-se que a instituição que publicou o maior número de artigos sobre auditoria no SUS foi o Ministério da Saúde, com quatro publicações. Esse fato se explica por se tratar de instituição responsável pela elaboração de normas e rotinas relacionadas ao trabalho do auditor no SUS, com impacto nas diferentes disciplinas da área.

Ao se analisar a amostra, verificou-se que a inexistência de um periódico específico de auditoria indexado, voltado para as ações e serviços no SUS, pode estar dificultando a divulgação do conhecimento produzido. A maioria dos artigos foi publicada em periódicos diversos, o que compromete, também, a rápida atualização do conhecimento.

Nesse contexto, após o ano 2000, constatou-se aumento no número de publicações sobre a temática. A partir de 2005, é válido destacar que houve fatos que justificam o destaque à auditoria no SUS: a implantação do Pacto pela Saúde em 2006; a sua incorporação como eixo da Política Nacional de Gestão Estratégica e Participativa no SUS (PARTICIPASUS) em 2007; e o fortalecimento do Sistema Nacional de Auditoria do SUS e a implementação de seu componente municipal por meio do eixo de Qualificação da Gestão do Programa Mais Saúde em 2008.

A proposta de Pacto pela Saúde, disposta na Portaria N° 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006, apresenta a auditoria como uma frente de trabalho, tratando-a como ferramenta de gestão e enfatizando seu caráter educativo e orientador. Nesse sentido, considera a auditoria como ferramenta relevante para a detecção das distorções do SUS, bem como para a proposição de suas correções. Soma-se a isso o fato que a Auditoria também passou a ser eixo da PARTICIPASUS por meio da Portaria N.º 3.027 ,de 26 de novembro de 2007, e defendida como recurso para a qualificação da gestão por meio do Programa Mais Saúde em 2008.

Acredita-se, ainda, que a inserção no ensino de pós-graduação brasileiro também poderá ser agregada como fator determinante do desenvolvimento na área de auditoria em saúde pública. Isso poderá contribuir decisivamente para a construção do conhecimento. No estado do Ceará, por exemplo, são três as instituições formadoras que ofertam vagas para auditoria de sistemas e serviços de saúde. Contudo, não houve ainda nenhuma citação dos trabalhos publicados nesse Estado.

Quanto à categoria profissional dos autores dos artigos, considerando-se apenas o primeiro autor de cada produção, observou-se que quatro eram médicos, seguidos por enfermeiros, com três publicações, cirurgião-dentista, psicólogo e técnico em radiologia, com uma publicação cada. Os profissionais da saúde dessas categorias, na condição de sujeitos da pesquisa, demonstram, assim, uma maior preocupação quanto aos saberes referentes ao processo de trabalho em auditoria do SUS, uma vez que nessa área há renovação frequente de toda a base normativa, exigindo do profissional a busca constante do conhecimento. Além disso, trata-se de um tema que exige atuação ativa de cada um dos profissionais, sendo, inclusive, objeto de cursos de especialização.

Na identificação das fontes para localização dos artigos, todos os artigos (n=6) são provenientes da rede Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). Esse fato tem sido observado como fator relevante, uma vez que o banco de dados dessa rede oferece informação sobre documentos primários ou indicativos de diretórios e serviços constantes de fontes primárias (BIREME, 2005).

Quanto à divulgação das informações, a LILACS registra a literatura científico-técnica em saúde, produzida por autores latino-americanos e do Caribe e publicada a partir de 1982. Nesse sentido, constitui fonte de localização interessante no que diz respeito à evolução das políticas públicas no País e, em especial, da auditoria do SUS.

Quanto ao conteúdo expresso em cada artigo, verifica-se que todas as publicações (n=6) apresentam os objetivos do estudo de forma clara, ou seja, possibilitam o fácil entendimento do leitor. No entanto, uma maior ênfase deve ser dada para este item, uma vez que o objetivo é a apresentação do que se pretende alcançar com a pesquisa. Constitui a ação proposta para responder à questão do estudo e é fundamental para a compreensão do estudo e do artigo publicado (STREUBERT, 2001). Sendo assim, faz-se necessária a atenção à composição dos artigos, bem como a apresentação de considerações finais pautadas no esclarecimento ou conclusão dos objetivos propostos.

Quanto ao tipo de publicação, duas delas são derivadas de teses. Outras duas são produtos de especialização (monografia) e mestrado (dissertação). Isso significa dizer que poucas publicações acadêmicas estão disponíveis com essa temática. Diante do exposto, questiona-se se o número reduzido é fruto de pouco interesse dos profissionais quanto à temática escolhida ou se há limitação quanto ao canal de publicação.

Em relação à temática, listam-se as categorias que compuseram nossa pesquisa: a) manuais de orientações técnicas; b) estudo de casos múltiplos; c) estudo de corte transversal / retrospectivo; d) relato de experiência; e) estudos seccionais; f) revisão de literatura; e, g) pesquisa avaliativa em saúde pública. A partir dos resultados observados, perceberam-se poucos estudos de caso e relatos de experiência. Em se tratando da construção do processo de trabalho, acredita-se que a publicação desses relatos pode contribuir significativamente para a melhoria contínua do trabalho e reconhecimento da atividade como ferramenta de gestão em saúde.

Conclusão

Na busca da melhor evidência disponível, conclui-se que esta revisão da literatura de base proporcionou a caracterização das publicações sobre auditoria no SUS. Pode-se observar, por meio deste estudo, que o número de publicações acerca dos descritores associados à auditoria no SUS ainda é incipiente. Em geral, uma pequena parcela de publicações relaciona os dois descritores.

Some-se a isso o fato que poucos textos estão disponibilizados na íntegra por meio da fonte proposta, BVS. Compreende-se que a pesquisa nacional em auditoria no SUS ainda está em construção. Contudo, é necessário que as publicações sejam disponibilizadas em meio eletrônico e recebam mais atenção dos autores, editores, analistas e veículos de publicação, para que o rigor subsidie a troca de experiência em saúde pública.

Referências

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  • BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de Normas de Auditoria. Brasília: Ministério da Saúde, 1998. 48 p.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2014

Histórico

  • Recebido
    Abr 2013
  • Aceito
    Jan 2014
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