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Acesso aos contraceptivos e direito à saúde em Angola: experiências de mulher e de farmacêutica

RESUMO

Este relato apresenta uma proposta do que a escritora Conceição Evaristo chama de ‘escrevivência’ – escrita da mulher negra, que se mescla com vivência, relato de memórias e memórias de seu povo, visando incomodar consciências e ecoar nossas histórias. O ‘escrever, viver e se ver’ da autora é reconhecido como ‘escrita da alma’, lugar onde cada mulher escreve considerando o mundo que vive, de uma forma integrada. Visa fazer uma breve reflexão sobre o acesso aos medicamentos, tomando o acesso aos métodos contraceptivos em Angola como recorte, tendo em conta a vivência da autora. É um estudo qualitativo e a coleta de dados foi feita por meio de pesquisa documental, estudo de campo e entrevistas. Para o tratamento de dados foi adotada a análise de conteúdo. Identificou-se que o acesso aos métodos contraceptivos em território angolano é incipiente, resultado de políticas públicas e boa governança pouco efetivas, bem como a interferência externa pouco resolutiva. Estes, são reforçados pela herança colonial, que propicia abordagens em desacordo com as necessidades locais. É fundamental que os direitos sexuais e reprodutivos sejam encarados como questão política, de saúde pública e inerente à dignidade humana, para além da perspectiva eugenista de controle de natalidade.

PALAVRAS-CHAVES
Acesso aos serviços de saúde; Direito à saúde; Angola; Anticoncepcionais

ABSTRACT

This report consists of what Conceição Evaristo calls ‘writing and living’ – the writing of black women, which mixes with experience, their memories, and the memories of their people, aiming to disturb consciences and echo our stories. The author’s ‘writing, living and self-seeing’ is recognized as the ‘writing of the soul’, from where each woman writes considering the world she lives in. It aims to briefly reflect on access to medicines, focusing on the access to contraceptive methods in Angola, based on the author’s experience. It is a qualitative study, and data were collected through documentary research, field study, and interviews. Content analysis was adopted for data processing. Access to contraceptive methods in Angolan territory is incipient, a result of ineffective public policies and good governance, as well as ineffective external interference. These are reinforced by colonial heritage, which provides approaches in disagreement with local needs. Sexual and reproductive rights must be seen as a political and public health issue inherent to human dignity, beyond the eugenic perspective of birth control.

KEYWORDS
Health services accessibility; Right to health; Angola; Contraceptive agents

Introdução

Aos 19 anos, fui ao ginecologista em um serviço de saúde privado (clínica privada) no município de Lobito – Angola, buscando um método adequado de contracepção (EDJFC, primeira autora). O profissional médico que me atendeu era russo e idoso. Ao explicitar minha proposição de usar contraceptivo, ele referiu que eu não deveria recorrer a métodos contraceptivos, pois era muito jovem; então fui liberada sem orientação alguma. Quando questionei a enfermeira (angolana) sobre a conduta, ela reforçou o mesmo discurso dizendo que não fornecem orientações ou opções de métodos contraceptivos para pessoas jovens, que o ideal era ter vários filhos e só assim recorrer à contracepção. Frustrada com a resolução da equipe de saúde, compartilhei com uma colega da faculdade, que me informou o nome do contraceptivo que ela usava e disse que ela comprava no comércio local. Então fiz o mesmo e, a partir daí, nunca mais tive interesse em ir a um serviço de saúde para questões de saúde da mulher, ou mesmo para acesso aos métodos contraceptivos em Angola.

Oito anos depois, tendo vivido por dez anos no Brasil, enquanto cursei e me graduei em Farmácia, tive meu filho e em seguida cursei Residência Multiprofissional em Saúde da Família. Voltei à Angola para coleta de dados para minha dissertação de Mestrado em Assistência Farmacêutica. Fui em busca de dados documentais e observações sobre as formas de acesso aos medicamentos essenciais e os serviços farmacêuticos naquele país. Impregnada pela formação e experiência profissional como farmacêutica no Brasil, a partir do pressuposto de que o acesso aos medicamentos é direito do cidadão e condição do direito à saúde.

No artigo nº 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos consta que “todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família, saúde e bem-estar [...]”11 Organização das Nações Unidas. Artigo 25: Direito a um padrão de vida adequado. Brasil: OMS; 2018. [acesso em 2022 mar 20]. Disponível em: https://nacoesunidas.org/artigo-25-direito-a-um-padrao-de-vida-adequado/.
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. Corroborando essa premissa, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 instituiu o direito à saúde como um bem essencial a todo indivíduo22 Babar Z, organizador. Pharmaceutical Policy in Countries with Developing Healthcare Systems. 1. ed. São Paulo: Adis; 2017. e no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 196633 Fundo das Nações Unidas para a População. Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. 16 dez 1966. [acesso em 2023 set 20]. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/pacto_internacional.pdf.
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, o direito à saúde foi ratificado como direito humano fundamental.

Em estudo sobre percepções e perspectivas das comunidades sobre sistemas de saúde na África, os entrevistados definiram saúde como “bem-estar físico, mental, emocional, espiritual, social e econômico”44 Organização Mundial da Saúde, Escritório Regional da OMS para a África. Sistemas de Saúde em África: Percepções e Perspectivas das Comunidades. Brazzaville: OMS; 2012. [acesso em 2023 abr 20]. Disponível em: https://www.afro.who.int/sites/default/files/2017-06/portuguese---health_systems_in_africa----2012.pdf.
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. Assim, uma boa saúde e bem-estar está diretamente relacionada a fatores como uma maximização de vida saudável, a minimização da exposição aos fatores de risco a favor da saúde e do bem-estar e da minimização de problemas evitáveis55 Organização Mundial da Saúde. O Estado da Saúde na região africana da OMS: uma análise da situação da saúde, dos serviços de saúde e dos sistemas de saúde no contexto dos objectivos de desenvolvimento sustentável onde estamos onde precisamos de ir. Brazzaville: OMS; 2018. [acesso em 2023 abr 20]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/275287/9789290341222-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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A saúde reprodutiva está apoiada nos direitos humanos e consiste em propiciar o exercício da sexualidade e reprodução humana de forma segura e satisfatória, onde o ser humano deve ter a liberdade de escolha sobre suas experiências e decisões66 Fundo das Nações Unidas para a População. Relatório da conferência internacional sobre população e desenvolvimento – plataforma de Cairo. Cairo: FNUAP; 1994. [acesso em 2023 set 20]. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/relatorio-cairo.pdf.
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. Atualmente, os direitos sexuais e reprodutivos representam o compromisso dos governos para garantir o acesso à saúde às mulheres de forma mais direcionada e são referidos no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) cinco, sobre igualdade de gênero, com as proposições de eliminar todas as formas de violência, práticas nocivas e assegurar o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva e os direitos reprodutivos. Os Estados se comprometem em viabilizar melhores condições para a garantia da igualdade de gênero77 United Nations. Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development. Genova: WHO; 2015. [acesso em 2022 mar 10]. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/21252030%20Agenda%20for%20Sustainable%20Development%20web.pdf.
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A construção dos direitos reprodutivos, como se conhece na atualidade, foi fruto do movimento constante e insistente de mulheres que reivindicaram na agenda da Organização das Nações Unidas (ONU) a inclusão dessa pauta66 Fundo das Nações Unidas para a População. Relatório da conferência internacional sobre população e desenvolvimento – plataforma de Cairo. Cairo: FNUAP; 1994. [acesso em 2023 set 20]. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/relatorio-cairo.pdf.
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. Com a realização de diversas conferências, o relatório da conferência de Cairo, realizada em 1994, é considerado um dos principais marcos na luta pelos direitos sexuais e reprodutivos, ratificando estes como direitos humanos, onde deve haver incentivo tanto a liberdade e autonomia, bem como o compromisso da gestão (pública, privada e filantrópica) na criação, efetivação e manutenção de políticas que estimulem o desenvolvimento permanente destes direitos88 Telo FCA. Direitos reprodutivos e (des)colonização: notas preliminares sobre a colonialidade dos direitos reprodutivos. Cad. Gênero Divers. 2019 dez; 5(4).. Como forma de abarcar com especificidade as mulheres africanas, foi ratificado o protocolo dos direitos das mulheres na carta africana dos direitos humanos, conhecido como o protocolo das mulheres, que entrou em vigor no ano de 200599 African Union. Protocol to the African Charter on Human and Peoples’ Rights on the Rights of Women in Africa. Ethiopia; 2003. [acesso em 2023 abr 20]. Disponível em: https://au.int/en/treaties/protocol-african-charter-human-and-peoples-rights-rights-women-africa.
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. Este é tido como um incentivo à promoção da igualdade de gênero, o respeito aos direitos humanos e à promoção da justiça social com relação ao sexo feminino, incluindo o direito a tomar decisões sobre seus corpos1010 Musoke HD. Direitos sexuais e reprodutivos: uma crítica ao artigo 14 do protocolo dos direitos das mulheres da África. R. Dir. sanit. 2012; 12(3):57-118.. Angola aderiu a este compromisso em 201088 Telo FCA. Direitos reprodutivos e (des)colonização: notas preliminares sobre a colonialidade dos direitos reprodutivos. Cad. Gênero Divers. 2019 dez; 5(4)..

O acesso a medicamentos essenciais é uma das prerrogativas importantes para a garantia da qualidade de vida. Essa garantia é reforçada à medida que as partes se empenham em diminuir as discrepâncias na oferta dos serviços de saúde, ao mesmo tempo que invistam recursos suficientes em ações como: o incentivo à ciência, à tecnologia, à inovação, à afirmação de políticas públicas centradas na defesa da vida e integradoras1111 Portugal A, Bermudez J. Santos R. Acesso a medicamentos: Direito Humano Fundamental! In: Bermudez J, organizador. Solidariedade ou Apartheid? Lições aprendidas na pandemia. São Paulo: Escola Nacional de Formação e Qualificação Profissional dos Farmacêuticos; 2022. p. 162-5.. O acesso aos contraceptivos é parte fundamental quando se fala sobre direitos sexuais e reprodutivos, pois propicia o empoderamento econômico, social e a diminuição da mortalidade materna e neonatal. Porém, estudos referem que este acesso é desigual quando se leva em conta questões como cor, raça, localização geográfica, nacionalidade e classe social1212 Brandão ER, Cabral CS. Juventude, gênero e justiça reprodutiva: iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(7):2673-82.,1313 Farias MR, Leite SN, Tavares NUL, et al. Utilização e acesso a contraceptivos orais e injetáveis no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016; 50(supl2):14s.,1414 Fonseca C, Marre D, Rifiotis F. Governança reprodutiva: um assunto de suma relevância política. Horiz Antropol. 2021; 27(61):7-46.,1515 Guedes KF, Raimundo VK, Bastos S. Saúde reprodutiva e o acesso a contraceptivos no contexto da pandemia de covid-19. Bis. 2021; 22(2):96-105..

Além disso, características socioculturais, geracionais e relacionais influenciam diretamente na forma como estes serviços de saúde podem ser ofertados. Portanto, estas estratificações propiciam uma acentuação nas desigualdades para o acesso aos serviços de saúde sexual e reprodutiva1212 Brandão ER, Cabral CS. Juventude, gênero e justiça reprodutiva: iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(7):2673-82..

A partir de 2010, as políticas públicas começaram a ser estruturadas em Angola, após longo período de instabilidade política e grandes fragilidades institucionais. A Política Nacional de Saúde descreve que a saúde é um direito humano, e que “o Estado se compromete em assegurar a disponibilidade dos recursos físicos do sistema de saúde”, no entanto, “nos limites de suas capacidades []”1616 Angola. Decreto Presidencial nº 262/10 de 24 de novembro de 2010. Aprova a Política Nacional de Saúde – revoga toda legislação que contra rie o presente decreto. Diário da República. 24 Nov 2010. [acesso em 2024 fev 28]. Disponível em: https://lex.ao/docs/presidente-da-republica/2010/decreto-presidencial-n-o-262-10-de-24-de-novembro/#:~:text=O%20presente%20documento%20de%20Pol%C3%ADtica,e%20os%20respectivos%20Planos%20Operacionais.
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. Essa descrição permeia o conteúdo das legislações do País desde o documento que cria o Serviço Nacional de Saúde em 1975 (então pautado na universalidade e gratuidade), época que marca a libertação do jugo colonial, até a Constituição da República e a Política Nacional de Saúde, atualizados ambos em 2010 e vigentes atualmente. Estas fazem referência que saúde é direito do cidadão, porém não descrevem qual é o ente incumbido de garantir o acesso ao direito à saúde1717 Calipi EDJF. Políticas Públicas relacionadas ao acesso aos medicamentos em Angola. Florianópolis. [dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2023..

De igual modo, as políticas farmacêuticas vigentes atualmente acompanham a tendência de apresentar o papel do Estado como regulador e não provedor na garantia do acesso aos medicamentos essenciais1717 Calipi EDJF. Políticas Públicas relacionadas ao acesso aos medicamentos em Angola. Florianópolis. [dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2023.. Assim, se identifica que ao longo dos anos as proposições de legislações na área da saúde para o País não tiveram como ênfase a descrição detalhada de que o acesso à saúde e aos medicamentos é um direito humano fundamental e quem são os atores responsáveis por esse processo1717 Calipi EDJF. Políticas Públicas relacionadas ao acesso aos medicamentos em Angola. Florianópolis. [dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2023., o que reverbera em iniquidades significativas na qualidade de vida das populações1818 Bermudez JAZ. Acesso a medicamentos: impasse entre a saúde e o comércio! Cad. Saúde Pública. 2017; 33(9):e00123117..

É sobre este contexto que se desenvolve o presente relato e reflexão a seguir. Visa fazer uma breve reflexão sobre o acesso aos medicamentos, tomando o acesso aos métodos contraceptivos em Angola como recorte. O relato propõe também considerar a experiência e vivência da primeira autora, enquanto angolana, com a temática da contracepção, ao mesmo tempo que considera sua vivência com o sistema de saúde brasileiro1919 Mascarenhas ELO. Produção científica africana e afrocentricidade: beleza, saúde, cura e a natureza holística da ciência africana. [dissertação]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2021.,2020 Remenche MLR, Sippel J. A escrevivência de Conceição Evaristo como reconstrução do tecido da memória brasileira. Cad. Ling. Soc. 2019; 20(2):37-51..

Material e métodos

Trata-se de uma pesquisa de natureza descritiva, do tipo relato de experiência, com base em uma vivência da autora durante a coleta de dados do projeto de pesquisa para o mestrado em Assistência Farmacêutica. O relato de experiência é uma produção de conhecimento que visa descrever uma vivência profissional que possa contribuir para determinada área de atuação2121 Marconi MA, Lakatos EM. Metodologia do Trabalho Científico. 8. ed. São Paulo: Atlas; 2017.. A pesquisa qualitativa se propõe a compreender os aspectos de pesquisa em sua dimensão sociocultural, e pode ser expressa por meio de crenças, valores, opiniões, representações e comportamentos; também se propõe a interpretar os significados dos fenômenos inseridos em contextos naturais2222 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14. ed. São Paulo: Hucitec; 2014..

A coleta de dados incluiu uma busca documental nas instituições locais, em legislações, sites ministeriais e institucionais, como o Ministério de Saúde de Angola (Minsa) e da Ordem dos Farmacêuticos de Angola (OFA) e literatura cinza ou não convencional.

Foram realizadas 12 entrevistas com servidores da Secretaria Estadual de Saúde alocados em diferentes setores e com hierarquias diferenciadas. Os entrevistados foram selecionados por critérios específicos e foram aplicados roteiros de entrevista diferenciados, respeitando as especificidades do cargo. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas e codificadas utilizando o software Nvivo®. Para garantia do anonimato na análise dos resultados, os participantes foram codificados.

Para melhor compreensão, foi realizada uma pesquisa observacional nos meses de julho a agosto de 2019, na delegação provincial de saúde (Secretaria Estadual de Saúde) de uma província de Angola, onde a pesquisadora acompanhou os entrevistados por cerca de 100 horas, com registro da observação em diário de campo. Por meio do diário de campo, foram registrados os eventos da observação e a progressão da pesquisa, além de análises da pesquisadora sobre os acontecimentos presenciados2323 Gil AC. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6. ed. São Paulo: Atlas; 2014..

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas Envolvendo Seres Humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina – CEPSH/Udesc (CAAE: 11955719.30000.0118 / Parecer: 3.376.034) e pela delegação provincial de saúde (Secretaria Estadual de Saúde) do local de observação em Angola. Todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Para o tratamento de dados, foi adotada a análise de conteúdo, compreendida como um conjunto de técnicas de pesquisa cujo objetivo é a análise dos significados e abordagem da informação contida nas mensagens2424 Bardin L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70; 1977.. Foi usada a modalidade análise interpretativa tendo como premissa o método indutivo. Esta abordagem, conforme Lakatos e Marconi2525 Lakatos EM, Marconi MA. Fundamentos de metodologia científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010., visa levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas nas quais se basearam.

Resultados e discussão

Durante a pesquisa observacional, identifiquei no depósito de medicamentos várias caixas de Dispositivo Intrauterino (DIU) com prazo de validade curto e questionei a um dos funcionários se havia dificuldade na distribuição e por isso estavam ali em abundância. No local estavam alguns fiscais representando o Ministério da Saúde que vieram fazer o processo de avaliação dos serviços e infraestrutura – um deles de pronto respondeu com a seguinte colocação:

tem que deixar caducar [vencer] mesmo, não tem nada que distribuir essas coisas, é preciso deixar as crianças nascerem e parar de imitar essas coisas do Ocidente.

Além disso, havia uma abundância de contraceptivos orais no depósito. Durante a conversa, outro informante afirmou que: “o envio destes ocorre conforme a solicitação das unidades sanitárias ou de algum representante da província, ou município”.

O que estes fatos nos indicam a respeito do acesso aos medicamentos como um direito à saúde em Angola? Quais valores sociais e contextuais delineiam a acessibilidade e uso de contraceptivos naquele país?

As falas e fatos observados descritos acima suscitaram reflexões e memórias do tempo de adolescente vivendo em Angola. Em que ponto a fala acima citada, vinda de um homem jovem, com posição social elevada, reflete a preocupação pela saúde da mulher e/ou influência do ocidente no dia a dia da mulher angolana? Isto ocorre em um país onde a fuga da paternidade é um fenômeno social e um problema de saúde pública que aumentou ou mesmo ganhou maior visibilidade nos últimos anos, resultando no agravamento de problemas sociais como o aumento da evasão escolar, a manutenção do trabalho infantil, a prostituição infantil, o aumento no nível da violência, ou seja, tem relação direta na organização familiar, no grau/nível de saúde e afeta diretamente a qualidade de vida da população2626 Kinhama VC. Fuga à paternidade em Angola, província do Cuanza Sul, município da cela, (causas e consequências). REASE. 2022; 8(09):2675-3375.,2727 Costa MC, Afonso AC, Campos MAS. A fuga à Paternidade à luz do Ordenamento Jurídico Angolano: Um olhar atento às causas e consequências no município do Mungo – Província do Huambo – Angola. Recima. 2023; 4(1):2675-6218..

A observação de abundância de medicamentos contraceptivos estocados, mas fora do alcance das mulheres, contrasta com a preconcepção comum de que os problemas de acessibilidade aos medicamentos em países de baixa renda se definem pela indisponibilidade de recursos públicos para aquisição, ou da insuficiência de produtos oriundos de ações humanitárias internacionais2828 Khatib R, Mckee M, Shannon H, et al. Availability and affordability of cardiovascular disease medicines and their effect on use in high-income, middle-income, and low-income countries: an analysis of the PURE study data. Lancet. 2016; 13(387):61-9.,2929 Sado E, Sufa A. Availability and affordability of essential medicines for children in the Western part of Ethiopia: implication for access. BMC Pediatrics. 2016; 16(40):1-8.,3030 Yamin AE, Maleche A. Realizing universal health coverage in East Africa: the relevance of human rights. BMC Int. Health Hum. Rights. 2017; 17(21):1-10.,3131 Nnaji C, Wiysonge CS, Okeibunor J, et al. Implementation research approaches to promoting universal health coverage in Africa: a scoping review. BMC Health Serv. Res. 2021; 21(414):1-17.,3232 Lohmann J, Brenner S, Koulidiati J, et al. No impact of performance-based financing on the availability of essential medicines in Burkina Faso: a mixed-methods study. PLOS glob. public health. 2022; 2(3):e0000212.. O caso observado revela que, se por um acaso o coordenador da unidade sanitária também entender que contracepção ‘é coisa do Ocidente’ e que tem que deixar as crianças nascerem, não haverá contraceptivos disponíveis nas unidades de saúde e, portanto, não haverá acesso a eles. Assim, anulam-se as possibilidades de incentivo ao planejamento familiar e aquelas mulheres que desejarem recorrer a qualquer um dos métodos oferecidos pelo Estado, enquanto política de saúde pública, deverão buscar outros meios. Aquelas que não têm recursos financeiros, ou conhecimento, ou autonomia para tanto, não terão nenhuma chance de acesso aos métodos contraceptivos.

Tendo como pano de fundo esses relatos, é importante referir que os direitos sexuais e reprodutivos são parte indissociável dos direitos humanos, portanto são universais e independem de credo, classe social, raça, cor ou qualquer particularidade pessoal; são essenciais para o bem-estar físico, emocional, mental e social das pessoas3333 Telo SV, Witt RR. Saúde sexual e reprodutiva: competências da equipe na Atenção Primária à Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2018; 23(11):3481-90..

Em estudo sobre a trajetória histórica das políticas de saúde da mulher em Angola, Rocha e colaboradores3434 Rocha ENSGN, Rodrigues DP, Luchesi LB, et al. Trayectoria histórica de las políticas de salud de la mujer en Angola. Cult. de los Cuid. (Edición digital). 2018; 22(51):38-45. identificaram que, ao longo dos anos, as parcerias internacionais foram fundamentais para a materialização de melhorias na área da saúde da mulher, em especial investimentos do governo sueco. Em contrapartida, uma vez que as parcerias não são específicas para um grupo populacional, muito do que vinha sendo construído foi perdido ou estagnado ao longo dos tempos. Possivelmente, fatores culturais como a condição de subalternidade interferiram nesta conjuntura3434 Rocha ENSGN, Rodrigues DP, Luchesi LB, et al. Trayectoria histórica de las políticas de salud de la mujer en Angola. Cult. de los Cuid. (Edición digital). 2018; 22(51):38-45..

O cenário ainda não é favorável: em 2017, a taxa de mortalidade materna era de 241 por cada cem mil nascidos vivos. A considerar que já foi o 14º pior país nessa classificação, atualmente ocupa a posição 41º e é o segundo pior país entre os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (Palop) e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), registrando cerca de três mil óbitos por ano3535 E-global Notícias em português. Angola: Mortalidade materna registra três mil vítimas por ano. E-global. 2023 mar 10. [acesso em 2023 mar 10]. Disponível em: https://e-global.pt/noticias/lusofonia/angola/angola-mortalidade-materna-regista-tres-mil-vitimas-por-ano/#:~:text=A%20posi%C3%A7%C3%A3o%20de%20Angola%20tem,lugar%2C%20tendo%20subido%2027%20lugares.
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. O País apresenta uma taxa de fecundidade de 6,16 e 5,96 por mulher para os anos de 2017 e 2020, respectivamente3636 Population Reference Bureau. World Population Data Sheet: middle-africa. 2021. [acesso em 2023 mar 10]. Disponível em: https://interactives.prb.org/2021-wpds/wp-content/uploads/2021/08/2021-world-population-data-sheet-middle-africa.pdf.
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. A taxa pode indicar maior dificuldade para as famílias no que concerne à alimentação e educação de qualidade, por exemplo, bem como uma diminuição na inserção da mulher no mercado de trabalho. Paiva e Caetano3737 Paiva CCN, Caetano R. Avaliação de implantação das ações de saúde sexual e reprodutiva na Atenção Primária: revisão de escopo. Esc Anna Nery. 2020; 24(1). referem que a mortalidade materna tende a ser um indicador útil para se avaliar a garantia dos direitos reprodutivos de um país, pois muitas destas são evitáveis. Perante este cenário, é importante referir que a saúde sexual e reprodutiva é uma questão de saúde pública que vai além da decisão de se ter filhos e, portanto, necessita ser tratada como política de Estado.

Nos países africanos, o acesso a métodos contraceptivos ainda é reconhecidamente insuficiente e por isso a União Africana, com seus 53 estados-membros, ratificou o compromisso de trabalhar para garantir o acesso universal a serviços de saúde sexual e reprodutiva até 20303838 Guttmacher Institute. Investimento na Saúde Sexual e Reprodutiva na União Africana. [acesso em 2023 mar 9]. Disponível em: https://www.guttmacher.org/pt/fact-sheet/investing-sexual-and-reproductive-health-african-union#:~:text=As%20pol%C3%ADticas%20da%20Uni%C3%A3o%20Africana,as%20pessoas%20que%20deles%20necessitam.
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. A União Africana apresenta que por cada US$ 1 gasto em serviços contraceptivos para além do que se gasta atualmente, poupar-se-iam US$ 2,77 em despesas de prestação de melhores cuidados maternos, neonatais e de aborto. Desse modo, um investimento integral resultaria também na diminuição em 78% do número de gravidezes não planejadas, nascimentos não planejados e abortos inseguros, e as mortes neonatais diminuiriam em 71%, ao passo que as mortes maternas cairiam 60%3838 Guttmacher Institute. Investimento na Saúde Sexual e Reprodutiva na União Africana. [acesso em 2023 mar 9]. Disponível em: https://www.guttmacher.org/pt/fact-sheet/investing-sexual-and-reproductive-health-african-union#:~:text=As%20pol%C3%ADticas%20da%20Uni%C3%A3o%20Africana,as%20pessoas%20que%20deles%20necessitam.
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Com uma população predominantemente jovem, com expectativa de vida de 63 anos para as mulheres, o uso de contracepção por mulheres casadas entre 15 e 49 anos é de 14% se comparado a 63% da classificação global, sendo que as mulheres com idade entre 15 a 49 anos representam 19% de todos os nascimentos quando comparada às mulheres com 35 anos ou mais, que representam 16%3636 Population Reference Bureau. World Population Data Sheet: middle-africa. 2021. [acesso em 2023 mar 10]. Disponível em: https://interactives.prb.org/2021-wpds/wp-content/uploads/2021/08/2021-world-population-data-sheet-middle-africa.pdf.
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Na prática do dia a dia, atualmente, a preocupação das mulheres que pensam buscar os serviços de saúde voltados para o planejamento familiar ainda é a mesma que no ano de 2011: na entrevista, a equipe de enfermagem faz perguntas como: ‘Quantos filhos você tem? Quantos anos você tem?’ E então, se a mulher for jovem (menos de 30/35 anos), pedem que ‘chame o marido’ para ver se ele tem conhecimento dos desejos da esposa e se autoriza o procedimento. Caso ela afirme que não tem companheiro, negam o atendimento, pois ela pode casar a qualquer momento e o marido querer filhos de imediato. Se a mulher nunca teve filhos, não é ‘permitido’ que procure métodos contraceptivos, assim como na minha experiência.

Há ainda o constrangimento de, se passando pelos requisitos para o uso do método contraceptivo, a depender da ocasião, o profissional responsável pela liberação do método em questão (geralmente médicos e médicas) não comparece ao serviço no dia da avaliação prévia, sendo necessário retornar ao serviço em outra ocasião, sem garantia de que será possível terminar o atendimento. Em estudo sobre controle da fertilidade das mulheres em Uganda, a autora cita um episódio, em determinado momento de sua vida, em que lhe foi negado o acesso aos contraceptivos a menos que apresentasse uma carta de seu marido, e esta, então, se sentou embaixo de uma árvore e rabiscou uma carta de um falso marido e assim teve o acesso desejado3939 Tamale S. Controle da Fertilidade das Mulheres em Uganda: Perspectivas sobre religião, direito e medicina. Sur - Rev. int. direitos human. 2016; 13(24):117-28..

Desse modo, ao invés de a mulher experimentar o exercício da vivência da sexualidade sem constrangimento, da maternidade voluntária e da anticoncepção autodecidida, ela é submetida a violências diversas por quem deveria primar pela atenção integral num assunto extremamente intimista e pessoal3333 Telo SV, Witt RR. Saúde sexual e reprodutiva: competências da equipe na Atenção Primária à Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2018; 23(11):3481-90..

Como consequência, geralmente a melhor maneira de acessar os métodos contraceptivos sem constrangimento é tendo uma pessoa conhecida dentro do serviço de saúde (frequentemente em maternidades) que facilite o atendimento, sem passar pelos trâmites comuns, ou mesmo que pegue os materiais (chip ou DIU) para serem inseridos num serviço privado. Ou ainda com um profissional de saúde em seu local de trabalho, independente da distância. É importante referir que muitas destas mulheres são letradas e de uma posição considerável dentro da sociedade, imaginemos então, entre aquelas de uma condição mais humilde e de maiores necessidades, como a cultura da ‘mulher parideira’ que influencia diretamente nos seus sonhos e liberdade para voar para onde quiser.

Estudo sobre iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no sistema de saúde brasileiro, o Sistema Único de Saúde (SUS), identificou que muito do que se tem como oferta de métodos contraceptivos, especificamente aqueles designados como contraceptivos hormonais reversíveis de longa duração, contém um valor estigmatizante e discriminatório, sob a justificativa de ‘proteção das mulheres em situação de vulnerabilidade’. Estas inequidades, impedem ações de ampliação para o acesso universal de todas as mulheres1212 Brandão ER, Cabral CS. Juventude, gênero e justiça reprodutiva: iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(7):2673-82.. Lembro quando, na época de gestante no ano de 2014, em uma consulta pré-natal em uma unidade de saúde de Florianópolis (na altura com 24 anos), a profissional que fazia meu cadastro questionou: ‘até que série você estudou?’ E ficou muito espantada quando respondi que estava na quinta fase do curso de graduação em farmácia, afinal, como nos diz Carneiro4040 Carneiro AS. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2005., aos corpos negros não é permitido certos lugares e/ou posições.

Considerando que o direito à saúde envolve aspectos essenciais como a inclusão e não restrição, implica em liberdade, equidade, oferta dos serviços e todos os bens a ele relacionados sem discriminação, de forma que esteja ao alcance de todos, quer por sua qualidade, quantidade, localização4141 UN Committee on Economic, Social and Cultural Rights. General Comment No. 14: The Right to the Highest Attainable Standard of Health (Art. 12 of the Covenant), 11 August 2000, E/C.12/2000/4. [acesso em 2023 mar 20]. Disponível em: https://www.refworld.org/docid/4538838d0.html.
https://www.refworld.org/docid/4538838d0...
, muitas dessas prerrogativas não estão disponíveis para a população angolana quando se trata de saúde sexual e reprodutiva. Assim, nos negam o acesso a informações e a liberdade de decisão sobre nossos próprios corpos, terceirizando a decisão para os representantes do Estado (profissionais de saúde e gestores) e para o homem. Estudo de Tamale3939 Tamale S. Controle da Fertilidade das Mulheres em Uganda: Perspectivas sobre religião, direito e medicina. Sur - Rev. int. direitos human. 2016; 13(24):117-28. refere que a narrativa do controle dos direitos sexuais e reprodutivos femininos, além do incentivo à natalidade, está intimamente relacionada a uma dependência econômica e separatista onde as mulheres são garantidas as atividades não remuneradas e subvalorizadas e, aos homens, a vida pública.

Muitas mulheres sequer desejam acessar os serviços de saúde concernente à saúde da mulher na totalidade. Sob essa perspectiva, do que adianta promover programas de assistência às gestantes e crianças, como mosquiteiros e programas de nutrição, se a decisão de ser mãe envolve uma série de atores que não apenas os progenitores? Quantas mortes por tentativas de abortos ‘não legais’ acontecem no País? Que tipo de educação nossas filhas e nossos filhos estão recebendo em relação à sexualidade? Desse modo, nosso direito à saúde é violentado diariamente e de diversas formas. Logo, percebe-se que a questão cultural de incentivo à natalidade e do papel da mulher na sociedade angolana é um campo de estudo que precisa ser considerado com atenção quando se fala de acesso aos serviços de saúde e a medicamentos3434 Rocha ENSGN, Rodrigues DP, Luchesi LB, et al. Trayectoria histórica de las políticas de salud de la mujer en Angola. Cult. de los Cuid. (Edición digital). 2018; 22(51):38-45.,4242 Goldenberg T, Stephenson, R. Applying a deviance framework to understand modern contraceptive use in sub-Saharan Africa. PLoS ONE. 2019; 14(5):e0216381..

No Brasil, foi aprovada recentemente a atualização da Lei nº 14.443/20224343 Brasil. Lei nº 14.443, de 2 de setembro de 2022. Altera a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, para determinar prazo para oferecimento de métodos e técnicas contraceptivas e disciplinar condições para esterilização no âmbito do planejamento familiar. Diário Oficial da União. 2 Set 2022. com mudanças nas normas de laqueadura e vasectomia. Entre as atualizações, a idade passa de 25 para 21 anos, não é mais necessária a autorização do cônjuge para a realização do procedimento e a gestante poderá solicitar a laqueadura durante o período do parto4343 Brasil. Lei nº 14.443, de 2 de setembro de 2022. Altera a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, para determinar prazo para oferecimento de métodos e técnicas contraceptivas e disciplinar condições para esterilização no âmbito do planejamento familiar. Diário Oficial da União. 2 Set 2022.. Estudo nacional revelou que 32,7% das mulheres brasileiras utilizam contraceptivos orais ou injetáveis, mas que a maioria os obtém nas farmácias comerciais. Dentre as mulheres que estavam utilizando, cerca de 1,6 milhão de usuárias afirmaram ter tentado obter os contraceptivos no SUS sem sucesso entre 2013 e 20141313 Farias MR, Leite SN, Tavares NUL, et al. Utilização e acesso a contraceptivos orais e injetáveis no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016; 50(supl2):14s., possivelmente por necessidade de prescrição médica ou por desabastecimento.

Mesmo em um país entendido como democrático e desenvolvido como o Brasil, a questão dos direitos da mulher ainda precisa ser discutida e consiste também numa questão de saúde pública. É importante referir que em Angola não há documento institucionalizado que condicione o acesso aos métodos contraceptivos.

Telo4444 Telo FCA. Direitos reprodutivos e (des)colonização: notas preliminares sobre a colonialidade dos direitos reprodutivos. Cad. Gênero Divers. 2019 dez; 5(4):199-218. faz apontamentos importantes sobre direitos reprodutivos, referindo que nos países africanos, é preciso considerar o componente cultural como fio condutor. Outro estudo refere que na África é preciso considerar também que as organizações familiares se diferenciam em muito da visão eurocêntrica e americanizada do que seria uma família nuclear e patriarcal4545 Oyèrónké O. Conceituando gênero: os fundamentos eurocêntricos dos conceitos feministas e o desafio das epistemologias africanas. 2004. [acesso em 2023 mar 20]. Disponível em: https://filosofia-africana.weebly.com/uploads/1/3/2/1/13213792/oyèrónké_oy?wùmí_-_conceitualizando_o.
https://filosofia-africana.weebly.com/up...
. Portanto, a discussão não é somente sobre procriar ou não, envolve toda uma comunidade com suas crenças relacionadas a ter filhos e que, apesar de ser direcionada majoritariamente às mulheres, os homens também são cobrados a ter um determinado número de filhos e quanto mais cedo melhor4444 Telo FCA. Direitos reprodutivos e (des)colonização: notas preliminares sobre a colonialidade dos direitos reprodutivos. Cad. Gênero Divers. 2019 dez; 5(4):199-218.. Além disso, a autora faz referência também ao teor colonialista nos documentos e ajuda internacional prestada aos países de baixa e média renda no quesito saúde reprodutiva, onde muitas vezes estes possuem um olhar com finalidade de frear a procriação e pouco consideram determinantes sociais envolvidas no processo.

Estudo sobre assistência farmacêutica e governança global da saúde em tempos de Covid-194646 Ribeiro AA, Ricardi LM, Pontes MA, et al. Assistência Farmacêutica e governança global da saúde em tempos de Covid-19. Saúde debate. 2022; 46(133):501-17. refere que as parcerias entre os Estados precisam considerar uma ‘abordagem de saúde pública abrangente’, com participação ativa e inclusão dos diversos atores, pois assim reverbera na diminuição da dependência extrema e iniquidades.

No caso específico de Angola, as parcerias internacionais se mostram frágeis pela corrupção, pela falta de transparência e pela dependência externa. Esse cenário facilita a condição de vulnerabilidade, como, por exemplo, na recepção de ‘ajudas e doações’ sem o senso crítico e identificação de necessidades locais, e tem influência direta na autonomia do País em relação a prestação dos serviços de saúde1717 Calipi EDJF. Políticas Públicas relacionadas ao acesso aos medicamentos em Angola. Florianópolis. [dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2023..

Desse modo, a saúde reprodutiva tem a ver com a dignidade humana, principalmente feminina. O guia para saúde reprodutiva4747 Fundo de População das Nações Unidas Brasil, Johnson & Johnson Foundation. Guia para saúde sexual e reprodutiva e atenção obstétrica: Informações, orientações e metodologias ativas para profissionais da Atenção Primária à Saúde. Brasília, DF: Enlace; 2022. refere que a saúde reprodutiva implica autonomia, segurança e liberdade nas decisões reprodutivas e sexuais, incluindo a oferta de serviços de saúde, informações e métodos eficientes e seguros para seu planejamento por homens e mulheres. Na África é preciso considerar que, mais do que contracepção limitada por controle de natalidade, precisamos de serviços de saúde que consigam oferecer ações que garantam o direito à saúde considerando especificidades de classe, raça, gênero e poder econômico4848 Musoke HD. Direitos sexuais e reprodutivos: uma crítica ao artigo 14 do protocolo dos direitos das mulheres da África. Rev. Dir. sanit. 2012; 12(3):57-118..

Neste contexto, deve-se considerar o conceito de justiça reprodutiva, que procura revisitar a discussão de que esta é, antes de tudo, uma temática política e envolve um valor econômico, político e emocional, por isso não pode ser associado a uma função estritamente feminina1212 Brandão ER, Cabral CS. Juventude, gênero e justiça reprodutiva: iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(7):2673-82..

Desse modo, os corpos femininos são controlados pelo Estado, pela indústria farmacêutica, pela igreja/religião e pela sociedade. O Estado normalmente define políticas públicas e, ao mesmo tempo, decide quem, onde, como e quando a mulher poderá acessar os serviços reprodutivos; a indústria farmacêutica estimula a aquisição a determinados produtos, com pesquisas direcionadas exclusivamente a mulheres e nada ou quase nada direcionados aos homens enquanto indivíduos ativos no processo de saúde reprodutiva e sexual; a religião determina e dita regras e comportamentos tidos como certos e/ou errados e finalmente a sociedade com toda a construção do racismo estrutural se coloca na posição de definir o que representa um padrão de vida/família moralmente aceitável como número de filhos, a obrigatoriedade moral de tê-los, quem pode não tê-los, como educá-los1212 Brandão ER, Cabral CS. Juventude, gênero e justiça reprodutiva: iniquidades em saúde no planejamento reprodutivo no Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(7):2673-82.,14.

A reflexão gerada pela questão do acesso aos métodos contraceptivos contribui enormemente para ampliar a compreensão da questão do acesso aos medicamentos em Angola ou em qualquer outro cenário. Fica evidente a necessidade de compreender o medicamento como objeto simbólico, repleto de significados e valores4949 Lefebvre H. O Direito à Cidade. São Paulo: Editora Moares; 1991. que ultrapassam, em muito, a lógica administrativa de seleção, compra e distribuição. No caso aqui relatado, os medicamentos contraceptivos e os DIU estavam vencendo e em quantidade abundante no estoque. Não há, portanto, falta de produtos ou recursos financeiros para isso. De igual modo, não havia, também, impedimentos de transporte, de armazenamento ou outras condições de estrutura física para disponibilizar os produtos. Os impedimentos são de ordem de estrutura social, muito mais complexas em termos de intervenções e de resolução. No entanto, estas questões não são consideradas em nenhuma política farmacêutica conhecida a nível nacional.

Considerações finais

O acesso aos métodos contraceptivos de forma segura e racional é essencial na garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Em Angola, o acesso a estes ainda é incipiente, devido a inúmeras barreiras que se colocam, como questões estruturais (alto índice de corrupção, pobreza, organização do sistema de saúde e políticas públicas deficientes) e o componente cultural, que perpassa todos os atores envolvidos e precisa ser compreendido na sua complexidade. É importante referir que saúde sexual e reprodutiva não se limita apenas ao controle de natalidade, antes, a sua efetivação consiste na garantia da dignidade humana, logo, é uma tratativa não individualista.

Para dirimir estas barreiras é necessário que se reconheça as fragilidades do sistema de saúde ao mesmo tempo que se pense em estratégias governamentais eficazes. Estas não devem se limitar a dependência de projetos realizados por organizações não governamentais ou instituições privadas isoladas, mas também considerar ações autóctones como identificar o número de unidades de saúde que fornecem acesso a informações e serviços, a qualidade dessas informações e a qualificação de todos os profissionais presentes nessas unidades. Associado a isso, é preciso considerar os diversos determinantes envolvidos no processo de forma contínua, para que assim reverbere na diminuição das iniquidades e garanta a integralidade do cuidado5050 Lemos A. Direitos sexuais e reprodutivos: percepção dos profissionais da atenção primária à saúde. Saúde debate. 2014; 38(101):244-53.,5151 Souza KV, Tyrrell MAR. Os fatos & atos relacionados ao (difícil) exercício dos direitos sexuais e reprodutivos: em recortes, o processo de viver de um grupo de mulheres de classes populares. Texto contexto – enferm. 2007; 16(1):47-54..

Assim, se coloca como desafio a continuidade no estudo sobre as nuances implicadas na garantia da saúde sexual e reprodutiva, de forma acessível e de qualidade por parte da comunidade feminina africana e mais especificamente a angolana. E que ao fazê-lo, leve-se em conta a violação de direitos que estas mulheres vêm sofrendo ao longo dos tempos, para que assim as intervenções sejam feitas por elas, com elas e para elas.

  • Suporte fnanceiro: não houve

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Editado por

Editora responsável: Maria Lucia Frizon Rizzotto

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2024

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2023
  • Aceito
    03 Out 2023
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