RESUMO
Este artigo parte da compreensão de interdisciplinaridade como modo de operar face às visões fragmentadas presentes nos processos de produção e de socialização do conhecimento. Objetiva compartilhar reflexões que problematizam a interdisciplinaridade a partir da experiência de formação acadêmica na pós-graduação de um grupo de pesquisa cujos integrantes expressam diversidade de formação e inserção profissional e se debruçam sobre relações entre políticas públicas, saúde e necessidades das pessoas. As reflexões foram elaboradas com base em questões emergentes nos encontros sistemáticos do grupo, que foi tomado como estratégia teórico-metodológica, e sustentadas a partir do diálogo entre saúde coletiva, como campo de saber e de prática, e psicologia social da práxis, formulada por Enrique Pichon-Rivière. O eixo articulador dessa experiência é a formação em sentido amplo que se manifesta pelo princípio de indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão, i.e., aprender-investigar-fazer, e como autoformação em um processo mútuo e de ação reflexiva, de aprender a aprender. Nesse sentido, argumenta-se que é metaformação e só pode se dar na perspectiva de diálogos de saberes e interdisciplinares.
PALAVRAS-CHAVES
Saúde coletiva; Psicologia social; Processos grupais; Educação de Pós-Graduação; Formação profissional em saúde
ABSTRACT
This article is based on the understanding of interdisciplinarity as a way to act against the fragmented visions present in the processes of knowledge production and socialization. The objective is to share reflections that problematize interdisciplinarity from the experience of graduate academic training in a research group whose members have diverse training and professional fields and focus on the relationships between public policy, health and human needs. The reflections were based on issues that emerged during the group’s systematic meetings, and the group was understood as a theoretical and methodological strategy, and was sustained by the dialogue between collective health as a field of knowledge and practice, and the social psychology of praxis, formulated by Enrique Pichon-Rivière. The articulating axis of this experience is training in its broadest sense, manifested on the principle of the inseparability of (i.e., learning-research-doing) and as self-training in a mutual process of reflective teaching-research-outreach action, of learning how to learn. In this sense, it is argued that it is a metatraining that can only take place from the perspective of knowledge dialogues and interdisciplinarity.
KEYWORDS
Collective health; Social psychology; Group processes; Education, graduate; Health human resource training
Introdução
Pretendemos, neste trabalho, compartilhar reflexões de um grupo de estudos e pesquisa que, ao problematizar a formação em perspectiva interdisciplinar, dialoga com a produção do campo da saúde coletiva e da psicologia social da práxis.
A saúde coletiva envolve um grande debate. Convergimos para o entendimento que a qualifica como campo de saberes e práticas ao articular diferentes tipos de conhecimentos e propor mudanças significativas à saúde desde uma compreensão crítica. Do ponto de vista do saber, a saúde coletiva opera a partir de abordagem ampla e complexa cuja produção se faz considerando várias disciplinas. No âmbito das práticas, orienta ações que não se restringem ao setor saúde e se referem, entre outras, à organização e ao processo de trabalho, à reorientação da assistência, à preocupação com modos de vida e a relações entre sujeitos no contexto social. Possibilita, assim, a ampliação do campo de ação para além do paradigma biomédico e de tendências patologizantes que privilegiam o olhar sobre a doença e desconsideram a saúde como processo resultante das condições materiais e de um conjunto de fatores que revelam desigualdade social, mecanismos de opressão, modos de vida e de subjetivação.
Por transitar entre o científico e o político e exigir diálogo estreito entre várias disciplinas e tipos de saberes, a saúde coletiva representa uma produção singular no contexto brasileiro e na América Latina, propiciando a elaboração de conceitos e princípios caros frente às fragmentações do conhecimento humano com suas antinomias frente às políticas, às ações no território e ao modo de viver dos sujeitos.
Contudo, sabemos que a tarefa não é simples e muitos desafios se colocam ao considerarmos a proposição de novos marcos conceituais e seus possíveis direcionamentos para as práticas, incluída a preocupação com processos de formação estabelecidos a partir de reflexão crítica e contínua acerca da situação de saúde interrelacionada e situada em contexto histórico, social, político e econômico.
No que se refere à formação, é interessante verificar que a expressão ‘saúde coletiva’ é adotada no Brasil, ao final da década de 1970, durante o primeiro encontro nacional de cursos de pós-graduação, que reunia os programas de medicina social, medicina preventiva, saúde comunitária e saúde pública. A trajetória da pós-graduação e sua história nesse campo é relevante, conforme nos mostra Nunes11 Nunes ED. Saúde Coletiva: Revisitando a sua História e os Cursos de Pós-Graduação. Ciênc. Saúde Colet. 1996 [acesso em 2021 out 23]; 1(1):55-69. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/vFTV3BJX5pHyDRRcfGtFw3p/?lang=pt.
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, 22 Nunes ED, Ferreto LE, Barros NF. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Ciênc. Saúde Colet. 2010 [acesso em 2021 out 23]; 15(4):1923-1934. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/HyH6bX8xtyf5wfWWRbKsWkG/?lang=pt.
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, e pode ser enriquecida com as contribuições produzidas em programas que, abertos aos problemas e referenciais trazidos do campo da saúde coletiva, colocam-se em diálogos que transcendem fronteiras disciplinares.
A psicologia social, por sua vez, tal como a saúde coletiva, constitui-se como matéria híbrida, situada num ponto de confluência de várias áreas. Sua problemática específica inscreve--se e define-se como campo dos limites, das fronteiras e das demarcações, dos filtros e das passagens33 Fernandes MIA, Scarcelli IR. A queda do hífen: história, política e clínica. In: Silva Junior N, Zangari W, organizadores. A psicologia social e a questão do hífen. São Paulo: Blucher; 2017. p. 103-115. [acesso em 2021 set 12]. Disponível em: https://sites.usp.br/ppg-pst/wp-content/uploads/sites/218/2017/03/psicologiasocialquestaohifen.pdf.
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. A psicologia social da práxis, mais especificamente, revela uma complexidade na confluência de áreas, disciplinas e práticas que se ligam em modos de fazer, modos de pensar, visões de mundo que vão se construindo no campo de ação e subsidiando a práxis, de forma a sustentar os diálogos em abertura e deslocamento, como circuitos abertos.
Formulada por Enrique Pichon-Rivière, essa psicologia social foi tecida em solo latino-americano a partir da experiência dilemática do autor, herdeiro das culturas francesa e guarani, que foi impelido a integrar o heterogêneo e a convergir o diferente desde sua infância. Na maturidade, processou as múltiplas experiências de contraste e contradição, traduzindo-as em um método de análise científica da realidade que privilegia a interconexão dos fenômenos, considerando o caráter complexo e contraditório e a procura dessa contradição em todas as coisas, inclusive no pensamento humano. Desenvolveu um método de trabalho e aprendizagem instrumentado pela heterogeneidade que contribui para as interpretações do real44 Quiroga AMP. Revisão histórica: a trajetória dos autores e de suas obras – Enrique Pichon Rivière. In: Instituto Pichon-rivière de São Paulo. O processo educativo segundo Paulo Freire & Pichon-Rivière. Petrópolis: Vozes; 1985. p. 15-26..
Pichon-Rivière (1907-1977), que se formou em psiquiatria e foi um dos principais precursores da psicanálise na América Latina, autodefiniu--se como um homem da saúde pública, médico sanitarista e psicólogo social ao desenvolver seu trabalho a partir da compreensão de que a saúde se constrói comunitariamente, coletivamente55 Lema VZ. Conversaciones con Enrique Pichon-Rivière: sobre el arte y la locura. 15. ed. Buenos Aires: Ediciones Cinco; 2008.. Sua longa experiência em instituições psiquiátricas, articulada com suas várias inserções, possibilitou a elaboração de um critério de saúde e de questões importantes nesse campo. Foi enfático sobre a existência do aparato de dominação em nossa sociedade, destinado, em última instância, a perpetuar as relações de produção, ou seja, de exploração. Esse aparato inclui trabalhadores de saúde como veiculadores de uma concepção hierárquica, autoritária e dilemática da conduta, de tal modo que profissionais se tornam líderes da resistência à mudança quando tratam pessoas que necessitam de cuidado como ‘equivocadas’, podendo condicioná-las a uma situação de cronicidade66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017..
Na trajetória dessa construção, destacam-se dois aspectos teóricos estreitamente relacionados, embora oriundos de níveis de generalização distintos: a ‘concepção de sujeito’, que considera as ordens histórico-social, simbólica e da cultura como o especificamente humano; e um ‘critério de saúde’, chamado também de adaptação ativa à realidade ou aprendizagem, meio de análise das formas de relação do sujeito com o mundo, da relação constitutiva da subjetividade. Os processos de aprendizagem são objeto de investigação sistemática, entendidos como processo psicológico e fenômeno social com base em uma metodologia que considera a emergência de obstáculos na relação do sujeito cognoscente com o objeto de conhecimento.
Considerando tais perspectivas, objetivamos neste artigo, compartilhar as reflexões e indagações ligadas a uma experiência de formação acadêmica que problematiza a interdisciplinaridade como modo de operar diante das visões fragmentadas presentes nos processos de produção e de socialização do conhecimento. Tais questões, elaboradas em diálogo com pós-graduandas(os) e graduandas(os) que compõem um grupo de pesquisa articulado a dois programas de pós-graduação, têm sido suscitadas a partir da saúde coletiva e áreas afins, particularmente a psicologia social.
Esse grupo integra estudantes de graduação com pós-graduandas(os), pesquisadoras(es) e professoras(es) de diferentes unidades e profissionais de serviços públicos oriundos de políticas sociais de saúde, educação, cultura, justiça, entre outros. Pretende, desse modo, refletir os potenciais alargamentos teórico--práticos, para ambos os campos, no encontro entre saúde coletiva e psicologia social.
A experiência mencionada vem sendo desenvolvida em dois programas de pós-graduação que incluem estudantes oriundos de diversas áreas de conhecimento: ‘Psicologia social’ para obtenção dos títulos de mestrado e doutorado em Psicologia na linha de pesquisa ‘Política, Saúde Coletiva e Psicologia Social’; e mestrado profissional ‘Formação Interdisciplinar em Saúde’.
Embora não sejam programas de pós--graduação em saúde coletiva, parte das temáticas desenvolvidas foram pautadas a partir desse campo, constituindo-se pesquisas77 Rivera MFA, Romão TA, Valentim ACMSF, et al. Psicologia Social e Políticas Públicas em diálogo com saúde e educação: questões de gênero, saúde mental, justiça, violência e permanência estudantil. In: Cordeiro MP, Lara MFA, Aragusuku HA, et al., organizadores. Pesquisas em psicologia e políticas públicas: Diálogos na pós-graduação. v. 1. São Paulo: IPUSP; 2019. p. 230-250. [acesso em 2021 set 12]. Disponível em: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portalde-livrosUSP/catalog/book/413.
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que investigam processos psicossociais que ocorrem em campos de relevância na vida social contemporânea, como políticas públicas intersetoriais, e que objetivam compreender os efeitos das políticas públicas sobre a vida das pessoas, além dos tipos de lacunas que se estabelecem entre os âmbitos político-jurídico e técnico-assistencial, quando está em questão a implantação de novos programas e políticas66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017..
Nessa experiência, que prima por encontros sistemáticos, privilegia o grupo como estratégia teórico-metodológica em uma perspectiva que não dissocia ensino-pesquisa-extensão e considera em sua composição sujeitos diversos e de campos de conhecimento múltiplos que objetivam exercitar o diálogo na busca pela superação de dicotomias, assim como a dialética entre sujeito e sociedade e as necessidades sociais de saúde.
Saúde coletiva e interdisciplinaridade como movimento articulador
Saúde coletiva é entendida como um campo científico88 Birman J. A physis da saúde coletiva. Physis: Rev. saúde colet. 1991 [acesso em 2021 out 25]; 1(1):7-11. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/MGJKwBxGS4gZjRMtNMFQ8md/?lang=pt.
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, 99 Campos GWS. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e práticas. Ciênc. Saúde Colet. 2000 [acesso em 2021 out 25]; 5(2):219-250. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/mvLNphZL64h-dTPL4VBjnrLh/abstract/?lang=pt.
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, 1010 Leal MB, Junior KRC. Saúde Coletiva em debate: reflexões acerca de um campo em construção. Interface comun. saúde educ. 2012 [acesso em 2021 out 25]; 16(40):53-65. Disponível em: https://www.scielo.br/j/icse/a/jfMpnfNFpGPnf5h79dww4DJ/abstract/?lang=pt.
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, 1111 Nunes ED. Saúde coletiva: história de uma ideia e de um conceito. Saúde Soc. São Paulo. 1994 [acesso em 2021 out 25]; 3(2):5-21. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/bTHWsnDCM3h9Fpj73YGSLgn/?lang=pt.
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, 1212 Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é saúde coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-12., onde se produzem saberes e conhecimentos acerca do objeto ‘saúde’ e se operam distintas disciplinas que o contemplam sob vários ângulos. Também é tomada como âmbito de práticas, no qual se realizam ações em diferentes organizações e instituições por diferentes agentes dentro e fora do setor da saúde1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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A saúde coletiva vem se transformando e se complexificando nas últimas décadas, passando, conforme Luz1414 Luz MT. Complexidade do Campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e trans-disciplinaridade de saberes e práticas – análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde Soc. 2009 [acesso em 2021 set 10]; 18(2):304-311. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MkLhKMvH4KqDSJNgSG48VqG/abstract/?lang=pt.
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, de um modelo salubrista polidisciplinar para uma estrutura discursiva semiaberta que inclui continuamente disciplinas oriundas de diferentes campos científicos, além das variadas práticas e formas de intervenção social. Pode ser considerada como campo de conhecimento de natureza interdisciplinar cujas disciplinas básicas são a epidemiologia, o planejamento e a administração de saúde e as ciências sociais em saúde1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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. Como disciplinas complementares, podem-se considerar a estatística, a demografia, a geografia, a clínica, a genética, as ciências biomédicas básicas, dentre outras1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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No âmbito de práticas, a saúde coletiva envolve as disciplinas que tomam como objeto
As necessidades sociais de saúde, como instrumentos de trabalho distintos saberes, disciplinas, tecnologias materiais e não materiais, e como atividades intervenções centradas nos grupos sociais e no ambiente, independentemente do tipo de profissional e do modelo de institucionalização1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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Abrange, portanto, um conjunto articulado de práticas técnicas, científicas, culturais, ideológicas, políticas e econômicas que são desenvolvidas tanto no âmbito acadêmico como nas instituições de saúde, organizações da sociedade civil e institutos de pesquisa1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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. Nessa perspectiva, a saúde coletiva fundamenta um âmbito de práticas transdisciplinar, multi-profissional, interinstitucional e transetorial, que considera como marco conceitual “a superação do biologismo dominante, da naturalização da vida social, da sua submissão à clínica e da sua dependência ao modelo médico hegemônico”1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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Como sabemos, a forma de produção de conhecimento por meio de disciplinas tem origem cartesiana em seu corolário da análise, no desmembrar para conhecer, o que conduziu a ciência ocidental com base nas especialidades; um reducionismo que constrói e trata objetos simples1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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. Com a expansão científica no século XX, a produção do conhecimento passou a visar não mais a fragmentação (análise), mas a construção de objetos por meio de um processo de composição de elementos constituintes (síntese)1414 Luz MT. Complexidade do Campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e trans-disciplinaridade de saberes e práticas – análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde Soc. 2009 [acesso em 2021 set 10]; 18(2):304-311. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MkLhKMvH4KqDSJNgSG48VqG/abstract/?lang=pt.
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. Observou-se, assim, a emergência de objetos complexos, que não se subordinavam a uma aproximação meramente explicativa, mas necessitavam de compreensão1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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. Conforme Almeida Filho1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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(38), “o objeto complexo é sintético, não-linear, múltiplo, plural e emergente”, sendo que
a organização convencional da ciência, em disciplinas autônomas e até estanques, precisa ser superada por novas modalidades da práxis científica, instaurando formas alternativas de disciplinaridade1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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Esse processo levou a uma abertura das fronteiras científicas, sendo necessário voltar para a polissemia resultante do cruzamento de diferentes discursos disciplinares, o que vem sendo chamado de interdisciplinaridade1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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. A interdisciplinaridade implica uma axiomática comum a um grupo de disciplinas conexas e, ao se sustentar sobre uma problemática comum, pode gerar aprendizagem mútua, que não ocorreria por uma simples adição1515 Almeida Filho N. Transdisciplinaridade e o Paradigma Pós-Disciplinar na Saúde. Saúde Soc. 2005 [acesso em 2021 set 10]; 14(3):30-50. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/FHKgcx975Y5CB-SR75SwMnKF/abstract/?lang=pt.
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A saúde coletiva foi atravessada por esse processo histórico e observou a emergência de objetos complexos em seu campo, o que tornou necessária sua transformação. Como afirma Granda (1994), citado por Paim e Almeida Filho1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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, para se estudar o processo saúde--doença, passou a ser necessário considerar os sujeitos sãos e enfermos não apenas para explicá-los, mas compreendê-los e construir potencialidades de ação.
O que é que define um furacão? Não é a medida da pressão barométrica, não é a velocidade dos ventos, não é a variação de temperatura, não é nada disso (que se pode estimar com um alto grau de precisão) mas é tudo isso, unificado em uma totalidade integral que se reconhece como o furacão, porém que não se reduz às suas medidas1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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Tal qual o furacão, o objeto da saúde co-letiva é complexo e não pode ser reduzido às suas partes1313 Paim JS, Almeida Filho N. Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Rev. saúde pública. 1998 [acesso em 2021 set 12]; 32(4):299-316. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/PDRmKQr7vRTRqRJtSgSdw7y/abstract/?lang=pt.
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Luz1414 Luz MT. Complexidade do Campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e trans-disciplinaridade de saberes e práticas – análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde Soc. 2009 [acesso em 2021 set 10]; 18(2):304-311. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MkLhKMvH4KqDSJNgSG48VqG/abstract/?lang=pt.
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reflete sobre a irreversibilidade dessa complexidade e sobre a irredutibilidade da saúde coletiva a um paradigma monodisciplinar, proveniente dos campos da biologia, das ciências humanas e sociais, das tecnologias das ciências aplicadas à saúde ou de planejamento e gestão. Sendo assim, na saúde coletiva coexistem diferentes modelos discursivos de saberes disciplinares, práticas de intervenção e formas de expressão científica, constituindo um campo hierarquizado de saberes, práticas e agentes1414 Luz MT. Complexidade do Campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e trans-disciplinaridade de saberes e práticas – análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde Soc. 2009 [acesso em 2021 set 10]; 18(2):304-311. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MkLhKMvH4KqDSJNgSG48VqG/abstract/?lang=pt.
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Ainda que as ações desenvolvidas no âmbito da saúde coletiva não estejam delineadas como disciplinas, podemos pensar que são referenciais, visões de mundo que podem ser consideradas como um esquema conceitual referencial e operativo, tal qual proposto por Pichon-Rivière1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005..
Psicologia social da práxis e interdisciplinaridade como ação-reflexão
A psicologia social da práxis expressa o pensamento de Pichon-Rivière em um esquema que sistematiza um conjunto de conceitos gerais e teóricos, cuja finalidade é dar conta de uma realidade para guiar uma ação sobre ela. Esse conjunto de conceitos, elaborados a partir do método dialético, está referido a um setor do real e a um determinado universo do discurso, permitindo a aproximação instrumental a um objeto particular concreto, e foi nomeado Esquema Conceitual, Referencial e Operativo (Ecro)1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005.. Entende que toda e qualquer investigação coincide com uma operação, pois não há indagação que não modifique a situação na qual emergiu.
Na abordagem de um campo de conhecimento, construir um esquema nessa perspectiva é importante no sentido de conduzir uma atitude autocrítica, i.e., que retifica ou ratifica, que faz análise semântica e sistêmica, e por incluir aspectos motivacionais referentes à verticalidade do sujeito que determinam os modos de abordar a realidade55 Lema VZ. Conversaciones con Enrique Pichon-Rivière: sobre el arte y la locura. 15. ed. Buenos Aires: Ediciones Cinco; 2008.. No caso do Ecro pichoniano, lança-se mão de três grandes campos disciplinares: as ciências sociais, que refletem a macroes-trutura, o sujeito situado na estrutura social e na cultura a que pertence; a psicanálise, que considera as identificações inconscientes na constituição do esquema referencial subjetivo e sobre as vicissitudes subjetivas nos processos de mudança; e a psicologia social, que oferece noções importantes sobre grupo, conceito de papel.
A psicologia social pichoniana está inscrita em uma perspectiva de crítica da vida cotidiana, tem como ponto de partida a prática e aborda o sujeito imerso em suas relações sociais, em suas condições concretas de existência, investiga a relação dialética e fundante entre a ordem sócio-histórica e a subjetividade. Trata-se, portanto, de um objeto de grande complexidade que expressa a multiplicidade de processos e de relações que mutuamente se determinam e se afetam.
Como campo operacional privilegiado onde habitam estrutura social e fantasias inconscientes do sujeito em inter-relação, o grupo é instrumento de investigação e ação. Estrutura-se a partir do interjogo de mecanismos de assunção e atribuição de papéis numa tarefa, que constitui sua finalidade. Permite a investigação do interjogo entre o psicossocial – o intrapsíquico, o grupo interno das cenas de interação internalizadas pelo sujeito – e o sociodinâmico – o intersubjetivo, o grupo externo – por meio da observação das formas de interação. Essa investigação sempre se dá em três direções: a psicossocial analisa o sujeito por meio de seus vínculos e relações interpessoais; a sociodinâmica analisa as diversas tensões que existem entre os membros do grupo; e a institucional investiga os grandes grupos, sua estrutura, origem, composição, história, economia, política, ideologia1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005..
O conjunto de contribuições presentes nesse esquema conceitual oferecido por Pichon-Rivière permite a compreensão horizontal, da totalidade comunitária, e a vertical, do sujeito nela inserido, de uma sociedade que está em permanente mudança, bem como dos problemas de adaptação do sujeito a seu meio.
Como instrumento, portanto, permite planejar um manejo das relações com a natureza e seus conteúdos, nas quais o sujeito se modifica a si mesmo e modifica o mundo, num constante interjogo dialético22 Nunes ED, Ferreto LE, Barros NF. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Ciênc. Saúde Colet. 2010 [acesso em 2021 out 23]; 15(4):1923-1934. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/HyH6bX8xtyf5wfWWRbKsWkG/?lang=pt.
https://www.scielo.br/j/csc/a/HyH6bX8xty... (171).
É uma perspectiva que indica uma visão integradora do ‘homem-em-situação’, objeto de uma ciência única, ou interciência, localizado numa determinada circunstância histórica e social. Para Pichon, essa visão é alcançada por meio de uma epistemologia convergente, na qual “todas as ciências do homem funcionam como uma unidade operacional, enriquecendo tanto o objeto do conhecimento como as técnicas destinadas à sua abordagem”1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005.(170).
Assim, refletimos sobre a possibilidade de considerar a interdisciplinaridade como ação--reflexiva a partir da perspectiva dessa visão integradora, mediadora de circuitos abertos que produzem aprendizagens diversas, simultâneas e transformadoras.
Psicologia social da práxis e saúde coletiva: tecendo pontes
A partir do esquema conceitual proposto por Pichon, baseando-se em uma perspectiva multidimensional dos problemas sociais emergentes no processo de trabalho em saúde e considerando seus aspectos subjetivos, pode-se pensar que, embora se valorizem as diferentes dimensões de um mesmo problema, é comum a tentativa de discriminá-las, como se algo que vem do social atravessasse o sujeito e logo voltasse para o social1717 Bauleo A. Notas de psicologia e psiquiatria social. São Paulo: Escuta; 1988., como elementos independentes. Porém, a partir da perspectiva pichoniana, não é possível o estabelecimento de tais limites, dessa forma. Ao mesmo tempo, uma indiscriminação, uma não consideração de limite algum promove ansiedades que obstaculizam a elaboração de conhecimento e paralisam os processos de trabalho e aprendizagem.
Essa situação pode ser exemplificada pela própria experiência de Pichon-Rivière no contexto da formação de profissionais no Hospício de Las Mercedes nas décadas de 1930 e 1940, em Buenos Aires, Argentina. Ele pôde verificar que um dos grandes problemas estava na impossibilidade de elaborar saberes adquiridos pela prática, ou saber operatório, e na falta de informações por parte desses profissionais sobre o processo de adoecimento e no modo de lidar com as pessoas internadas. Considerou, assim, os obstáculos epistemológicos e epistemofílicos, que se configuram em causas importantes para a paralisia dos processos de trabalho no campo da saúde.
Os obstáculos epistemológicos dizem respeito às noções de disposição ou de carência de estruturas cognitivas e conceituais necessárias para uma determinada tarefa, enquanto os obstáculos epistemofílicos se ligam às resistências à mudança, resultantes dos medos básicos do ataque e da perda66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.. A tentativa do grupo de se proteger de tais questões manifesta-se a partir de um processo de paralisia ou de estancamento da aprendizagem no qual o grupo passa a lidar com o conteúdo da aprendizagem de forma estereotipada1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005..
Isso impede a abertura para a incorporação de elementos novos, já que só se admite os conteúdos do conhecimento antigo. Pode-se, assim, refletir sobre o caráter complexo do trabalho interdisciplinar, considerando tais proposições. Diante de uma situação nova, que exige o abandono de antigas concepções, se explicita a falta de saberes que ofereçam algum tipo de segurança e depara-se com a indefinição em relação aos limites das diferentes práticas.
É fácil imaginar tal situação no campo da saúde na contemporaneidade, em que tantas mudanças sociais, políticas, econômicas vêm se instalando. No âmbito do trabalho, por exemplo, os medos que se expressam pelos trabalhadores podem ser compreendidos também como medo da perda da identidade profissional, o que emerge como fonte de ansiedade, que se refere também à falta de noção de limite66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.. Essas angústias, contradições e ambiguidades ligadas às relações grupais no cotidiano de trabalho no campo da saúde representam as dicotomias do pensamento, as lacunas entre instituição, ideias e práticas.
Pichon-Rivière, a partir de suas experiências no campo da saúde mental, pôde verificar que o medo da loucura, relacionado a temores hipocondríacos da contaminação e do contágio, se configuravam como as mais importantes fontes de resistência à aprendizagem da psiquiatria. Isso, porque o autor percebeu que a aprendizagem no fundo significa “identificar-se com o objeto do conhecimento, penetrar literalmente nele”1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005.(108), o que promove ansiedades ligadas à fantasia de ficar preso dentro do objeto.
Além disso, observa-se, também diante de situações novas, o medo do fracasso, que é o medo de não saber, “que se expressa como medo da convivência, medo da exposição, medo de não corresponder ao que se imagina e se espera de um profissional”66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.(168). Para ele, a explicitação das fantasias inconscientes ligadas aos medos da perda e do ataque permite a superação desse obstáculo epistemofílico, superando, assim, o estancamento da aprendizagem. Isso permite um salto dialético que promove a continuidade da tarefa1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005..
Importante também considerar que, ao mesmo tempo em que mecanismos defensivos expressos no grupo diante de uma tarefa nova representam impeditivos para a construção de novas práticas, também podem representar formas de ‘adaptação ativa à realidade’ e se configurar como possibilidades de os trabalhadores resistirem às adversidades que são desafiados a enfrentar66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017..
À medida que o sujeito apreende esse objeto de conhecimento e o transforma, ele modifica a si mesmo, entrando, assim, em um interjogo dialético com o mundo66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.(174).
O medo da loucura, antes expresso pelos trabalhadores conforme afirmado, hoje pode ter sido deslocado para os limites estendidos das novas áreas de atuação66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017., o que tem sido defendido como interdisciplinaridade ou intersetorialidade no campo da saúde coletiva.
As contribuições vindas da saúde coletiva e da psicologia social da práxis nos trazem reflexões e questões acerca das dimensões de diversas ordens e áreas do conhecimento implicadas nos problemas que nos são colocados66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.. Nesse contexto, destacamos como nosso interesse a reflexão psicológica que deve ser feita a partir de uma atitude analítica que faça frente à consciência ingênua, indagando o interjogo de necessidades e satisfação66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017. e as modalidades de resposta social em cada formação social concreta.
Nesse sentido, Scarcelli66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017. propõe quatro âmbitos que auxiliam o ato de interrogar, identificar problemas e delimitar dimensões ao realizar uma análise da realidade que se pretende crítica à consciência ingênua e à vida cotidiana. Configurados como um recorte metodológico, apresentam-se como:
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Político-jurídico: indaga sobre leis, diretrizes políticas, programas governamentais e não governamentais decorrentes dessas políticas e seus aspectos legais, normas, prescrições, entre outros.
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Social-cultural: indaga sobre grupos e sujeitos, suas necessidades e demandas no contexto de proposição e implantação de políticas e práticas.
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Teórico-conceitual: indaga sobre fundamentos teóricos e filosóficos, sobre concepções que sustentam práticas, programas, diretrizes políticas, leis, etc.
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Técnico-assistencial: indaga sobre os modos de criação, implantação, implementação e desenvolvimentos de práticas de programas, diretrizes políticas e leis66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.(218).
Tais âmbitos, que não podem ser entendidos e operados separadamente, possibilitam, junto às dimensões de análise propostas por Pichon-Rivière e à vasta produção que integra o campo da saúde coletiva, agregar conhecimentos sobre os fenômenos numa perspectiva pluridimensional e interdisciplinar. Esses âmbitos referem-se a um conjunto de indagações que conduzem a reflexões a respeito de objetos e fenômenos compartilhados entre psicologia social e saúde coletiva, com vistas à produção de uma reflexão dialética, que, além de não privilegiar uma disciplina, como vínhamos discutindo, pretende não privilegiar também qualquer dimensão do campo da saúde para que este não seja reduzido à mera assistência nos serviços, por exemplo.
Com isso, registra-se a amplitude do conceito de saúde, das ações e práticas produzidas nesse contexto, pretendendo enfrentar as tendências frequentes de burocratização e de agir instrumental, como estereotipia descrita por Pichon, que acabam por simplificar o complexo processo saúde-doença, assim como a atuação e investigação nesse campo66 Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017..
(Meta)formação na pós-graduação
A experiência do grupo aqui considerado, ainda que não esteja inscrita num programa de pós-graduação de saúde coletiva, tanto tem se pautado em como trazido contribuições para esse campo nos últimos quinze anos. É um grupo que se articula considerando a proposição de interciência, ou epistemologia convergente, conforme enuncia a psicologia social pichoniana; tem como pós-graduandas(os) discentes com tipos de formação tais como psicologia, sociologia, educação física, terapia ocupacional e moda e inserções profissionais nas áreas da saúde, educação, justiça. Além disso, vem desenvolvendo pesquisas que problematizam políticas públicas em setores como saúde e educação, na interface com gênero, saúde mental, justiça, violência e permanência estudantil77 Rivera MFA, Romão TA, Valentim ACMSF, et al. Psicologia Social e Políticas Públicas em diálogo com saúde e educação: questões de gênero, saúde mental, justiça, violência e permanência estudantil. In: Cordeiro MP, Lara MFA, Aragusuku HA, et al., organizadores. Pesquisas em psicologia e políticas públicas: Diálogos na pós-graduação. v. 1. São Paulo: IPUSP; 2019. p. 230-250. [acesso em 2021 set 12]. Disponível em: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portalde-livrosUSP/catalog/book/413.
http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/por...
. Desse modo, as pesquisas trabalham a partir de áreas afins que também operam nas fronteiras.
Tal experiência se desenvolve a partir da compreensão que seu próprio eixo articulador é a formação em sentido amplo que inclui a autoformação, de modo a oferecer o desenvolvimento de postura aberta para transitar entre diferentes modelos teórico-práticos, sem perder a especificidade do conhecimento e da atuação na área e, desse modo, assumir gradativamente a responsabilidade por sua própria formação, compreendida como contínua e permanente.
O sentido é amplo também ao se ter como princípio a indissociabilidade do tripé ensi-no-pesquisa-extensão, ou seja, do aprender--investigar-fazer. Isso, porque há pesquisas cujos objetos são as atividades de extensão e há projetos de extensão que se constituem como campo de investigação; além de as interlocuções entre professoras(es), profissionais e pesquisadoras(es) serem, essencialmente, atividades de ensino e extensão. Assim, tal experiência afirma e aprimora a indissociabilidade desse tripé, seja em disciplinas da estrutura curricular, na articulação entre as atividades-fim do ensino de graduação, pós--graduação, pesquisa, cultura e extensão, assim como no fortalecimento de projetos vinculados às políticas públicas e sociais e ao investimento em políticas de permanência estudantil.
Compreensão similar estende-se também ao contexto do trabalho em saúde, propondo-se integrar o tripé educação permanente, pesquisa em serviço, ou sistematização de experiência, e assistência-gestão na formação contínua para os setores sociais.
A formação em sentido amplo é, portanto, o metaobjetivo desse grupo que, conforme nos ensina a psicologia da práxis, refere-se a processos de aprendizagem, de adaptação ativa à realidade, como um itinerário em espiral contínua e “um aprender a aprender e um aprender a pensar”1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005.(162) que integram estruturas afetivas, conceituais e de ação (sentir-pensar-fazer).
Tal compreensão está na base do desenvolvimento de atividades requeridas na pós-graduação, principalmente no modo de conduzir as orientações de pesquisa e as disciplinas oferecidas na estrutura curricular.
Uma disciplina incluída como parte dos dois programas aqui considerados é ofertada a discentes de diferentes unidades da universidade, o que tem se refletido em participações desde diversas áreas do conhecimento e práticas. Essa disciplina objetiva discutir temas relacionados às políticas públicas e à implantação de práticas na área de saúde e saúde mental, a partir de questões e conceitos formulados no campo da psicologia social tais como intersubjetividade, grupos, instituições; e refletir criticamente sobre desafios à pesquisa em psicologia social no campo das políticas públicas de saúde, tomando-as não de modo naturalizado, mas como resultado de processos sociais complexos compostos por tensões, conflitos e lutas entre distintos interesses e projetos de sociedade. É um modo de indagar e problematizar a política pública e a estrutura social, vendo Estado em uma perspectiva ampla, não apenas reduzido à burocracia do poder executivo que implanta as políticas públicas destinadas a uma dada população.
Essa disciplina agrega pós-graduandas(os) com formação em diferentes áreas e oriunda(os) de outros programas de pós-graduação da própria universidade e de outras. O desenvolvimento da prática pedagógica adotada, que é participativa e inspirada na técnica operativa1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005., possibilita um processo de avaliação contínua, o que tem favorecido a constituição de uma rede de diálogos entre estudantes e profissionais que atuam em diferentes setores sociais, especialmente no setor público de saúde, que transcende o período no qual foi realizada, resultando em outras atividades, como eventos e ações, ciclos de aulas abertas que colocam o Sistema Único de Saúde em debate e possibilitam a participação da comunidade externa à universidade.
As tradicionais orientações previstas nos programas de pós-graduação foram reformuladas, de modo a seguir a perspectiva pedagógica dialógica e fundamentações teóricas sobre processos grupais, e oferecidas prioritariamente na modalidade grupal, possibilitando apoio à formação e autoformação de pós--graduandas(os) a partir do debate de suas pesquisas e incentivo para compartilhamento de investigações. Essa ferramenta colabora para a consolidação de grupos de pesquisa e para o aprimoramento da atitude investigativa necessária à produção de conhecimentos e à construção de práticas. Tais atividades didáticas e pedagógicas em perspectiva participativa adotam um diálogo constante com o outro no contexto social, sendo esse um processo de criação no qual todos se recriam.
O diálogo igualitário é de fundamental importância para ensino-aprendizagem, embora considerando que, dissociada do ato investigativo e da produção de conhecimento, a formação corre o risco de se restringir a mero treinamento ou a formas de qualificação que resultem menos em atitudes criativas no processo de trabalho e mais na adaptação de pessoas a alguma lógica burocratizada.
Considerações finais
A experiência de formação aqui considerada, construída na relação docente-estudante e no grupo aprendendo a aprender, reflete e problematiza a formação como objetivo transversal no ensino superior, com a noção de interdisciplinaridade como confluência de diferentes campos de saberes e fazeres. Ao privilegiar o grupo como estratégia teórico-metodológica, como técnica operativa, trabalha em um circuito aberto, que privilegia a aprendizagem por meio da problematização e dos deslocamentos que possam emergir. Isso é possível, pois o grupo é cenário imediato da experiência, de determinação recíproca entre sujeitos, de interdependência entre o intrassubjetivo e o intersubjetivo, entre o sujeito e o contexto vincular.
Além disso, é experiência que se inspira no modo de compreender educação como paideia1818 Jaeger W. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes; 1986. para pensar a formação em sentido amplo que se manifesta na instituição acadêmica pelo princípio de indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão e, além de seus limites como aprender-investigar-fazer, pela disposição contínua para abertura e por meio da autoformação.
Tal tarefa revela a complexidade com a qual nos deparamos no encontro entre áreas e visões de mundo que se põem em jogo na construção de uma práxis; no entendimento de que toda e qualquer investigação e prática não só indagam, mas modificam o saber e a prática1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005..
Destaca-se também o caráter complexo desse trabalho, pretendido interdisciplinar, ao considerarmos que as situações desconhecidas, novas, exigem o abandono de um saber fazer e, por isso, apresentam-se como ameaçadoras, como obstáculos epistemológicos e epistemofílicos1616 Pichon-Rivière E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes; 2005., como carência de estruturas cognitivas e conceituais que se manifestam como resistência à mudança, operando em um fazer estereotipado, fechado e burocratizado.
Enfim, o trabalho do grupo de pesquisa aqui considerado tem sido mobilizador e implicado, necessário ao diálogo interdisciplinar, de acordo com a psicologia social da práxis, por meio de atuações integradoras, mediadoras da circulação de discursos com a finalidade de aprendizagem mútua das disciplinas, como ação-reflexiva. Em diálogo com a saúde coletiva, tem nos ensinado que esse pode ser um dos modos de romper com o fazer de adição ou sobreposição de saberes para poder operar sobre uma problemática comum a tarefa que nos articula: a saúde.
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Suporte financeiro: não houve
Referências
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2Nunes ED, Ferreto LE, Barros NF. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Ciênc. Saúde Colet. 2010 [acesso em 2021 out 23]; 15(4):1923-1934. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/HyH6bX8xtyf5wfWWRbKsWkG/?lang=pt
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5Lema VZ. Conversaciones con Enrique Pichon-Rivière: sobre el arte y la locura. 15. ed. Buenos Aires: Ediciones Cinco; 2008.
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6Scarcelli IR. Psicologia Social e Políticas Públicas: Pontes e Interfaces no Campo da Saúde. São Paulo: Zagodoni; 2017.
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7Rivera MFA, Romão TA, Valentim ACMSF, et al. Psicologia Social e Políticas Públicas em diálogo com saúde e educação: questões de gênero, saúde mental, justiça, violência e permanência estudantil. In: Cordeiro MP, Lara MFA, Aragusuku HA, et al., organizadores. Pesquisas em psicologia e políticas públicas: Diálogos na pós-graduação. v. 1. São Paulo: IPUSP; 2019. p. 230-250. [acesso em 2021 set 12]. Disponível em: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portalde-livrosUSP/catalog/book/413
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Jan 2023 -
Data do Fascículo
Oct-Dec 2022
Histórico
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Recebido
28 Out 2021 -
Aceito
14 Jun 2022