Open-access O fim da ditadura militar no pensamento político de Raymundo Faoro: republicanismo, democracia e ordem patrimonialista

The end of the military dictatorship in the political thinking of Raymundo Faoro: Republicanism, democracy and the patrimonialist order

Resumo

Este artigo reconstrói as reflexões de Raymundo Faoro nos anos que marcaram o fim da ditadura militar brasileira de 1964. Nele, serão utilizadas como fontes obras, artigos científicos, colunas de opinião e entrevistas concedidas pelo autor entre 1977 e 2002. O estudo aponta, por um lado, uma visão negativa de Faoro sobre o processo de transição democrática, entendido como um rearranjo conservador de elites, apresentando, dessa forma, a evidente centralidade dos conceitos de patrimonialismo e estamento burocrático na interpretação do intelectual. Por outro, seus pronunciamentos demonstram um conceito substantivo de democracia e revelam a influência de temas do republicanismo clássico em seu pensamento político.

Palavras-chave:
Raymundo Faoro; ditadura militar; democracia; pensamento político brasileiro; pensamento social brasileiro

Abstract

This article reconstructs Raymundo Faoro's reflections on the years that marked the end of the military dictatorship that first took power in Brazil in 1964. It uses as sources studies, academic articles, opinion columns and interviews given by Faoro between 1977 and 2002. The study points to his negative view of the democratic transition process, understood as a conservative rearrangement of elites; at this time, the centrality of the concepts of patrimonialism and bureaucratic state in the intellectual's interpretation is evident. On the other hand, Faoro's pronouncements demonstrate a substantive concept of democracy and reveal the influence of classical republican themes on the author's political thought.

Keywords:
Raymundo Faoro; military dictatorship; democracy; Brazilian political thinking; Brazilian social thought

Introdução

No final do século XX, Raymundo Faoro teve forte atuação na luta contra a ditadura militar brasileira como advogado, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), jornalista, acadêmico e intelectual público, concedendo entrevistas e publicando artigos de opinião em diferentes revistas do país. Esta pesquisa tem por objeto de estudo a produção intelectual do autor no momento político de fim da ditadura, que se inicia com a política de “distensão” de Ernesto Geisel, e a transição do regime autoritário para o democrático, cujo marco central foi a promulgação da Constituição Federal de 1988. Através da análise do material produzido por Faoro nessas diferentes frentes de atuação política e intelectual, é realizada uma reconstrução de suas principais reflexões sobre a abertura democrática. O estudo traz dados que contribuem para dois debates importantes acerca da interpretação de Faoro: os usos analíticos e normativos da categoria de patrimonialismo estamental em sua obra; e a localização do autor em discursos do pensamento político brasileiro.

Sua obra de maior relevo histórico, Os donos do poder, apresenta uma interpretação de amplo alcance da sociedade brasileira: a presença contínua de uma estrutura patrimonialista estamental na formação sócio-política nacional. Nela estão os dois conceitos centrais da sociologia faoriana, patrimonialismo e estamento burocrático, ambos denúncia da grande influência que a sociologia de Max Weber exerceu no autor, manuseada heterodoxamente no seu trabalho. O Brasil, para Faoro, era uma ordem patrimonial, com um poder centralizado e arbitrário, regido por um "aparelhamento político [...][que] governa, em nome próprio, num círculo impermeável de comando.”2 A este grupo social formado por governantes, burocratas e setores das elites econômicas e culturais, o patronato político brasileiro, o autor nomeia de estamento burocrático. O estamento, que foi originalmente aristocrático, “se burocratiza progressivamente, em mudança de acomodação e não estrutural”3. Isso porque “a dominação tradicional [...] na época histórica do mundo moderno, não prescinde de um quadro administrativo, cujo recrutamento se dá dentro ou fora da casa do governante”4.

A publicação de Os donos do poder se deu no contexto dos debates nacionalistas e desenvolvimentistas da Terceira República. A hegemônica aposta no Estado como condutor de transformações do país explica, ao menos em parte, a modesta recepção do livro. Em 1975, o momento era outro e Faoro trazia novo estofo para a crítica ao autoritarismo vigente no país, sendo recebido como instrumento na luta contra a ditadura militar (Jasmin, 2003).5

Apresentada no livro, a proposta sociológica de Raymundo Faoro polemizava com alguns modelos explicativos do Brasil. Negando um suposto passado feudal do país, dava continuidade a uma tradição em crescimento que remonta a Caio Prado Jr. Postulando a autonomia do Estado e examinando o poder político exercido em causa própria, rompia com esquemas marxistas que explicavam o país fundamentalmente pela dinâmica de classes (Schwartzman, 2003). Todavia, foi somente a partir de 1975 que Faoro passou a integrar o cânone de referências teóricas das ciências sociais brasileiras (De Brito, 2018), posto que é frequentemente atribuído ao fato de ter sido ele o primeiro a se utilizar sistematicamente de categorias weberianas no Brasil, especialmente a de patrimonialismo (Ricupero; Ferreira, 2006).6

Uma primeira ordem de debates sobre o autor refere-se à introdução do patrimonialismo estamental como conceito explicativo de nossa história. Luiz Werneck Vianna (1999) enxerga duas vertentes interpretativas da categoria no Brasil: o patrimonialismo da sociedade civil de Florestan Fernandes e Maria Sylvia de Carvalho Franco, para quem a ordem patrimonial prevalece no mundo privado estruturado pela escravidão, pela dominação oligárquica e pela pobreza do Estado, e o patrimonialismo do Estado de Faoro e Simon Schwartzman. Rubens Campante (2003) traça de modo aprofundado a história dos usos da categoria e suas relações com Faoro. Por um lado, Maria Sylvia de Carvalho Franco (1997) e José Murilo de Carvalho (1979) negam o caráter estamental na estratificação brasileira, relativamente fluída para ambos. Por outro, Florestan Fernandes (2006) caracteriza como estamento as camadas proprietárias brasileiras. Já Antônio Paim (1998), apesar de reconhecer o patrimonialismo no Brasil, caracteriza-o como modernizante, não conservador. Fernando Uricoechea (1978) identifica a burocracia patrimonial, mas vê nela um vetor de racionalização da esfera pública. Simon Schwartzman (2007), autor mais próximo de Faoro, diagnostica a primazia do patrimonialismo no desenvolvimento brasileiro e sua associação com padrões autoritários do país, apesar de incorporar parcialmente críticas como as de Paim e Carvalho. Ao cunhar o termo neopatrimonialismo, busca afastar um caráter absoluto e a-histórico que a análise de Faoro possuiria.

Na obra de Faoro, a categoria de patrimonialismo estamental informa o diagnóstico de um país não moderno, atrasado pela herança ibérica, de capitalismo politicamente orientado, onde a sociedade civil é sufocada e coagida por um esquema oligárquico de poder, local no qual não se formou uma classe propriamente burguesa e o desenvolvimento econômico, o empresariado e as classes industriais são atados, dependentes e imiscuídos ao poder público e ao patronato político. Uma segunda ordem de debates sobre Faoro refere-se ao lugar desta interpretação na tradição de pensadores políticos e sociais do Brasil.

Há uma compreensão, informada por Werneck Vianna (1999) e avançada por Jessé Souza (2008) e Fernando Henrique Cardoso (2013), de que a obra de Faoro o coloca na tradição de críticos do Estado e propagandistas da sociedade civil, sendo sua agenda a do liberalismo político e econômico. Bernardo Ricupero e Gabriela Nunes Ferreira (2005; 2006) e Gildo Marçal Brandão (2007) contestam a completa filiação de Faoro à interpretação estatista do processo histórico brasileiro. Para os três, há, no autor, um pessimismo analítico que não encontra soluções políticas para o país. Segundo Ricupero e Ferreira, o impasse advém de uma visão negativa do privatismo nacional que ecoa argumentos de Oliveira Vianna.7 Rubens Campante (2009) e Juarez Guimarães (2009) situam Faoro no discurso político do republicanismo, apontando como objetivo de sua obra a “formação da cultura republicana brasileira” (Guimarães, 2009, p. 78). Finalmente, Leonardo de Brito (2018) aceita como válidas as interpretações “pessimistas” e republicanas do pensamento faoriano.

Este trabalho será estruturado para melhor exposição dos seus resultados de pesquisa da seguinte forma: a primeira seção debaterá a interpretação de Faoro sobre a transição democrática, destacando como os conceitos de patrimonialismo e estamento burocrático informam sua visão negativa sobre o processo. Nela, serão apresentados argumentos que ora atestam críticas às categorias faoriana, ora as afastam. Já a segunda seção será dividida em dois subtópicos. O primeiro realizará um esforço compreensivo do conceito de democracia que Faoro manuseia em seu ativismo, demonstrando que se trata de um conceito substantivo no qual ideias de legitimidade, participação, igualdade e sociedade de classes são importantes. E o segundo demonstrará que as ideias de liberdade e cidadania contestatória da teoria republicana clássica influenciam o seu pensamento político, adicionando elementos para a literatura composta por Campante (2009), Guimarães (2009) e De Brito (2018).

Transição democrática: a nova roupa do estamento

O processo político que desaguou na redemocratização iniciou-se em 1974, sob o comando de Ernesto Geisel e Golbery de Couto e Silva; a política da distensão de Geisel, porém, intencionava liberalizar o regime ditatorial, não o democratizar. João Figueiredo deu continuidade ao projeto, recheado de ambiguidades, avanços e retrocessos liberalizantes, sob o nome de política de abertura (Condato, 2005). Para além da movimentação da cúpula do poder e dos rearranjos institucionais, Raymundo Faoro diagnosticava mudanças nas décadas de 1970 e 1980 que indicavam alterações profundas e consequentes no país.

O ano de 1973 marcou o final do chamado “milagre econômico” brasileiro e o rebote veio na forma de uma crise econômica. Para Faoro, a tecnocracia, ou seja, o exclusivismo do discurso técnico-oficial mesclado ao poder estatal era uma característica do regime militar e, no geral, dos regimes autoritários.8 Com suas promessas de eficiência de gestão e resultados econômicos, o regime esperava assentar a sua legitimidade. “Passada a borracheira, com a ressaca, não sobrou nem a eficiência nem a legitimidade.”9 A “ressaca” ainda desaguaria em uma maré grevista, de intensidade inédita no regime militar, entre 1978 e 1980. O intelectual apontava que aquela movimentação sindical tinha novos contornos no país, denunciando uma nova consciência política dos atores grevistas: “se encurtou, com a tendência a desaparecer, o espaço entre as reivindicações salariais, de natureza puramente econômica, e as reivindicações políticas.”10 Faoro percebia também uma alteração no ambiente público de debate: escândalos, acusações, denúncias, críticas que antes eram subterrâneas e sufocadas agora “duram e se encadeiam”.11 Entre 1983 e 1984, a campanha de Diretas Já tomava as ruas. Nela, o gaúcho enxergava mais do que uma ofensiva pela eleição direta, divisava uma vocalização “mais ampla e mais profunda, que põe em discussão o regime e o sistema, no seu espectro político e social.”12 Havia um novo país rompendo os diques de contenção: urbano, trabalhador, industrializado, inserido no sistema de produção, com uma opinião pública de independência inédita13.

Faoro enxergava, portanto, o Brasil em uma situação de crise - conforme o filósofo da história, Jacob Burckhardt, um momento de potencialidades e aceleração da história14. Percebendo tal crise, ele trabalhou para acelerá-la. Entre 1977 e 1979, ocupou o cargo de presidente da Ordem de Advogados do Brasil, tornando-a uma das grandes associações da sociedade civil engajadas na luta pelo fim da ditadura. A OAB foi a primeira instituição a assumir uma denúncia pública de tortura por parte dos militares. Faoro, pessoalmente, tornou-se interlocutor do governo Geisel na luta pelo retorno do habeas corpus, enquanto utilizava a estrutura institucional que presidia para advogar pela pauta, ao lado da defesa da independência do Ministério Público, das garantias da magistratura, do fim da censura, da anistia ampla e incondicional e da necessidade de convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte (Curi, 2008).

Raymundo Faoro esteve presente também na imprensa, publicando e dando entrevistas constantes sobre a situação do país. Nelas, o intelectual realizava seu diagnóstico da lenta abertura do regime: a transição se desenhava como um rearranjo elitista, uma conciliação oligárquica tocada pelo patronato político brasileiro. Aqui está presente o tipo de raciocínio de Os donos do poder que valoriza a temporalidade histórica na política e trajetórias de longa duração. Como foi a passagem do Império para a República e da Colônia para o Império, o estamento conservador brasileiro toca suas reformas através das lições ibéricas do absolutismo esclarecido de Pombal e de Dom João VI: “avançar para que, quando os outros chegassem lá, você já tivesse feito, à sua maneira, aquilo que os outros poderiam ter feito”15, ou seja, fazer antes que o povo faça, controlando e estancando o reformismo pelo alto.

Os dados que apontavam para essa conclusão eram vários: a gradual e inconstante liberalização do regime; a forte resistência contra as eleições diretas; o estreito alargamento da cúpula dirigente do governo e a cooptação de setores civis para a transição pelo alto;16 a formação da Aliança Democrática, a união do Movimento Democrático Brasileiro com membros dissidentes do Partido Democrático Social, partido alinhado ao sistema militar;17 a eleição indireta, em 1985, de José Sarney, político que, para Faoro, carregava a ideia udenista da ditadura como um regime educador da política nacional;18 a manutenção, no governo civil, de mecanismos de segurança da ditadura e da base de sustentação conservadora e empresarial;19 a continuidade da vigília e da interferência militar na política em questões como a reforma agrária, a lei de greves, a restrição à anistia;20 e a permanência da garantia da ordem interna na órbita do Exército.21 A presença dos militares na política, mesmo com a gradual ascensão civil, garantia alta atenção de Faoro que, constantemente, opinava sobre a temperatura da caserna. A possibilidade de não aceitação de algum resultado eleitoral e um rearranjo dos setores conservadores com o Exército permanece nas suas preocupações até pelo menos 1998.22

Todavia, o maior atestado de permanência do pacto estamental para Faoro foi o controle sobre o processo de constitucionalização do Brasil. O estrato militar da ditadura resistiu, por um período, à própria ideia de realizar uma Constituinte no país, propondo liberalizar o regime através de emendas constitucionais à carta vigente de 1967. O movimento pela reconstitucionalização ganhou tração, mas, já a partir de 1984, a Aliança Democrática, oposição à ditadura, aventava a tese de que a Constituinte deveria ser tocada pelo congresso eleito no próximo ciclo eleitoral. Esse foi o projeto que venceu e, em 1985, José Sarney convocou a Assembleia Constituinte, criando também a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais para elaborar um anteprojeto a ser apresentado aos congressistas. Faoro é um crítico ferrenho de ambas as propostas.

Para ele, a ideia de transformar o Congresso em uma Assembleia Constituinte, sem que tivesse sido eleito pelo sufrágio direto com os plenos poderes de uma Assembleia Constituinte, significava colocar a sorte dos congressistas em suas próprias mãos. “Entre os constituintes, eleitos pelo povo, e o governo, formado com as sobras da mobília do regime em despedida, haveria um elo macio de transições, transigências e transações.”23 Buscando lições da história constitucional, o intelectual denuncia que o paradigma do modelo proposto, do Constituinte pela via do Congresso, é o do “simulacro” de 1967, não os de 1891, 1934 e 1946 - que, ressalta, padeceram também de outros vícios e “trapaças”. No primeiro caso, o Congresso, mais ligado ao próprio governo e às estruturas institucionais que o elegeram e mais afastado dos anseios reais da sociedade, “fez, construiu e fabricou as instituições. Inventou, em última instância, um povo para servi-lo e obedecer-lhe.”24

O problema de origem se agrava pelas deficiências propositais do sistema eleitoral do período. O Colégio Eleitoral brasileiro era eleito com distorções regionais que torturavam a igualdade do valor do voto e as proporcionalidades demográficas: “na Câmara dos Deputados, São Paulo vale, por eleitor, 0,6; [...] em contraste, o Acre entra, por eleitor, com o peso 9,4; Sergipe com 2,3; Roraima com 14,5”25. Essa manipulação dos mapas eleitorais era a estratégia que imperava desde 1964, “feita sob medida para domesticar a soberania popular”.26 O Norte e o Nordeste, super-representados, eram, para Faoro, as regiões do coronelismo mais pungente do país, onde o controle do eleitorado por mecanismos financeiros ilegais e pela violência per si ainda alcançavam grandes proporções. Finalmente, a própria manipulação econômica das campanhas eleitorais, financiadas por representantes das oligarquias nacionais, distorciam a livre competitividade política.27 Na verdade, a oposição à ditadura empunhava essas críticas durante a campanha das Diretas Já: “o Congresso não podia, pela sua representatividade deficiente, eleger o presidente da República. Entende-se agora que ele pode fazer o mais, ele que era, até ontem, inapto para fazer o menos.”28

O projeto era, portanto, manter o “país do coronelismo, da rédea central dos favores, das verbas e dos subsídios, o país politicamente arqueológico, no qual o mandonismo se cruza às nomeações burocráticas”, ou seja, o país patrimonial, no controle dos “conflitos e dissídios do país industrial e moderno”, “numa conjuração estamental do Brasil velho contra o Brasil contemporâneo.”29 A transição democrática propagada pelos setores civis que então adentravam na cúpula do patronato político tratava-se “de sair de onde se está, com a delicadeza de não inquietar quem está sentado e de prometer as cadeiras ocupadas a quem está de pé, aguardando sua vez.”30 Na acidez típica dos textos de Faoro do período está a denúncia da exclusão sistemática do povo, seja enquanto corpo eleitoral ou como sociedade civil organizada, de reconstrução da realidade política do país. Permanecia no estamento burocrático brasileiro a demofobia das elites do século XVIII: o povo, “na visão das cúpulas, seria a reunião amorfa e explosiva de pecados e cobiças [...] ele seria imaturo, incapaz de se governar, manipulável pelos grupos radicais”31.

É perceptível, na análise negativa que Faoro realiza do processo de abertura política, a compreensão expressa em Os donos do poder de que o estamento burocrático brasileiro tem historicamente a capacidade de moldar-se para novos arranjos institucionais na medida em que as alterações autônomas da sociedade as tornam inadiáveis. Chegava o momento, portanto, do estamento adaptar-se às vestes democráticas, sem largar as rédeas das mãos32.

Esta exposição da interpretação de Faoro joga luz sobre certos aspectos da categoria de patrimonialismo estamental no autor. Em primeiro lugar, a análise corrobora a crítica que José Murilo de Carvalho (1979) endereça à ideia de estamento burocrático em Faoro: a sua inespecificidade, isto é, a ausência de uma definição sistemática dos atores e grupos que constituiriam o estamento. No decorrer dos anos estudados, Faoro adiciona diversos grupos ao “patronato político brasileiro”: a cúpula militar, integrantes do MDB, do PDS, da Aliança Democrática, Sarney e seu círculo próximo de governo, setores da burocracia estatal e da elite econômica. Não há, contudo, um esforço sistemático de delimitação.

Os dados também permitem notar com clareza que as críticas dirigidas por Faoro no período se endereçam não ao Estado per si, em um recorte liberal anti-estatista e laissez faire, mas à sua apropriação por um estamento conservador que o instrumentaliza para seu próprio interesse. Ao contrário das interpretações de Jessé Souza (2008) e Fernando Henrique Cardoso (2013), é Rubens Campante (2020) quem caracteriza o sentido normativo da crítica ao patrimonialismo em Faoro. À frente, outros argumentos serão expostos para corroborar essa afirmação.

Ainda, o trabalho suaviza a crítica à suposta imutabilidade e a-historicidade da análise faoriana (Schwartzman, 2007). No período, o autor esteve atento e interessado em rearranjos e transformações sociais do país, dedicando-se à análise de um país crescentemente urbano, industrializado, inserido no sistema de produção, com um ascendente no novo sindicalismo e uma opinião pública de autonomia inédita. Além disso, Faoro diferencia geograficamente distintas dinâmicas de dominação política (ponto importante para Schwartzman) ao debater o sistema eleitoral brasileiro. É certo, todavia, que reafirma a tensão dessas transformações com o patronato político, resultando em um rearranjo do estamento, que mostra nova capacidade de adaptação.

O que acompanha o argumento da adaptabilidade do estamento, que se veste então de democrata, é outro: o de que o resultado dessa transição - ou transação estamental - não será uma verdadeira democracia.

A democracia pode ser o resultado da “democratização”, mas não necessariamente. [...] Democratização houve quando se sublevou o Terceiro Estado, em 1789. Democratização existiu com a Revolução Russa. A democratização esteve presente com o surgimento da República de Weimar, em 1919. Modestamente, ela deu sinais de si em 1945, com o ostracismo de Vargas. Palidamente, ela frequentou a ascensão de Tancredo Neves. Em nenhum desses momentos, entretanto, a “democratização” amadureceu na democracia. No lugar da última, despontou a tirania militar, a burocracia despótica, o prólogo hitlerista, uma oligarquia renovada. As forças conservadoras criam, na democratização, uma caricatura democrática.33

O que seria, então, uma autêntica democracia para Raymundo Faoro?

Em busca da democracia

Elementos de um conceito substantivo de democracia

A grande necessidade do processo de democratização do país é fundar a nova ordem política sob a legitimidade. Tal imperativo, além de ser doutrinário e normativo, também é operacional, ou seja, uma condição para a fundação, o funcionamento e a manutenção da democracia.

Nenhum poder político, argumenta o autor citando a filósofa alemã Hannah Arendt, é baseado exclusivamente nos meios de violência, na força (poder nu); a força sozinha não é capaz de engendrar uma ordem política. Os Estados operam através do poder e da autoridade, nas conceitualizações weberianas clássicas dos termos: a probabilidade de impor a sua própria vontade sobre o outro e a probabilidade de ter um comando acatado por outro, respectivamente. Porém, conforme ensina Rousseau, o mais forte nunca é tão forte para ser sempre o senhor, e a ordem calcada somente no poder só dura enquanto opera com eficiência. Por sua vez, a autoridade pressupõe um mínimo de voluntária aceitação à ordem, o que a distingue é justamente o seu momento de voluntarismo por parte de quem acata. A autoridade só existe quando há alguma crença na legitimidade da ordem. Ao se realizar pela legalidade em uma ordem jurídica, a legitimidade existe com uma densidade por trás e acima das leis o que garante a sua eficiência. É ela que engendra coesão e estabilidade, porque se propaga no tempo para além da capacidade de mando do governo; na realidade, quando existe autoridade, o poder possui papel acessório. A legitimidade é, portanto, um conceito empírico, histórico e descritivo, que torna a ordem política possível:

Nenhum dos regimes autoritários, civis ou militares, estruturados de cima para baixo, conseguiu entrar na rotina institucional. Funcionaram, às vezes, com transitória eficiência, enquanto seus guardas mantiveram o dedo no gatilho. Argentina, Uruguai, Espanha, Portugal, Grécia. Aí está o que acontece com a ilegitimidade, aqui e em toda parte, categoria que nada tem de teórica ou de jacobina, ao contrário do que supõem os golpistas de vários continentes e de muitos climas.34

Numa chave interpretativa weberiana do Estado e da ordem política, Faoro faz da legitimidade uma condição sine qua non da democracia enquanto sistema de governo real no mundo:

A legitimidade, que vem de baixo, ao contrário do poder, supõe, no momento em que apela para a crença, uma racionalidade orientada em direção a valores. É este conceito imanente de legitimidade que impede que se tome por democracia o cesarismo e a autocracia eletiva. Há, portanto, na legitimidade, um momento que permeia a própria legalidade formal e se materializa em valores. O Estado pressupõe a existência de valores políticos materiais, que prescindem, para se concretizar, do feitio natural e para os quais é insuficiente o direito positivo, que legitimam a comunidade política e a consolidam internamente. Esta é, na verdade, a versão atualizada, ainda que não a literal, das teses de Max Weber, construídas e completadas a partir de sugestões, não raro fragmentárias, que sua obra oferece.35

Legitimidade, por sua vez, não se confunde com legalidade. Se a legalidade contradiz a realidade social, está em dissonância com a sociedade, ela não engendra autoridade e legitimidade, mas só consegue se fundamentar no poder. E a única maneira de garantir que a legalidade espelhe a sociedade ou, nas palavras de Faoro, que a constituição semântica se torne uma constituição normativa, é garantindo a participação da sociedade na construção cotidiana da ordem política e, por consequência, de suas leis. A capacidade de reivindicar, barganhar, argumentar e ver suas posições representadas e a participação no processo decisório garantem a aceitação dos seus resultados. “A legitimidade [...] atinge sua plenitude na participação das decisões políticas.”36

Criticando a teoria elitista da política (Mosca, Pareto e Schumpeter) e se contrapondo a ela, bem como a teóricos do conceito minimalista ou procedimental de democracia, para quem “a legitimidade é uma questão ininteligível”, “um extravio da realidade” e um “juízo ético”37, Raymundo Faoro expõe uma teoria da democracia que retira o enfoque das elites e da sua operacionalidade, colocando-o na relação entre sociedade e Estado, dando à democracia um elemento substantivo, não apenas formal.

Nessa perspectiva, democracia também é coisa diferente de - ou então: é mais do que - liberalismo político. O constitucionalismo moderno sem dúvidas tem origens liberais: sua questão fundamental é a harmonia entre a sujeição à ordem social e a manutenção da liberdade, seu aspecto definidor é o controle do arbítrio e do poder e a criação de freios aos poderes governamentais. O Estado de direito, a divisão dos poderes, a afirmação dos direitos individuais são elementos constitutivos de uma democracia. Contudo, “ocorre que, historicamente, o liberalismo não foi, na sua origem, democrático, senão burguês e, em muitos resíduos, aristocrático.”38 Foram alterações sócio-históricas que semearam o germe igualitário e participativo presente no liberalismo político e “não se tardou a verificar [...] que o controle do poder, imposto para resguardar e garantir a liberdade, criou uma cadeia de direitos, solidariamente vinculados e em permanente expansão.”39 Em outra passagem, com poder de síntese, tem-se: “a democracia, pode-se afirmar, democratizou o liberalismo, expandindo-o em direção a direitos concernentes à participação social.”40 Vale ressaltar que Faoro diferencia liberalismo econômico de liberalismo político e, se concilia este último com a democracia, isso se dá justamente, porque ele “se divorciou do seu reverso econômico”41.

Em termos práticos, isso significava para o Brasil que apenas uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva, eleita de modo representativo e com intensa participação da sociedade, poderia ser capaz de criar uma democracia autêntica no país. A transição como transação poderia reformar o regime e a institucionalidade, liberalizando-o, construindo um Estado de direito, abrindo o processo político para uma ordem relativamente mais competitiva e fundando uma democracia em seu sentido puramente formal, na qual o estamento burocrático, sob nova roupagem, continuaria controlando o processo decisório. Todavia, sem a verdadeira inserção da população, a “democratização” jamais resultaria em uma democracia.

A leitura de textos e entrevistas de Faoro no período também permitem compreender elementos importantes da face substantiva da democracia no autor. A primeira delas é que a entrada em uma ordem democrática tem por condição alterações na sociedade que, em contradição direta com o sistema político, geram tensões insuperáveis e tornam as mudanças inevitáveis. A democracia, portanto, possui uma face social que é uma sociedade de classes e industrial.

Tema importante de Os donos do poder, Faoro não enxerga no Brasil um país propriamente capitalista, mas sim um capitalismo politicamente orientado em que o estamento se sobrepõe às classes sociais. Nas últimas décadas do século XX, o autor ressalta com frequência sinais de transformação. Um dos sinais da crise do regime militar era justamente o “novo país” - urbano, trabalhador, industrializado, inserido no sistema de produção - que colocava o regime de 1964 em tensão. Essa transformação social não deveria e nem poderia ser um projeto tecnocrático de elites estatais, conforme a tradição da política brasileira, dedicada a sucessivos projetos de “modernização” que não são “mais do que um fim subjetivo de um grupo de pessoas, incapaz, por não se irradiar como força interna, de se incorporar à história”42. “O desenvolvimento não pode ser a matéria de decretos”43, ele é um processo que não necessita de comandos externos para se realizar e que envolve todo o corpo social, altera a dinâmica de classes e os papéis sociais vigentes; é um fato com origens na própria sociedade.

Faoro espera dessas mudanças sociais a constituição de uma verdadeira sociedade de classes no Brasil. Para ele, a anulação das classes sociais, resultado do projeto político dos setores conservadores brasileiro, “provoca uma manipulação estamental.”44 O Brasil precisa da ascensão do burguês, do capitalista moderno, “a classe-chave”45 que coordena e organiza - em antítese ao estamento que dirige e conduz - a transformação capitalista capaz de modernizar a sociedade e o Estado em direção à ordem burocrático-legal. Na exata mesma importância, precisa da ascensão do proletariado enquanto classe organizada, com consciência de classe e expressão política que leva a ampliação do Estado de direito para sua forma democrática. Esta para Faoro é uma lição histórica: depois das revoluções burguesas, “a emergência de novas classes sociais e grupos, antes tidos por subalternos e privados de voz, levou a que se ampliasse e se desse corpo à igualdade, por força da crescente participação no direito de votar e nas decisões públicas.”46 Daí Faoro lamentar o estado do sindicalismo brasileiro, “muito fraco, que se emancipa do poder público com muita dificuldade, que vive ainda do Imposto Sindical [...] e leva uma vida muito precária”,47 defender o direito à manifestação e greve dos trabalhadores, pois “é preciso que se entenda que a greve nada mais é que uma maneira de o trabalhador reivindicar”48 e entusiasmar-se com a fundação e a atuação do Partido dos Trabalhadores nos anos 1980 e 1990, “um partido que surgiu de dentro do operariado”,49 um instrumento da classe operária brasileira, uma esquerda legítima, “condição sine qua non para se ter um instrumento de consciência da cidadania”.50

A democracia substantiva de Faoro possui um teor participacionista, moldado pela sua associação entre legitimidade e participação. Sua consequência lógica é que a democracia pressupõe direitos políticos, de associação e de opinião. O que se deve destacar é que Faoro entende a participação democrática como algo que vai além do processo eleitoral representativo: a participação popular “simplisticamente não é redutível à eleição, nem se identifica à posse do título eleitoral.”51 É o constante intercâmbio entre a sociedade e o governo o melhor produtor de políticas públicas eficientes. Isso significa a organização civil de órgãos autônomos do Estado e da burocracia. Também significa voltar ao “abandonado arsenal da democracia direta.”52 O autor não explora amplamente este último tema, mas uma pista sobre o seu significado é sua visão positiva sobre a experiência do orçamento participativo na gestão de Tarso Genro, do Partido dos Trabalhadores, na cidade de Porto Alegre entre 1993 e 1996.53

A democracia substantiva de Faoro também possui um evidente teor igualitarista. Os primeiros vestígios desse igualitarismo estão nas reformas que o intelectual defendia como parte do processo brasileiro de democratização: nova legislação sobre o sindicalismo; nova lei de greves; aumento real do salário mínimo; reforma agrária; taxação sobre ganhos de capital; e políticas amplas de redistribuição de renda. Todas elas apontam para uma associação entre democratizar as instituições e também o tecido social do país, entre democratização e o enfrentamento dos gigantes problemas de desigualdade de renda. “Mais cedo ou mais tarde o problema do desequilíbrio social, que é o problema número 1, terá de ser enfrentado. O Brasil não escapa disso”.54

Para além de um problema humanitário, a desigualdade social e econômica distorce o processo democrático, engendrando o fenômeno do coronelismo, do mando eleitoral, da compra de votos, do domínio econômico. A participação política qualificada exige condições básicas de existência e acesso à informação. Em um ciclo virtuoso, a entrada das classes vulneráveis na política gera as pressões para a criação e a manutenção de tais condições. Para que não haja dúvida, Faoro afirma: “Democracia significa igualdade. E distribuição de renda. Significa que, se o cidadão tiver um emprego, ele tem a vida dele resolvida.”55.

Republicanismo clássico no pensamento político de Raymundo Faoro

Elencados os elementos constitutivos do conceito de democracia em Faoro, será apontado aqui que tal conceito, e consequentemente parte do pensamento político do autor, é informado por temas e argumentos do republicanismo clássico.

De modo amplo, o republicanismo clássico é uma tradição de pensamento que tem suas origens em Roma, criada a partir da herança aristotélica, repensada por Políbio, Cícero e Tito Lívio e recuperada na Renascença por Maquiavel, Guicciardini, Harrington e Sidney. A escola é caracterizada fundamentalmente por três grandes ideias:

A primeira ideia é que a igual liberdade de seus cidadãos, em particular sua liberdade como não dominação - a liberdade que deriva de não viver sob o poder de outro - é o principal objetivo do estado ou da república. A segunda é que, se a república deve assegurar a liberdade de seus cidadãos, então ela deve satisfazer uma gama de restrições constitucionais amplamente associadas com a constituição mista. E a terceira ideia é que, se cidadãos devem manter a república em linha, então eles devem ter a virtude individual e coletiva para acompanhar e, se necessário, contestar políticas públicas e iniciativas: o preço da liberdade é vigilância eterna (Pettit, 2013, p. 170, tradução nossa).

Pelo menos duas dessas ideias estão presentes, com as devidas qualificações, nas reflexões de Raymundo Faoro. Aquela que provavelmente é o tema central do republicanismo clássico é também o que aparece mais consistentemente nas reflexões de Faoro: a noção de liberdade.

Para os autores da tradição, uma pessoa é um “liber, ou um homem livre, na medida em que possui suficiente poder e proteção na esfera de liberdades básicas” (Pettit, 2013, p. 173, tradução nossa). Em contraste com a tradição liberal de pensamento, que entende a liberdade em seu conceito negativo, concebendo-a como natural e pré-estatal, a liberdade para os neoromanos é um estado “derivado de viver em um governo bem ordenado” (Skinner, 2003, p. 18, tradução nossa). Desse modo, liberdade é um conceito diretamente associado ao de cidadania ou, em uma formulação sintética, “liberdade pode simplesmente significar ‘cidadania’” (Lewis apud Pettit, 1993, p. 168, tradução nossa). Aqui, a condição para a liberdade não está cumprida se um homem está sujeito à dominação de outro; para que ele seja livre, não basta que não sofra nenhuma interferência, é necessário que também esteja previamente protegido, com garantias contra qualquer interferência não legítima. Essa noção de liberdade como não dominação significa que “na construção republicana, o real inimigo da liberdade é o poder que algumas pessoas podem ter sobre outras, enquanto no entendimento liberal, assimetrias interpessoais não são em si censuráveis” (Pettit, 1993, p. 166, tradução nossa). Como resultado, a lei não necessariamente restringe a liberdade, o rule of law na realidade “oferece uma perspectiva de segurança não disponível sob o domínio de indivíduos todo-poderosos” (Pettit, 1993, p. 166, tradução nossa). Também como consequência, liberdade está fortemente ligada à autodeterminação dos indivíduos, inclusive na esfera da res pública (coisa pública), na qual eles não podem estar submetidos ao arbítrio de seus governantes.

Faoro pensa a liberdade política nesses termos. Para ele, “no momento em que a liberdade natural se converte em liberdade política, a exclusão alcança apenas uma categoria especial de vínculos, perdendo sua significação qualificadamente negativa” e “o que entendemos por liberdade política é, dessa forma, no fundo, a autonomia”.56 Assim como na relação entre liberalismo e democracia, a liberdade liberal (ou moderna) é importante, pois estabeleceu barreiras que garantem os direitos invioláveis ao Estado,57 apesar de não esgotar o conceito. Citando Rousseau, um republicano da tradição franco-germânica (Pettit, 2013), em um argumento que faz todo o sentido em uma chave neorromana e nenhum em uma liberal, Faoro afirma: “Os homens [...] sob o império da vontade geral, devem ser forçados a ser livres. O que está aí escrito, para espanto de muitas gerações, é que os cidadãos devem ser libertados de todas as dependências dos particulares, cujo poder se condensa em desigualdades econômicas e sociais.”58 Na mesma linha, o autor enxerga uma relação positiva entre lei e liberdade, reivindica a superação da “arcaica antinomia entre Estado e liberdade” e afirma: “O Estado não será, pelo fato de ser Estado, o inimigo da liberdade, para que não se converta em dogma a presunção válida em favor da liberdade dos indivíduos.”59 Mais uma vez, aqui está clara a imprecisão das interpretações que entendem Faoro como um autor antiestatista (Souza, 2008; Cardoso, 2013).

Uma segunda ideia do republicanismo é a de que os cidadãos de uma república livre, se assim quiserem mantê-la, devem permanecer em estado de constante vigília, num ideal que os estudiosos chamam de cidadania contestatória - “uma cidadania comprometida a interrogar os outros elementos do governo e ter sua própria voz na determinação de leis e políticas” (Pettit, 2013, p. 171). Não há dúvidas de que Raymundo Faoro valoriza uma cidadania contestatória e a compreende como condição sine qua non de uma ordem democrática. Em seus textos, a participação relaciona-se reciprocamente com a legitimidade da ordem política, gera bons resultados e mantém a liberdade dos cidadãos. Faoro notoriamente valoriza o conceito de sociedade civil, afirmando, em diversas ocasiões, a importância dela para a democracia. “A sociedade, na sua dinâmica permanente, legitima e deslegitima o poder, validando ou desclassificando a autoridade.”60

Esses dois temas jogam luz sobre os elementos substantivos do conceito de democracia de Faoro. A liberdade em perspectiva republicana é conceitualmente igualitarista e participacionista. A exigência da não dominação frente aos governantes implica uma série de liberdades e direitos políticos; a não dominação na esfera privada, por sua vez, implica uma sociedade mais igualitária social e economicamente, com uma estrutura estatal protetiva dos menos favorecidos, o que exige do Estado uma participação positiva e interventiva no mundo social. O ideal de cidadania contestatória, por óbvio ligado ao de liberdade, aprofunda ainda mais as exigências participacionistas do republicanismo: apenas a constante e ativa contestação da sociedade frente ao governo é capaz de manter um regime de liberdade - em Faoro, raciocínio explícito no ciclo virtuoso entre igualdade, participação e legitimidade.

Há ainda dados concretos que indicam a relação do pensamento político de Faoro à tradição republicana. Os estudos em teoria republicana ganharam notoriedade a partir de 1970, com as publicações de autores como John Pocock, Quentin Skinner e Anthony Pagden. Não suficientes as proximidades em estilo de argumento e a coesão lógica entre essas ideias e o conceito de democracia do brasileiro, o autor estava ciente da existência da tradição republicana, bem como dos então contemporâneos estudos sobre o tema. Em Existe um pensamento político brasileiro?, Faoro aborda o debate, discute o clássico texto de Benjamin Constant A liberdade dos antigos comparada à dos modernos, aponta o “teor participativo” da liberdade dos antigos, demonstra ciência da diferença desta para o liberalismo político e lamenta a deslegitimação “dogmática” do republicano Rousseau. Citando diretamente As fundações do pensamento político moderno de Quentin Skinner61, ele afirma: “O Renascentismo europeu, além de privilegiar a ideia da nacionalidade, com a nota tônica posta na soberania interna, fixa o contorno da ideia de liberdade. O conceito, desde então, em que pese o tegumento retórico que o envolve, significa independência e autogoverno.”62

Finalmente, alguns comentários podem ser traçados sobre a relação de Faoro com a ideia de constituição mista. Para os neorromanos, um governo estável e que garante a liberdade deve conter em si elementos dos três tipos de governo na tipologia de Políbio: o aristocrático, o monárquico e o democrático. Em Maquiavel, esse argumento significa a exigência de compor um governo com as classes que constituem uma sociedade complexa. A saúde dos Estados não é resultado da harmonia social, mas do conflito; em seus Discorsi, são os conflitos entre o Senado e a plebe que mantiveram Roma livre e favoreceram a criação de leis benéficas à liberdade. A tradição de pensar a política através de categorias de classes é abandonada pelo liberalismo político e reaparece como motor do processo histórico em Karl Marx (Bobbio, 1997).

No limite, é possível dizer que existe uma aproximação no modo de pensar a política entre Faoro e os neorromanos. O conflito de classes possui centralidade para a forma como o autor pensa a formação e o funcionamento de uma democracia: é ele quem cria as condições sociais para uma ordem autenticamente democrática e é a capacidade do Estado de canalizar e representar esses conflitos que gera bons resultados políticos. Para os republicanos clássicos, “a presença de classes e especialmente as disputas que possam existir entre elas são vistas como normais e como parte do exercício da liberdade republicana” (Da Silva, 2015, p. 36), bem como para Faoro: “a sociedade democrática é por essência conflituosa.”63 Todavia, trata-se de uma aproximação menos consistente. A pesquisa não encontrou referências diretas a autores da tradição neorromana nas discussões de Faoro sobre o tema. A visão da sociedade como essencialmente conflituosa é típica de boa parte da reflexão sociológica e do pensamento político moderno e a canalização dos conflitos sociais pelo Estado não é uma ideia exclusiva dos republicanos clássicos.

Considerações finais

A análise do material produzido por Faoro no final da ditadura militar de 1964 aponta para três elementos. O primeiro seria uma interpretação negativa da abertura democrática, entendida como um movimento estamental que não alterou a ordem patrimonialista brasileira. Um segundo elemento seria a existência de um conceito substantivo de democracia no pensamento do autor, com demarcadores típicos do liberalismo político, mas também informado por ideias de legitimidade, participação, igualdade e sociedade de classes. Já o terceiro refere-se à influência das ideias de liberdade e cidadania contestatória do republicanismo clássico em seu pensamento político.

Com enfoque na teoria democrática de Faoro, o artigo contribui para a literatura que o aproxima do republicanismo, composta pelos estudos de Juarez Guimarães (2009), Rubens Campante (2003, 2009) e Leonardo de Brito (2018)64.Para Guimarães, trata-se de uma chave interpretativa capaz de atravessar toda a obra do autor: “Faoro foi o primeiro entre nós a construir uma narrativa de longa duração a partir do critério da liberdade política, entendida em sua chave republicana, como autogoverno de cidadãos autônomos.” (Guimarães, 2009, p. 80).

O estudo confirma, todavia, um caráter ressaltado por De Brito (2018) no pensamento de Faoro: a tensão entre o analítico e o normativo. A pesquisa traz dados que elucidam os fins normativos de Faoro e o horizonte político de seu ativismo. No nível analítico, ela aponta uma atenuação do pessimismo que autores identificam em Os donos do poder. Parte desse pessimismo viria do diagnóstico de uma sociedade organizada politicamente composta por bandidos e caudilhos (Ricupero; Ferreira, 2006) e de um povo “desvalido, supersticioso, castrado, sebastianista, resignado, incapaz, parasitário, abúlico” (Campante, 2009, p. 137). No período aqui estudado, a caracterização que Faoro realiza do povo e da sociedade é positiva. Mas, ainda assim, o autor não acha soluções para o impasse estamental: o patronato político conduz a constitucionalização e segue capaz de resistir às transformações sociais e às pressões democratizantes. No final do século XX, Faoro não encontra no Brasil um caminho para a ascensão da sociedade de classes, para a efetiva participação popular, para a democracia.

Referências

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  • 2
    Nota sobre citações: serão extensivamente citados direta e indiretamente aqui textos de Raymundo Faoro. A referenciação dessas citações especificamente será realizada através de notas de rodapé para evitar poluir excessivamente a redação e facilitar a leitura. FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. São Paulo: Globo, 2001. p. 871.
  • 3
    Ibidem. p. 870
  • 4
    A aventura liberal numa ordem patrimonialista. São Paulo: Revista USP, n. 17, 1993. p. 16.
  • 5
    A obra passou por adições e alterações entre as edições, principalmente uma mudança de perspectiva propositiva: há uma proposta revolucionária em 1958, que se perde para uma visão mais pessimista em 1975 (Ricupero; Ferreira, 2008). O caráter geral da análise e seus principais argumentos, todavia, não foram significativamente modificados (Jasmin, 2003).
  • 6
    Faoro reconhece, no prefácio da segunda edição de Os donos, a “perplexidade que alguns leitores da primeira edição demonstraram, ante uma terminologia aparentemente bizarra” (Faoro, 2001, p. 10). Na realidade, Sérgio Buarque de Holanda já havia utilizado a categoria de patrimonialismo, com outro tratamento, em Raízes do Brasil. Guerreiro Ramos também utilizou o conceito em textos de teoria administrativa. Mas, o fato é que o uso por Faoro teve repercussões mais amplas na academia e na política brasileira (Schwartzman, 2003).
  • 7
    Ricupero e Ferreira (2005; 2006) mostram a peculiar posição que Faoro ocupa num dos debates mais longos do pensamento político nacional: o divórcio entre Estado e nação. Faoro diagnostica, como Oliveira Vianna, a inadequação das ideias e das fórmulas estrangeiras à realidade nacional, contudo, nem por isso adota seu programa de modernização pelo alto, dado o caráter patrimonial que identifica no Estado. Além disso, ele concorda com Tavares Bastos ao identificar os males conservadores da sociedade brasileira na origem ibérica, na fragilidade da sociedade civil e na centralização estatal, no entanto, nem por isso, adota o programa de reformismo institucional. Não é, portanto, nem um “privatista”, nem um estrito “estatista” (Carvalho, 1997).
  • 8
    FAORO, Raymundo. “O país é pré-capitalista” (05/01/1988). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008.
  • 9
    O sorridente encalacrado (29/09/1982). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 46.
  • 10
    FAORO, Raymundo. O equilíbrio instável (20/07/1983). In: Ibidem. p. 79.
  • 11
    Uma doença pertinaz (23/02/1983). In: Ibidem. p. 53.
  • 12
    A fogueira dos líderes (28/03/1984). In: Ibidem. p. 95
  • 13
    Contra a conciliação (31/07/1985). In: Ibidem.
  • 14
    Uma doença pertinaz (23/02/1983). In: Ibidem.
  • 15
    FAORO, Raymundo. Uma armadilha para o PT (04/01/1989). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008. p. 73.
  • 16
    O funeral da ditadura. In: Ibidem
  • 17
    A coligação dominante (30/10/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 46.
  • 18
    A democracia absorveu a ditadura (31/12/1985). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008.
  • 19
    Ibidem.
  • 20
    A coligação dominante (30/10/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018.
  • 21
    O tempo constituinte (17/02/1987). In: Ibidem.
  • 22
    FAORO, Raymundo. A apostasia de Fernando Henrique (24/06/1998). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008.
  • 23
    A razão da Constituinte (09/01/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 124.
  • 24
    FAORO, Raymundo. A razão da Constituinte (09/01/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 124. p. 125.
  • 25
    Ibidem. p. 127.
  • 26
    Ibidem. p. 127.
  • 27
    Contra a Conciliação (31/07/1985). In: Ibidem.
  • 28
    A razão da Constituinte (09/01/1985). In: Ibidem. p. 128.
  • 29
    Constituinte entre aspas (03/07/1985). In: Ibidem. p. 143 e p. 142.
  • 30
    FAORO, Raymundo. A transição e o recurso da espada (26/12/1984). In: Ibidem. p. 113.
  • 31
    Vinte anos depois (04/04/1984). In: Ibidem. p. 98.
  • 32
    A coligação dominante (30/10/1985). In: In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018.
  • 33
    FAORO, Raymundo. A “transição” passiva (12/01/1988). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 197.
  • 34
    FAORO, Raymundo. A razão da Constituinte (09/01/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 126.
  • 35
    FAORO, Raymundo. Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 48. Aqui está muito clara uma característica do weberianismo de Faoro: mesmo apropriando-se criativamente das categorias do alemão, Faoro distancia-se de diversas conclusões e implicações que Weber delas retira, especialmente seu elitismo normativo (Campante, 2009).
  • 36
    36, Ibidem.
  • 37
    Ibidem. p. 65.
  • 38
    FAORO, Raymundo. Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 12
  • 39
    Ibidem. p. 15.
  • 40
    Ibidem. p. 12.
  • 41
    Ibidem.
  • 42
    FAORO, Raymundo. A questão nacional: a modernização. São Paulo: Revista Estudos Avançados, v. 6, n. 14, 1992. p. 19.
  • 43
    Ibidem. p. 20.
  • 44
    FAORO, Raymundo. Transição, uma manobra conservadora (07/02/1990). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008. p. 84.
  • 45
    A democracia absorveu a ditadura (31/12/1985). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008. p. 37.
  • 46
    Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 15.
  • 47
    Uma Constituinte tutelada (30/12/1986). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008. p. 49.
  • 48
    Ibidem. p. 50.
  • 49
    O profeta ganha a imortalidade (06/12/2000). In: Ibidem. p. 165.
  • 50
    “A elite brasileira é marginal” (22/01/1992). In: Ibidem. p. 114.
  • 51
    FAORO, Raymundo. Ser ou não ser eleitor (03/06/1986). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018.
  • 52
    Ibidem.
  • 53
    A reeleição e o estelionato eleitoral (17/03/1999). In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008.
  • 54
    “Se o Lula for eleito e contemporizar…” (15/05/2002). In: Ibidem. p. 172.
  • 55
    FAORO, Raymundo. “Se o Lula for eleito e contemporizar…” (15/05/2002). In: In: FAORO, Raymundo. A democracia traída. Org.: DIAS, Maurício. São Paulo: Globo, 2008. p. 172.
  • 56
    FAORO, Raymundo. Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 49.
  • 57
    Existe um pensamento político brasileiro? São Paulo: Revista Estudos Avançados, v. 1, n. 1, 1987.
  • 58
    FAORO, Raymundo. Ser ou não ser eleitor (03/06/1986). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 176.
  • 59
    O Estado não será inimigo da liberdade (Carta de Curitiba). In: GUIMARÃES, Juarez (org.). Raymundo Faoro e o Brasil. São Paulo: Perseu Abreu, 2009. p. 18 e 19.
  • 60
    Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 52.
  • 61
    A concepção de liberdade republicana de Skinner se alteraria nos anos 1990, chegando a uma formulação mais próxima da de liberdade como não dominação. Já nos escritos dos anos 1980, porém, “[a] abordagem de Skinner fazia a liberdade republicana parecer uma hábil combinação entre liberdade negativa, manifesta na ausência de interferência sobre as escolhas individuais, e liberdade positiva, expressa na participação como meio necessário para proteger a área de livre atuação dos indivíduos” (Silva, 2008, p. 178).
  • 62
    FAORO, Raymundo. Existe um pensamento político brasileiro? São Paulo: Revista Estudos Avançados, v. 1, n. 1, 1987. p. 18.
  • 63
    Contra a conciliação (31/07/1985). In: FAORO, Raymundo. A República em transição. Org.: FALCÃO & FRANCO. Rio de Janeiro: Record, 2018. p. 211.
  • 64
    De Brito aponta como a face normativa de Faoro aparece em seu elogio (condicional) do liberalismo “nacional” e “irado” do Brasil no texto Existe um pensamento político brasileiro?. Expressos nos ciclos de revoltas do período colonial e imperial (Inconfidência Mineira, Revolução dos Alfaiates na Bahia e Revolta Praieira, por exemplo), esses discursos bebiam de fontes como os confederalistas norte-americanos, os jacobinos franceses, Adam Smith, Raynal, Condillac, Mably, Voltaire e Rousseau. Apesar de circular a ênfase que Faoro dá a essas fontes intelectuais, De Brito não explicita dado notável: elas eram, por sua vez, influenciadas por diferentes matrizes do republicanismo (Starling, 2018); o elogio aos revoltosos, portanto, pode ser interpretado como um elogio indireto à tradição republicana.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    29 Nov 2023
  • Aceito
    05 Ago 2024
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