Open-access A insuficiência do planejamento orçamentário como planejamento de políticas públicas

The insufficiency of budget planning as public policy planning

Resumo:

O artigo objetiva explorar a temática do planejamento de políticas públicas, em especial, a incompletude desse planejamento que vem sendo realizado sob o viés majoritariamente orçamentário. O problema da pesquisa reside na seguinte questão: por que o planejamento orçamentário é insuficiente para se planejar políticas públicas? Essa “escolha” pela matriz do planejamento orçamentário encontra explicação na própria evolução da atividade de planejamento brasileiro que será abordada na primeira parte do artigo. O retrospecto realizado demonstra a crescente influência do fiscalismo no planejamento estatal, que se soma à questão da financeirização do Estado e repercute, por consequência, na financeirização das políticas públicas. No entanto, por entender que as políticas públicas constituem a base de efetivação de direitos sociais, mostra-se necessário que o seu planejamento abranja, além dos aspectos orçamentários, elementos adicionais igualmente necessários, como a definição de objetivos, descrição do modelo decisório e organizacional. Conclui-se os aspectos orçamentários e financeiros como condicionantes únicas do planejamento não se coadunam com a efetivação dos direitos fundamentais no âmbito do Estado Social brasileiro. O método utilizado é o hipotético-dedutivo, com pesquisa e análise da doutrina pertinente para elucidação do problema enfrentado.

Palavras-chave:
Planejamento; Políticas públicas; Orçamento; Financeirização

Abstract:

The article explores the theme of public policy planning, in particular, the incompleteness of this planning, which has been carried out under a mostly budgetary bias. The research problem lies in the following question: why is budget planning insufficient for planning public policies? This “choice” through the budget planning matrix finds explanation in the evolution of Brazilian planning activity itself, which will be addressed in the first part of the article. The retrospective carried out demonstrates the growing influence of fiscalism on state planning, which adds to the issue of the financialization of the State and, consequently, has repercussions on the financialization of public policies. However, as it is understood that public policies constitute the basis for implementing social rights, it is necessary for their planning to cover, in addition to budgetary aspects, additional elements that are equally necessary, such as the definition of objectives, description of the decision-making and organizational model. Otherwise, there is a serious risk that budgetary and financial aspects will be the only constraints on planning, which are sometimes not consistent with the implementation of fundamental rights within the scope of the Brazilian Social State. The method used is hypothetical-deductive, with research and analysis of the relevant doctrine to elucidate the problem faced.

Keywords:
Planning; Public policies; Budget; Financialization.

1 Introdução

O presente artigo pretende discutir a insuficiência do planejamento orçamentário como planejamento de políticas públicas. Observa-se, no dia a dia da administração, a ausência de diretrizes claras para o planejamento de políticas públicas; serão executadas na medida do previsto na dotação orçamentária, sem maiores preocupações com outros fatores igualmente relevantes, como a delimitação de seus objetivos, modelo decisório e organizacional, fixação de metas quantitativas e/ou qualitativas que, mais a frente, permitirão a avaliação dessas políticas. Justifica-se, então, a relevância do tema em razão da incompletude dos elementos que deveriam compor o planejamento de políticas públicas. Atribui-se tal situação a própria lógica evolutiva da atividade de planejamento brasileiro, que evolui do desenvolvimentismo ao fiscalismo que, por sua vez, se atrela à financeirização das políticas públicas.

O problema orientador pode ser resumido na seguinte pergunta: por que o orçamento não pode ser tido como suficiente ao planejamento de políticas públicas? Ao se estabelecer marcos muito claros que o Estado Social brasileiro é incompatível com a financeirização das políticas públicas, busca-se demonstrar os outros elementos que devem integrar a etapa de planejamento das políticas públicas.

Objetiva-se, assim, discutir de onde nasce a lógica de que o orçamento é suficiente para o planejamento de políticas públicas, necessitando, para tanto, remeter a um breve histórico da atividade de planejamento no Brasil que evolui e se entrelaça com a própria história da financeirização: o nascimento do capitalismo industrial no Brasil na década de 1930; as sucessivas crises financeiras enfrentadas para o financiamento do capitalismo industrial dão origem às restrições de índole financeira e fiscal no Estado, levando à modificação do paradigma do capitalismo brasileiro da produção de bens para a produção de “papel”, de “ativos”. Todo esse cenário acaba por impor a financeirização das políticas públicas, na lógica do neoliberalismo.

Em um movimento contrário a esse exposto, que estabeleça como norte do Estado Social a efetivação dos direitos fundamentais pelo Estado, é salutar que o planejamento de políticas públicas se efetive em bases mais amplas que a via estrita do orçamento, a fim de que as políticas públicas tenham como pressuposto primeiro os objetivos a serem atingidos e não quanto há de orçamento para ser investido. Esses objetivos devem ser discutidos com a sociedade para a formatação do modelo decisório e organizacional, que será responsável pela fixação de metas quantitativas e/ou qualitativas que possibilitarão a adequada avaliação das políticas públicas.

O artigo se orienta pelo método hipotético-dedutivo, abordando-se na revisão de literatura autores de áreas diversas ao Direito no tocante ao histórico do planejamento brasileiro, além de uma breve revisão de literatura sobre a abordagem Direito e Políticas Públicas e Direito das Políticas Públicas para se percorrer o caminho de que a financeirização das políticas públicas é incompatível com o Estado Social brasileiro. Ao planejar “por completo” as políticas públicas, o foco do orçamento é posto em igualdade de importância com os demais elementos que devem igualmente ser objeto da decisão estatal.

2 Planejamento no Brasil: do desenvolvimentismo ao fiscalismo

Planejamento em sentido amplo como prescreve a Constituição no art. 174, não se limita ou se circunscreve ao planejamento orçamentário. A praxis que não raras as vezes se observa é a de planejar a ação governamental sob a ótica orçamentária, deixando de lado tantos outros aspectos relevantes, como a delimitação clara dos objetivos da ação estatal; os meios pelos quais a ação planejada será desenvolvida, englobando o modelo decisório e o modelo organizacional; a participação e controle da sociedade destinatária e as questões de governabilidade necessárias para a realização do planejamento e sua implementação (Administração Pública, Legislativo, Judiciário, Tribunal de Contas, Ministério Público).

Nessa linha equivocada de raciocínio, o planejamento prima pelo montante de recursos - quanto se tem a investir - a partir de um orçamento pronto, muitas vezes sem a participação efetiva da sociedade na construção de prioridades. Propõe-se, entretanto, uma mudança de perspectiva: a decisão político-administrativa na atividade de planejamento deve partir do elenco de objetivos e mecanismos de efetivação, incluindo-se nesses últimos os aspectos orçamentários e financeiros, com a necessidade de prospecção desses recursos, que pode inclusive mudar a realidade orçamentária.

Buscando investigar quais os possíveis fatores para a preponderância contemporânea do planejamento orçamentário em detrimento do próprio planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, volta-as à análise histórica do planejamento estatal brasileiro. Qual o contexto histórico em que a atividade de planejamento tem início na história republicana; os fatores que vincularam a atuação estatal às necessidades que o país enfrentava e evidenciam o comportamento do planejamento estatal da década de 19301 até os dias atuais.

Os fenômenos econômicos que se desencadeiam a partir da década de 1930 acabam contornando o cenário político que colocará o planejamento no centro da ação estatal. No campo econômico, destaca-se, inicialmente, a necessidade de transição da economia agroexportadora para a industrial, que só aconteceria se o governo abandonasse a política do café-com-leite rumo à substituição das importações. Nesse contexto, a tensão latente entre as oligarquias versus novas forças sociais advindas do processo de urbanização e início da industrialização desemboca na Revolução de 1930, que marca o fim da República Velha e o início de um novo período republicano, sob o comando de Getúlio Vargas.2

A atividade de planejamento do Estado brasileiro é, então, moldada pelos aspectos socioeconômicos (a princípio, mais econômicos do que sociais); o planejamento começa, ainda que de maneira incipiente, a ser utilizado como ferramenta, como instrumento para que o Estado alcance os fins de desenvolvimento almejados. Nessa marcha histórica, resta evidenciado que o planejamento é o mecanismo utilizado pelo Estado para promover o desenvolvimento econômico, ora de maneira mais presente (Estado interventor) ora mais distante (Estado subsidiário), a depender dos atores, dos interesses em jogo, do perfil constitucional e, principalmente, do panorama socioeconômico de cada período, sendo o desenvolvimento social quase que uma consequência daquele, ou instrumento para alcançar os fins econômicos.3 A ideia é fazer o percurso de como o planejamento estatal se comporta a partir do nascer do Estado desenvolvimentista, caracterizado pela forte carga de intervenção na atividade econômica até o Estado fiscalista, de caráter subsidiário e que atrela fortemente o planejamento ao orçamento.

Iniciando na década de 1930, o contexto político que condiciona o planejamento é, sem sombra de dúvidas, o fim da Primeira República, com a deposição do presidente Washington Luís e a ascensão de Getúlio Vargas, inicialmente empossado como Chefe do Governo Provisório e que acaba se perpetrando como Presidente do Brasil por meio de golpe civil (1937) instaurando-se a ditadura do Estado Novo, que perdura até o ano de 1945. A ideia central era a desconstituição do federalismo oligárquico e a concentração dos poderes nas mãos do Presidente, Getúlio Vargas. Para tanto, a fragmentação do poder político (oligarquias estaduais) foi substituída por um governo federal forte, com poderes centralizados, apto a elaborar as políticas econômicas necessárias à industrialização do Brasil (GOMES, 2012, p. 31).

Consigne-se, entretanto, que o processo de industrialização do Brasil dependia de “ajuda” externa, em especial, dos Estados Unidos e Europa: importação de maquinário, know-how, eventuais empréstimos ou investidores que demonstrassem interesse no Brasil. Desta forma, as duas grandes guerras impactaram o processo de industrialização do Brasil, seja pela escassez de importação de determinados produtos, forçando o Brasil a suprir, por meios próprios, parte do mercado interno, seja ainda pela própria configuração de muitos Estados estrangeiros no pós-guerra na adoção de bases do welfare state.

O ideal de um Brasil urbano e industrializado que deveria alcançar a condição de país desenvolvido se opunha ao modelo agroexportador até então característico, com centros de poder espalhados nas mãos das oligarquias cafeeiras. A necessidade que se tinha como premente era da passagem de uma economia agroexportadora para a construção de uma economia nacional voltada ao mercado interno, por meio da política de substituição de importações. Para que tal política pudesse ser colocada em prática, era necessário que a estrutura produtiva fosse adaptada às novas demandas de expansão industrial, apurando quais eram as necessidades do país a serem absorvidas pelo sistema produtivo e o dimensionamento do mercado interno (Bielschowsky, 2004, p. 25).

O impulso do processo de industrialização do Brasil em 1930 deve ser contextualizado a partir do panorama mundial da crise de 1929 que representou a recessão econômica que atingiu o capitalismo internacional a partir da década de 1920. O cenário nacional de exportação de bens primários e importação de bens industrializados exigiu que o Governo promovesse, artificialmente, um certo equilíbrio no balanço de pagamentos.

No campo das importações, houve uma combinação de controles de quantitativos com desvalorizações cambiais, fazendo com que as importações fossem reduzidas de 416,6 milhões de dólares em 1929 para 108,1 milhões de dólares em 1932 (Simonsen, 1979, p. 4). Já em relação às exportações, o Governo também teve um papel decisivo na proteção à produção cafeeira, principal comodity da época, seja pela sustentação dos preços do café, seja ainda pela queima dos excedentes. Essa intervenção do Estado na economia proporcionou um ambiente econômico favorável para a expansão das indústrias tradicionais, como as têxteis e alimentares e para o surgimento de novos setores como a metalúrgica, de produtos químicos e cimento (Simonsen, 1979, p. 4). Devido à grande dificuldade de importações em razão da Primeira Guerra Mundial e da necessidade de manutenção do equilíbrio da balança de pagamentos, a solução encontrada foi a reestruturação do parque industrial existente e ocioso e, subsidiariamente, a importação de equipamentos de segunda mão provenientes de fábricas estrangeiras atingidas pela crise (Baer, 1977, p. 18).

O grau de tecnicidade exigido para o enfrentamento, pelo Estado, de questões econômicas e sociais decorrentes do processo de industrialização até então incipientes na agenda governamental republicana, além de todo movimento crescente do welfare state e a pressão internacional da Organização Internacional do Trabalho - OIT - para o reconhecimento de legislação trabalhista, levou à criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), em 1938, que introduziu, dentre outros temas, a noção de eficiência da administração pública, o sistema de mérito para o ingresso no serviço público e a concepção de orçamento como plano de trabalho (Wahrlich, 1974, p. 30).

Foi o Dasp responsável pela elaboração do primeiro plano desse período, em 1942, intitulado “Plano Quinquenal de Obras e Reaparelhamento da Defesa Nacional. Tratou-se, em verdade, de uma lista de investimentos com característica de orçamento especial, sem que se realizasse nenhum esforço ou arranjo institucional para a execução do plano, não havendo dados oficiais sobre o grau de implementação (Daland, 1969, p. 26). Um segundo plano, também de autoria do Dasp, elaborado em 1943 intitulado “Plano de Obras e Equipamento”, para viger entre os anos de 1944-1948, de maneira mais sofisticada, foi dotado de um fundo que deveria ser provido com um bilhão de cruzeiros a cada ano. No entanto, também não se tem informações sobe o nível de execução (Daland, 1969, p. 27).

A Missão Cookie (1942-1943) foi o primeiro grande esforço de diagnóstico da economia brasileira com o objetivo de formular um programa de ação estatal, promovida de maneira conjunta com os Estados Unidos em razão do ingresso dos dois países na Segunda Guerra Mundial. Para que se identificasse qual a contribuição que o Brasil poderia dar à Guerra fez-se, preliminarmente, o estudo sobre a conjuntura e estrutura econômica da época, com vistas a orientar um planejamento de grande escala (Baer, 1977, p. 26-28).

Em um segundo ciclo da industrialização, iniciado em decorrência das restrições às importações imposta pela Segunda Guerra Mundial e a oportunidade de se alavancar a substituição das importações, a política governamental se centrou na proteção contra a concorrência externa por meio da proibição de importação de produtos com similar nacional e pela imposição de altas tarifas aduaneiras, o que resultou, entre os anos de 1947 a 1956, em uma taxa média de crescimento anual do setor secundário na ordem de 8,8% contra 3,9% em relação à agricultura (Simonsen, 1979, p. 5).

O breve panorama traçado coloca em evidência o embrião de um Estado que assume o protagonismo na determinação dos rumos da economia e passa a priorizar o desenvolvimento econômico por meio da atividade industrial - o denominado desenvolvimentismo. A influência da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe - CEPAL - no Brasil foi significativa e ajudou a moldar a agenda desenvolvimentista do país durante boa parte do século XX. Economistas e intelectuais brasileiros, como Celso Furtado,4 foram diretamente influenciados pelas ideias cepalinas e contribuíram para a implementação de políticas baseadas nessas ideias. A orientação desenvolvimentista da CEPAL proporcionou uma base teórica e prática para a busca de um modelo de desenvolvimento que priorizasse a industrialização, a autonomia econômica e a justiça social, além da adoção da tese do planejamento como mecanismo que possibilitaria o aproveitamento dos recursos das economias subdesenvolvidas (Pereira, 2011, p. 123).

Por consequência, o papel do Estado na condução do planejamento econômico assume importância capital.5 Desponta a era da intervenção do Estado na economia, figurando este como agente condutor dos rumos do desenvolvimento nacional, como forma de acelerar o ritmo de desenvolvimento econômico nos países subdesenvolvidos. Cabe ao Estado, por meio do planejamento econômico, “contingenciar recursos escassos entre objetivos concorrentes, e escalonar sua utilização eficiente no tempo e no espaço.” (Campos, 1962, p. 9). Essa influência permaneceu relevante até a crise da dívida dos anos 1980, que levou à reestruturação das economias latino-americanas e à adoção de políticas neoliberais na década seguinte. No entanto, as ideias da CEPAL continuam a ser uma referência importante para debates sobre desenvolvimento na América Latina, incluindo o Brasil.

A grande questão a ser analisada é a metodologia, o modo pelo qual o planejamento estatal foi concebido e implementado a partir do pensamento econômico desenvolvimentista. A via eleita foi a base pela qual se desenvolveu a atividade de planejamento a partir da década de 1950 e seu desenrolar tem repercussão até os dias atuais, como se demonstrará. A doutrina aponta dois tipos de planejamento possíveis: de um lado, o planejamento integral, desenvolvido pela CEPAL; e, de outro, o planejamento seccional, que tem como grande expoente o economista Roberto Campos e como exemplo prático o Programa de Metas (1956-1960).

A vertente do planejamento global/integral desenvolvido pela CEPAL no Brasil teve como expoente máximo o economista Celso Furtado. O planejamento integral parte do pressuposto que o planejamento deve ter início nas projeções globais da economia, verticalizando, ao depois, para os diversos setores. As projeções gerais possibilitam traçar um cenário de alternativas possíveis em termos de planejamento da economia e no grau de esforço exigido por cada uma delas. Ao depois, uma vez eleito o objetivo, passa-se à elaboração dos programas parciais/setoriais, que, somados, levarão ao cumprimento total do programa (CEPAL, 2000, p. 265-266).

De maneira oposta, o planejamento seccional foca na parte de maneira isolada, sem preocupação prévia com a análise do todo. Adotado pelo Brasil a partir na década de 1950, trabalha a ideia de concentrar os esforços do planejamento em setores prioritários da economia que pudessem transformar pontos de “estrangulamento” em pontos de “crescimento” ou “germinação” (Bielschowsky, 2004, p. 111), tais como setores de transporte, energia, indústrias básicas. O investimento nesses setores teria o potencial de atrair os investimentos privados. Para Roberto Campos, um dos responsáveis pela elaboração do Programa de Metas, uma das vantagens do planejamento seccional é sua exequibilidade facilitada, por deixar de vislumbrar, como no planejamento integral, uma solução prévia para questões complexas como a coordenação entre iniciativas públicas e privadas, informações estatísticas sobre a economia, cujas soluções não se vislumbram a curto prazo (Campos, 1962, p. 28).

Exemplo de planejamento seccional que influenciou sobremaneira os rumos do desenvolvimento econômico do país foi o Programa de Metas (1956-1960), no governo do presidente Juscelino Kubitschek. O Programa elencou 5 grandes áreas de atuação - energia, transporte, indústria, educação e alimentação -, distribuindo dentre elas 30 metas, mais a construção de Brasília, tida como a 31ª meta. Tais metas abrangiam apenas ¼ da produção nacional, caracterizando-se, efetivamente como plano setorial.6 Nessa perspectiva, confirma-se que as áreas prioritárias eleitas abrangeram, em sua maioria, setores que se constituiriam pontos de germinação para a industrialização brasileira e o desenvolvimento do setor privado. Mesmo havendo a previsão de metas na área de educação, em tese atrelada ao desenvolvimento de políticas sociais, é de se assinalar que o Programa se limitou à formação de pessoal técnico, em uma clara associação dessa meta aos interesses do desenvolvimento econômico subjacentes ao programa.

Se por um lado, o planejamento seccional possa parecer mais dinâmico e de mais fácil realização por parte da administração, por outro, verifica-se que a inexistência de projeções globais da economia e de um o planejamento de todas as áreas em que deva incidir a ação estatal apta a embasar a confecção dos planos seccionais, traz prejuízos ao próprio desenvolvimento do país. Nesse modelo seccional, planeja-se as partes, sem ter a ciência prévia do todo; elege-se, por critérios da política, as metas prioritárias a serem efetivadas, sem maiores respaldos de ordem técnica da conjuntura a ser modificada por meio do planejamento.

Observou-se que o Programa de Metas não buscou conciliar as necessidades de recursos financeiros nos setores abarcados pelo plano com os outros setores não contemplados, nem tampouco teve a preocupação de ajustar-se à disponibilidade global de recursos (Baer, 1977, p. 56). Ainda em relação ao Programa de Metas, a análise de sua execução demostra claramente o privilégio, por parte do Estado, do atingimento de determinados objetivos em detrimento de outros igualmente constantes no plano. E mais: o planejamento sem coordenação acabou por tornar inviável alcançar simultaneamente alguns desses objetivos. Por exemplo: o objetivo de expansão das indústrias substitutivas de importação utilizando recursos internos conflitava com a meta de estabilização de preços; a meta de equilíbrio regional foi prejudicada pela predominância da expansão industrial concentrada no sul do país recursos (Baer, 1977, p. 68-69).

Por consequência, ainda que o Programa de Metas tenha alcançado a maioria de suas metas, o Governo Kubitschek foi relutante em implantar políticas monetárias e fiscais enérgicas e manter taxas cambiais realistas, resultando em um agravamento da inflação e crise cambial que acarretou sérias distorções econômicas que repercutiram em sucessivos governos (Simonsen, 1979, p. 60). Esse fato se deve, em uma análise perfunctória, no desequilíbrio nas receitas de exportação (produtos primários da agricultura) versus importações crescentes de bens de capital, matérias primas, produtos intermediários e bens de consumo atrelados ao processo de industrialização. A preocupação governamental, naquele momento, era manter os índices de crescimento “antes de se manifestarem as dificuldades no balanço de pagamentos.” (Baer, 1977, p. 97).

Essa dificuldade na balança de pagamentos foi percebida alguns anos depois, especialmente em razão do esgotamento da política de substituição de importações e a consequente retração do crescimento da economia brasileira. A fase de euforia vivenciada entre 1957-1961 que proporcionou uma taxa de crescimento do Produto Interno Bruto de 6,9% ao ano, não se repetiu no período de 1962 a 1964, quando essa mesma taxa caiu para 3,4% ao ano, anunciado o período de estagnação econômica que viria mais à frente (Martone, 1975, p. 69).

Por consequência, esse início de estagnação econômica vivenciado a partir de 1960 e que reverberou de maneira mais aguda nas próximas décadas é a origem de um dos principais aspectos atualmente enfrentados no planejamento de políticas públicas, qual seja, a primazia do planejamento orçamentário. Se antes o planejamento para o desenvolvimento econômico pontuava diretrizes ousadas por imperativo da necessidade de industrialização do Brasil, o incremento das políticas públicas sociais na Constituição de 1988, até como resposta ao modelo anterior baseado no crescimento econômico vai ser diretamente impactado em termos de financiamento.

O planejamento governamental desenhado ao depois do Programa de Metas tinha o desafio de enfrentar o déficit no Tesouro Público, as altas taxas de inflação, perda do poder de compra da população em geral e, principalmente, lidar com o fim do período de substituição de importações que traria um período de recessão à economia brasileira. O Plano Trienal (1963-1965) que sucedeu o Programa de Metas, implementou amargas medidas de política econômica visando sanear as distorções econômicas herdadas, por meio de suspensão aos subsídios ao consumo, diminuição à oferta de crédito bancário e reajuste da taxa cambial a níveis realistas (Macedo, 1975, p. 52). Diante de uma forte pressão do funcionalismo público, foi concedido, no segundo semestre de 1963, aumento salarial de 60% a essa classe, aumentando expressivamente o déficit governamental e repercutiu, inclusive, em aumentos no nível do salário-mínimo da ordem de 56,25% (Macedo, 1975, p. 62). O aumento dos custos diminuía os lucros da iniciativa privada, que pressionavam o crédito bancário e ocasionavam a alta dos preços dos produtos. O plano não chegou a ser executado até o fim, diante das tensões sociais causadas pelas medidas impopulares e, posteriormente, pela queda do Presidente João Goulart e a instauração do Governo Militar.

O planejamento após a Revolução de 1964, sem adentrar a análise específica de cada um dos planos, traz como uma de suas principais características uma pretensa implementação de um pragmatismo racional traduzido pela “aliança tática entre militares e tecnocratas”, no que foi denominado de “autoritarismo modernizante.” (Simonsen, 1979, p. 41). Propunha-se um novo tipo de administração, onde a excessiva politização dos cargos administrativos fruto de uma política clientelista deveria ceder espaço a uma gestão mais técnica, apta a enfrentar os efeitos colaterais do fim da era da industrialização por substituição de importações, tais como as questões financeiras decorrentes - endividamento, processo inflacionário, equilíbrio da balança de pagamentos, combinada com a necessidade contínua de investimentos em infraestrutura, políticas sociais e de mitigação das desigualdades regionais.

Cite-se, como exemplo, o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG, 1964-1966), que alcançou melhor êxito em termos de técnica de planejamento se comparado ao Plano Trienal que lhe antecedeu. Isto porque, em maior sofisticação em relação aos planejamentos seccionais, adotou a prática de estudos de diagnósticos globais para se orientar a ação governamental setorial, preocupando-se, ainda, com a questão das desigualdades regionais. (Lübke, 2022, p. 92). A premissa sob a qual o PAEG se ancorou acabou mostrando-se falsa: o combate à inflação implicaria, automaticamente, no retorno do crescimento econômico. As medidas amargas ao controle da inflação, como o aumento real da carga tributária na ordem de 45% (Martone, 1975, p. 83), impactaram diretamente os preços reduziu drasticamente a capacidade de consumo. Sem expectativa do aumento do consumo, não há motivação ao setor privado para a realização de novos investimentos.

Sob o aspecto procedimental, ganha relevo na história do planejamento estatal brasileiro, os Planos Nacionais de Desenvolvimento editados a partir da década de 1970. O Ato Complementar n. 43, de 1969 fixou normas para a elaboração de tais planos, cuja execução deveria estar vinculada ao Orçamento Plurianual de Investimentos, inaugurando uma política de continuidade do planejamento. Com essa política de continuidade, vislumbrava-se, como deixa claro o I Plano Nacional de Desenvolvimento (1972-1974), “a coerência e racionalidade das decisões, mediante planejamento de longo prazo.” (Brasil, 1971, p. 17).

Sob o aspecto econômico, os Planos Nacionais de Desenvolvimento I, II e III, vigentes, respectivamente durante o período de 1972-1974, 1975-1979 e 1980-1985, enfrentam temas como a necessidade de inovação tecnológica, integração nacional, política energética, por meio da primazia da empresa privada na atividade econômica e a consequente atuação subsidiária do Estado no setor econômico. Ainda, as políticas de desenvolvimento social passam, de maneira sistemática e contínua a figurar nos Planos Nacionais de Desenvolvimento. O II Plano Nacional de Desenvolvimento, previu políticas de emprego, qualificação de mão-de-obra, integração social (PIS, PASEP, habitação, investimentos em transporte coletivo) (Brasil, 1974, p. 18-19). O III Plano Nacional de Desenvolvimento conferiu ênfase, na área educacional, à educação rural e nas periferias urbanas; na saúde, previu atendimento mais ampliado da população, por meio do Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS); no saneamento, voltou-se a priorização da implantação de redes de esgoto sanitário nas periferias das grandes cidades (Brasil, 1980, p. 12).

Ao final do período analisado (1930-1985), é possível se traçar um panorama evolutivo do planejamento voltado ao ideal do desenvolvimentismo, que condicionou, ou ao menos influenciou o período democrático: a) construção das bases estatais de uma burocracia que seria responsável pela elaboração e execução do planejamento, a partir dos comandos da política; b) prevalência do planejamento seccional/setorial, como mecanismo mais facilitado de programação da ação estatal sob o ponto de vista técnico; c) a diminuição da presença do Estado na atividade econômica na medida em que o ciclo de substituição de importações se finda; d) lenta evolução da vinculação da execução dos planos às fontes de financiamento, que ocasionou diversos desequilíbrios de ordem econômica nas finanças do Estado.

A transição para o período democrático a partir de 1985 e a promulgação de uma Constituição repleta de programas sociais em um período em que os países europeus já mostravam sinais da queda do estado social e adoção do neoliberalismo traz o desafio não só de implementação desse Estado Democrático de Direito, mas também de alavancar as bases financeiras desse novo Estado com a incumbência de efetivação de direitos fundamentais por meio de políticas públicas constitucionalizadas.

Constata-se que o desenvolvimentismo, nos termos relatados, não foi capaz de elevar o Brasil à condição de país desenvolvido; que as questões sociais se encontravam latentes foram, senão marginalizadas, tratadas de maneira pontual pelo Estado, sem o compromisso da universalização do desenvolvimento social, com políticas votadas a públicos delimitados, nem sempre coincidentes com as reais necessidade subjacentes à sociedade. Essas “falhas” do desenvolvimentismo afetavam diretamente a população e não passaram desapercebidas pelo Constituinte de 1988, constituindo-se as políticas públicas uma resposta para a construção das bases de um novo tipo de “desenvolvimento” que não privilegiasse apenas a dimensão econômica, mas que também enxergasse as necessidades sociais advindas do processo de urbanização e industrialização.

Embora o desenvolvimentismo tenha gerado crescimento econômico e modernização industrial, ele também teve efeitos ambíguos sobre a desigualdade social. O crescimento econômico foi altamente concentrado em setores urbanos e industriais, deixando de lado o setor agrário e as regiões rurais. A industrialização beneficiou principalmente as grandes cidades do sudeste, como São Paulo e Rio de Janeiro, acentuando as disparidades regionais. A industrialização acelerou a migração rural-urbana, levando milhões de pessoas a se mudarem para as cidades em busca de emprego, resultando em crescimento desordenado das cidades, com a formação de favelas e aumento da pobreza urbana. Embora tenha havido aumento no emprego industrial, os benefícios do crescimento econômico não foram distribuídos de forma equitativa. A concentração de renda aumentou, beneficiando principalmente a elite industrial e empresarial, enquanto a classe trabalhadora urbana e rural permanecia em condições precárias. As políticas sociais e de redistribuição de renda não acompanharam o ritmo do crescimento econômico. Houve falta de investimentos em educação, saúde e habitação, essenciais para melhorar a qualidade de vida e reduzir a desigualdade social.

Economistas como Celso Furtado criticaram o modelo desenvolvimentista por sua incapacidade de promover um desenvolvimento inclusivo e sustentável. Argumentaram que a dependência de capitais estrangeiros e a concentração de renda perpetuavam a desigualdade. As crescentes desigualdades sociais fomentaram movimentos sociais e sindicalistas que demandavam melhores condições de trabalho, distribuição de terra e direitos sociais. As tentativas de implementar reformas estruturais, como a reforma agrária, foram frequentemente bloqueadas por interesses políticos e econômicos dominantes, mantendo as desigualdades. Para enfrentar essas desigualdades, será crucial o desenvolvimento de políticas públicas efetivas que promovam uma distribuição mais equitativa dos benefícios econômicos, investimentos em áreas sociais e infraestrutura, e uma maior inclusão das regiões e setores mais marginalizados da sociedade.

O contrassenso a ser enfrentado pelo planejamento naquele momento de implementação do Estado Democrático era conseguir equilibrar desenvolvimento econômico e social, administrando a “herança” decorrente da execução de uma política econômica desenvolvimentista que não primou pela compatibilização entre realização de objetivos versus recursos disponíveis. A Constituição de 1988 trouxe a “ferramenta” do planejamento de longo prazo para a consecução do “desenvolvimento nacional equilibrado” (art. 174, parágrafo único). Também não abandonou a tradição do planejamento seccional ao contemplar planejamentos de saúde, educação, assistência social, o planejamento orçamentário.

O planejamento de longo prazo, infelizmente, não foi implementado no Brasil. O que se viu no período democrático foi a implementação de uma série de planos visando a estabilidade econômica e o início do desenho pela legislação infraconstitucional e progressiva implementação das grandes políticas públicas sociais como saúde, educação e assistência social. Sob a presidência de Sarney, foram implementados quatro planos econômicos: Cruzado (fevereiro de 1986), Cruzado 2 (novembro de 1986), Bresser (julho de 1987) e Verão (janeiro de 1989), que não foram exitosos no controle da inflação. Já na década de 1990, o Presidente Fernando Collor de Mello implantou dois outros planos econômicos (Plano Brasil Novo - conhecido como Collor I - e Collor II), que também não surtiram os efeitos desejados. Somente com a implementação do Plano Real (1994), que o Estado brasileiro inicia o processo de estabilização da economia.

A partir de então, o ideal da estabilidade econômica se soma a novos postulados que conferem as premissas de um Estado neoliberal: redução de seu “tamanho”, com a implementação da reforma gerencial e menor interferência na economia (Nohara, 2012, p. 93-94). Não é mais o Estado desenvolvimentista, que promove de forma direta a industrialização, a prestação do serviço, transitando “para um Estado que atue como regulador e facilitador ou financiador a fundo perdido desse desenvolvimento.” (Bresser-Pereira, 1997, p. 17). E como enfrentar, em termos práticos, este grande paradoxo: de um lado, a Constituição de 1988 inclusiva e expansiva em relação ao serviço público e políticas públicas e, de outro, uma reforma que encolhe o Estado, criando uma assincronia entre os compromissos constitucionais assumidos e a garantia de sua efetivação. Muito embora as políticas públicas de saúde e educação tenham percentuais constitucionalmente fixados de investimento, a política fiscalista que acompanha a Reforma Administrativa inviabiliza em elevado grau até mesmo essas políticas.

Surge uma nova “leva” de planejamentos seccionais para enfrentar o problema da estagnação industrial percebido desde a década de 1980, que ganha complexidade diante do aumento da participação das empresas multinacionais (Goulart, 2020, p. 110), destacando-se, de maneira exemplificativa, a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE, 2004), a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP, 2008), e o Plano Brasil Maior (PBM, 2011). No campo da infraestrutura, que também sofreu com a ausência de capacidade financeira do Estado para investimentos a partir do fim do “milagre econômico”, menciona-se a maior participação do setor privado com a concessão de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. O Programa de Investimento em Logística (PIL, 2012) buscou aumentar a participação privada nos investimentos em infraestrutura, reduzir o valor da tarifa dos serviços e melhorar sua qualidade (Carvalho, 2018, p. 83-84). Não há como se deixar de mencionar o Programa de Aceleração do Crescimento - PAC - em suas duas edições (2007-2010 e 2011-2014), que englobou os maiores investimentos públicos em infraestrutura econômica, social e urbana, além da implementação de medidas regulatórias para incentivo da atividade privada, como a concessão de crédito e desonerações tributárias (Cardoso Júnior e Navarro, 2016, p. 29-32).

As políticas públicas sociais finalmente ganharam forma: algumas visando a universalização do acesso a serviços, como saúde e educação; a implementação da seguridade social, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social; a sistematização de uma política nacional de cultura com o objetivo de promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.7 Surgem como resposta a uma visão canhestra do desenvolvimento predominantemente econômico, centrado no imperativo da industrialização e privilégio, em termos de políticas de infraestrutura, das regiões brasileiras mais industrializadas (sudeste e sul). As políticas sociais, até então, eram pensadas como suporte ao desenvolvimento econômico e não centradas na preocupação com a dignidade da pessoa humana.

No entanto, apesar a expansão de políticas públicas em campos anteriormente não explorados pelo Estado de maneira sistemática e visando o atendimento integral da população, o planejamento continua a insistir no erro da ausência de uma visão do todo, do efetivo “planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado” (art. 174, §1º), capaz de “garantir o desenvolvimento nacional” (art. 3º, II) e a harmonia entre “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (art. 1º, IV), sem se descuidar do direito de todos ao “meio ambiente ecologicamente equilibrado”, cujo dever de defesa e preservação é compartilhado entre o Poder Público e à coletividade (art. 225).

Ainda, o federalismo brasileiro impacta diretamente a forma com que se organizam e se executam as políticas públicas (Bitencourt e Reck, 2021, p. 96). Em um modelo de organização descentralizada dos entes é essencial que haja uma adequada coordenação das ações, atribuições atinentes a cada um, pois a implementação e execução das políticas públicas pressupõe elementos de coordenação, diálogo para o planejamento dos diversos modelos organizacionais que darão suporte à implementação das políticas públicas no âmbito de entes federativos autônomos, mas que devem guardar relação entre si.

As políticas setoriais continuam sendo o mecanismo de efetivação do planejamento em detrimento do planejamento de longo prazo, ainda não implementado após a Constituição de 1988. O prejuízo é ainda maior porque, geralmente, as políticas setoriais sofrem descontinuidades ou reformulações a cada novo mandato do Chefe do Poder Executivo, reflexo, também da necessidade de um amadurecimento (ou solidariedade?) do sistema federativo, cujos entes não se “conectam” em busca da realização de objetivos comuns a partir da conjugação de esforços econômicos, administrativos, de gestão.

Na falta deste o comando nuclear - plano de longo prazo -, reunindo diretrizes gerais a serem efetivadas mediante políticas públicas planejadas, a visão de longo prazo que prevalece é unicamente a financeira. Se no passado, priorizavam-se as metas a serem alcançadas em detrimento das fontes de financiamento, na atualidade, é o aspecto financeiro que dita a meta. Daí porque o planejamento das políticas públicas vem acontecendo em grande parte pela via estrita do orçamento, à míngua de outros elementos técnicos que permitam estruturar a arquitetura completa da política; que permita traçar parâmetros qualitativos e quantitativos que ao final formarão o aporte necessário para sua avaliação.

Nessa sequência de ideias, o fiscalismo faz-se acompanhar da financeirização entendida como a própria alteração do perfil do capitalismo brasileiro - passagem do movimento de industrialização - produção de bens e capital vinculado à propriedade dos bens de produção - para a primazia da finança, ou seja, os bens passaram a ser os papéis, as ações, os títulos de dívidas fictos, incorpóreos (Bitencourt e Reck, 2021, p. 101), ditando um novo modo - em nossa visão equivocado - de planejar a política pública, como adiante será explanado.

3 Políticas públicas e financeirização: a insuficiência do orçamento como planejamento de políticas públicas

A financeirização de políticas públicas refere-se ao processo pelo qual instrumentos e lógicas do setor financeiro são incorporados na formulação e implementação dessas políticas. Esse fenômeno implica uma crescente dependência de mecanismos financeiros, como mercados de capitais, fundos de investimento e instrumentos financeiros complexos para financiar e gerir serviços públicos e projetos governamentais.8

É possível ser observada em diversas práticas, como as Parcerias Público-Privadas (PPPs). Essas parcerias envolvem a cooperação entre o governo e empresas privadas para financiar, construir e operar serviços públicos e infraestrutura, como rodovias, hospitais e escolas, entre outros serviços públicos que antes eram não apenas coordenados, mas executados pelo Estado. Nessas parcerias, o setor privado frequentemente se vale das estruturas e investimentos estatais para operacionalizar suas atividades. Permite-se, ainda, um modelo em que o parceiro privado fornece o capital inicial e, em troca, recebe receitas futuras geradas pelo projeto ou pagamentos do governo. Além disso, a emissão de títulos de dívida pública, a contratação de empréstimos de bancos e instituições financeiras que constituem formas de fomento estatal são mecanismos comuns utilizados para financiar projetos de infraestrutura e serviços sociais.

Outro aspecto da financeirização é a integração de práticas de fusões e aquisições, comuns no setor privado, para reorganizar e otimizar entidades e ativos públicos. Essa estratégia pode envolver a transferência de ativos públicos para entidades financeiras, que os gerenciam e operam de acordo com princípios de mercado. Além disso, instrumentos financeiros sofisticados, como derivativos e securitização, são utilizados para gerir riscos e garantir financiamento para projetos públicos. A securitização de receitas futuras de pedágios ou taxas de uso de serviços públicos é um exemplo dessa prática.

Não há dúvidas que a financeirização causa impactos nas políticas públicas, tanto positivos quanto negativos. Por um lado, os proponentes argumentam que ela pode trazer maior eficiência e inovação na gestão de serviços públicos, aproveitando a expertise e os recursos do setor privado. Além disso, pode facilitar a captação de recursos para investimentos em infraestrutura e serviços sociais, que dificilmente poderiam ser financiados exclusivamente com recursos públicos.

No entanto, críticas fundamentadas apontam que a financeirização pode aumentar a desigualdade e reduzir a acessibilidade de serviços públicos, à medida que a busca por lucros pode levar a aumentos de tarifas e à exclusão de populações vulneráveis. Serviços essenciais, como saúde e educação, se tratados como commodities, implicam na priorização do retorno financeiro sobre o bem-estar social, na contramão da Constituição de 1988. Além do mais, a falta adequada de equilíbrio para financiar as políticas públicas evidencia um cenário caótico de desmanche do Estado, que sob tais condições econômicas têm afetada não somente sua capacidade prestacional mas também e a eficiência do serviço.

A complexidade dos instrumentos financeiros e das estruturas de PPPs pode dificultar a transparência e a accountability na gestão pública, acarretando uma diminuição da capacidade de controle e regulação por parte do governo e da sociedade civil. Além disso, a dependência de mercados financeiros e instrumentos complexos pode expor o setor público a riscos financeiros elevados, incluindo volatilidade do mercado e crises financeiras. A incapacidade de gerir adequadamente esses riscos pode levar a endividamento excessivo e crises fiscais.

Dessa forma, a financeirização também evidencia a tensão entre o dever do Estado de efetivação de direitos sociais e a ascensão dos postulados neoliberais - objetivos de ajustes fiscais, busca de estabilidade monetária, o que repercute de maneira direta nas políticas sociais. Nessa lógica, o planejamento da efetivação dos direitos sociais via políticas públicas tem como base primeira os aspectos relacionados a viabilidade de financiamento, para somente depois modelar-se o raciocínio dos objetivos a serem alcançados.

Absorvendo o mote da financeirização que assenta suas bases no neoliberalismo, destaca-se 3 emendas constitucionais que evidenciam limitações impostas ao orçamento público e que refletem no financiamento das políticas públicas: 1) Emenda Constitucional 1, de 1994 e demais alterações que instituiu e modificou a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que é um mecanismo que permite ao governo federal usar livremente percentual de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas; 2) Emenda Constitucional 19, de 1998, que impõe uma série de limites para as despesas com pessoal ativo ou inativo da Administração Pública; 3) Emenda Constitucional 109, de 2021, que determinam que os entes federativos conduzam suas políticas fiscais de forma a manter a dívida pública em níveis sustentáveis, determinando que a elaboração e a execução de planos e orçamentos devem refletir a compatibilidade dos indicadores fiscais com a sustentabilidade da dívida.

Fato é que a financeirização afeta diretamente a efetivação de direitos sociais. Nesse sentido, Massoneto e Bercovici defendem a configuração de uma cisão entre a constituição financeira e a constituição econômica, na medida em que a Lei de Responsabilidade Fiscal limita a ação da constituição financeira como fonte de financiamento para implementação da ordem econômica e social da Constituição de 1988. Tem-se uma constituição financeira “blindada” e a efetivação da constituição econômica “ficam restritas, assim, às sobras orçamentárias e financeiras do Estado.” (Bercovici e Massoneto, 2006, p. 71).

É exatamente esse o estado da arte: se por um lado, as políticas públicas refletem a realização dos direitos fundamentais pela administração pública no âmbito do Estado Social brasileiro, por outro, reforçando o princípio do equilíbrio, há um dever, introduzido na Constituição pela Emenda 109, de 2021, dos entes federativos em “conduzir suas políticas fiscais de forma a manter a dívida pública em níveis sustentáveis” (art. 164-A). Essa sustentabilidade reforça a necessidade de viabilidade fiscal para implementação das políticas públicas, acentuando, ainda que indiretamente, a primazia do planejamento dos aspectos orçamentários e fiscais em detrimento de uma gama de outras situações que compõe o planejamento de políticas púbicas e mais adiante será explorado. No entanto, mesmo diante da evidência da financeirização e da perda de espaço da constituição econômica no espaço de financiamento, diante do engessamento da constituição financeira, o planejamento das políticas públicas não pode se restringir aos aspectos de ordem orçamentária.

Muito embora a Constituição de 1988 tenha trazido um sofisticado sistema de leis orçamentárias, até então sem precedentes no ordenamento jurídico pátrio como passa a se expor, não há como se sustentar que o planejamento de políticas públicas se encerre com a elaboração e aprovação das leis orçamentárias. A começar, pelo plano plurianual (PPA), lei cujo prazo de vigência se estende por 4 anos e estabelecerá, “de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada.” (art. 165, §1º da Constituição). O objetivo do PPA, como planejamento de médio prazo é, senão, exercer o papel central de organização da ação do Estado, uma vez que os demais planos e programas nacionais, regionais e setoriais com ele devem se compatibilizar (art. 165, §4º da Constituição). Exerce a função estratégica de ser o elo do planejamento estatal com o os objetivos indicativos de longo prazo; de políticas de governo, de médio prazo e da realização dos gastos previstos no orçamento anual (Paulo, 2010, p. 173).

A partir do PPA 2024-2027, o Governo Federal busca imprimir uma visão mais abrangente de planejamento que ultrapasse o estrito viés de modulação da política fiscal, buscando a implementação de processos de planejamentos voltados à “organização de capacidades estatais e estabelecimento de prioridades em políticas públicas;” (Lemos, Serafim e Martins Neto, 2024, p. 25). Um planejamento voltado aos resultados (performance budget) e não exclusivamente para as despesas (expenditure budget), intrinsecamente ligado à eficiência dos gastos. Daí a importância do PPA não pensado como instrumento de planejamento isolado, mas sim, conectado aos demais planejamentos nacionais, regionais e setoriais que também veiculam políticas públicas, exercendo função integrativa entre os diversos atores federativos e os diversos campos de atuação.

Aqui reside o primeiro fundamento para se sustentar que o planejamento de políticas públicas não se restringe ao planejamento dos aspectos de fundo orçamentário: o PPA não é o espaço que viabiliza o planejamento completo da política pública. O fato de a Constituição impor que planos e programas sejam elaborados em consonância com o PPA implica em dizer que os objetivos das políticas públicas devem estar entre as diretrizes, objetivos e metas do PPA, sem prejuízo do efetivo planejamento da política pública em si, para além dos aspectos orçamentários e financeiros. A política pública sob a ótica de “um sistema de interação, capaz de se autorreferenciar e com isto adquirir estabilidade no tempo” (Reck e Bitencourt, 2017, p.134) demanda, para sua formulação/planejamento, a visualização e normatização, pelo Direito,9 de todas as fases de seu ciclo, o que extrapola os limites das leis orçamentárias.

O PPA define diretrizes, objetivos e metas da administração relativamente a despesas de capital além daquelas relativas aos programas de duração continuada. Nesse sentido, as políticas públicas devem guardar compatibilidade com o conteúdo do PPA, mas não estarão detalhadas, à minúcia, nessa peça orçamentária. O que ocorre, na prática, é a compatibilização entre os programas do PPA e o objetivo das políticas públicas para que estas encontrem previsão orçamentária para futura execução. É necessário, então, a realização do planejamento da política pública em si, a partir de objetivos, modelos decisórios e organizacionais, público-alvo, tempo, fontes de financiamento, mecanismos de implementação e avaliação. É objeto de planejamento o desenho procedimental do ciclo das políticas públicas10 muito embora há quem entenda que o planejamento da política pública incida sobre as fases de implementação e avaliação.11

Como instrumento macro de planejamento de médio prazo, o PPA pode contribuir com o planejamento de políticas públicas não somente nos aspectos orçamentários e financeiros, oferecendo, também uma visão interdisciplinar dos problemas públicos e como eles podem ser enfrentados de forma articulada e transversal a diversos órgãos da administração pública. O grande desafio da administração é promover a integração de políticas públicas, a fim de que os problemas públicos sejam enfrentados de maneira multidimensional, pois ultrapassam as competências de um único órgão. Partindo-se do pressuposto que, potencialmente, as políticas públicas são formuladas de modo a abranger mais de uma dimensão do desenvolvimento sustentável,12 a compatibilização das políticas públicas com o PPA pode trazer essa visão abrangente/global em relação a integração da ação administrativa de diversos órgãos públicos para o enfrentamento de problemas públicos complexos.

Prosseguindo a análise das leis orçamentárias, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de caráter anual, é instrumento que promove a ligação entre o respectivo ano do PPA e a lei orçamentária anual (LOA). Nos termos do art. 165, §2º da Constituição, a LDO especifica, para o ano, as metas e prioridades da administração pública federal além de aspectos de índole orçamentária e fiscal voltadas ao equilíbrio fiscal - “as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância com trajetória sustentável da dívida pública, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária” - além da política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.

Dentre as peças orçamentárias previstas no art. 165 da Constituição, talvez seja a LDO a lei mais distante em relação ao planejamento orçamentário de políticas públicas, pois alberga conteúdo mais geral relativo a orientações para a elaboração da LOA e de uma política fiscal sustentável. Nesse sentido, as políticas públicas devem, de alguma forma, guardar relação com as metas e prioridades da Administração, bem como estar alinhadas às entrelinhas do equilíbrio fiscal preconizado pelo §2º do art. 165 da Constituição. A LDO também é o local adequado para a revisão dos valores previstos no PPA de acordo com eventuais modificações na projeção de receitas, repercutindo, por consequência, nas políticas públicas.

Na sequência de ideias que vem se desenvolvendo, cabe ao PPA planejar as linhas mestras pelas quais a administração se orientará a médio prazo. Por sua vez, cabe à LDO orientar a elaboração da LOA, que, de maneira concreta, passa a executar as despesas a partir das receitas previamente estimadas. De maneira objetiva, “o orçamento é uma autorização para efetuar despesas. Sem orçamento não pode haver despesa, e sem efetuar despesas a Administração Pública não pode funcionar.” (Dallari, 1996, p. 159). Trata-se da descrição típica do princípio da exclusividade, inscrito no art. 165, §8º da Constituição, que apregoa que a lei orçamentária não poderá conter matéria estranha à fixação das despesas e à previsão das receitas. Daí se extrai a íntima relação entre planejamento de políticas públicas e orçamento: se a futura despesa não encontrar previsão na lei orçamentária, não poderá ser realizada. Entretanto, reforça-se que, inobstante a imprescindibilidade do planejamento orçamentário das políticas públicas, a isto não se encerra.

Atualmente, abandona-se a visão da LOA como peça burocrática restrita a contabilidade e a prestação de contas para os órgãos de controle, que não guarda relação com a gestão do governante, uma vez que o modelo de programa e ações não se alteram. Avança-se para uma visão estratégica do orçamento, onde a LOA é definida a partir da diretriz estratégica de governo, alinhada ao plano de governo e políticas públicas, correspondendo a execução anual do contido no PPA. Como imperativo de transparência da gestão, a prestação de contas não se volta somente ao governo e aos órgãos de controle, mas também à sociedade. E como decorrência do controle social e da própria avaliação de sua execução, a LOA não se mostra uma peça engessada, estando sujeita a adequações, ajustes no contexto de uma gestão horizontalizada.

Bem assinala Francisco Sérgio Silva Rocha que o orçamento é um instrumento de planejamento pois, para além da mera previsão de receitas e estimativas de despesas, nasce e se desenvolve a partir da interação entre o Poder Executivo e Legislativo na efetivação de políticas públicas, permitindo o controle sobre o gasto público (Rocha, 2011, p. 742). Observa-se, contudo, que não se pode reduzir o planejamento ao orçamento, uma vez que a LOA não é o locus adequado para a fixação das diretrizes de atuação do Estado, “significando apenas uma forma de incrementar o controle racional dos gastos públicos, olvidando a verdadeira tarefa que é a transformação das estruturas socioeconômicas.” (Rocha, 2011, p. 742).

E não está aqui a se defender que o planejamento orçamentário mereça ser relegado a segundo plano. Desde a edição da Lei 4.320, de 1964 ainda em vigor, existe a determinação no sentido de que “a Lei do Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar a política econômica financeira e o programa de trabalho do Govêrno” (art. 2º). Essa mesma lei cristaliza outra máxima do direito financeiro, consistente na impossibilidade de realização de despesa sem prévio empenho (art. 60). Reside aqui, a importância imediata do planejamento orçamentário: é na lei orçamentária anual que se prevê a receita e se fixa a despesa. E ainda, na ausência de dotação específica que possa fazer frente a determinada despesa, não há como se efetivar o pagamento.

No entanto, como em linhas anteriores se expôs, a correspondente interface orçamentária para fazer face à execução de determinada política pública é apenas uma das facetas do planejamento. Em síntese, é possível afirmar que o planejamento orçamentário, compreendidos o PPA, LDO e LOA, constitui-se elemento essencial ao planejamento de políticas públicas, mas a ele não pode se resumir.

Quer se reforçar tal premissa a partir da análise das recentes alterações na Constituição que trouxeram uma nova forma de enxergar as políticas públicas. Não sem tempo, a Emenda Constitucional n. 108, de 2020 introduziu o parágrafo único ao art. 193 da Constituição Federal, juridicizando a função de planejamento das políticas públicas sociais, com a necessidade de participação da sociedade nas etapas de formulação, monitoramento, controle e avaliação. O planejamento de políticas sociais a que se refere o art. 193, parágrafo único deve ser interpretado de maneira conjunta com os arts. 37, §16 e 165, §16, ambos da Constituição, introduzidos pela Emenda Constitucional 109, de 2021, que evidenciam o dever de os órgãos da administração pública realizar avaliação de seus resultados. A abordagem das políticas públicas enquanto “modelo de processo” (Coelho, Lolli e Bitencourt, 2022, p. 11) auxilia sobremaneira no seu planejamento, uma vez que o planejamento enquanto processo pode ser encarado como um “fio condutor” que materializa procedimentalmente (em termos normativos e administrativos) as etapas do ciclo.

O art. 37, §16 remete ao dever de órgãos e entidades da administração pública, de maneira individual ou conjunta, realizar avaliação das políticas públicas, “inclusive com divulgação do objeto a ser avaliado e dos resultados alcançados.” Em complemento, o §16 do art. 165 determina que as leis orçamentárias “devem observar, no que couber, os resultados do monitoramento e da avaliação das políticas públicas previstos no §16 do art. 37 desta Constituição.” Nessa sequência de ideias, o monitoramento e avaliação das políticas públicas devem subsidiar o novo ciclo de leis orçamentárias.

Planejamento, monitoramento, controle e avaliação das políticas públicas passam a figurar na Constituição como etapas necessárias, conferindo a noção de processualidade, de início, meio e fim às políticas públicas, cujas ações de cada fase devem ser bem delimitadas pelo Direito. Tais ações possuem grande interface com o orçamento, ou seja, com a garantia de execução da despesa necessária para fazer frente à execução da política pública: há necessidade de se contratar serviços de terceiros? Realizar compras? Garantir a prestação de serviços públicos? Realizar de fomento financeiro?

No entanto, a garantia de execução orçamentária não é suficiente para a efetivação da política pública e dos programas e ações que dela decorrem. A exemplo, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), fundo especial de natureza contábil é instrumento permanente de financiamento da educação pública.13 Neste caso, garante-se os recursos orçamentários, no limite legal estabelecido a cada estado-membro, Distrito Federal e município, para investimentos na educação básica e valorização dos profissionais da educação. Porém, os recursos orçamentários são apenas uma das facetas do planejamento das políticas públicas custeadas com recursos do Fundeb: quais serão os programas desenvolvidos, seu objeto, público-alvo, metas a serem alcançadas, entidades envolvidas, arranjos jurídicos-institucionais, resultados pretendidos? Como se dará o processo de monitoramento e avaliação?

No caso em análise, vislumbra-se a necessidade de que o planejamento seja elaborado a médio ou longo prazo, pois os resultados almejados por programas e ações implementados a partir do Fundeb não terão resultados percebidos em um exercício orçamentário. Ou seja, planejamento de políticas públicas não pode se restringir à realização de previsão orçamentária. Há que se promover uma mudança cultural no âmbito da administração pública, que tem assumido a tendência de resumir o planejamento de políticas públicas à previsão na próxima lei orçamentária anual, sequer tomando as cautelas de voltar-se à análise do plano plurianual ou dos planejamentos setoriais, como plano de educação, saúde e assistência social. As políticas públicas devem estar associadas ao planejamento de médio e longo prazo da administração pública.

Em uma maior dimensão, o planejamento de políticas públicas, para além dos aspectos orçamentários e financeiros, requer a definição ou desenho de uma modelagem jurídica, de um verdadeiro regime jurídico que compreende a definição de três elementos das políticas públicas, quais sejam: os modelos decisórios, os modelos organizacionais e os objetivos (Bitencourt e Reck, 2021, p. 40). É a concatenação desses elementos que possibilitarão a execução, monitoramento e avaliação das políticas e, portanto, devem estar compreendidos na atividade de planejamento.

Planejar determinada política pública implica em descrever, à minúcia, seu modelo decisório. Como elemento da política pública, Caroline Muller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck ensinam que o modelo decisório é a ferramenta que permite a decisão da autoridade no âmbito de uma determinada política pública. Consiste no desenho de um padrão, previamente descrito e normatizado de um fluxo de decisões na política pública. O Direito assume papel fundamental na descrição do modelo decisório, pois “não só limita, mas também possibilita as decisões, tanto no conteúdo como na forma, por meio de regras, tais como as de competência, forma e procedimento.” (Bitencourt e Reck, 2021, p. 34). Importante destacar que elementos de natureza política e jurídica confluem para a formatação do modelo decisório, que tem como ponto de partida um problema, prognóstico ou ação necessária. O que o modelo decisório faz é dar as opções ao administrador, demonstrando quais as consequências/efeitos na adoção de um ou outro caminho possível pelo Direito (Bitencourt e Reck, 2021, p. 34).

A formatação de um modelo decisório para determinada política pública remete à ideia de planejamento como procedimento, de descrever fases sucessivas como já assinalado. Adverte-se, no entanto, que mais do que a sucessividade lógica dos atos, o processo de planejamento - no caso, de políticas públicas - deve evidenciar sua destinação teleológica: a solução de um problema público ou a consecução de objetivos relevantes para a efetivação de direitos fundamentais, pela administração pública deve ser o norte orientativo para a formatação do modelo decisório.

No processo de construção de determinado modelo decisório, cada alternativa disponível (porque albergada pelo Direito) implica na abertura de uma ou mais possibilidades: bifurcações, trifurcações que devem ser objeto de decisão do administrador e que implicam em consequências que devem ser sopesadas no momento decisório. O modelo decisório é formulado a partir dos objetivos da política, que devem ser alcançados a partir da escolha certeira dos modelos organizacionais. O planejamento, então, deve ser o mecanismo apto a explicitar, de maneira didática, a modelagem jurídica das políticas públicas, a partir de escolhas sucessivas que levem em conta “a riqueza de conteúdos e possibilidades da política pública, mas com foco nos aspectos jurídicos.” (Bitencourt e Reck, 2021, p. 40-41).

O avanço em cada etapa da escolha implica, por exemplo, na adoção de modelos organizacionais14 distintos para atendimento do objetivo da política pública, importando na análise/sopesamento das capacidades institucionais e especializações funcionais inerentes a cada instituição disponível para a formação do arranjo que irá materializar a política pública. Neste ponto, cabe abrir um parêntese para evidenciar a importância da instituição como entidade distinta do poder político para o planejamento de políticas públicas. O planejamento é um elemento que auxilia na institucionalização da política pública, reduzindo a possibilidade de alterações do desenho da política por parte do governo. Isto porque, “a institucionalização converte em jurídicas questões antes postas em termos apenas políticos.” (Bucci, 2013, p. 213). A institucionalidade, materializada pelo Direito, deve ser responsável por garantir parâmetros de sustentabilidade de uma política pública em face da alternância dos governos, na tentativa de frear eventuais retrocessos (Ruiz, 2023, p. 23).

Cabe, nessa perspectiva, ao Direito normatizar essas escolhas sucessivas que levarão ao desenho da política pública, formatando-a em um documento jurídico. Planejar a política pública vai além do dever de enunciar, que poderia estar restrita ao elenco, em ato normativo, de seus objetivos gerais, fontes de financiamento e instrumentos. Além da descrição da fase prévia, que juridiciza os elementos que formam a arquitetura da política, o documento jurídico ainda deve prever as fases que se sucedem o planejamento em si, que são os requisitos relativos ao acompanhamento da execução da política, avaliação e a construção de uma matriz de riscos, esta última pouco explorada pela doutrina, mas que encontra exemplos na legislação vigente.

A fase inicial é entendida aqui como a construção do “plano” ou do instrumento jurídico que, a partir da decisão pública em cada etapa sucessiva do modelo organizacional eleito, descreve elementos materiais e humanos necessários, precifica-os para posterior inclusão em orçamento, atribui competências às organizações, disciplina o relacionamento entre elas; entre elas e o ente público, a partir da análise de suas capacidades institucionais e especializações funcionais, visando a materialização do direito fundamental perseguido pela administração por meio da eleição dos instrumentos15 de política pública.

Em verdade, o plano é um documento jurídico descritivo que vincula o agir dos das organizações e do Estado para a consecução dos objetivos da política, a partir de parâmetros quantitativos e/ou qualitativos, a depender do caso concreto, que subsidiará a execução da política pública, seu monitoramento, permitindo a estipulação de parâmetros objetivos que serão objeto de controle administrativo, social, externo e judicial.

Aliás, o monitoramento da política pública, enquanto etapa de sua execução também deve encontrar suporte legal no plano. Eventual desvio da rota planejada deve ensejar, de maneira imediata, a adoção de medidas administrativas tendentes à retomada do prumo ou superação da dificuldade encontrada não prevista inicialmente. Cita-se como exemplo, a figura do “Plano de Providências”, prevista no art. 40 da Resolução 33, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Assistência Social. Em linhas gerais, ideia do Plano de Providências é traçar diretrizes para a superação de dificuldades dos entes federados superar dificuldades dos entes federados na gestão e execução dos serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais, a ser elaborado pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, por meio das seguintes etapas: a) identificação das dificuldades; b) definir ações para enfrentar as dificuldades diagnosticadas; e c) indicar responsáveis por cada ação e os prazos para cumprimento.

Outra ideia que também se lança para potencializar a implementação das políticas públicas é a formatação, na fase do planejamento da política pública, de uma espécie de “mapa de riscos” onde o ente promotor da política pública elenque os principais riscos - evento futuro e incerto que possa ensejar uma consequência ou impacto negativo na execução da política - classificando-os quanto à probabilidade de ocorrência - alta, média ou baixa -, indicando, ao final, as medidas que podem ser adotadas para evitar ou mitigar a ocorrência do dano.

E, por fim, todos esses elementos descritivos que permitiram acompanhar o “passo-a-passo” da execução da política pública serão fundamentais para sua avaliação, conforme determina o §16 do art. 37, que deverão subsidiar um novo ciclo de planejamento orçamentário, nos termos do que dispõe o §16 do art. 165 da Constituição. O mecanismo de avaliação da política pública deve estar minudentemente descrito no plano e será realizado a partir dos parâmetros qualitativos e/ou quantitativos previamente pactuados. Se o planejamento de políticas públicas se resumir aos aspectos orçamentários, a única forma de avaliação cabível é a quantitativa, o que não se mostra razoável.

Note-se que a partir da descrição mais ampla do processo de planejamento que parte da procedimentalização do modelo decisório, é possível compreender que em alguma etapa o elemento orçamentário da política pública influenciará a tomada de decisão. Mas, como se defende, o planejamento da política não pode se restringir ao planejamento de sua previsão orçamentária. Reitera-se: a “linguagem” orçamentária não está voltada à descrição da política pública, nem tampouco permite o exercício de ações necessárias de controle e monitoramento qualitativo, que são muito diversas dos procedimentos contábeis que evidenciam a contabilização de receitas e despesas. Planejar políticas públicas, então, não pode se resumir a inclusão de dotação orçamentária para fazer face às despesas advindas de sua execução.

A efetivação de direitos fundamentais via políticas públicas acontece através da mediação do Estado: seja a partir de instrumentos próprios, seja com a colaboração de terceiros. Seja por um ou outro caminho, o Estado não se desincumbe do planejamento das políticas públicas mesmo se consideradas as questões da financeirização, o fiscalismo e os postulados neoliberais que tensionam o Estado Social brasileiro. Essa perspectiva suscita ao planejamento inúmeros debates relativos à extensão da efetivação dos direitos pelo Estado, o modelo organizacional a ser adotado, ponderando-se, inclusive, qual o nível de cooperação dos privados e os custos e formas de financiamento.

4 Conclusões

O retrospecto do planejamento realizado no demonstra como a atividade de planejamento transitou: a) da mera realização de planos sem grandes preocupações de vincular o atingimento das metas a previsões de financiamento; b) para o caminho da integração técnica do planejamento com o orçamento, ainda que sem grande correspondência no mundo dos fatos, levando ao c) direcionamento do planejamento governamental para o combate do processo inflacionário - a partir de onde o planejamento das ações do governo começam a se vincular à primazia do fiscalismo, financeirização ínsita aos postulados neoliberais, mas que entra em rota de colisão com a efetivação dos direitos no âmbito do Estado Social brasileiro.

Por consequência, o planejamento das políticas públicas tem assumido um caráter mais atrelado aos aspectos orçamentários, relegando a segundo plano o que há de mais fundamental que é justamente traçar a rota, um verdadeiro itinerário de como o Estado garantirá a efetivação de direitos em um determinado tempo (médio e longo prazo), tendo-se em vista objetivos previamente traçados, a partir de um fluxo de decisões que contemple um determinado modelo organizacional.

Há que se fixar o entendimento de que o planejamento de políticas públicas no contexto do Estado Social brasileiro não pode sucumbir à financeirização: os instrumentos e lógicas do setor financeiro não podem balizar a formulação e implementação de políticas públicas, sob pena se levar à ruína as bases do Estado Social. Inobstante seja fundamental o estabelecimento de parâmetros objetivos às leis orçamentárias no tocante à projeção da arrecadação e distribuição as despesas, o perseguido equilíbrio fiscal não pode ser atingido às custas de sacrifícios exclusivos da efetivação dos direitos sociais.

A construção de bases sólidas para a implementação de políticas públicas que permitam seu constante monitoramento, correção imediata de eventuais inconsistências e a avaliação sempre necessária depende de um planejamento em termos mais amplos que envolvam, necessariamente, a definição de objetivos, do modelo decisório e organizacional e a imprescindível participação social, a fim de que, de maneira prospectiva, o Estado possa visualizar, a partir de decisões fundamentadas, a política pública como um todo e entrelaçar à sua realização todos os elementos necessários, como os instrumentos e as fontes de financiamento.

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Notas

  • 1
    O recorte temporal se dá em razão da conjuntura política, econômica e social que marca historicamente um novo período na República brasileira. A Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio Vargas ao governo simboliza a mudança de orientação de uma política oligárquica para um cenário que contemplasse o processo de industrialização e urbanização, conferindo novas perspectivas à economia brasileira. A transformação política e econômica se projeta na sociedade com o surgimento de camadas médias e massas urbanas com necessidades diversas, inclusive, de participação política.
  • 2
    O período pós-revolução industrial desenha um novo panorama nos países industrializados, com o assentamento do capitalismo industrial e as novas relações trabalhistas estabelecidas em razão da nítida divisão entre o capital e o trabalho.
  • 3
    A exemplo, a doença ou invalidez do trabalhador poderia torná-lo improdutivo. Logo, a política previdenciária ou de saúde foi construída tendo como pano de fundo os fins econômicos e não sociais da doença.
  • 4
    Celso Furtado entende o desenvolvimento como “um processo de transformação que engloba o conjunto de uma sociedade”, atrelado ao planejamento econômico e social como como expressão de um processo de conduta racional. (Furtado, 2000, p. 41).
  • 5
    Como nenhum processo está livre de críticas, um dos apontamentos ao início da atividade de planejamento no Brasil é o fato de que ele não foi implementado a partir de premissas racionais, de ordenação do Estado como ocorreu na Alemanha ou União Soviética, mas sim a partir de pressupostos diversos, tendo se vislumbrado como um “instrumento eficaz para encurtar o caminho para uma posição de nação moderna e poderosa, com um elevado padrão de vida.” (Daland, 1969, p. 11.)
  • 6
    Nesse sentido: Lafer, 1975, p. 38.
  • 7
    Para uma análise mais acurada das políticas sociais implementadas a partir da Constituição de 1988, verificar: Lübke, 2022, p. 104-107.
  • 8
    Sobre a relação entre o Estado Social brasileiro e a financeirização: Bitencourt e Reck, 2021, p. 101-116.
  • 9
    Alinha-se a nova linha de estudo das políticas públicas, pelo Direito intitulada “Direito das Políticas Públicas”, na esteira do que vem sendo produzido pelos Professores Janriê Reck e Caroline Müller Bitencourt, que propõem a complementação das reflexões do campo da Ciência Política pelo Direito, ultrapassando os limites da judicialização das políticas públicas ao explorar o regramento constitucional e administrativo das diversas fases e dimensões da política pública. Nesse sentido, consultar as obras: Bitencourt e Reck, 2021; e Reck, 2023.
  • 10
    Para Janriê Reck, o ciclo das políticas públicas são: agendamento, formulação, implementação e avaliação (RECK, 2023). De maneira mais específica, Leonardo Secchi aponta as seguintes fases do ciclo das políticas públicas: identificação do problema, formação de agenda, formulação de alternativas, tomada de decisão, implementação, avaliação e extinção (Secchi, Coelho e Pires, 2020).
  • 11
    Para Luciana Leite Lima e Luciana Pazini Papi, as fases de agendamento, formulação e tomada de decisão não seriam objeto do planejamento propriamente dito, mas forneceriam insumos para a realização das etapas de implementação e avaliação (Lima e Papi, 2020, p. 32).
  • 12
    Cita-se, como exemplo, o Programa Nacional de Alimentação Escolar, instituído pela Lei 11.947, de 2009, que para além da alimentação dos alunos, objetiva “contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo.” (art. 4º).
  • 13
    Por meio da Emenda Constitucional n° 108, de 27 de agosto de 2020, e encontra-se regulamentado pela Lei nº 14.113, de 25 de dezembro de 2020.
  • 14
    Compreende a reflexão sobre quais as organizações que estarão presentes para e implementação da política pública, a partir da análise das suas capacidades institucionais e especializações funcionais. “Fazem parte do modelo organizacional, assim, o desenho de quais organizações irão tomar decisões e que tipo de decisões serão tomadas, assim como a estrutura interna dessas organizações, suas relações com os procedimentos democráticos como finalmente as relações entre as organizações.” (Bitencourt e Reck, 2021, p. 35).
  • 15
    Os instrumentos são as formas de atuação das políticas públicas na sociedade, assim elencados: serviços públicos, fomento, obras públicas, bens públicos, poder de polícia, sanção penal, intervenção do Estado na propriedade, atividade empresarial do Estado, programas gerais e ações individuais (Bitencourt e Reck, 2021, p. 36-40).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2025
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Set 2024
  • Aceito
    13 Nov 2024
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