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A abordagem Direito e políticas públicas: temas para uma agenda de pesquisa

The Law and public policy approach: themes for a research agenda

Resumo

O direito e as políticas públicas possuem uma imbricação no campo teórico e prático, identificada pela existência formal conferida pelo direito às ações governamentais, a relação entre ambos mediada por desenhos jurídico institucionais e pela intersecção entre direito e política na implementação de políticas públicas. Estas aproximações possibilitaram a criação da abordagem Direito e Políticas Públicas (DPP). Tendo como premissa o surgimento desta abordagem, este artigo tem como problema as seguintes questões: a) quais os eventuais ganhos analíticos de se utilizar a abordagem DPP para análise de objetos de pesquisa?; b) quais temas podem compor uma agenda de pesquisa à referida abordagem? Traçado o pano de fundo, o artigo objetiva elaborar respostas parciais às questões levantadas, além de apresentar possíveis temas de pesquisa afeitos à abordagem DPP. Para cumprir estes fins, o trabalho utiliza como metodologia a revisão bibliográfica e se divide em quatro partes. 1) vincular a discussão sobre direitos sociais às políticas públicas, em vista da necessidade dessas para a efetivação desta espécie de direitos. Analisar os direitos sociais em conjunto com as ações governamentais permite identificar aspectos políticos que permeiam a sua concretização. 2) Relação entre direito, instituições e políticas públicas, ilustrando a relevância da institucionalidade para a eficácia das políticas públicas, como também a importância de uma análise descritiva - e não apenas normativa - na visualização das políticas públicas no campo jurídico. 3) Possibilidades de utilização da abordagem DPP. 4) Delimitação das políticas públicas no contexto histórico e político do Estado Social, apontando as recentes alterações na Constituição de 1988 que restringem a capacidade do Estado. Conclui-se que a abordagem DPP permite analisar o direito vinculado ao contexto político e institucional do qual faz parte. Além disso, a identificação, neste artigo, de diferentes temas que estão na fronteira entre direito e política pode contribuir com uma agenda de pesquisa multidisciplinar que se encontra em construção.

Palavras-chave:
Direito e políticas públicas; Direito e política; Estado Social; Políticas públicas e instituições

Abstract

Law and public policies have an overlap in the theoretical and practical field, identified, among other factors, by the formal existence attributed by the right to governmental actions, the relationship between law and public policies mediated by institutional legal designs and by the intersection between law and politics in the implementation of public policies. These reflections enabled the creation of the Law and Public Policies (LPP) approach. Starting from the premisse to the emergence of this approach, this article addresses the following questions: a) What are the possible analytical gains of using the DPP approach to analyze research objects?; b) What themes can compose a research agenda for this approach? The article aims to elaborate partial answers to the questions raised and to presenting possible research topics related to the DPP approach.. To achieve this purpose, it is based in a review methodology and it is divided in four parts. 1) Link the discussion on social rights to public policies, in view of their need for the realization of this kind of rights. Analyzing social rights together with government actions allows identifying political aspects that permeate their implementation. 2) the relationship between law, institutions and public policies, illustrating the relevance of institutional design for the effectiveness of public policies, as well as the importance of a descriptive analysis - and not just normative - in the visualization of public policies in the legal field. 3) Possibilities of using LPP approach. 4) Delimitation of public policies in the historical and political context of the welfare state, pointing out the recent changes in the 1988 Brazilian Constitution that restrict the State’s capacity to provide services. It is concluded that the DPP approach allows analyzing the law linked to the political and institutional context of which it is a part. Furthermore, the identification, in this article, of different themes that are on the border between law and politics can contribute to a multidisciplinary research agenda that is under construction.

Keywords:
Law and public policy; Law and politics; Welfare state; Policies and institutions

1 INTRODUÇÃO

As políticas públicas podem ser visualizadas de diferentes perspectivas, a depender da área de conhecimento utilizada. Essa multiplicidade de perspectivas explica-se pelo fato de que elas são um objeto inerentemente multidisciplinar. Construir soluções governamentais em escala ampla para problemas sociais complexos demanda a atuação de uma multiplicidade de atores estatais e não estatais e a conjugação de diferentes tipos de conhecimento. Em outras palavras, a materialidade das políticas públicas, por demandar uma atuação multisetorial, torna necessário o seu estudo por áreas do conhecimento distintas.

O direito é uma das áreas que vem apresentando sua contribuição ao estudo das políticas públicas, considerando a imbricação existente entre ambos no processo de implementação de direitos sociais. A possibilidade de identificar componentes jurídicos em diferentes fases do ciclo de uma política evidencia que o direito não se limita a garantir existência formal às ações governamentais1 1 Neste artigo utilizaremos o termo ação governamental como sinônimo de políticas públicas. .

A cooperação entre os entes federativos para elaborar e implementar as políticas públicas, a definição dos seus meios e fins pelo Executivo e pelo Legislativo, bem como o controle realizado pelo Judiciário e pelos Tribunais de Conta explicitam a permeabilidade de temas jurídicos na teoria e na prática das políticas públicas no Brasil.

A imbricação entre direito e políticas públicas pode ser evidenciada por, ao menos, cinco fatores: I) necessidade de utilizar instrumentos jurídicos para implementar as ações governamentais; II) a existência formal que o direito confere às políticas (policies); III) a relação entre instituições e políticas públicas mediada pelos desenhos jurídico institucionais; IV) a institucionalidade das arenas nas quais ocorrem a disputa política, modelada pelo direito; V) a intersecção entre direito e política na implementação de ações governamentais.

Tendo como premissa o surgimento da abordagem direito e políticas públicas (DPP), este artigo tem como problema as seguintes questões: a) quais os eventuais ganhos analíticos de se utilizar a abordagem DPP para análise de objetos de pesquisa?; b) quais temas podem compor uma agenda de pesquisa à referida abordagem?

No primeiro tópico, serão estabelecidos pontos de contato na discussão entre políticas públicas e direitos sociais, explicitando a importância das políticas para a efetivação de direitos prestacionais. No segundo capítulo, será abordada a relação entre direito, instituições e políticas públicas. No mesmo capítulo será discutido, também, a relação entre diferentes espécies normativas e as políticas públicas, buscando compreender como a institucionalidade das arenas do Legislativo e do Executivo ampliam ou restringem a eficácia das ações governamentais.

No terceiro tópico, aborda-se as políticas públicas na materialidade do Estado social, ressaltando que aquelas surgem a partir da existência deste. Inserido nessa discussão, ressalta-se a necessidade de um Estado social bem estruturado como condição determinante à existência de políticas públicas efetivas. A discussão sobre ações governamentais ganha um componente estratégico ao vincular-se ao debate sobre um Estado de bem-estar social consolidado que encontra na implementação de políticas um de seus eixos norteadores.

Este artigo tem como objetivo geral a delimitação de temas que possam compor uma agenda de pesquisa na abordagem DPP, sem a pretensão de esgotar a questão. Sobre os objetivos específicos, destaca-se: a) explicitar a relação entre direito, políticas públicas e instituições; b) analisar as políticas públicas como potencial instrumento de efetivação dos direitos sociais; c) compreender a origem das políticas públicas no contexto do Estado de bem-estar social. Para atingir os objetivos, utiliza-se a revisão bibliográfica, consultando artigos e livros especializados sobre o tema, no âmbito nacional e internacional.

2 POLÍTICAS PÚBLICAS E CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS

Se algumas décadas atrás uma das grandes preocupações dos juristas concentrava-se na justificação dos direitos fundamentais, atualmente pode-se afirmar que o desafio foi deslocado do campo da justificação para o da efetivação. Mais exatamente, não basta justificar um direito fundamental na doutrina jurídica sem garantir que esse direito produza efeitos práticos na vida dos indivíduos.

Desse modo, ganha relevância o desenvolvimento de mecanismos eficientes para a concretização dos direitos sociais, tendo em vista que a mera positivação destes não lhes garante, necessariamente, efetividade. É nessa perspectiva que Norberto Bobbio aponta que: “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-lo, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político” (2004, p. 16). A previsão de direitos sociais em diplomas jurídicos desvinculados da criação das condições materiais necessárias à sua concretização aproxima-se de um fetichismo legal, que carrega como horizonte máximo a positivação de direitos, a despeito da sua concretização.

Joaquim Herrera Flores, ao elaborar sua teoria crítica dos direitos humanos, afirma que esses não são: “meras declarações de boas intenções ou postulados metafísicos”. A análise de Flores é útil para pensarmos os direitos sociais como a criação de “condições materiais e acesso a bens que permitam uma vida digna” (2009, p. 20HERRERA FLORES, Joaquim. A (re)invenção dos direitos humanos. Tradução de Carlos Roberto Diogo Garcia, Antonio Henrique Graciano Suxberger, Jefferson Aparecido Dias. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009.). Em outras palavras, não basta declarar direitos sem disponibilizar os meios necessários para satisfazê-los. E qual seria, então, o papel das políticas públicas nesse debate?

As políticas públicas podem servir como uma espécie de ponte, uma vez que deslocam os direitos sociais de seu espaço abstrato para lhes garantir materialidade, ainda que de forma relativa, a partir da sua implementação. Ao estabelecer um fim que deve ser alcançado e uma solução para determinado problema social, as políticas públicas devidamente estruturadas explicitam os meios necessários para que se possa alcançar o fim socialmente relevante estabelecido anteriormente.

A apropriação do conceito de políticas públicas pelo direito cria uma inovação para a noção de esquema normativo, composto pela lógica “se-então”, para ser complementada pela ideia de normas vinculadas a objetivos, na lógica “fim-meio” (Bourcier, 1993BOURCIER, Daniéle. Modéliser la decision administrative. Réflexions sur quelques paradigmes. In: Le droit administratif en mutation. Paris: PUF, 1993.). Tradicionalmente as condutas jurídicas são pautadas pelo seguinte esquema: “se” o sujeito praticar a conduta “então” receberá a sanção.

A abordagem direito e políticas públicas permitiria um novo olhar a esse esquema, estabelecendo um “fim” a ser alcançado pelo Estado e, conjuntamente, o “meio” que o Estado deverá trilhar para atingir esse fim. A ação governamental, portanto, deve explicitar os processos, procedimentos e recursos necessários para a consecução do objetivo que pretende atingir. O desenho jurídico institucional garante estruturação às ações governamentais, permitindo que o Estado construa mecanismos efetivos para o alcance dos fins almejados pela política pública.

Entretanto, a concretização de direitos sociais e a implementação de políticas públicas dependem menos de uma doutrina jurídica bem organizada e mais da composição de interesses políticos que disputam entre si para concretizar ou flexibilizar direitos sociais e, consequentemente, políticas públicas.2 2 Não ignoramos, todavia, que um bom domínio jurídico do assunto possui relevância no desenvolvimento de mecanismos de composição de interesses.

Outro ponto de análise diz respeito às políticas públicas vinculadas à tripartição dos poderes. Se as normas da policy seguem a lógica “fim-meio”, é possível discutir qual Poder ficará responsável por elaborar o fim de uma ação governamental e qual ficará responsável por estabelecer os meios necessários para a sua implementação. De um modo geral, o Poder Legislativo costuma definir, a partir de sua competência constitucional, os fins da política, enquanto o Executivo se encarrega de definir os meios de implementação. Entretanto, a depender da iniciativa de lei responsável pela construção do arcabouço da ação governamental, essas funções podem ser intercambiáveis entre os poderes.

Caso os meios necessários para atingir determinado fim sejam mobilizados em desacordo com as regras e os princípios do próprio ordenamento jurídico, corre-se o risco de adotar um consequencialismo vulgar, que toma as consequências positivas de determinada política como o fim último a ser alcançado, independentemente de os meios utilizados estarem em desacordo com os parâmetros constitucionais.

Podemos indagar, ainda, se os meios utilizados para implementar a política pública devem ser estabelecidos apenas pelo Estado e por seu aparato burocrático, ou devem ocorrer com alguma participação da sociedade civil. Pensar em políticas setoriais, como saúde e educação, envolve a elaboração de caminhos que possam ser permeáveis aos indivíduos que vivem cotidianamente com essas políticas. Os conselhos gestores de políticas públicas podem representar, ainda que de forma limitada, uma relativa permeabilidade do governo às demandas da sociedade civil. A criação de mecanismos de participação social e controle de implementação são relevantes para a consolidação de uma gestão democrática das políticas públicas.

Willian Clune, ao discutir questões similares, destaca a necessidade de a análise de políticas públicas dar mais atenção à participação e ao empoderamento dos cidadãos do que os modelos de implementação top/down ou command control costumam estabelecer. Assim, seria necessário pensar em uma ação centralizada por parte do governo que possa, paralelamente, estimular a ação autônoma dos indivíduos que serão beneficiários das políticas públicas (Clune, 1993CLUNE, William H. Law and Public Policy: Map of an Area, 2 S. Cal. Interdisc. L. J. 1, 1993.). Em outras palavras, garantir que as decisões que resultam na elaboração e implementação das políticas não ocorram apenas no topo da burocracia estatal, mas sejam construídas, também, com a participação da sociedade civil.

O processo de elaboração do Plano Nacional de Educação pode ilustrar esta discussão. O PNE 2014-2024, política de Estado que estabelece os objetivos a serem perseguidos em âmbito estatal durante 10 anos, foi construído com intensa participação de setores da sociedade civil e de profissionais ligados à educação pública. Um exemplo disso foi a realização do CONAE (Conferência Nacional de Educação) 2010, que elaborou um documento base para o Plano Nacional de Educação. Entretanto, ainda que haja fiscalização de setores da sociedade sobre as metas do PNE 2014-2024, não há mecanismos jurídicos que vinculem e responsabilizem os governantes no sentido de atingirem as metas educacionais estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação.

A criação de canais institucionais que garantam permeabilidade às demandas sociais também pode ser uma forma de garantir maior permanência às políticas públicas. Aqui vale uma breve observação. A alternância governamental e a constante alteração normativa podem criar fatores de descontinuidade às políticas públicas. Garantir legitimidade social para a ação governamental, a partir de mecanismos institucionais que permitam a participação da sociedade civil na elaboração, implementação e fiscalização das políticas, pode representar um fator de maior resiliência às políticas diante de tentativas de desmontes e esvaziamentos por parte de governos. Assim, a participação popular na gestão das políticas não é apenas um fator de controle democrático ou accountability, mas também uma estratégia para consolidar a permanência de tais ações governamentais.

3 DIREITO, POLÍTICAS PÚBLICAS E INSTITUIÇÕES

O neoinstitucionalismo - corrente teórica utilizada por parte dos pesquisadores da abordagem DPP - não se limita a investigar os atores políticos e sociais individualmente considerados, mas centraliza a visão nas instituições em que tais indivíduos estão inseridos e investiga as capacidades e os limites que esses arranjos institucionais criam para a elaboração e implementação das políticas públicas. Entre as três correntes do neoinstitucionalismo, a abordagem DPP estabelece um diálogo, mais frequentemente, com o neoinstitucionalismo histórico.

A importância das instituições na análise de políticas públicas é explicitada no clássico texto de Ellen Immergut (1992), em que a autora demonstra como o desenho das instituições em cada país contribuiu de forma decisiva para o êxito - ou a falta dele - na consolidação de um seguro de saúde nos países analisados. A partir de um olhar sobre a arena de ação - arena executiva, parlamentar e eleitoral - Immergut demonstra que os arranjos institucionais foram determinantes para a maior ou menor absorção das demandas de saúde pelo Estado.

Outros trabalhos destacam a centralidade das instituições, como de Douglas North, que as define como “regras do jogo”, ou seja, os parâmetros que ditarão os espaços nos quais ocorrerão as disputas políticas e, também, como ocorrerão tais disputas (North, 1990NORTH, D. Institutions, Institutional Change and Economic performance. Cambridge University Press, Cambridge , 1990.). Paul Pierson utiliza o conceito de path dependence (dependência da trajetória), afirmando que as decisões tomadas no momento que as instituições são formadas influenciam de maneira relevante no futuro funcionamento dessas, considerando o provável constrangimento criado pelas instituições que dificultaria eventuais mudanças em sua estrutura. Assim, a dependência da trajetória é relevante para delimitar a direção e o desenvolvimento posterior das instituições e das políticas públicas. Segundo Pierson, levar em conta a dependência da trajetória é dar atenção às dinâmicas que reforçam (self-reinforcing) os arranjos institucionais anteriormente postos, como também compreender os feedbacks positivos que ocorrem no sistema político (Pierson, 2004PIERSON, P. Politics in time: history, institutions, and social analysis. Princeton: Princeton University Press; 2004.).

Uma das possibilidades de pesquisa consiste em analisar as limitações e possibilidades criadas para a política pública a partir de seu desenho jurídico-institucional, tendo em vista que a disposição de competências, relações intersetoriais, tarefas entre os gestores, define boa parte do funcionamento da policy e diz muito sobre sua possibilidade de êxito (Bucci; Coutinho, 2017BUCCI, M.P.D.; COUTINHO, D. Arranjos jurídico-institucionais da política de inovação tecnológica: uma análise baseada na abordagem de direito e políticas públicas. In: COUTINHO, Diogo; FOSS; MOUALEM, (org.). Inovação no Brasil: avanços e desafios jurídicos e institucionais. São Paulo: Blucher, 2017. ).

Diogo Coutinho faz algumas observações sobre a delimitação da institucionalidade de uma política pública. Nas palavras do autor, visualizar o direito como arranjo institucional consiste em compreender que o “Direito define tarefas, divide competências, articula, orquestra e coordena relações intersetoriais no setor público e entre este e o setor privado” (2013, p. 23COUTINHO, Diogo R. O Direito nas Políticas Públicas. In: Política Pública como Campo Disciplinar, Eduardo Marques e Carlos Aurélio Pimenta de Faria, orgs., Rio de Janeiro/São Paulo: Ed. Unesp, Ed. Fiocruz, 2013.). Assim, a elaboração do desenho jurídico institucional vincula-se a ideia dos meios políticos e jurídicos necessários à efetivação de políticas públicas, dada sua capacidade de “possibilitar a integração de um conjunto complexo de normas, atores, processos e instituições jurídicas” (Bucci; Coutinho, 2017BUCCI, M.P.D.; COUTINHO, D. Arranjos jurídico-institucionais da política de inovação tecnológica: uma análise baseada na abordagem de direito e políticas públicas. In: COUTINHO, Diogo; FOSS; MOUALEM, (org.). Inovação no Brasil: avanços e desafios jurídicos e institucionais. São Paulo: Blucher, 2017. , p. 314).

Essa perspectiva permite ampliar a visão sobre a efetividade das políticas públicas, pois uma política eficaz não se faz apenas com uma produção legislativa sólida, em vista da necessidade da base normativa em se articular com atores governamentais e não governamentais, instituições e orçamento público.

Nesse sentido, é necessário potencializar a denominada imaginação institucional, não se limitando a reproduzir antigos modelos de instituições, mas sim, buscar no conjunto histórico e social o desencadeamento da capacidade de pensar novos arranjos institucionais, em um novo contexto político, para a solução de problemas estruturais. Nesse ponto, não basta encaixar antigas soluções, elaboradas previamente, em problemas relativamente novos. É necessário, antes, a compreensão do problema e suas especificidades para o desenvolvimento de uma solução madura, que aponte caminhos a serem seguidos.

Contudo, considera-se a crítica de Boito de que as instituições não estão apartadas do processo social e econômico, sendo pouco eficaz uma análise que considere as dinâmicas políticas de modo formal, como se essas produzissem efeitos independentemente da dinâmica social em que estão inseridas (Boito; Galvão, 2012 BOITO JR., Armando; GALVÃO, Andréia. Apresentação. In: BOITO JR., Armando; GALVAO, Andréia (org.). Política e Classes Sociais no Brasil dos anos 2000. São Paulo: Alameda, 2012).

Se tradicionalmente o positivismo afirma que o direito tem como objeto de estudo a norma jurídica, a abordagem DPP pode ampliar esse recorte, ao defender que as ciências jurídicas não estudam apenas a norma jurídica, mas também, as instituições. Dessa forma, a própria norma jurídica só é criada através de instituições, que existem previamente, responsáveis pela atividade legiferante e pelo seu controle jurisdicional. Em outras palavras, há a necessidade de uma materialidade institucional do Estado como condição sine qua non para a produção de normas, sendo que esta materialidade é formada tanto pelas instituições quanto pelos procedimentos que as modelam. É nesse sentido que Santi Romano afirmou que: “o direito são as normas e o que põe as normas” (Romano Apud Bucci, 2013BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma Teoria Jurídica das Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva , 2013;).

As instituições podem servir como ponto de conexão para um diálogo interdisciplinar entre o direito e a ciência política, pois ambas as áreas do conhecimento as têm como objeto de estudo, cada qual iluminando determinados pontos do referido objeto. O componente jurídico pode ser identificado ao observarmos que o direito é responsável por garantir existência formal às instituições, bem como elaborar o seu desenho jurídico institucional.

Sobre o estudo das políticas públicas nos cursos jurídicos, vale sublinhar alguns pontos. Não é raro que os estudantes de direito comecem a análise de uma política pública prescrevendo como determinada ação governamental deveria funcionar. Essa inclinação relaciona-se com o fato de que o curso de direito costuma lidar com um pensamento normativo, acostumado a declarar como as coisas deveriam ser, antes mesmo de descrever como elas são, focando no mundo do dever-ser e negligenciando o mundo do ser. A realização de disciplinas, por estudantes de direito, em outras faculdades, como Faculdade de Ciência Política ou Sociologia, evidencia esse contraste entre um pensamento descritivo e um pensamento normativo, dada a ânsia dos juristas em tentarem prescrever a solução de um problema antes mesmo de entenderem as determinações que o constituem (Bucci, 2019BUCCI, Maria Paula Dallari. Método e aplicações da abordagem Direito e Políticas Públicas. REI-Revista Estudos Institucionais, v. 5, n. 3, 2019).

A abordagem DPP requer que os pesquisadores deem alguns passos atrás antes de formularem afirmações prescritivas. Isto posto, reitera-se a necessidade de identificar como o problema se apresenta na sociedade, de maneira fática, e como a política pública foi realmente implementada, de modo a detectar os eventuais gargalos que dificultam a sua efetividade. Em outras palavras, antes de afirmar como a ação governamental deveria ser, é necessário ter maior clareza de como ela é, considerando como o tema chegou à agenda governamental, quais foram suas estratégias de implementação, os atores sociais e governamentais envolvidos com a chegada do tema à agenda e a sua capacidade concreta de atingir os objetivos inicialmente propostos.

A discussão proposta neste tópico pode ser elaborada por outra perspectiva, destacando a instrumentalização de diferentes espécies normativas para fundamentar legalmente uma política pública e, além disso, explicitando as instituições envolvidas na implementação de determinada ação governamental. Kreis e Christensen apontam a existência de normas estatutárias, constitucionais, regulatórias e judiciais (2013KREIS, A. M. and CHRISTENSEN, R. K. Law and Public Policy. Policy Stud J, 41: PP. 38- 52, 2013.).

Desse modo, as diferentes espécies normativas possuem especificidades enquanto guias do comportamento dos administradores e policymakers. Sobre as diferenças encontradas na fase de produção da norma, visualiza-se uma maior abertura do Parlamento para o lobby se comparado ao Poder Executivo (Cesário, 2016CESÁRIO, Pablo Silva. Redes de influência no Congresso Nacional: como se articulam os principais grupos de interesse. Rev. Sociol. Polit., v. 24, n. 59, p. 109-127, set. 2016). A existência de mais pontos de vetos na produção normativa do Poder Legislativo, como o sistema bicameral ou as votações em comissões temáticas, também são úteis para ilustrar essas distinções.

Compreender a institucionalidade da arena na qual a política pública está sendo formulada - ou implementada - pode ser estratégico, pois permite visualizar os pontos de veto, mapear os tomadores de decisão e explicitar que o arranjo institucional do Executivo, Legislativo ou Judiciário servirá de mediação entre os interesses envolvidos. A atuação da Defensoria Pública e do Ministério Público para a efetivação ou fiscalização das políticas públicas também é um fator a ser considerado nesta discussão.

Todavia, alerta-se para o risco de que tais estratégias se convertam em um consequencialismo, fundamentado em uma soberania de fins. Há um risco eminente quando as garantias e os direitos fundamentais viram um obstáculo para a consecução do fim que se quer atingir, tomando as consequências ditas positivas de determinada política como o objetivo último a ser alcançado, independentemente de os meios utilizados estarem em desacordo com os parâmetros constitucionais.

Para além da definição de normas estatutárias, judiciais e constitucionais, afirma-se a existência de diferentes pontos de veto a depender da espécie normativa adotada. A medida provisória, como forma de desempenho da função legislativa pelo Executivo (função atípica) possibilita uma aceleração do processo decisório de formalização da lei. Isso porque, a própria Constituição estabelece o trancamento da pauta do Senado ou da Câmara dos Deputados se a medida provisória não for votada em determinado período temporal (art. 62, §6º da Constituição Federal3 3 Art. 62, § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. ). Essa especificidade procedimental auxilia, por vezes, para acelerar a deliberação dos parlamentares.

4 APONTAMENTOS SOBRE A UTILIZAÇÃO DA ABORDAGEM DPP

Umas das possibilidades de análise da política pública é visualizá-la pela perspectiva de ação governamental em escala, isto é, as políticas públicas se preocupam com a resolução de problemas de, no mínimo, um conjunto de pessoas, e não a pacificação de um problema individual. Dito de outro modo, enquanto o direito tradicionalmente busca proteger interesses particulares, olhando para a justiça individual, a política pública preocupa-se com o bem estar de um grupo, de forma agregada, considerando que essa nunca é construída para uma única pessoa, mas no mínimo para um grupo de pessoas. Embora algumas áreas do direito estejam vinculadas à noção de bem estar coletivo, como o direito ambiental e o direito constitucional, o próprio exercício da advocacia privada tende a se preocupar, tradicionalmente, com o bem estar individual de um cliente (Clune, 1993CLUNE, William H. Law and Public Policy: Map of an Area, 2 S. Cal. Interdisc. L. J. 1, 1993.).

Outra característica determinante de uma política pública é que ela envolve uma ação governamental coordenada e articulada, ou seja, demanda a atuação de múltiplos entes governamentais, a participação de atores externos ao governo, a coordenação entre diferentes níveis do Estado - federal, estadual e municipal - grupos de interesse atuando nos três Poderes, participação da sociedade civil, entre outros.

Os diferentes atores que influenciam uma política pública, entretanto, possuem especificidades em relação a determinadas fases dessa política. Segundo Kingdon o Presidente da República possui maior capacidade para inserir determinado problema na agenda governamental, mas pouca influência na elaboração de soluções. Por outro lado, pesquisadores e acadêmicos possuem pouca capacidade de colocarem um tema na agenda governamental, mas detêm influência e meios para elaborar alternativas que serão destinadas à solução do problema enfrentado pela ação governamental (KINGDON, 1984).

É necessário frisar que nem todo objeto de pesquisa deverá ser analisado com as lentes da abordagem DPP, considerando que certos temas serão mais bem contornados a partir da análise jurídica tradicional. Entretanto, temas que envolvam uma intensa imbricação entre direito e política, ação governamental e desenho jurídico-institucional, entre outras questões, podem ser mais bem compreendidos a partir da abordagem referida.

Neste ponto, respondendo a uma das questões levantadas na introdução deste artigo, destaca-se que uma das utilidades da abordagem DPP é evidenciar a capacidade do direito em converter impulsos políticos em medidas despersonalizadas, possibilitando uma permanência institucional que transcende a existência dos atores políticos que a criaram. Essa utilidade demonstra a importância de se evidenciar a imbricação de aspectos jurídicos e políticos na análise das políticas públicas.

Nesse sentido, é relevante assinalar outras funcionalidades da abordagem DPP:

Ela permite compreender o direito “em ação” nas políticas públicas (superando, desse modo, uma abordagem meramente descritiva, estática e formal do elemento jurídico) e, por conta disso, não o isola ou disseca do contexto político-institucional em que opera. Possibilita, em suma, a integração dos juristas ao campo multidisciplinar de estudos das políticas públicas (Bucci; Coutinho, 2013COUTINHO, Diogo R. O Direito nas Políticas Públicas. In: Política Pública como Campo Disciplinar, Eduardo Marques e Carlos Aurélio Pimenta de Faria, orgs., Rio de Janeiro/São Paulo: Ed. Unesp, Ed. Fiocruz, 2013., p. 315).

Observa-se que a concepção de direito “em ação” remonta a definição de políticas públicas para parte da ciência política, que a compreende como “Estado em ação” (MARQUES, 2013MARQUES, Eduardo. As políticas públicas na ciência política. In: MARQUES, Eduardo; FARIA, Carlos Aurélio Pimenta de. (Orgs) A política pública como campo multidisciplinar. São Paulo/Rio de janeiro: Unesp/ Fiocruz, 2013.). A superação de uma perspectiva jurídica estática leva em consideração a interação do direito com o contexto político e institucional em que está inserido, pois embora alguns tentem isolar o direito metodologicamente, em busca de uma pureza científica, não é razoável desconsiderarmos que o direito se relaciona, diretamente, com outras dimensões sociais, políticas e institucionais, compondo um todo social. Embora possamos isolar o objeto de pesquisa para visualizarmos suas especificidades, é necessário retornar à totalidade na qual esse objeto está inserido.

Assim, a abordagem tenta visualizar o direito em movimento, a despeito da tendência tradicional de enxergá-lo de forma estática. O modo como os conceitos jurídicos são ensinados no âmbito da graduação já evidenciam essa tendência de apresentar o fenômeno jurídico enquanto experiência inerte, dada separação existente entre essas ideias e o contexto político, ou ainda, entre o mundo do ser e o mundo do dever ser.

5 POLÍTICAS PÚBLICAS NO CONTEXTO DO ESTADO SOCIAL

A política pública não tem uma existência deslocada de um contexto histórico e social, mas pelo contrário, é fruto de uma forma específica de organização do Estado e da sociedade. Assim, a política pública, como a conhecemos atualmente, tem como fonte o Estado social e a organização moderna da economia capitalista. Há uma multiplicidade de deveres estatais que são específicos ao Estado de bem-estar, como por exemplo, a concretização dos direitos sociais. Não é difícil perceber que a própria alteração na postura do Estado social, devendo atuar de forma prestacional para concretizar direitos sociais, requer um aprofundamento em relação às políticas públicas. Nas palavras de Clarice Duarte:

No Estado social de direito, é a elaboração e a implementação de políticas públicas - objeto, por excelência, dos direitos sociais - que constituem o grande eixo orientador da atividade estatal, o que pressupõe a reorganização dos poderes em torno da função planejadora (Duarte, 2007DUARTE, Clarice Seixas. A educação como um direito fundamental de natureza social. Educ. Soc., Campinas , v. 28, n. 100, p. 691-713, Outubro. 2007., p. 701).

Todavia, algumas contradições permeiam essa temática. A primeira refere-se ao fato de que no Brasil houve “uma Constituição dirigente ao tempo em que os Estados que lhe serviram de inspiração já viviam outra realidade” (Bucci, 2018BUCCI, Maria Paula Dallari. Constituição, política e políticas públicas. In: 30 anos da Constituição de 1988. Uma jornada democrática inacabada. Carlos Bolonha e Fabio Corrêa Souza de Oliveira (orgs.). Rio de Janeiro, 2018, p. 119-132). Assim, se o Estado social é regulamentado, no Brasil, a partir dos eixos estabelecidos pela Constituição de 19884 4 Embora a Constituição de 1934 já trouxesse diretrizes constituintes de um Estado social, o início do Estado Novo em 1937 dificultou a concretização dessas diretrizes no Estado Brasileiro. - inspirada no Welfare State norte americano e no Estado de bem estar social europeu - devemos destacar que na década de 90 essa concepção estatal já estava enfraquecida na Europa e nos Estados Unidos, em virtude da ascensão de políticas econômicas neoliberais, consolidadas pelo governos de Margareth Thatcher e Ronald Regan, respectivamente.

Uma segunda contradição refere-se à existência de um Estado Democrático em uma economia capitalista. Assim, enquanto a democracia requer, ao menos idealmente, uma capacidade mais ou menos igual entre os indivíduos de decidirem sobre os rumos políticos do Estado, o capitalismo é guiado pela lei da acumulação, colocando muito capital na mão de poucos e nenhum capital na mão de muitos. Desse modo, há uma coexistência permeada por essa contradição quando observamos um modo de produção capitalista em um sistema democrático. A possibilidade de converter o poder econômico em poder político também é relevante para essa discussão.

É possível discutir, também, o declínio do Estado social no Brasil mesmo antes da sua concretização. Isso porque, várias normas e diretrizes governamentais elaboradas nos últimos anos têm colocado em xeque a proteção dos direitos sociais, como por exemplo, a diminuição do orçamento da União para investimento nas áreas sociais, flexibilização dos direitos trabalhistas, terceirização do trabalho, entre outras. Nesse ponto da discussão, não basta olharmos de maneira restritiva para a norma e considerá-la como ponto máximo de norteamento do Estado, mas compreender que as normas aprovadas pelo Congresso Nacional e defendidas pelo governo representam diferentes projetos políticos para o país.

Reformas consolidadas pelo Executivo e Legislativo Federal, bem como decisões do STF podem auxiliar na compreensão de um declínio dos direitos sociais: I) EC 95 de 2016, que estabeleceu congelamento dos investimentos públicos durante vinte anos, atualizando os “gastos” do Estado de acordo com a inflação de cada ano; II) reforma trabalhista instituída pela Lei 13.467/ 2017. III) terceirização de atividades fim por meio de decisão do STF; III) restrição do direito à greve por meio do RE 693456, julgado pelo STF; IV) possibilidade do negociado prevalecer sobre o legislado a partir da reforma trabalhista.

A Emenda Constitucional 95 de 2016 - também conhecida como PEC do teto de gastos - estabeleceu um congelamento dos investimentos públicos durante vinte anos, atualizando os “gastos” do Estado de acordo com a inflação de cada ano. Com a EC 95 de 2016 não há mais a necessidade de os governantes investirem uma porcentagem paulatinamente crescente em políticas sociais, mas apenas de investirem nessas áreas o que fora aplicado no ano anterior, acrescido da inflação. Dessa forma, ainda que o PIB do Brasil aumente de um ano para o outro, os recursos para tais áreas ficarão estagnados, e o aumento do PIB não refletirá no investimento em direitos sociais. Considerando que as políticas públicas só podem ser concretizadas a partir de receitas orçamentárias, a EC 95 fragiliza a própria dimensão de efetividade daquelas. Curiosamente, a parte do orçamento designado ao pagamento dos juros da dívida pública não entra no congelamento de gastos estabelecidos pela EC 95.

A crítica em relação aos orçamentos destinados à implementação de políticas públicas, afirmando que esses engessariam a política, “substituindo o processo de decisão política pelas imposições constitucionais” não é recente, sendo difundido há pelo menos vinte anos (2006, p. 72). Entretanto, conforme destacam Massoneto e Bercovicci, tais críticos não são tocados pelo mesmo incômodo em relação ao orçamento destinado à tutela de políticas neoliberais de ajuste fiscal (2006BERCOVICI, G.; MASSONETTO, L. F. A Constituição Dirigente Invertida: A Blindagem da Constituição Financeira e a Agonia da Constituição Econômica. Boletim de Ciências Econômicas, vol. XLIX. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2006. ).

De acordo com Bercovicci e Massoneto, embora a Constituição de 1988 garantisse uma extensa lista de direitos sociais e políticas públicas, tais direitos não estavam acompanhados de instrumentos financeiros capazes de lhes garantir efetividade. Dito de outro modo, havia a previsão de direitos sociais, mas não a previsão de instrumentos financeiros que lhes garantissem uma efetiva concretização (2006BERCOVICI, G.; MASSONETTO, L. F. A Constituição Dirigente Invertida: A Blindagem da Constituição Financeira e a Agonia da Constituição Econômica. Boletim de Ciências Econômicas, vol. XLIX. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2006. ).

Outra crítica possível relaciona-se ao caráter de financiamento das políticas públicas pela Constituição de 1988, pois se há uma definição de ações a serem implementadas paulatinamente pelos governos, o financiamento dessas políticas, da perspectiva tributária, remete a uma dinâmica regressiva, pois concentra a tributação no consumo em detrimento da taxação progressiva da renda e da propriedade.

Considerando que só há dois tipos de investimentos possíveis, quais sejam, o público e o privado, o esvaziamento da capacidade de investimento do Estado aumenta o poder de barganha do setor privado. Portanto, a potencialidade de crescimento da economia e da criação de empregos se concentra mais intensamente na mão do setor privado, ampliando sua força de influência para a aprovação de reformas, como a trabalhista.

Há três aproximações possíveis ao analisarmos a política pública no direito: macroinstitucional, mesoinstitucional e microinstitucional. A primeira considera a dinâmica política e a ação do Estado que permeiam a política pública, e seria a aproximação mais distante. Uma análise intermediária seria a mesoinstitucional, que foca no arranjo institucional de uma política pública, bem como a funcionalidade que esse desenho jurídico institucional terá para a efetividade da política em questão. Por fim, a análise microinstitucional seria uma espécie de átomo analítico, ao observar a ação governamental - análise mais próxima -, a política pública em si, considerando os atores sociais e governamentais envolvidos e os problemas que a política pública almeja solucionar (Bucci, 2013BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma Teoria Jurídica das Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva , 2013;).

Partindo da conceituação sobre os planos macro, meso e microinstitucional - e considerando o Estado Social enquanto fonte das políticas públicas - algumas reflexões podem ser feitas. Ainda que possamos focar na análise da ação governamental (plano microinstitucional) ou dos arranjos institucionais (plano mesoinstitucional), não podemos ignorar as determinações que impactam intensamente esses dois planos, advindas do plano macroinstitucional, que englobam a política (politics) e o Estado. É nesse sentido que se torna relevante delimitar as políticas públicas e seus arranjos institucionais no contexto do Estado Social, com o intuito de situá-los em uma realidade material e política específica. Dito de outro modo, o olhar para o plano macroinstitucional talvez permita uma “politização” (politics) da análise de políticas públicas (policy).

Situar a origem das políticas públicas no contexto do Estado Social, com uma determinação histórica e política específica, permite observarmos não só o campo da policy, mas também da politics, considerando a dinâmica política que permeia a elaboração e implementação de políticas públicas. Desse modo, visualiza-se a política pública e o direito não apenas como concepções abstratas, mas a partir da materialidade política e histórica que lhes constituem. Neste ponto, destaca-se que a ascensão de políticas neoliberais nos últimos anos é um fator de enfraquecimento e desmonte das políticas públicas no Brasil.

Se considerarmos a produção normativa como um reflexo da disputa de forças que ocorrem no seio da sociedade, concluímos que o Estado Social não é algo que se concretiza plenamente, ao ser positivado, mas sim um horizonte que deve ser disputado continuamente para que possa ser garantido. Essa perspectiva do Estado Social vinculado à correlação de forças na sociedade remete ao caráter político que existe na discussão das políticas públicas, que será abordado a seguir.

Sarat e Silbey criticam os pesquisadores que defendem a neutralidade dos estudos de políticas públicas, como um estudo puramente técnico, capaz de vincular meios disponíveis a determinados fins, ignorando os aspectos inerentemente políticos que envolvem essa discussão. Embora a separação entre politics e policy seja invocada frequentemente como uma ferramenta didática, que permite a visualização de diferentes dimensões que envolvem a ação do Estado e do governo, Sarat e Silbey destacam que autores vinculados ao liberalismo jurídico usam essa separação com o anseio de apontar que a análise de políticas públicas seria um campo apolítico (1988SARAT, A. & SILBEY, S. The pull of the policy audience. Law & Policy, 10, 97-166, 1988.) (Souza; Bucci, 2019SOUZA, Matheus Silveira de; BUCCI, Maria Paula Dallari. O estado da arte da abordagem direito e políticas públicas em âmbito internacional: primeiras aproximações. REI - Revista Estudos Institucionais, [S.l.], v. 5, n. 3, p. 833-855, dez. 2019. ISSN 2447-5467.).

A preocupação com um governo eficiente, dessa forma, seria uma questão de técnicas eficientes de administração, desvinculando a análise da política com P maiúsculo. Inserida neste debate, Deborah Stone afirma que discussões sobre políticas públicas podem, frequentemente, obscurecer os conflitos políticos subjacentes às ações governamentais mas não eliminá-los (1988).

Acreditar na possibilidade de atuação governamental como mero problema de gestão, demandando apenas especialistas treinados no assunto, é desconsiderar que a construção de toda norma ou política pública envolve a defesa de interesses de grupos distintos e que, por vezes, tais interesses são inconciliáveis. Isso porque, há sempre uma ideologia por detrás dos discursos que fundamentam e justificam uma ação governamental.

Defender a elaboração de políticas públicas como mero instrumental técnico - capaz de ligar os meios aos fins - pode servir, inclusive, para obscurecer os interesses daqueles que serão beneficiados com determinadas ações governamentais. Essa lógica política, levada ao extremo, enfraquece o princípio da soberania popular, criando algo como uma “soberania técnica”. Entretanto, essa perspectiva não deve significar que os tomadores de decisão ignorem os conhecimentos produzidos pela ciência, capazes de garantir maior segurança e eficácia às políticas. A pandemia do covid-19 evidenciou essa problemática, desvelando as ações desastrosas dos governantes que tomaram decisões a despeito dos fundamentos científicos.

Políticas de transporte público, que podem demandar uma realocação da quantidade de espaço viário para ônibus ou para carros particulares, são um exemplo claro sobre essa disputa. Outro exemplo possível é a discussão sobre políticas públicas de educação profissional e tecnológica, pois essas colocam em tensão diferentes projetos de educação profissional para o país, pois não há um consenso sobre qual tipo de educação é melhor para os indivíduos e para a sociedade.

Para ilustrar a problemática, considera-se a previsão de que as políticas públicas de educação deverão cumprir, de acordo com a Constituição (art. 205), o papel de desenvolvimento pessoal, preparo para o exercício da cidadania e qualificação profissional. Dessa forma, falar sobre diferentes projetos de educação é também discutir as diferentes ideologias que os permeiam e os fundamentam.

A ideia da educação apenas como qualificação profissional, desconsiderando seus outros dois aspectos, se levada ao extremo, pode servir não para amenizar, mas sim para intensificar as desigualdades sociais. Assim, ainda que em termos didáticos possamos separar política (politics) de políticas públicas (policy), é importante observarmos que a elaboração e implementação de políticas públicas sempre envolvem tomadas de decisões que são, também, políticas (politics).

Neste ponto, afirma-se a necessidade de “politizar” a análise de políticas públicas, reconhecendo as normas jurídicas, que dão suporte às políticas (policy), como a cristalização da disputa entre interesses divergentes e retomando a imbricação existente entre direito, políticas públicas e política. Desse modo, a análise de políticas públicas no direito pode servir, em alguma medida, não para obscurecer, mas para descortinar os conflitos políticos inerentes à discussão da política pública em questão (Souza; Bucci, 2019SOUZA, Matheus Silveira de; BUCCI, Maria Paula Dallari. O estado da arte da abordagem direito e políticas públicas em âmbito internacional: primeiras aproximações. REI - Revista Estudos Institucionais, [S.l.], v. 5, n. 3, p. 833-855, dez. 2019. ISSN 2447-5467.).

Outra possibilidade é olhar às políticas públicas não apenas na perspectiva de outputs transformados institucionalmente em inputs, mas também pelo enfoque das disputas que ocorrem na própria sociedade em relação aos direitos. Se as instituições são fundamentais para o resultado das políticas públicas, deve-se considerar que elas não possuem um funcionamento autônomo e indiferente em relação à conjuntura política e ao grau do debate nas disputas sociais.

Dito de outra forma, não há um arranjo institucional perfeito, que produzirá resultados positivos em qualquer conjuntura política e a despeito das disputas entre os grupos sociais. Reformas estruturais, como por exemplo a emenda do teto de gastos (EC 95), fragilizam a capacidade do Estado de financiamento e, consequentemente, interferem na produção dos resultados almejados. A correlação de forças entre as classes sociais e frações de classe, bem como as disputas entre as forças políticas organizadas são determinantes para a eficácia e resiliência das políticas públicas. Ainda que os fatores endógenos sejam determinantes às políticas públicas, relacioná-las a fatores exógenos pode representar ganhos analíticos para a pesquisa em DPP.

6 CONCLUSÃO

A abordagem DPP pode servir de instrumental teórico para o pesquisador que busca compreender políticas públicas cujos componentes jurídicos e políticos estão intimamente vinculados. Explicitar o contexto político e institucional que determinada ação governamental foi formulada e implementada também é relevante para visualizar as diferentes determinações que envolvem uma política pública.

A identificação de objetos de estudo em comum entre o direito e a ciência política - como as instituições e os arranjos institucionais - indica um terreno apto ao diálogo interdisciplinar, pois a investigação de objetos de pesquisa semelhantes, ainda que partindo de áreas de conhecimento distintas, permite visualizar problemas de pesquisa a partir de diferentes perspectivas.

Nesse sentido, não é raro observarmos, tanto na literatura de DPP nacional como na internacional, um diálogo com autores clássicos da ciência política e da policy sciences, tais como Sabatier, Kingdon, Robert Dahl, Ellen Immergut, Lowi, Lindblom, entre outros. Tais autores construíram uma base teórica que é essencial para a análise das políticas públicas em diferentes campos de estudo. Para ilustrar a afirmação precedente pode-se citar o ciclo de políticas públicas e a topologia de políticas - esta última desenvolvida por Lowi - como teorias capazes de organizar a análise de políticas (policies) em diferentes áreas do conhecimento. A interlocução com essa literatura, portanto, permite aprimorar a análise das políticas públicas no direito, ao visualizar a norma jurídica, as instituições e os arranjos institucionais em conjunto com os componentes políticos que lhes constituem.

Isolar um objeto de estudo para destrinchar suas mínimas especificidades é o passo precedente para analisá-lo, em um segundo momento, a partir do contexto político que está inserido. A premissa segundo a qual a norma jurídica é a cristalização de disputas políticas e sociais que representam interesses distintos auxilia no desvelamento do contexto político que permeou a construção de diferentes políticas públicas. Desvelar esse contexto permite analisar a política pública não de maneira isolada, mas colocá-la em relação com o Estado e demarcar a influência da correlação de forças para a resiliência das políticas públicas.

O elemento político se movimenta a partir da institucionalidade desenhada por normas jurídicas. Observar que a existência do direito se vincula à necessidade de instituições preexistentes para a criação do próprio direito auxilia nessa discussão. Desse modo, se trivialmente dizemos que o direito é criado pela política, é relevante recordar que o funcionamento da política (politics) depende de uma regulamentação jurídica prévia, isto é, é condicionado por sua institucionalidade.

Portanto, busca-se enxergar as instituições do Estado não de maneira isolada, pela perspectiva de seu funcionamento intrínseco, mas na relação que essa institucionalidade possui com as demandas sociais, identificando que a mudança na correlação de forças entre as classes sociais e suas frações determinará uma maior ou menor permeabilidade do Estado às demandas de distintos grupos.

Neste breve artigo, buscou-se indicar alguns temas que podem ser verticalizados na pesquisa da abordagem DPP. Arrisca-se afirmar que o ponto de contato que atravessa quase todas as problemáticas discutidas é a intersecção entre o direito e a política (politics), considerada em ao menos três perspectivas: a) o direito é produzido pela política e a política é produzida pelo direito, pois aquela necessita de instituições jurídicas prévias para seu funcionamento; b) a correlação de forças políticas é determinante para a implementação e resiliência das políticas públicas; c) a institucionalidade das arenas políticas pode ampliar ou restringir a eficácia das políticas públicas, seja na sua elaboração ou mesmo na sua implementação.

Este artigo, em suma, não pretendeu abarcar a totalidade das discussões que permeiam a abordagem DPP, mas apenas realizar alguns apontamentos sobre as relações que envolvem o direito, a política, a institucionalidade e as políticas públicas, de tal modo que a única conclusão possível seria no sentido de que a multiplicidade de temas que se abre para a investigação forma uma promissora agenda de pesquisa no campo jurídico e multidisciplinar.

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  • 1
    Neste artigo utilizaremos o termo ação governamental como sinônimo de políticas públicas.
  • 2
    Não ignoramos, todavia, que um bom domínio jurídico do assunto possui relevância no desenvolvimento de mecanismos de composição de interesses.
  • 3
    Art. 62, § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.
  • 4
    Embora a Constituição de 1934 já trouxesse diretrizes constituintes de um Estado social, o início do Estado Novo em 1937 dificultou a concretização dessas diretrizes no Estado Brasileiro.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2022
  • Aceito
    05 Abr 2022
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