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O outro cultural: migrantes, refugiadas e a vítima da violência de gênero

The Cultural Other: Migrants, Refugees and the Gender Violence Victim

Resumo

Decorrente de pesquisa de doutorado que trata da (co)produção do refúgio e das pessoas refugiadas em distintas instâncias de governamentalidade, este artigo aborda as práticas de gestão das emoções acionadas nas atividades de um projeto de conscientização sobre a violência de gênero, direcionado a mulheres migrantes e refugiadas residentes na cidade de São Paulo. A partir de etnografia realizada em distintos lócus das ações do projeto, abordo como as emoções realizavam um trabalho ora de aproximação, ora de afastamento da categoria da vítima, operando em processos de diferenciação e de produção de fronteiras. Percorro as soluções apresentadas às beneficiárias e a negociação de posicionamentos relativos a noções de vitimização, vulnerabilidade, cultura e tradição.

Palavras-chave:
vitimização; refugiados; violência de gênero; fronteiras; emoções.

Abstract

Resulting from a doctoral research which addresses the (co)production of refuge and refugees in different instances of governmentality, this article reflects on the practices of managing emotions in the activities of a project to raise awareness about gender violence, aimed at migrant and refugee women living in the city of São Paulo. Based on ethnography carried out in different Iocus of the project, I discuss how emotions performed a work of approximation or distancing from victim category, operating in processes of differentiation and production of borders. I address the solutions presented to the beneficiaries and the negotiation of positions related to notions of victimization, vulnerability, culture and tradition.

Keywords:
victimization; refugees; gender violence; borders; emotions

Resumen

Fruto de una investigación doctoral que trata sobre la (co)producción del refugio y de las personas refugiadas en diferentes instancias de gubernamentalidad, este artículo aborda las prácticas de gestión de las emociones desencadenadas en las actividades de un proyecto de sensibilización sobre la violencia de género, dirigido a a mujeres migrantes y refugiadas residentes en la ciudad de São Paulo. A partir de una etnografía realizada en diferentes locus de las acciones del proyecto, abordo cómo las emociones realizaron un trabajo ya sea de aproximación, o de alejamiento de la categoría de la víctima, operando en procesos de diferenciación y producción de fronteras. Repaso las soluciones presentadas a los beneficiarios y la negociación de posiciones relacionadas con las nociones de victimización, vulnerabilidad, cultura y tradición.

Palabras clave:
victimización; refugiados; violencia de género; fronteras; emociones

Introdução

Dalva pôs-se a caminhar com passos decididos desde o fundo do auditório, de onde, até minutos antes, assistia às falas das demais palestrantes. Posicionou-se de frente para a plateia e agarrou o microfone, que segurou forte contra o peito. Permaneceu de pé. Mais de 40 mulheres e crianças estavam sentadas diante dela. O barulho das vozes, dos gritos e do choro das crianças dominava a sala, impedindo que a presença de Dalva fosse notada. Ela estava diante de mulheres vindas de distintos países. Naquele dia, no entanto, elas vinham da Cidade Antônio Estevão de Carvalho, um bairro do distrito de Itaquera, na zona leste da cidade de São Paulo, o qual se fez morada para inúmeras congolesas e angolanas que haviam solicitado refúgio ao governo brasileiro na última década. Tentavam conter as crianças porque era sábado e os filhos não tinham escola ou creche. Considerando a importância do evento, em que todas aprenderiam sobre a Lei Maria da Penha, entraram em um ônibus que as levou até o edifício da Subprefeitura da Sé, na região central da cidade. Após um suspiro profundo, Dalva projetou sua voz bem alto, quase aos gritos: “Boa tarde, sou Dalva, Coordenadora de Políticas para as Mulheres”. Nenhuma reação. “O que tenho para dizer a vocês aqui hoje é que vocês não estão sozinhas. Eu também já estive em uma relação de violência”. Os gritos que preenchiam a sala transformaram-se em buchichos curiosos. Ela ganhou a atenção da plateia indócil.

Dalva falou da sua própria vida. Ela era uma mulher que se aproximava dos 50 anos. Contou que vinha de uma família de “imigrantes”, assim como aquelas que escutavam a sua história. Disse que seu avô “veio da Itália descalço para o Brasil” e que ela mesma havia queimado a mão naquela manhã fazendo pasta, sua comida favorita. Confidenciou que se casou muito jovem, que seus filhos eram fruto desse casamento e que percebeu, após 15 anos de matrimônio, que vivia um relacionamento abusivo: “Quando tomei consciência da minha situação, me separei”. Narrou em seguida como lutou para formar-se e para ter uma carreira de sucesso, “apesar de todas as dificuldades”, conciliando estudos, trabalho e o cuidado com os filhos. Tendo superado tantas adversidades, Dalva estava diante daquelas mulheres em posição de dar um testemunho não apenas de sofrimento, mas de superação. Se ela podia relatar sua história, se podia trabalhar pelas mulheres, foi porque não se calou, foi porque, sobrevivente de um relacionamento abusivo, foi capaz de sair daquela situação. “Coitada”, Chara sussurrou, baixinho, próximo ao meu ouvido. Sentada na cadeira à minha direita, a etíope tinha no colo a bebê de seis meses da sua vizinha, a congolesa Jana. Chara sentia pena de Dalva.

Este artigo aborda as práticas de gestão das emoções nas atividades de um projeto de conscientização sobre a violência de gênero, implementado a partir da localização das suas beneficiárias dentre os sujeitos vitimados pela “violência”, pela “tradição” ou pela “vulnerabilidade”. Descrevo, nas próximas páginas, algumas das técnicas de subjetivação e de sensibilização no contato entre agentes de governo e migrantes e refugiadas cujas vidas tais agentes buscavam afetar. As ações do projeto se inscreviam em tecnologias implicadas na produção emocional de fronteiras (Olivar, 2019OLIVAR, José Miguel Nieto, 2019. “Señora, no espere que un día de hospital cure 40 años de mala vida”: morte, emoções e fronteira. Horizontes Antropológicos. agosto 2019. vol. 25, no. 54, p.79-110. ). Analiso essas práticas em seus efeitos de territorialização da violência, de atribuição cultural e de pedagogia afetiva, profundamente implicados em projetos liberais contemporâneos que dialogam intimamente com noções caras a alguns setores dos feminismos.

Esta reflexão decorre de pesquisa de doutorado (Ribeiro, 2021RIBEIRO, Jullyane Carvalho. 2021. Fazer-se refugiada: fronteiras, crises e (co)produção de diferenças na gestão do refúgio. Ph.D. Dissertation, Universidade de Campinas.) em que investiguei as administrações do refúgio em distintos âmbitos de governo, analisando projetos e intervenções operacionalizados por organizações religiosas, agências internacionais e pelas estruturas estatais. Analisei ainda como essas técnicas de gestão e os processos de subjetivação e elas vinculados eram atravessados por categorizações de gênero, raça, sexualidade e pertencimento nacional. Na pesquisa, acompanhei o cotidiano de refugiadas e solicitantes de refúgio de distintas nacionalidades, como República Democrática do Congo (RDC), Nigéria, Angola, Cuba e Etiópia, as quais conheci, a princípio, por terem vivido em um abrigo para migrantes na região central de São Paulo. Foi também a partir do meu acompanhamento dessas mulheres que tomei conhecimento das atividades do projeto que analiso neste artigo, considerando que várias delas foram convidadas a participar das suas atividades por exercerem um protagonismo nas ditas “comunidades” em que viviam.

Produzindo a vítima

O encontro em que Dalva tornou pública sua história de violência tinha o objetivo de instruir “mulheres migrantes e refugiadas” sobre a Lei Maria da Penha, a legislação destinada à prevenção e à punição da violência doméstica e familiar contra as mulheres. Tratava-se do encerramento de um projeto realizado na cidade de São Paulo entre os anos de 2017 e de 2018, o qual foi tocado por agências internacionais em parceria com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos. O objetivo era trabalhar com a prevenção e o combate a situações de “violência de gênero” entre as beneficiárias, por meio da realização de seminários e rodas de conversa que privilegiavam o formato dos depoimentos e em que, supunha-se, as falas sobre os danos poderiam emergir.

Participaram do projeto mulheres de idades e formações muito variadas, desde pessoas sem escolaridade até com formação superior. Parte significativa do público a que Dalva direcionava seu relato era de pessoas cujos trânsitos e subjetividades orbitavam em torno das categorias de solicitantes de refúgio ou refugiadas. Refugiados são, nas regulações jurídico-administrativas das mobilidades, aqueles que obtiveram o reconhecimento de um “fundado temor de perseguição” da parte do Estado de destino ou ainda, na legislação brasileira do refúgio, o reconhecimento de que o território em que residiam ou de sua nacionalidade apresentava uma situação de “grave e generalizada violação de direitos humanos”. Solicitantes de refúgio são aqueles que estão ainda pleiteando esse reconhecimento, enquanto à categoria de migrante relacionam-se, da parte dos agentes institucionais, motivações outras, como a necessidade econômica, “melhorar de vida” ou “aproveitar a vida” (Togni, 2014TOGNI, Paula Christofoletti, 2014. A Europa é o Cacém. Mobilidades, género e sexualidade nos deslocamentos de jovens brasileiros para Portugal. Ph.D. Dissertation, Instituto Universitário de Lisboa.). Destinado a migrantes e refugiadas, o projeto não fazia distinção entre essas categorias. De um modo geral, as participantes provinham de outros países “do sul”, ou seja, de lugares frequentemente produzidos como nações de emigração e de expulsão de conacionais.

As rodas de conversa do projeto foram coordenadas por oito migrantes e refugiadas, denominadas “mediadoras culturais”, as quais receberam 600 reais mensais para que pudessem organizar as oficinas em cada um dos quatro “pontos focais” em que aconteciam as suas ações. Os encontros foram realizados tanto no centro da cidade como também no que se entendia como “territórios” das “mediadoras culturais”, ou seja, em bairros e localidades da “periferia” de São Paulo. A presunção era, então, que a mediação de mulheres que tivessem uma suposta proximidade cultural e afetiva com as migrantes e refugiadas, faria com que os depoimentos emergissem com mais facilidade1 1 Não por acaso, refiro-me a formuladoras e implementadoras no feminino. Uma demanda política de setores dos movimentos feministas refere-se, justamente, à possibilidade de construção de “espaços seguros” em que as experiências relativas à violência de gênero possam transmutar-se em fala ou em depoimento. A produção desses espaços estaria condicionada, primordialmente, a serem estes exclusivos de mulheres. Configura-se também, historicamente, a partir do depoimento, no âmbito da institucionalização dos feminismos e do combate à violência contra as mulheres e, posteriormente, da violência de gênero, a figura da “queixa”, de que fala Gregori (1992). Uma narrativa que produz a vítima discursivamente e um artefato central na construção de um “caso” (Corrêa, 1983). .

Uma extensa literatura antropológica tem como objeto o trabalho realizado pelas emoções em contextos de sofrimento e de violência, assim como sua articulação com a produção contemporânea da figura da vítima. Trabalhos como os de Maria Claudia Coelho (2010COELHO, Maria Claudia, 2010. “Narrativas da violência: a dimensão micropolítica das emoções”. Mana. Outubro de 2010. vol. 16, no. 2, p. 265-285. ) e de Coelho e Rezende (2011COELHO, Maria Claudia e REZENDE, Claudia Barcellos, 2011. Introdução. O campo da antropologia das emoções. In: COELHO, M.C; REZENDE C.B. Cultura e sentimentos: ensaios em antropologia das emoções. Contra Capa; Faperj. 220p. ) propõem um fecundo diálogo com a noção de “micropolítica das emoções”, cunhada por Catherine Lutz e Lila Abu-Lughod (1990LUTZ, Catherine A. e ABU-LUGHOD, Lila (eds.). 1990. Language and the politics of emotion. Cambridge: Cambridge University Press . 228p.). Lutz e Abu-Lughod apontam que os discursos sobre as emoções são também práticas que estruturam aquilo sobre o que se fala. Essa perspectiva permite que a análise recaia nas articulações entre as emoções e as relações de poder, em seu reforço ou reestruturação de hierarquias sociais. A noção de que as emoções se configuram em gramáticas emocionais, como apontam Coelho e Pardo (2018COELHO, Maria Claudia e PARDO, Johana, 2018. “O pátio do recreio: Interação, “bullying” e gramáticas emocionais da vitimização”. Dilemas - Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. 11 dezembro 2018. vol. 11, no. 3, p. 533-561.), enfatiza seu caráter relacional e os modos como se atualizam nas interações.

A articulação entre as gramáticas emocionais e os processos de conformação da categoria da vítima tem desempenhado um papel central também nas reflexões de Cynthia Sarti (2011SARTI, Cynthia, 2011. “A vítima como figura contemporânea”. Caderno CRH. abril 2011. vol. 24, no. 61, p. 51-61. ), que analisa o lugar da vítima na legitimação moral de demandas sociais e seu papel no reconhecimento público do sofrimento. Sarti reflete sobre o cruzamento entre a vitimização e a produção de subjetividades. Nessa perspectiva, a vítima se apresenta como “uma forma socialmente inteligível de expressar o sofrimento associado à violência, legitimando demandas e ações sociais de reparação e cuidado” (Sarti, 2011: 56). Sarti enfatiza ainda a incidência das demandas feministas no processo de conformação da “vítima da violência de gênero”, uma figura que orbita em torno da categoria da vulnerabilidade e de uma construção que delimita a abrangência das políticas específicas.

Com o seu emotivo relato Dalva conquistou as sensibilidades de uma plateia difícil apresentando-se como algo mais do que apenas a representante de uma causa distante (Boltanski, 2004BOLTANSKI, Luc, 2004. Distant Suffering: Morality, Media and Politics. Cambridge: Cambridge University Press. 266 p.). Ela produzia a autenticidade do seu engajamento a partir do acionamento de uma gramática emocional que a colocava na posição de mais uma vítima da “violência de gênero”. Uma vítima com rosto e voz, mas que não existia fora das técnicas narrativas que borravam singularidades, servindo à estratégia de tornar a causa coletiva: “vocês não estão sozinhas”. A fala da Secretária destinava-se a vítimas potenciais, as quais, tendo sido dadas as ferramentas para o reconhecimento de possíveis danos, teriam que vasculhar suas relações com o objetivo de identificarem situações de abuso e reconhecerem-se a si próprias e às suas amigas e vizinhas como um tipo particular de vítima, assim como para que identificassem determinados atos não apenas como conflito, mas como crimes (Debert e Gregori, 2008DEBERT, Guita Grin e GREGORI, Maria Filomena, 2008. “Violência e gênero: novas propostas, velhos dilemas”. Revista Brasileira de Ciências Sociais. fevereiro 2008. vol. 23, no. 66, p. 165-185. ).

Dalva buscava um efeito de identificação a partir de uma pedagogia preventiva, para que a vítima difusa da violência de gênero não se tornasse uma vítima de carne e osso (Lowenkron, 2015LOWENKRON, Laura, 2015. O monstro contemporâneo: a construção social da pedofilia em múltiplos planos. Rio de Janeiro: EDUERJ. 456 p.) ou, caso viesse a se identificar ou a se descobrir como essa vítima, que performasse da maneira tida como correta: denunciando o agressor. Mas, além de vítima, Dalva era também a vazão institucional desse sofrimento. Era na Rede de Atendimento que aquela dor devia buscar acolhida. Assim, Dalva era um sujeito da dor e do sofrimento e, simultaneamente, uma representante dos esforços institucionais de administração dessa dor. Nesse aspecto, a sua fala operava também uma certa quebra de protocolo. Falar sobre os sofrimentos particulares não era o comportamento esperado de uma representante estatal nos espaços institucionais. O Estado se expunha na performance de Dalva como uma instituição vulnerável e também passível de vitimização. Assim, a sua performance desafiava a visão do Estado como uma entidade fundamentalmente “masculina”, discutida em distintos trabalhos (Brown, 2006BROWN, Wendy, 2006. Finding the man in the state. In: SHARMA, A.; GUPTA, A. The Anthropology of the State: a reader. Oxford: Blackwell Publishing. 425 p.; Vianna e Farias, 2011VIANNA, Adriana e FARIAS, Juliana, 2011. “A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional”. Cadernos Pagu. dezembro 2011. no. 37, p. 79-116. )2 2 Uma literatura recente apresenta, para além da dimensão masculina das práticas estatais, também os aspectos de feminilidade acionados nas suas atuações. Maria Gabriela Lugones (2018) analisa determinadas gestões judiciais enquanto gestões “maternais”, ou exercícios de poder aproximados ao poder materno. Já Vianna e Lowenkron (2018), referem-se à coprodução, ou “duplo fazer” entre gênero e Estado. Em diálogo com uma extensa bibliografia, as autoras enfatizam a importância da consideração das dimensões de gênero do próprio Estado, considerando como este se apresenta “em ato”. . O Estado corporificado por Dalva era aquele com o qual as mulheres podiam contar não apenas para solicitar proteção, mas também para confidenciar. Contudo, Dalva performava determinadas características contemporaneamente atribuídas a uma vítima que se produzia em contraste com a passividade e que lutava para sair desta condição. Assim, ela articulava a denúncia a uma capacidade de agência como característica da feminilidade.

Analiso a performance de Dalva em seu aspecto de pedagogia, na busca das agentes institucionais por ensinar não apenas o que é “violência de gênero”, mas os modos adequados da manifestação do sofrimento e do engajamento por reparação. Essas pedagogias privilegiavam a vazão da dor em espaços institucionais, no formato dos depoimentos e da denúncia pública no campo da justiça criminal, a qual, pude notar, nem sempre tinha uma aceitação tão ampla assim entre as migrantes e refugiadas. Isso porque os sentidos do Estado como regulador de fronteiras, relações e afetos estavam sendo produzidos segundo tecnologias bastante complexas, o que transpareceu no momento das manifestações da plateia, ao final da fala de Dalva.

Enquanto todas batiam palmas, Judith, uma congolesa de não mais que 30 anos de idade, ergueu o braço e acenou em direção a Dalva, impaciente: “A Lei Maria da Penha coloca o marido na cadeia e depois o que acontece? Eu estou desempregada, é meu marido que sustenta a casa”. Também a angolana Angelina, na faixa dos 40 anos, se levantou, tomando coragem para fazer sua colocação: “Na nossa comunidade é diferente. Se alguma mulher denunciar o marido vai ficar ‘mal falada’. Eu não tenho família no Brasil, o que eu vou fazer?”.

Ambas as colocações, tanto de Judith quanto de Angelina, sugerem, em um primeiro plano de análise, que situações de violência institucional, violações de direitos e a impossibilidade de acesso ao mercado de trabalho eram obstáculos na realização das soluções para a “violência de gênero”. O desemprego e a falta de perspectiva de sustento econômico desde a chegada ao país eram algumas das queixas frequentes das refugiadas, tanto nos eventos públicos quanto nas conversas cotidianas. As colocações de Judith e Angelina faziam menção também a distintas rupturas nas relações afetivo-familiares. Não ter família no Brasil ou ter a casa sustentada exclusivamente pelo marido são situações que revelam uma sensação de dano no que se refere às relações de apoio emocional e material. Observo que não ter família no Brasil, para as refugiadas, é uma situação frequentemente relacionada às impossibilidades financeiras e de documentação, aos processos de regulação e fixação que se manifestam nas assimetrias postas nos regimes de mobilidade global (Glick Schiller e Salazar, 2013GLICK SCHILLER, Nina e SALAZAR, Noel B., 2013. “Regimes of Mobility Across the Globe”. Journal of Ethnic and Migration Studies. fevereiro 2013. vol. 39, no. 2, p. 183-200. ). Assimetrias profundamente estruturadas nas tecnologias de gênero que marcam os trânsitos e as relações que se dão na vida cotidiana a partir desses atravessamentos.

Mas a intervenção de Angelina, quando afirmava que “na nossa comunidade” as coisas eram diferentes, podia suscitar mais de uma interpretação. A primeira, constantemente reforçada nos eventos públicos organizados pelas estruturas do refúgio, sugeria que “comunidade” indicava uma espécie de diferença “cultural” inscrita em nações onde predominariam relações de gênero mais “opressivas” e “tradicionais”. Na presunção de que aquelas mulheres vinham de lugares cujo cotidiano era mais intensamente marcado não apenas pela violência contada a partir da sua história política, como também no que se refere às relações de afeto e intimidade, supostamente brutalizadas. Com alguma frequência, localizava-se esses confins (Serje, 2011SERJE, Margarita, 2011. El Revés de la Nación: territorios salvajes, fronteras y terras de nadie. Bogotá: Ediciones Uniandes. 368 p.) em “África” ou nas africanas, tidas como sujeitos mais “tradicionais” e insuficientemente socializados nas formas “modernas” de se relacionar.

Já o segundo efeito que aparece na referência de Angelina a uma “comunidade”, tem relação com a demarcação das fronteiras da alteridade em territórios nacionais “periféricos”, ou seja, em lugares habitados por populações tidas como “insuficientemente socializadas” nas leis e na ordem estatal (Das e Poole, 2004DAS, Veena e POOLE, Deborah (eds). 2004. Anthropology in the margins of the state. New Delhi; Oxford: Oxford University Press. 332 p.). Desenham-se, assim, os confins internos à nação, em que supostamente o Estado não se faz presente: a Cidade A.E. Carvalho, a zona leste, “pra lá de Itaquera”. Uma demarcação que, ao produzir suas alteridades internas, buscava posicionar um determinado “Brasil” dentre as nações e imaginações de liberdade e modernidade. Um Brasil que era, na fala das funcionárias, o centro de São Paulo, “o Estado”, a Subprefeitura da Sé, assim como a Secretária e sua herança europeia, a qual, não obstante ser migrante “como vocês”, tomou consciência da opressão e separou-se.

As intervenções de Judith e Angelina indicavam, no entanto, que a confiança que Dalva buscava alicerçar em sua fala esbarrava nas fronteiras da representação. Dalva, além de vítima da violência de gênero, apresentava-se a partir da localização de funcionária, representante de um Estado que, na vida cotidiana de migrantes e refugiadas, era produtor de violência institucional nos “territórios” em que viviam essas mulheres. Violência direcionada a populações que, a despeito de terem atravessado fronteiras, habitavam outros confins: as “periferias” paulistanas.

™Existe apenas uma verdade universal∫

Pouco antes da fala de Dalva na sede da subprefeitura da Sé, uma jovem promotora de justiça indagava à distraída plateia: “Alguém aqui sabe me dizer o que é violência de gênero?”. Ninguém arriscou uma resposta. Ela continuou: “Existe o sexo biológico, mas existem papéis de gênero. Comportamentos que se espera do homem e da mulher”. Prosseguiu falando sobre temas como “feminicídio” e “cultura do estupro”. Explicou que a violência sexual também pode acontecer dentro de casa: “Fazer sexo com o marido sem consentimento é estupro, é importante lembrar”. Enquanto a promotora falava sobre “papéis de gênero” busquei os olhos de Chara. Sentada ao meu lado, ela balançava o bebê de Jana nos braços e tinha o olhar vazio, fixo em algum ponto da cadeira à sua frente. Certamente pensava em outra coisa. “Gênero é a construção social do masculino e do feminino, quero que vocês fixem isso”, arrematou a promotora. O bebê dormiu nos braços de Chara e ela voltou de suas divagações. Me fitou, esboçou um sorriso tímido e falou baixinho: “dormiu, graças a deus”. Finda a fala da promotora, foi transmitido um vídeo em que o então secretário da ONU, António Guterres, afirmava que “existe apenas uma verdade universal, a de que a violência contra as mulheres é intolerável”.

Recordei-me, então, do dia em que conheci Chara, apenas algumas semanas antes. A ocasião era também um encontro daquele mesmo projeto, em uma igreja evangélica na Cidade A.E. Carvalho. Ali, a etíope, de 29 anos, vivia com sua amiga também etíope, Jahzara, de 31 anos. No mesmo bairro viviam Jana, seu marido e filhos. Naquele sábado, a nossa missão era levar duas grandes bacias cheias de bolinhos de chuva, fritos pelo marido de Jana, e alguns refrigerantes de laranja, até a igreja em que aconteceria o encontro do projeto. A comida era comprada com os 80 reais que Jana recebia do projeto para essa finalidade, em sua função de “mediadora cultural”. Fui conversando com Chara até a igreja, equilibrando os bolinhos de chuva nos braços, enquanto ela me falava da sua trajetória.

Chara despediu-se da sua família na Etiópia no ano de 2015 e passou primeiro pelo Sudão, seguindo depois para o Líbano onde, através do consulado do seu país, rapidamente conseguiu trabalho com uma família libanesa. Trabalhou como doméstica em Beirute por pouco mais de um mês e então os empregadores a convidaram para passar férias no Brasil. Chara ficou apreensiva porque conhecia muitas etíopes que trabalhavam no Líbano, mas no Brasil não conhecia ninguém. Quando os empregadores alegaram que seriam apenas três meses de férias, ela cedeu. Partiu rumo a São Paulo com um visto de turista. Chegando ao país, confiscaram seu passaporte e a mantiveram isolada. Passados os três meses das supostas férias, Chara já estava farta e queria voltar para o Líbano. Depois de um ano, a situação ainda era a mesma e os patrões finalmente admitiram que não pretendiam mais voltar. Chara trabalhava sem folga, sem contato com ninguém e sem falar o português. Ela recebia 100 reais mensais e os empregadores diziam que os outros 500 reais que completavam o salário estavam sendo enviados para a sua família na Etiópia. O filho da sua patroa a empurrou quando ela se recusou a limpar a cozinha após uma festa oferecida pelo rapaz. Após a agressão, Chara se trancou no quarto, recusando-se a sair, e ligou para a sua conterrânea, Jahzara, que ela nunca havia visto pessoalmente. Jahzara soube da existência de “outra etíope” na cidade através da filha do seu empregador. A menina estudava na mesma escola frequentada por uma das crianças cuidadas por Chara.

Jahzara, que também estava no encontro do projeto, havia passado por uma situação muito semelhante alguns anos antes. Tendo partido da Etiópia, foi buscar trabalho no Líbano, de onde foi levada após algumas semanas a São Paulo. O pretexto foi o mesmo: passariam férias, após as quais retornariam ao Líbano. Quando teve o seu passaporte retido, Jahzara entendeu que os empregadores não pretendiam voltar. Após um mês vivendo em São Paulo, Jahzara precisou ir até a farmácia para comprar absorventes. Saiu andando sem rumo e se perdeu. Sem saber como voltar, sentou-se na calçada e chorou, sendo socorrida por uma mulher que vendia café na rua. Após passar por um abrigo para migrantes, Jahzara conseguiu se empregar novamente e optou por permanecer no Brasil juntando algum dinheiro para enviar à sua família.

Mais de um ano depois, Jahzara incentivava Chara a seguir seus passos e sair da casa dos libaneses. Sob gritos e ameaças, Chara fugiu. Deixou para trás seus documentos, suas roupas e o salário. Alguns dias depois, as duas voltaram à casa para buscar a mala e o passaporte de Chara. Conseguiram recuperá-los após Jahzara ameaçar levar o caso à polícia. Chara buscou, então, reconstruir sua vida em um país de que nada sabia e nem ao menos gostava. As duas amigas foram viver juntas na zona leste, onde alugaram uma pequena casa, a princípio com a renda de Jahzara. No bairro, conheceram Jana e passaram a participar do projeto das agências da ONU. Diziam que gostavam das atividades nos finais de semana, quando tinham a oportunidade de sair um pouco de casa.

Ainda que tivesse me narrado tudo na igreja momentos antes do encontro do projeto, Chara nunca chegou a contar essa história em qualquer das suas atividades. Na tarde em que acompanhávamos as falas das agentes institucionais na Subprefeitura da Sé, Chara escutava e lamentava muito por Dalva. Sentia pena da vítima da “violência de gênero” com a qual, entretanto, não se identificava. Não desejava denunciar e nem mesmo via qualquer possibilidade de denúncia dos abusos que sofreu e dos quais tinha consciência e nomeava como violência. Achava também que seu sofrimento não cabia, não se encaixava nos propósitos do projeto porque, em sua visão, o que havia sofrido não era “violência de gênero”, considerando que a sua relação com o agressor era trabalhista e não afetiva. Chara tampouco via qualquer vantagem em buscar reparação judicial ou policial contra as pessoas que a mantiveram em cativeiro e confiscaram seu passaporte, uma “família de comerciantes ricos”, em suas palavras, da qual ela não sabia sequer o sobrenome.

A “verdade universal” da intolerância face à violência contra as mulheres, de que falava o representante da ONU, não significou, na trajetória de Chara, qualquer acesso a reconhecimento ou reparação. De toda maneira, Chara nunca reivindicou esse lugar, uma posição de sujeito a qual ela não acreditava que poderia lhe trazer qualquer vantagem prática. O reconhecimento público do seu sofrimento passaria, necessariamente, no âmbito das pedagogias do projeto, por uma queixa ou denúncia criminal que sustentasse sua posição de vítima. Posteriormente, quando perguntei a Chara se ela tinha o desejo de fazer uma denúncia que poderia, em minha visão, iniciar um processo com base na legislação sobre tráfico de pessoas, que inclui o deslocamento para ser submetida a “trabalho escravo”, Chara negou por não enxergar qualquer vantagem em tal denúncia3 3 Para uma discussão sobre a categoria do “tráfico de pessoas” em suas aproximações e afastamentos contextuais da categoria histórica “trabalho escravo” no contexto brasileiro, ver Sprandel (2016). . Acreditava que, por meio daquela legislação, dificilmente conseguiria documentos, o seu maior desejo naquele momento. Preferiu aguardar a resolução do seu processo de refúgio, o que não aconteceu até o momento em que Chara e Jahzara, novamente desempregadas e despejadas da pequena casa em que pagavam aluguel, decidiram sair do país.

Em reflexão sobre a figura da vítima do tráfico de pessoas, Piscitelli e Lowenkron (2015PISCITELLI, Adriana e LOWENKRON, Laura, 2015. “Categorias em movimento: a gestão de vítimas do tráfico de pessoas na Espanha e no Brasil”. Ciência e Cultura. junho 2015. vol. 67, no. 2, p. 35-39. ) observam que a noção de vítima é acionada em um campo de disputas entre quem pode ou não ser enquadrado na categoria. Tecnologias que buscam engendrar processos de subjetivação com o objetivo de que as pessoas “tecnicamente definidas como traficadas” desenvolvam uma espécie de consciência de sua condição (Piscitelli e Lowenkron, 2015: 36). Para as participantes do projeto que pude acompanhar mais de perto, também o engendramento da identidade da “vítima da violência de gênero” não obteve tanto sucesso, ao menos não no formato da queixa. Na visão de Chara, como também de Judith e Angelina, com base em suas interpelações, esse lugar de vítima tampouco era vantajoso, justamente porque não viam nele qualquer garantia de direitos para além da punição criminal aos homens de sua “comunidade”. Ao contrário, nos seus lugares de afeto e vivência, ser uma “vítima da violência de gênero” as colocava em uma posição de inferioridade. Seriam “mal faladas” além de correrem o risco de não encontrarem mais seu sustento econômico e afetivo naquela mesma “comunidade”.

A fuga da casa dos patrões e a busca por novas possibilidades de documentação através da solicitação de refúgio representaram importantes passos na lenta reconstrução material e subjetiva de Chara. Assim como o foram também o encontro com Jahzara e as redes de afeto que ela pôde acessar a partir da sua relação com Jana e das reuniões do projeto. Uma reconstrução possível, como colocado por Das (1995DAS, Veena, 1995. Critical Events: An Anthropological Perspective on Contemporary India. New Delhi: Oxford University Press. 240 p.), a partir de um trabalho árduo e cotidiano no refazer das relações em sua dita “comunidade”. Uma “comunidade” que materializava não um grupo cultural amorfo, mas um compartilhamento afetivo e de sustento econômico e material. A ideia da denúncia como ruptura completa e abrupta de uma situação de violência, nesse sentido, corresponde a um ideal que, nas vidas de Chara, Angelina e Judith, não se concretizou.

Fronteiras de gênero, fronteiras da nação

As pedagogias destinadas às migrantes e refugiadas participam também em processos de produção de fronteiras. Gênero, nacionalidade e processos de racialização são elementos centrais dessa produção, por serem estruturantes das relações de governo, assim como também noções erigidas a partir dessas regulações e fixações. Retomo aqui a análise de Anne McClintock (2010MCCLINTOCK, Anne. 2010. Couro imperial: raça, gênero e sexualidade no embate colonial. Campinas: Editora da Unicamp. 600p.), a qual demonstra que a produção dos territórios nacionais passa pela invenção e produção de espaços anacrônicos a serem penetrados, conquistados e explorados. Nessa construção, as fronteiras são traçadas a partir de inúmeras tecnologias de violência. Da mesma maneira, Veena Das (1995DAS, Veena, 1995. Critical Events: An Anthropological Perspective on Contemporary India. New Delhi: Oxford University Press. 240 p.) aponta que a produção de fronteiras forjada no momento histórico da partição - o violento processo de separação entre Índia e Paquistão - apenas foi possível porque se ancorou nos sequestros e violações das mulheres. Os argumentos das autoras indicam a centralidade do gênero na produção das fronteiras nacionais. O que gostaria de enfatizar, entretanto, é que os processos de violência, além de delimitarem fronteiras e nações, delimitam também imaginações sobre territórios e populações a que corresponderiam narrativas específicas sobre as relações de gênero em seus limites.

Chandra Mohanty (1984MOHANTY, Chandra Talpade, 1984. Under Western Eyes: Feminist Scholarship and Colonial Discourses. boundary 2. 1984. vol. 12/13, p.333-358. ) traz reflexões importantes sobre a produção simbólica e material dos sujeitos que habitam esses territórios. Mohanty aponta que os feminismos “brancos” e “ocidentais” têm participação fundamental nessa produção, através da articulação da categoria “mulheres do terceiro mundo”, ou de seu análogo “mulheres de cor”. Enquanto o denominado “primeiro mundo” seria produzido como tal porque alegadamente participaria de relações de gênero mais igualitárias e mais livres, as “mulheres do terceiro mundo” representariam um grupo homogêneo. Mulheres cujos mundos seriam atravessados pela pobreza, opressão e incivilidade. Com essa reflexão em mente, retomo o relato de Chara, que não se identificou com a fala de Dalva e com a posição de vítima performada por ela durante o evento. Isso porque identificar-se com essa condição significaria ocupar uma posição de vitimização distinta. Dalva era a vítima que se refazia através da denúncia e do depoimento público. Chara, não. Tampouco Judith e Angelina, que afirmavam que, na “nossa comunidade”, as coisas eram diferentes, e que haviam diferenças atravessadas por hierarquias mais complexas.

Outra camada de análise tem relação com o sinuoso jogo dos processos de imputação/reivindicação da categoria de vítima, em que operam intricadas técnicas de atribuição de semelhanças e diferenças cujo efeito é reforçar hierarquias entre vítimas, assim como entre aquelas pessoas que desejam pleitear esse reconhecimento perante as malhas institucionais. Maria Claudia Coelho (2010COELHO, Maria Claudia, 2010. “Narrativas da violência: a dimensão micropolítica das emoções”. Mana. Outubro de 2010. vol. 16, no. 2, p. 265-285. ) aponta que a compaixão, no âmbito das economias emocionais, tem o poder de aproximar pessoas em alguns aspectos e, ao mesmo tempo, de aprofundar diferenciações entre elas. Aponto que, no que se refere ao sentimento de piedade, essas diferenciações são demarcadas com maior intensidade. Isso porque é possível sentir pena apenas de quem ocupa um lugar social distinto de si, em um processo de intensificação de assimetrias entre quem sente e o objeto da piedade. Identificar-se com a fala de Dalva e com a posição performada por ela significaria ocupar mais uma posição de vitimização, para além do processo de deslocamento forçado e do trabalho degradante, com tudo o que a essas vítimas é reservado. A “pena” de Chara pode ser lida, assim, como uma recusa a se identificar com a posição de vítima a ela destinada nesse contexto.

O ™outro∫ cultural

A congolesa Jana, que se aproximava dos 40 anos, foi convidada pelas implementadoras do projeto para ser “mediadora cultural”. Partiu dela a sugestão de que algumas das rodas de conversa fossem realizadas na Cidade A.E. Carvalho. Jana alertou que a maior parte das mulheres que lá viviam não poderia comparecer a reuniões no centro de São Paulo, tanto por falta de recursos financeiros como porque as atividades de cuidado que exerciam em suas casas não permitiriam uma ausência prolongada nos finais de semana. Ela tomou a iniciativa de entrar em contato com o pastor de uma igreja evangélica do bairro e conseguiu autorização para realizar os encontros em sua sede aos sábados.

Jana vivia no segundo andar de um sobrado alugado, dividido entre várias famílias, como aqueles um dia chamados de “cortiços”. A dona do sobrado era brasileira, assim como seus vizinhos. Ela saiu da RDC com seu bebê recém-nascido. Trabalhou como advogada para inúmeras organizações internacionais. Foi, entretanto, a sua posição tida como de liderança entre os “refugiados congoleses” na cidade, assim como seu trabalho anterior como agente comunitária de saúde, que fez com que ela fosse convidada para ser “mediadora cultural” no projeto da ONU. O nome dado às responsáveis pela organização das rodas de conversa nos “territórios” é sugestivo porque, de um lado, pressupõe uma diferença cultural entre nacionais e refugiadas e, de outro, assume uma homogeneidade cultural em “territórios” outros. A interposição dessas fronteiras culturais reforçava hierarquias e imaginações frente a uma diferença produzida nos próprios espaços de interação do projeto. Ainda que fosse reconhecido, nas intervenções, que a “violência de gênero” era “uma verdade universal”, ou seja, que essa violência acontecia em todos os lugares, supunha-se que ela adquiria contornos particulares em territórios como a Cidade A.E. Carvalho. Nesses processos de territorialização da violência, os territórios “outros”, fossem eles denominados “Congo”, “África” ou “Cidade A. E. Carvalho”, eram lugares imaginados como confins, em que distintos modos de violência estavam sendo narrados a partir de inúmeros relatos.

Enquanto “mediadora cultural”, Jana estava sendo posicionada em uma fronteira entre diferentes mundos. Entretanto, ainda que fizesse uma espécie de “ponte”, por sua posição de liderança comunitária, Jana ainda assim era localizada pelo saber de profissionais, técnicas e consultoras, responsáveis por fazer uma interpretação cultural dessas alteridades. Nesse sentido, a atuação das “mediadoras culturais”, não obstante indicarem o reconhecimento de certas habilidades sociais e ativistas dessas mulheres, produziam o que James Clifford denomina, para o contexto da antropologia, como “a coerência de outros culturais e si-mesmos intérpretes” (Clifford, 1988: 100CLIFFORD, James, 1988. On Ethnographic Self-Fashioning: Conrad and Malinowski. In: CLIFFORD, J. The Predicament of Culture Twentieth-Century Ethnography, Literature, and Art. Cambridge: Harvard University Press. 398 p.). “Outros culturais” produzidos pelo discurso “técnico” e profissional das funcionárias e consultoras das organizações.

Jana atrasou-se no dia em que cheguei acompanhada por Chara à igreja em que aconteceria o encontro do projeto, quando levamos os bolinhos de chuva oferecidos por ela e por seu marido Alain. O lanche era considerado um elemento importante para que as vizinhas comparecessem com seus filhos, que precisavam comer. A boliviana Carol, mais uma “mediadora cultural” que atuava com Jana no bairro, já estava por lá quando chegamos, assim como outras 20 mulheres. Era o último encontro do ano e Jana e Carol sugeriram uma atividade para “trabalhar a autoestima”, em que todas teríamos que citar ao menos uma qualidade das demais. As qualidades eram faladas alto por cada uma e então eram escritas em papéis coloridos que guardaríamos conosco como lembrança. Tivemos um encontro emotivo, em que transpareceram afinidades e também as desavenças profundas que atravessavam as relações. A temática da “violência de gênero” não foi trabalhada e nem sequer citada. Nenhuma história de violência foi compartilhada naquele dia. Jana me contou que assim era melhor, porque não era fácil criar um clima de cumplicidade naquele ambiente, com “pessoas tão diferentes”, para falar sobre dores e sofrimentos considerados tão íntimos. Além disso, segundo ela, muitas das mulheres que participavam dos encontros sequer se conheciam anteriormente ao início das oficinas. Essas são importantes informações que desafiam a noção de proximidade cultural e sua transcrição automática em afinidade e afeto.

Jana tampouco compartilhou em quaisquer dos encontros a situação de violência que sofreu quando foi presa por suas atividades políticas em Kinshasa. Em sua percepção, aquela ocorrência não cabia no espaço das rodas de conversa. Os motivos eram vários. Jana achava que se expor a colocaria em um posicionamento vulnerável perante aquelas mulheres. Ela havia lutado pelo reconhecimento da posição de liderança que ocupava. Posicionar-se como vítima poderia significar colocar também tudo isso a perder. Além disso, suas vizinhas e amigas não conheciam os detalhes de sua prisão. Algumas ocupavam um espectro político distinto do seu, não sendo necessariamente possível estabelecer uma cumplicidade relativa ao que sofreu naqueles dias.

As torturas que sofreu na prisão e de que falava apenas tangencialmente também não eram vistas por Jana como “violência de gênero”. A vazão de seu sofrimento não passava pela queixa. Jana era uma militante cuja luta não tinha ficado no passado, em um território e em um tempo de violência que foi deixado para trás. A sua denúncia era do regime de terror político que se perpetuava naquele mesmo instante em seu país. Era também uma denúncia em nome de outras vítimas: das mulheres violentadas em contexto de guerra as quais ela atendia no leste da RDC. Ainda que sua atividade profissional no leste do Congo não fosse suficientemente valorizada em São Paulo (uma atividade, por sua vez, similar à de algumas das funcionárias das organizações implementadoras do projeto), era esse lugar que Jana desejava para si. Desde que chegou à cidade, entretanto, o único posicionamento que lhe havia sido possível ocupar era o de vítima da violência, de refugiada. Ela era solicitada a falar como uma expert no sofrimento, como um exemplo, portanto, mais do que como uma profissional, intelectual ou militante.

A subjetividade atribuída a Jana era a de uma vítima com expertise, denominada “mediadora cultural”, a qual apresentaria uma proximidade essencial e afetiva das demais mulheres do projeto, em especial das africanas. Não obstante as distintas nacionalidades, experiências de racialização e bagagem política, educacional e de classe, era suposto que todas provinham de territórios de violência e que deviam aprender a denúncia como modo de regeneração. Era isso o que fazia da violência de gênero uma “verdade universal”: a pretensa universalidade da vítima dessa violência. Essa vítima podia ser qualquer Dalva, Chara ou Jana. Entretanto, um aspecto para o qual chamo a atenção é que a recusa desse posicionamento de vítima podia significar, para Chara e para Jana - mas dificilmente para Dalva - uma negação dessa universalidade. Uma negação lida como socialização insuficiente, desconhecimento jurídico ou mesmo ignorância com relação aos mecanismos democráticos. Negação da liberdade, da modernidade e da autonomia.

Desfecho

Argumento que a (im)possibilidade narrativa dos danos sofridos por Chara e por Jana no léxico da “violência de gênero” opera na produção de fronteiras civilizacionais em distintas escalas. Processos que aproximam RDC e Cidade A.E. Carvalho enquanto territórios de violência supostamente marcados pela falta de intervenção, de denúncia e de Estado. Aponto que essas fronteiras estão sendo erigidas a partir de políticas e práticas de regulação das relações afetivas no cotidiano. Na sua produção, identificar-se com a vítima da violência de gênero, indignar-se com essa violência e crer nas pedagogias e nas soluções judiciais e criminais é posicionar-se ao lado da modernidade, é posicionar-se como um sujeito livre e autônomo.

Para Jana, o sofrimento, intimamente conectado à luta política, era o combustível que a fazia seguir. O que não significava, entretanto, que ela se visse como uma mera vítima, menos ainda como a “vítima da violência de gênero” performada por Dalva, aquela que se refazia a partir da denúncia. As instituições que protegiam Dalva, ainda que alegadamente fossem as mesmas que deveriam proteger Jana, a produziam como uma vítima completamente diferente. Não se identificar como essa vítima era necessário para a reconstrução cotidiana de Jana, de seus vínculos afetivos e das economias que garantiam seus modos de vivência. Viver através e apesar desse sofrimento, transposto em luta, preenchia seus dias de esperança: de um dia poder voltar, de novamente poder fazer política ao lado dos companheiros de partido, de rever seus filhos que ficaram em Kinshasa, na casa dos avós.

Retomando as intervenções no evento da Subprefeitura da Sé, ao dizer que em “nossa comunidade” não é assim, Angelina delimitava um espaço em que os elementos de busca por uma paz social através do depoimento e da denúncia nem sempre se encaixavam, seja pelo desemprego, pela necessidade de reconstrução de laços afetivos e familiares, pelo “estrangeirismo” 4 4 Para uma análise da construção histórica e normativa da figura do estrangeiro no país ver Seyferth (2008). Falo em “estrangeirismo” como um processo de sujeição/subjetivação ancorado na produção de subjetividades advindas de territórios e tempos “outros”, além de uma categoria de acusação em determinados contextos. ou mesmo pela falta de confiança ou crença nas soluções estatais. A pergunta feita a Dalva: “O que fazer?”, tem o efeito de reposicionar a funcionária em seu lugar de representante do Estado, de sujeito ao qual se pode direcionar demandas por direitos e reparação.

Se Dalva buscava, com sua fala, apontar a importância da denúncia nos espaços designados para tal, enfatizando também a agência das vítimas nessa situação - “me separei” -, Angelina e Judith devolviam “ao Estado” a responsabilidade por soluções que pudessem ir além da relação vítima/agressor. Demandavam direitos não em nome de uma “vítima”, mas da “nossa comunidade”. Quando Angelina e Judith falavam sobre uma ordem doméstica afetada pelas disposições do mercado de trabalho e pelas rupturas nos laços de sustento e afeto, elas retiravam as soluções do âmbito das disposições em denunciar ou mesmo do desconhecimento sobre leis e normas, as redirecionando para as demandas por justiça social. A denúncia que se ensinava no projeto, assim, poderia significar não apenas denunciar um agressor, mas toda uma “cultura”, toda uma “comunidade”.

Localizar-se a si mesma em uma “comunidade” particular é também anular parcialmente os efeitos da busca por uma identidade homogênea de “mulher vítima de violência” fora das relações de poder que marcam as vidas a partir das margens como menos dignas de serem vividas (Butler, 2010BUTLER, Judith, 2010. Marcos de guerra: las vidas lloradas. Barcelona: Editorial Paidós. 254 p.). É reivindicar um lugar para além da queixa, como também um espaço de luta por condições de recuperação e reconstrução das possibilidades de vivência material e afetiva. Quando dizem que na “nossa comunidade” não é assim, Judith e Angelina estão dizendo que a denúncia não terá os mesmos efeitos em todos os lugares e de qualquer posição de sujeito. Isso não significa desconhecer a “violência de gênero” e seus mecanismos, mas duvidar da aplicabilidade das mesmas soluções institucionais nos lugares governados a partir de práticas de criminalização e de controles que promovem, no cotidiano dessas mulheres, uma intensa ruptura afetivo-material.

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  • 1
    Não por acaso, refiro-me a formuladoras e implementadoras no feminino. Uma demanda política de setores dos movimentos feministas refere-se, justamente, à possibilidade de construção de “espaços seguros” em que as experiências relativas à violência de gênero possam transmutar-se em fala ou em depoimento. A produção desses espaços estaria condicionada, primordialmente, a serem estes exclusivos de mulheres. Configura-se também, historicamente, a partir do depoimento, no âmbito da institucionalização dos feminismos e do combate à violência contra as mulheres e, posteriormente, da violência de gênero, a figura da “queixa”, de que fala Gregori (1992). Uma narrativa que produz a vítima discursivamente e um artefato central na construção de um “caso” (Corrêa, 1983CORRÊA, Mariza, 1983. Morte em Família: Representações jurídicas de papéis sexuais. Rio de Janeiro: Edições Graal. 315 p.).
  • 2
    Uma literatura recente apresenta, para além da dimensão masculina das práticas estatais, também os aspectos de feminilidade acionados nas suas atuações. Maria Gabriela Lugones (2018LUGONES, Maria Gabriela. 2017. “¿Matronato? Gestiones maternales de protección estatal”. Cadernos Pagu. 8 janeiro 2018. no. 51.) analisa determinadas gestões judiciais enquanto gestões “maternais”, ou exercícios de poder aproximados ao poder materno. Já Vianna e Lowenkron (2018VIANNA, Adriana e LOWENKRON, Laura, 2018. “O duplo fazer do gênero e do Estado: interconexões, materialidades e linguagens”. Cadernos Pagu. 8 janeiro 2018. no. 51), referem-se à coprodução, ou “duplo fazer” entre gênero e Estado. Em diálogo com uma extensa bibliografia, as autoras enfatizam a importância da consideração das dimensões de gênero do próprio Estado, considerando como este se apresenta “em ato”.
  • 3
    Para uma discussão sobre a categoria do “tráfico de pessoas” em suas aproximações e afastamentos contextuais da categoria histórica “trabalho escravo” no contexto brasileiro, ver Sprandel (2016SPRANDEL, Marcia Anita, 2016. “Vou pra rua e bebo a tempestade”: observações sobre os dissabores do guarda-chuva do tráfico de pessoas no Brasil. Cadernos Pagu. 2016. no. 47. ).
  • 4
    Para uma análise da construção histórica e normativa da figura do estrangeiro no país ver Seyferth (2008SEYFERTH, Giralda, 2008. Imigrantes, estrangeiros: a trajetória de uma categoria incomoda no campo político. 26 a Reunião Brasileira de Antropologia. Porto Seguro. junho 2008. Avaliable at: Avaliable at: http://www.imigracaohistorica.info/uploads/1/3/0/0/130078887/seyferth_giralda._imigrantes_estrangeiros_a_trajet%C3%B3ria_de_uma_categoria_inc%C3%B4moda_no_campo_pol%C3%ADtico.pdf [Accessed on: 21.12.2021].
    http://www.imigracaohistorica.info/uploa...
    ). Falo em “estrangeirismo” como um processo de sujeição/subjetivação ancorado na produção de subjetividades advindas de territórios e tempos “outros”, além de uma categoria de acusação em determinados contextos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Dez 2021
  • Aceito
    01 Abr 2022
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