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Projetos desenvolvimentistas nas terras do sem-fim: Expansão do agronegócio e precarização do trabalho no semiárido baiano

Developmental projects in terras do sem-fim: expansion of agribusiness and precarization of labor in the semiarid of Bahia state (Brazil)

Resumos

A modernização agrícola ocorrida no Brasil a partir dos anos 1970 desencadeou transformações significativas no campo, sendo estas acentuadas em virtude da reestruturação produtiva do capital. Passados aproximadamente 40 anos, velhos problemas persistem, revelando as contradições do modelo agrário/agrícola adotado pelo Estado para sustentar o projeto de modernização do país. Novos territórios são incluídos no circuito reprodutivo do capital, tendo como desdobramento processos de desterritorialização, expropriação, miséria e precarização do trabalho postos como inevitáveis na trajetória rumo ao progresso e modernidade. Refletir sobre os resultados desse fenômeno faz-se necessário porque, através de sua análise, é possível identificar a origem de graves problemas vivenciados no campo e na cidade, pois no caso brasileiro, não é possível dissociar o campo da cidade. Para a realização da pesquisa fez-se necessário a construção de um referencial teórico associado a imersões a campo, com o intuito de estabelecer uma interlocução entre a teoria e a prática. A pesquisa está pautada na abordagem qualitativa, sendo utilizados diversos instrumentos de coleta de dados, tais como entrevistas, diário de campo, registro fotográfico e relatos orais, utilizados durante as várias etapas do trabalho de campo.

Modernização da agricultura; Expropriação camponesa; Precarização do trabalho; Agronegócio da manga; Livramento de Nossa Senhora (BA)


The agricultural modernization occurred in Brazil since the 1970s triggered significant changes in the field, which are accentuated due to the restructuring of productive capital. After about 40 years, old problems persist, revealing the contradictions of agrarian model/agriculture adopted by the State to support the project of modernization of the country. New territories are included in the reproductive circuit of capital, with the unfolding processes of dispossession, expropriation, misery and precariousness of work stations as inevitable on the path towards progress and modernity. Reflecting on the results of this phenomenon is necessary because, through its analysis, it is possible to identify the source of serious problems experienced in the field and in the city, as in the case of Brazil, it is not possible to separate the fields of the city. For the realization of this investigation it was necessary the use of theoretical references, with the intention to establish a relation between theory and practice. The research founds in the qualitative characterization of the scientific problem, with a use of different research´s methods such as interviews, diaries of fieldwork, photographical register and oral´s tales.

agriculture’s modernization; farmer´s expropriation; work´s precariousness; agribusiness; Livramento de Nossa Senhora (Bahia)


INTRODUÇÃO

No Brasil, a modernização da agricultura deu-se a partir da região Sul do país (década de 1960) e, ainda hoje, continua seu processo expansionista, principalmente nas regiões Nordeste e Norte, expresso pelo avanço da fronteira agrícola, cujos contornos têm sido delimitados pela territorialização do capital. Esse fenômeno é verificado por meio da expansão da fruticultura irrigada no Semiárido baiano, da soja nos Cerrados do Nordeste e da Amazônia, ocasionando profundas transformações socioespaciais, além de contribuir, sobremodo, para deflagrar disputas territoriais entre camponeses, populações tradicionais, trabalhadores da terra e o agronegócio.

No que se refere à região Nordeste, o processo de modernização da agricultura ocorreu concomitante às ações desenvolvidas pelo Estado, em consonância com a oligarquia agrária regional/local com o propósito de minimizar os efeitos da seca. De cunho assistencialista/paternalista, a Política de Irrigação assumiu a responsabilidade de acabar com a “falta de água” e assim dotar o Semiárido brasileiro das condições adequadas para que a agricultura empresarial pudesse ser praticada. O constructo do imaginário da seca ao longo de todo o século XX serviu para justificar perante a sociedade a necessidade de canalizar recursos para solucionar os problemas relacionados à escassez hídrica, colocando-a como a responsável pelo atraso e miséria da maioria da população camponesa dessa região. É fato que o discurso do Estado desconsiderava toda a dinâmica camponesa do Semiarido, transformando as medidas emergenciais num apanágio para os problemas regionais. Não era interessante para as oligarquias agrárias locais colocar em evidência a riqueza cultural dos camponeses caatingueiros, seus saberes-fazeres que, inclusive, muito serviam para minimizar os efeitos das secas. Ressalta-se que, embora a pobreza fosse real, muitas famílias camponesas produziam a maioria dos produtos consumidos, mesmo com parcos recursos financeiros e com pouca terra. O Estado sempre optou pela modernização o território através de grandes empreendimentos em detrimento de medidas alternativas, valorizando os saberes locais, as formas de (re)existência do camponês caatingueiro. Nesse sentido, a construção ideológica da questão Nordeste, do Semiárido enquanto uma região-problema economicamente inviável buscou respaldo, segundo Silva (2011SILVA, J. de S. Aridez mental, problema maior: contextualizar a educação para construir o “dia depois do desenvolvimento”no semiárido brasileiro. Campina Grande: Embrapa, 2011., p. 3), nos pressupostos da ciência moderna, defensora dos ideais desenvolvimentistas. Essa mesma ciência viabilizou a consolidação do capitalismo a partir dos séculos XVI e XVII, e nos legou o paradigma clássico de inovação. A partir desse paradigma, a sociedade ficou refém da dicotomia criada para a dominação - desenvolvidos-subdesenvolvidos -, na qual a ideia de desenvolvimento passou a ser instituída como meta para as políticas de governo. Tendo o “desenvolvimento” como apanágio, o Semiárido passou a ser pensando como espaço a ser desenvolvidona perspectiva da agricultura irrigada. Essa síntese fácil sobre um espaço tão complexo, contraditório e diverso trouxe profundas consequências para as populações dessa região, sendo estas manipuladas para a manutenção das estruturas de poder. Em sua essência, a Política de Irrigação implantada no Nordeste contribuiu para aumentar as desigualdades sociais e econômicas regionais, fortalecer a concentração fundiária e fomentar a precarizaçao do trabalho.

No Nordeste brasileiro, mais especificamente onde a seca sempre representou um fator determinante/limitador para o desenvolvimento da região (a transposição do rio São Francisco é um exemplo disso), o imaginário da seca perpetuado pela “aridez mental” (SILVA, 2011SILVA, J. de S. Aridez mental, problema maior: contextualizar a educação para construir o “dia depois do desenvolvimento”no semiárido brasileiro. Campina Grande: Embrapa, 2011., p. 3) serviu para arrecadar recursos financeiros que, após a década de 1970, deixaram de ser aplicados na construção de açudes em propriedades particulares para serem utilizados, prioritariamente, na implantação de projetos de irrigação, ou na criação de infraestrutura que possibilitasse a implantação destes. Percebe-se que a construção do imaginário da seca é perpassada por elementos da política (poder), do saber (ciência) e do discurso (mídia) que matematizam as causas das mazelas socioeconômicas do Semiárido brasileiro e fundamentam as verdades do desenvolvimento que tanto tem devastado natural, social e institucionalmente a paisagem sertaneja. A valorização extremada das adversidades físicas do Semiárido brasileiro serviu (e ainda serve) como instrumento de legitimação e consolidação da colonização política, econômica e cultural que instituiu a ideia de “região-problema”, esterilizando e recriando imaginários e constructos sociais a partir de uma concepção homogeneizante que as elites locais, o Estado e o capital têm em relação a essa região.

É nesse contexto que o Estado, por meio da Política de Irrigação, criou as condições favoráveis para a territorialização do grande capital no Semiárido nordestino, visto que mediante a aplicação de recursos públicos, passou a dotar frações desse território de infraestrutura (barragens/açudes, canais de irrigação, adutoras, rodovias), possibilitando o desenvolvimento de atividades agrícolas (produção de frutas tropicais, por exemplo) com vistas a atender à demanda dos mercados do Centro-Sul do país, bem como o mercado internacional. Em função dessas ações, o Semiárido nordestino se transformou em um grande produtor frutícola, assumindo lugar de destaque no cenário nacional, visto que além dos fatores naturais (água, terra e luminosidade) o capital tem à sua disposição mão de obra barata em abundância e de fácil acesso.

Seguindo essa lógica, no final da década de 1970, Livramento de Nossa Senhora (BA), município localizado no Semiárido baiano, foi contemplado com a implantação do projeto de irrigação do Vale do Rio Brumado, cuja execução da obra ficou sob a responsabilidade do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). Assim, estavam dadas as condições para a territorialização do capital, passando o município a ser o segundo produtor de manga destinada à exportação do estado da Bahia.

A implantação do projeto de irrigação em Livramento de Nossa Senhora (BA) ocasionou um processo de desterritorialização-reterritorialização dos camponeses e trabalhadores da terra, visto que a área desapropriada pelo DNOCS era ocupada por muitas famílias camponesas na condição de meeiros, arrendatários e posseiros que, com a desapropriação foram expulsos das terras sem direito a indenização, pois não se constituíam os donos legítimos das propriedades. Muitas famílias desapropriadas foram para a periferia da cidade, enquanto que outras passaram a morar em povoados próximos à cidade (Patos e Barrinha), não sendo contemplados com a doação de lotes.

Este artigo tem por objetivo apresentar os resultados obtidos com a pesquisa de dissertação intitulada Modernização da agricultura: expropriação camponesa e precarização do trabalho no agronegócio da manga em Livramento de Nossa Senhora (BA) realizada junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Goiás – Campus Catalão. O objetivo da pesquisa foi compreender as transformações ocorridas na agricultura do município de Livramento de Nossa Senhora (BA), a partir da implantação do projeto de irrigação do Vale do Rio Brumado, na década de 1980, e seus desdobramentos, no que se refere ao confronto capital versus trabalho no agronegócio da manga. Para a realização da pesquisa fez-se necessário a construção de um referencial teórico associado a imersões a campo, com o intuito de estabelecer uma interlocução entre a teoria e a prática. A pesquisa está pautada na abordagem qualitativa, sendo utilizados diversos instrumentos de coleta de dados, tais como entrevistas, diário de campo, registros fotográficos e relatos orais. Os resultados obtidos durante o trabalho de campo foram analisados e interpretados a partir do referencial teórico, comparecendo no decorrer da pesquisa através de produtos cartográficos, gráficos, fluxogramas, quadros, tabelas e fotografias.

Ante ao exposto, espera-se evidenciar como ocorre o processo de naturalização das relações de poder e de dominação política e cultural, a desvalorização das práticas camponesas e, em contrapartida, a supervalorização do agronegócio enquanto espectro do que é moderno e daquilo que seria o responsável por promover a superação das desigualdades e injustiças sociais no campo. Propomos pensar a partir de outra racionalidade que não a do Semiárido enquanto região “inviável”, pois acreditamos que essa concepção serve àqueles que saqueiam as potencialidades naturais e socioeconômicas dessa fração do território nordestino, mediante a homogeneização de suas paisagens, de seus problemas, povos e culturas para possibilitar o forjamento de um imaginário centrado na concepção de progresso a qualquer custo, baseado em princípios, objetivos e necessidades alheios à realidade local. O progresso pensado pelo Estado para as populações do Semiárido nordestino é posto como uma realidade inquestionável e baseado em ações enrijecidas, não havendo alterações na esfera de decisões e de poder.

Naturalizados em muitas situações, retificados ou menosprezados em tantas outras, os problemas dos sujeitos do Semiárido e suas culturas comparecem nas Políticas Públicas de maneira irregular, pois quando a seca representa a possibilidade de angariar recursos financeiros esta passa a ser, amesquinhadamente utilizada pelos discursos político e midiático como sustentáculo de campanhas eleitoreiras e de legitimação de grandes projetos como se verifica com as obras da transposição do São Francisco. O entendimento dos processos que perpassam a realidade socioeconômica, política e cultural do Semiárido nordestino deve ocorrer a partir de um olhar desprovido de pré-conceitos, de modo que a concepção de desenvolvimento vigente no mundo ocidental não seja considerada a priori como inexorável e benéfica. O fulcro discursivo deve ser outro, o de pensar o campesinato do Semiárido a partir de ações locais, através do fortalecimento das iniciativas endógenas, no sentido de valorizar a convivência do sertanejo com seu território da vida, de modo a reconhecer a importância dessa agricultura para a economia local, devido ao fato desta ser a responsável pela produção da maioria dos produtos consumidos regionalmente.

Nesse sentido um olhar crítico em relação aos projetos desenvolvimentistas em execução no Nordeste brasileiro na atualidade nos leva a perceber que o comprometimento ideológico, a cegueira técnica e as articulações entre a elite regional e o Estado constituem-se em grandes obstáculos para que haja de fato desenvolvimento social e, consequentemente, a amenização das desigualdades regionais. Os projetos desenvolvimentistas em curso atualmente no Nordeste brasileiro que têm dado a tônica ao novo e promissor momento vivenciado por esta região como o Complexo Portuário Pernambucano (Refinaria Abreu e Lima e a Petroquímica Suape), o Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CE), a Transposição do São Francisco e a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (IOL), são também os fomentadores de conflitos e injustiças sociais e ambientais. Especificamente na Bahia, destacam-se a implantação dos projetos de irrigação (Projeto Salitre em Juazeiro e Projeto Baixio do Irecê que abrange os municípios de Xique-Xique, Itaguaçu da Bahia, Jussara, e Sento Sé ), a construção das PCH’s Pedra Branca e Riacho Seco, da Ferrovia de Integração Oeste-Leste e da Adutora do Sistema de Suprimento de Água Industrial (SSAI) que irá transpor água do São Francisco para levar até o Complexo de Extração Pedra de Ferro sob responsabilidade da Bahia Mineração (BAMIN). As fissuras existentes nestes projetos desenvolvimentistas desencadeiam lutas de resistência, colocando a necessidade de se pensar em outras perspectivas de desenvolvimento que não aquelas vindas “desde abajo” como retrata Porto-Gonçalves (2006)PORTO-GONÇALVES, C. W. A reinvenção dos territórios: a experiência latino-americana e caribenha. In: Los desafios de las emancipaciones em um contexto militarizado. Ceceña, Ana Esther. CLACSO, Buenos Aires, Argentina, 2006.. Ao longo das últimas décadas, o Semiárido brasileiro vem sofrendo agressões, sobretudo, por meio dos grandes projetos resultantes das políticas desagregadoras e setoriais do Estado. Territórios da vida são reduzidos a jazidas minerais, ou ainda, a territórios do agrohidronegócio, (MENDONÇA e MESQUITA, 2007MENDONÇA, M. R.; MESQUITA, H. A. O agro-hidro-negócios no cerrado goiano: a construção das (re)sistências. II ENCONTRO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E DE BARRAGENS, Salvador, 2007. Anais..., Salvador, 2007.; THOMAZ JUNIOR, 2010aTHOMAZ JÚNIOR, A. O agrohidronegócio no centro das disputas territoriais e de classe no Brasil do século XXI. Campo-Território: revista de Geografia Agrária, v. 5, n. 10, p. 92-122, agosto de 2010a., 2010bTHOMAZ JÚNIOR, A. Dinâmica territorial do agrohidronegócio e os desdobramentos para o trabalho. XI JORNADA DO TRABALHO. João Pessoa, 2010. Anais... João Pessoa, UFPB, 2010b.; DOURADO, 2011DOURADO, J. A. L. Expansão do agrohidronegócio no Semi-árido nordestino e os conflitos por terra e água: revisitando a questão campo-cidade. In: SANT’ANA, R. S.; CARMO, O. A. do; LOURENÇO, E. Â. de S. Questão agrária e saúde do trabalhador: desafios para o século XXI. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, p.115-126.) colocando em conflito projetos de mundo diferentes.

Nesse sentido, a geografia assume um papel de destaque na “leitura” da realidade, tornando-se um instrumento que permite analisar profundamente os desdobramentos do modelo de desenvolvimento adotado para o país, as diversas relações sociais e de poder materializadas no território, bem como as dinâmicas territoriais do capital, possibilitando identificar suas estratégias de territorialização. Ainda nessa perspectiva, parte-se do pressuposto de que a geografia dispõe de um instrumental capaz de fornecer os elementos para que se possa compreender as contradições existentes nas Políticas Públicas, particularmente no tocante à implementação de megaprojetos desenvolvimentistas e quais os seus desdobramentos para as populações, principalmente aquelas que vivem no campo.

O NORDESTE SEMIÁRIDO E AS POLÍTICAS DE PLANEJAMENTO REGIONAL

Muito já foi dito em relação à problemática da Região Nordeste, transformando a discussão sobre o processo de construção do imaginário da seca quase que em um lugar-comum, com suas tragédias humanas, enquanto resultado do inglório conflito entre homem x natureza. Porém, o que há de novo nessa discussão é o fato dos “desequilíbrios sociais” decorrentes da “Questão Nordeste” ainda continuarem a merecer atenção e lugar de destaque nas análises sobre as dinâmicas espaciais daquela fração do território nacional. Do Nordeste açucareiro, litorâneo e caracterizado pela opulência dos saraus e dos canaviais - verdadeiros “mares de cana” - ao Nordeste algodoeiro-pecuário, do senhor/coronel, ser “rústico”, do lugar distante – o Sertão – e das massas fustigadas pelas intempéries climáticas, as transmutações espaciais deixam evidentes, através dos muitos mosaicos político-econômicos e socioculturais, que a permanência das contradições e mazelas materializadas nesta região ainda exigem e permitem análises com o propósito de mergulhar na realidade dos sujeitos que constroem e reconstroem as paisagens nordestinas em suas múltiplas faces.

A transição do “velho” para o “novo” Nordeste, com os grandes pomares encravados nas áreas semiáridas, nos oportuniza tratar com afinco os problemas vivenciados pelas populações que habitam o Semiárido nordestino, de modo a colocar no centro do debate os resultados da implementação de programas governamentais destinados a introduzir mudanças no cenário econômico sem considerar com a devida atenção a estrutura da propriedade da terra. Assim temos as continuidades ocultas postas em um campo de conflitos no qual as rupturas profundas somente acontecem se as classes hegemônicas se beneficiam de alguma forma com os seus desdobramentos. Os resultados das ações do Estado, por meio do planejamento regional iniciado por volta da segunda metade do século XX favoreceram a expansão do capital industrial e financeiro, mediante a oferta de infraestrutura, terra, água e mão de obra. Os territórios do agronegócio, conhecidos como “Califórnia do Nordeste” têm demonstrado as novas faces da agricultura nordestina após o processo de modernização da agricultura, cujos desdobramentos adquirem relevo com a reestruturação produtiva do capital (THOMAZ JÚNIOR, 2002THOMAZ JÚNIOR, A. Por trás dos canaviais os “nós” da cana: a relação capital x trabalho e o movimento sindical dos trabalhadores na agroindústria canavieira paulista. São Paulo: Anablume/ Fapesp, 2002. 388 p.) em suas mais variadas formas e espacialidades. A expansão do agronegócio no Semiárido tem desvelado as possibilidades que esta região pode oferecer desconstruindo do imaginário social a relação unívoca e indissociável existente entre Semiárido e a ideia de atraso, miséria e repulsão populacional.

Antigas relações de poder com marcas da tradição “coronelista” co-existem e re-existem ainda hoje com a emergência de novos atores políticos ante ao projeto hegemônico de transformação da espacialidade nordestina, através de uma roupagem atualizada e desenhada pela agricultura modernizada, centrada principalmente na fruticultura irrigada. Mesmo na economia globalizada nordestina, o acesso à terra e água continuam sendo instrumentos de dominação, como nos “velhos” tempos da sociedade agrária caracterizada pela trilogia cana-de-açúcar-pecuária-algodão. No passado, o coronel controlava o acesso à água através das cercas de seus latifúndios, sob a complacência do Estado, ao passo que hoje é o grande capital que se apropria das terras e água disponibilizadas, via política de irrigação, para a produção de commodities. Uma das grandes questões postas ao crivo da crítica geográfica é a reflexão sobre o processo de apropriação das riquezas produzidas nas terras semiáridas nordestinas. Se há a produção de riquezas há consequentemente, aqueles que se apropriam dos resultados do trabalho, possibilitando-nos trazer para o debate elementos como as transformações no seio da agricultura regional, as mutações nas relações de trabalho no campo e os seus rebatimentos na cidade, bem como o seu ascendente processo de precarização, e as interferências deste fenômeno na dinâmica espacial das sociedades nordestinas.

A década de 1970 foi marcada por uma série de medidas adotadas pelo Estado que intensificou as ações com o objetivo de inserir a Região Nordeste na lógica produtiva do capital e modernizar a agricultura, através da implantação de vários planos como o POLONORDESTE (1974), o Proterra ((1971), o Projeto Sertanejo (1976), sendo estas medidas fortalecidas através da criação da CODEVASF. Tais ações representam o desdobramento da política iniciada no final dos anos 1940, com a criação de órgãos como DNOCS, Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) em 1948 e a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF) cujo funcionamento também ocorreu em 1948, sendo posteriormente transformada na Superintendência do Vale do São Francisco (SUVALE) em 1967. Além destes órgãos, temos a criação do Banco do Nordeste (BNB) em 1952, com a função de captar recursos para a implementação do projeto desenvolvimentista assumido pelo Estado para a Região Nordeste. Em relação a essa questão, Sorj (1986)SORJ, B. Estado e classes sociais na agricultura brasileira. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. 162 p. acredita que a

política de modernização da agricultura terminou se transformando numa política de incentivo à concentração de terras, uma vez que a criação de infra-estrutura e juros subsidiados determinou um processo de valorização das mesmas. No entanto, a relação inversa não existe: o processo de concentração de terras não significou necessariamente uma maior modernização da agricultura. (SORJ, 1986SORJ, B. Estado e classes sociais na agricultura brasileira. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. 162 p., p. 116).

Transformada na panaceia para os graves problemas sociais vivenciados cotidianamente pela população que vive no Semiárido nordestino, a agricultura irrigada passou a representar a única alternativa para amainar as disparidades sociais e econômicas que solapam a vida dos camponeses e trabalhadores da terra que, periodicamente, vêem sua existência ameaçada pelos infortúnios das secas. Neste contexto, presenciou-se a execução de projetos sem a menor preocupação com as populações afetadas por seus desdobramentos, pois uma das características marcantes destes empreendimentos é a sua implementação sem considerar as particularidades e interesses daqueles que supostamente serão beneficiados com os seus resultados. Como exemplo marcante dessa política, temos as mais de 110 mil famílias expropriadas pela construção das barragens de Sobradinho (1979) e de Itaparica (1987), muitas delas assentadas em agrovilas enquanto que outra parte foi para as periferias de cidades. As mudanças vivenciadas por estas famílias não se resumiram apenas ao lugar de morada, estando atrelada a uma série de aspectos, como o convívio em áreas com elevados índices de pobreza e violência, como é o caso das periferias urbanas e das agrovilas e a consequente transformação dos camponeses em mão de obra barata, desqualificada e ociosa, já que muitos dos expropriados não foram reassentados em outras terras, restando-lhes apenas a venda de sua força de trabalho nos projetos de irrigação ou em ocupações temporárias nas cidades. De acordo com Bloch (1996)BLOCH, D. As frutas amargas do Velho Chico: irrigação e desenvolvimento no vale do São Francisco. São Paulo: Livros da Terra, 1996. 117 p.

Os projetos de irrigação têm sido justificados, legal e politicamente, pela utilidade pública da obra implantada e pelo interesse social para a população da área de influência. Na prática, a garantia de que os desapropriados – particularmente os pequenos agricultores - terão preferência na aquisição dos lotes nos projetos não se tem verificado. (BLOCH, 1996BLOCH, D. As frutas amargas do Velho Chico: irrigação e desenvolvimento no vale do São Francisco. São Paulo: Livros da Terra, 1996. 117 p., p. 31).

É nesse sentido que o modelo de desenvolvimento adotado para o Nordeste semiárido deve ser problematizado porque este não tem sido capaz de tirar da pobreza e miséria os milhões de sertanejos que habitam o campo e as periferias urbanas, visto que as ações do Estado, muitas vezes em consonância com os ditames do grande capital nacional e internacional, não os coloca como protagonistas, desconsiderando as suas necessidades e formas de organização social, acarretando graves consequências como a marginalização social e a exploração das populações pelos grandes atores econômicos locais.

EIS QUE SURGE UM OÁSIS NA CAATINGA: O PROJETO DE IRRIGAÇÃO DO VALE DO RIO BRUMADO E A MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA EM LIVRAMENTO DE NOSSA SENHORA (BA)

Quando os apologistas da implantação do Projeto de Irrigação em Livramento de Nossa Senhora (BA) produziram, por meio do discurso e da força política, a cegueira acerca dos reais interesses que motivaram a execução deste empreendimento, o que se pretendia era promover, dentro dos “parâmetros legais”, o desenraizamento do camponês para possibilitar a introdução de um novo modelo de agricultura, no qual fosse possível ao capital produzir mais em menos tempo e com menor custo. Para atender a tal propósito, “o capital investe em tecnologia, maquinaria, organiza o trabalho de forma mais eficiente, enfim, moderniza os meios de produção para ser competitivo no mercado”. (MENEZES, 2007MENEZES, S. O. De “supérfluos” a sujeitos históricos na contramão do capital: a geografia do (des)trabalho. 2007. 224 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) Universidade Federal de Sergipe. São Cristóvão: UFS-NPGEO., p. 3, grifo do autor).

Nas ações do Estado e do capital em Livramento de Nossa Senhora (BA), são verificadas três estratégias criadas e colocadas em prática para possibilitar as condições adequadas à territorialização do agronegócio. Primeiro: desterritorializar (material, política e culturalmente) o camponês, em nome do “progresso”, de modo que o seu modo de pensar estivesse preparado para a introdução de novas práticas agrícolas sustentadas no pacote tecnológico da revolução verde. Nesse sentido, percebe-se que os projetos desenvolvimentistas colocados em prática pelo Estado e em parceria com o grande capital desconsideram por completo a existência dos sujeitos historicamente territorializados nos espaços, impondo-lhes medidas restritivas e/ou delimitando a sua capacidade de atuação, e, por isso, transformando profundamente seu modus vivendi. Em segundo lugar: tornar os custos com o cultivo das lavouras para o autoconsumo insustentáveis, devido aos processos burocráticos como o pagamento de taxa à Cooperativa do DNOCS (10% da produção) e as imposições quanto aos cultivos a serem praticados. Terceiro: o entrelaçamento destes fatores acabaria por expulsar, de forma “natural” o camponês da terra, sem eliminá-lo do processo produtivo, já que este deveria assumir a sua nova função na lógica do agronegócio, ou seja, a de mão de obra barata e pouco qualificada.

Iniciada em 1976, a implantação do projeto de irrigação em Livramento de Nossa Senhora (BA) foi parcialmente financiada com recursos estrangeiros, mais especificamente, com a ajuda financeira do Banco da Alemanha (SANTOS, 2009SANTOS, R. M. dos. Trajetória: reportagens sobre Livramento de Nossa Senhora. Salvador; Egba, 2009. 223 p., p. 26). Durante o período militar, o governo captou recursos externos para viabilizar a campanha imperialista do “milagre brasileiro”, da construção do “Brasil Potência” pelas vias da modernização. Os interesses do Estado, ao incentivar a criação de projetos de irrigação no Nordeste, tornaram-se muito evidentes, pois, de acordo com Sorj (1986)SORJ, B. Estado e classes sociais na agricultura brasileira. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. 162 p.,

[...] após o golpe de 1964, o Estado autoritário manteve o pacto entre o capital urbano e a propriedade rural da terra. [...]. Embora a manutenção das condições necessárias à reprodução ampliada de capital industrial urbano haja colaborado claramente para uma continuidade essencial nas políticas brasileiras de desenvolvimento agrícola do pós-guerra, foco desta estratégia, no final dos anos 60, deslocou-se, gradual mas incisivamente da ocupação de fronteiras para a capitalização do processo de produção rural, via políticas de investimentos subsidiadas pelo Estado, principalmente através de programas de crédito rural . (SORJ, 1986SORJ, B. Estado e classes sociais na agricultura brasileira. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. 162 p., p. 151).

A implantação do Projeto de Irrigação em Livramento de Nossa Senhora (BA) foi repleta de controvérsias, incertezas e financeiramente dispendiosa, com gastos em infraestrutura da ordem de Cr$ 200 milhões, em sua fase inicial, saltando para Cr$ 893 milhões, em função das várias interrupções da obra, segundo cálculos feitos pelo próprio DNOCS, em 1979. Em um levantamento cadastral para desapropriação feito pela empresa LASA Engenharia e Prospecção S. A., a pedido do DNOCS em 1977, foram cadastradas 744 propriedades, totalizando 205 famílias. Porém, em reportagem publicada pelo Jornal A Tarde foi mencionado um número muito maior de famílias moradoras nas propriedades, quantidade essa levantada, segundo a reportagem, pelo próprio DNOCS, totalizando aproximadamente 1.400 famílias (1.300 famílias de camponeses posseiros e meeiros e 100 famílias de proprietários efetivos). A divergência em relação ao número de famílias a serem desapropriadas demonstra a fragilidade das informações, cujo intuito pode ter sido o de escamotear os dados para reduzir as indenizações e minimizar as possíveis oposições quanto à implantação do projeto de irrigação.

O Projeto de Irrigação do Vale do Rio Brumado foi concebido com intuito de promover a irrigação de aproximadamente 5.153ha, localizados no vale desse mesmo rio, em Livramento de Nossa Senhora (BA). Atualmente essa área é bem maior, devido à expansão desordenada da agricultura irrigada, centrada na mangicultura para além dos limites do projeto de irrigação, podendo chegar a 10 mil hectares. Esse fato tem gerado conflitos por água entre os irrigantes dos municípios de Livramento de Nossa Senhora (BA) e do município de Dom Basílio (BA) que também utilizam da água da Barragem Luis Vieira para irrigar lavouras de manga e maracujá.

Embora os projetos de irrigação sejam executados com recursos financeiros públicos as cercas presentes denotam as relações de poder em que estes estão envoltos. O Estado torna-se controlador do acesso e uso da água, determinando assim quem serão os sujeitos habilitados a usufruir deste recurso e ainda qual a sua utilidade, já que o foco da Política de Irrigação no Nordeste semiárido esta fundamentada na fruticultura para exportação. Os canais construídos – os caminhos das águas – pelo Estado não levam a água para qualquer lugar; seu destino foi estrategicamente planejado e executado, objetivando criar as condições adequadas para que determinados sujeitos sociais pudessem usufruir desses privilégios. Os “oásis” em meio à Caatinga são grandes pomares cuja produção vai abastecer seletos mercados internacionais, ao passo que as populações locais, onde foram implantados os Projetos de Irrigação, têm que importar produtos da alimentação básica, como é o caso de Livramento de Nossa Senhora (BA), município com áreas potencialmente produtoras de feijão, arroz e milho e que são ocupadas pelas lavouras de manga. Isso explica, de certa forma, os motivos que levaram muitas famílias expropriadas pelo DNOCS a não terem recebido lotes ou, quando receberam, terem enfrentado inúmeras dificuldades para se manterem na terra, já que estes empreendimentos são criados com o propósito de não darem certo como redistribuição da terra.

A “modernização da agricultura” em Livramento de Nossa Senhora (BA) desencadeou intensos processos de desterritorialização-reterritorialização. Ao analisar o processo de reterritorialização dos expropriados, sob os moldes da agricultura modernizada, deve-se considerar as transformações sócio-espaciais em função da introdução de novos atores, regidos por outra lógica, porque estas transformações vêm sempre acompanhadas, segundo Haesbaert (1997HAESBAERT. R. Des-territorialização e identidade: a rede “gaúcha” no Nordeste. Niterói: EDUFF, 1997. 293 p., p. 94), “da construção de novos territórios.” Tanto os proprietários quanto os camponeses e trabalhadores da terra relutavam em sair das terras porque teias de relações sociais centenárias estavam na iminência de serem estranguladas, laços afetivos, relações parentais, sentimento de pertencimento, seriam desconstruídos para possibilitar a concretização da política de desenvolvimento regional adotada para o Nordeste semi-árido.

Sobre o enraizamento do camponês ao seu lugar de morada e à valorização das relações familiares, Woortmann (1995WOORTMANN. E. F. Herdeiros, parentes e compadres: colonos do Sul e sistemas do Nordeste. São Paulo: Hucitec, 1995. 336 p., p. 243, grifos do autor) diz que “[...] trabalho e família são categorias de discurso que se interpenetram nas representações camponesas, e se associam à terra, à terra de trabalho, que é morada da vida.” Nesse sentido, quando os camponeses foram forçados pelo DNOCS a saírem das terras, mesmo aqueles que estavam na condição de agregados, parceiros e meeiros, vivenciaram momentos de tensão e incertezas em decorrência das transformações nas condições de trabalho e no lugar de morada, pois terra e trabalho são inerentes ao campesinato. Acostumados com o trabalho na terra e com a autonomia em relação ao que e como plantar, particularidades próprias da condição camponesa, os expropriados viram seus referenciais identitários (família, casa, lugar de morada e/ou território da vida) desarticulados. Assim, o projeto de irrigação que, segundo o discurso político de seus idealizadores, dinamizaria a agricultura irrigada do Vale do Rio Brumado, serviu muito mais para desalinhavar o tecido social dos camponeses, bem como suas experiências territoriais, tendo estes que se aventurar na construção de novos territórios e novas relações sociais.

Embora reconheça-se a complexidade que envolve os processos de desterritorialização-reterrerritorialização, em suas várias nuances, não é possível conceber o território como algo amorfo, tampouco, o camponês como um sujeito estático. Ao se refletir sobre a relação do camponês com o território, concorda-se com Mendonça (2004)MENDONÇA, M. R. A urdidura espacial do capital e do trabalho no Cerrado do sudeste Goiano. 2004. 457 f. Tese (Geografia), UNESP, Presidente Prudente. quando esse afirma que

O território não significa apenas o enraizamento, a tradição, a permanência de ações e valores que resistem às mudanças, mas também significa movimento, fluidez e possibilidades, na medida que se tem claramente a produção de singularidades, mediante as múltiplas formas de conexão com a totalidade e vice-versa. (MENDONÇA, 2004MENDONÇA, M. R. A urdidura espacial do capital e do trabalho no Cerrado do sudeste Goiano. 2004. 457 f. Tese (Geografia), UNESP, Presidente Prudente., p. 139).

Na “leitura” da apropriação e produção do espaço, é importante destacar as contradições que perpassaram a execução da obra, pois os problemas não se resumiram apenas aos aspectos econômicos que justificaram a sua implementação. Faz-se necessário considerar todas as implicações sociais desencadeadas pelo processo de retirada dos camponeses dos lugares onde moravam e exerciam o trabalho na terra, visto ter essa desterritorialização ocasionado certa estagnação da agricultura camponesa praticada no Vale do Rio Brumado. Isso ocorreu devido ao fato das famílias desapropriadas, em sua maioria, não terem outras terras onde pudessem continuar a cultivar as lavouras como tradicionalmente faziam, passando a ocupar-se como força de trabalho para o agronegócio da manga.

O SABOR AMARGO DO DESENVOLVIMENTO: A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO AGRONEGÓCIO DA MANGA

Fazer uma “leitura” da práxis social do ser que trabalha, a partir dos desdobramentos da reestruturação produtiva do capital no universo simbólico e na subjetividade do trabalho, tornou-se condição necessária para a apreensão dos conflitos que vivem a classe trabalhadora, no campo e na cidade, cuja raiz “[...] está sediada nos rearranjos do metabolismo do capital em escala mundial [...]” (THOMAZ JÚNIOR, 2008). No campo, a territoriailização do agronegócio é, em muitos casos, acompanhada da monopolização do território pelo capital, processos esses respaldados pelos poderes midiático e político, empenhados em convencer a população sobre os seus benefícios e importância para a regulação das desigualdades sociais. Para alcançar tais propósitos são utilizados os mais variados discursos, inclusive, o do aumento da renda e de empregos, promessas quase sempre não cumpridas, pois o agronegócio busca a produção máxima com o mínimo de mão de obra, em virtude do elevado grau de mecanização e do uso intensivo de agroquímicos.

Com a expansão do agronegócio da manga em Livramento de Nossa Senhora (BA), este passaria a representar uma das poucas oportunidades de inserção no mercado de trabalho para um contingente significativo da população local, tanto do campo quanto da cidade. Em se tratando dos trabalhadores da produção de manga naquele município, é possível verificar a existência de um amálgama de sujeitos, cujas realidades estão imbricadas de elementos e significados que refletem a flexibilização, a precarização e a terceirização do trabalho, enquanto estratégias arquitetadas pela ordem metabólica do capital.

As análises sobre os sujeitos que trabalham no agronegócio da manga não devem partir da suposição de que tratam-se apenas de proletários, urbanos ou rurais, caso contrário, incorre-se no erro de descaracterizar e simplificar a sua historicidade. As pesquisas de campo permitiram fazer uma “leitura” dos trabalhadores da manga a partir das contradições do metabolismo do capital, de modo a evidenciar as várias formas de trabalho no campo em Livramento de Nossa Senhora (BA), com destaque para as diferentes modalidades do processo de precarização e subproletarização (boias-frias, temporários, part time e por produção).

Muitos destes trabalhadores (homens, mulheres e adolescentes) estão sujeitos à dupla exploração, em virtude da existência de empreiteiros “gatos” que atuam diretamente como intermediários com os médios e grandes produtores, agenciando os camponeses e proletários urbanos para o trabalho nas lavouras. Os empreiteiros chegam a descontar da diária dos trabalhadores até R$5,00 como forma de pagamento pelo transporte que é fornecido para o trabalhador. Geralmente, entre o contratante, nesse caso o produtor de manga, e o empreiteiro “gato” é feito um acerto em relação à quantia paga pela empreitada. Por sua vez, o empreiteiro faz nova negociação com os trabalhadores ganhando, além da taxa cobrada pelo transporte, mais uma parcela que pode chegar a 30% do valor da diária. Quando o trabalhador faz hora-extra esse valor pode chegar a 40% da diária.

O valor da diária paga aos trabalhadores pelos empreiteiros varia entre R$18,00 e R$23,00, a depender do sexo e do serviço desempenhado. As mulheres recebem R$18,00 podendo chegar a R$20,00 trabalhando na lavoura enquanto os homens recebem entre R$20,00 a R$23,00, podendo chegar a R$25,00 se a função desempenhada for a de pulverização dos pomares. Cabe destacar que, em sua maioria, a pulverização dos pomares é feita de forma mecanizada. Para ganhar R$18,00 uma mulher deve fazer a limpeza e poda de 30 pés de manga ao dia e se, após terminada a sua empreitada esta desejar fazer a limpeza de mais 15 pés de manga recebe ao final de um dia de trabalho R$30,00. (Figura 1).

Figura 1
Remuneração recebida pelo trabalhador da produção de manga em Livramento de Nossa Senhora (BA)

Os valores pagos pela diária não levam em consideração se o trabalhador possui ou não escolaridade. Durante as pesquisas de campo foram encontrados trabalhadores que haviam completado o ensino médio e por falta de opção estavam trabalhando na produção de manga. De acordo com dados da RAIS 2009, a produção de manga gera 235 empregos diretos com carteira assinada. (Quadro 1)

Quadro 1
Número de postos de trabalho com registro em carteira no agronegócio da manga em Livramento de Nossa Senhora (BA)

Assim, pode-se questionar os discursos que atribuem ao agronegócio a responsabilidade e capacidade de reduzir as desigualdades sociais no campo e na cidade, pois, trata-se de trabalho temporário, mal remunerado e sem nenhuma garantia legal para o trabalhador, pois a quantidade de trabalhadores com carteira assinada é insignificante diante da expressividade que o agronegócio da manga representa para Livramento de Nossa Senhora (BA). Nesse sentido, há que se repensar os privilégios e incentivos governamentais dados ao agronegócio no Brasil, em detrimento da agricultura camponesa, pois o modelo agroexportador concentra terras, explora mão de obra mal remunerada e acumula riquezas. Na maioria dos casos, os dados da RAIS/TEM sobre os empregos gerados pelo agronegócio da manga em Livramento de Nossa Senhora (BA) referem-se aos trabalhadores que exercem funções de secretaria, finanças, gerência de campo, supervisão em galpão e/ou packing house ou motorista, que geralmente possuem o Ensino Médio. Em relação aos trabalhadores das lavouras, galpões e packing house o fato de ter o não maior escolaridade não interfere no valor da diária paga.

Foi constatada também a presença de muitos adolescentes com idade entre 15 e 17 anos trabalhando na produção de manga, tanto nas lavouras quanto nos galpões, sendo estes de diversos lugares da zona rural e da periferia da cidade. Alguns haviam abandonado a escola justamente para trabalhar durante a colheita de manga, fato que revela total desrespeito às leis em vigor no país, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Estado tem um papel importante nesse processo, pois, diante do problema, furta-se a buscar uma solução para a grave situação em que se encontram os adolescentes-trabalhadores da manga.

Ao visitar uma casa onde estavam alojados 12 trabalhadores, identificou-se que cinco destes eram menores de idade, todos vindos da zona rural do município de Lagoa Real (BA) que faz fronteira com Livramento de Nossa Senhora (BA). Os motivos que haviam levado os jovens a buscar trabalho na produção de manga foram o longo período de estiagem e a dificuldade em encontrar serviço nos lugares onde moram, não havendo assim, outra alternativa senão complementar a renda da família trabalhando como diaristas. Os adolescentes afirmaram que antes de trabalhar na produção de manga estavam acostumados a trabalhar como diaristas na lavoura, inclusive na colheita de algodão nas fazendas do Vale do Iuiú, grande região produtora de algodão da Bahia. Para Thomaz Júnior (2007)

[...] a intensa mobilidade do trabalho, diante do movimento constante de sua desrealização não tem sido entendido, porque os instrumentos teórico-conceituais estão distantes e desprivilegiam a práxis histórica, social e ontológica do trabalho. (THOMAZ JÚNIOR, 2007, p. 24).

As mulheres que trabalham na lavoura estão em uma situação de forte exploração porque têm desempenhado funções que exigem força, conquistando espaços na produção de manga que eram “territórios” masculinos, porém isso não representa avanços em relação à questão de gênero, haja vista que as mulheres ainda recebem menos ao desempenhar as mesmas funções que os homens. Esta parece ser uma estratégia do capital para pressionar os homens a aumentar a produtividade, sem ter que implantar inovações técnicas e tecnológicas.

O agronegócio, de modo abrangente, e neste caso específico, o agronegócio da manga se sustenta, entre outras formas, pelo discurso da geração de emprego, porém, observa-se que o maior número de empregos gerados com carteira assinada pelo agronegócio da manga está concentrado em funções de secretaria, gerência de campo ou caseiros, ou seja, um número relativamente reduzido de vagas, que não justifica a sua defesa como sendo a solução para o desemprego no campo. Os funcionários com vencimentos mais expressivos no trabalho na mangicultura recebem em média um salário mínimo e meio.

Entre os trabalhadores da manga (Figura 2) é grande a presença dos trabalhadores camponeses, principalmente aqueles que residem em áreas onde não há a possibilidade de cultivar lavouras durante os meses de estiagem, restando-lhes buscar no trabalho assalariado temporário os meios de reprodução da família, o que demonstra a complexidade que envolve o ser camponês no Brasil.

Figura 2
Ocupação antes de trabalhar na produção de manga. Livramento de Nossa Senhora (BA)

Assim, não se estaria diante da classificação direta ou subentendida de subproletários ou de classe subordinada à classe operária, mas sim de uma classe ou segmento (a depender da situação), dissociado da complexa trama social que caracteriza a comunidade camponesa, que de forma mais intensa em países como o Brasil, vive a duplicidade de ser camponês e de exercer outras atividades laborativas, bem como em alguns momentos utilizar trabalhadores assalariados, sendo, pois, essa a condição para manter sua realidade/identidade camponesa. (THOMAZ JÚNIOR, 2005THOMAZ JÚNIOR, A.. Se camponês, se operário! Limites e desafios para a compreensão da classe trabalhadora no Brasil. In: Geografia e trabalho no século XXI. Presidente Prudente: Centelha, 2005. p. 158)

No tocante às mulheres, estas se encontram ocupadas de maneira mais presente no processo pós-colheita, cujo período de duração é relativamente curto. Dessa forma, há, nos meses de entressafra, a necessidade de buscar outra ocupação, sendo mais comum o trabalho como domésticas ou auxiliar de serviços gerais no setor de serviços. Como essa forma de trabalho é pouco remunerada, logo que se inicia o período de safra, as mulheres deixam o trabalho como domésticas e retornam ao trabalho na produção de manga. A preferência pelo trabalho nos galpões e packing houses se deve ao fato de receberem mais, pois geralmente o salário de uma empregada doméstica fica em torno de R$250,00 e R$300,00, bem abaixo do que a trabalhadora da manga pode vir a ganhar, entre R$450 e R$550,00, somados os acréscimos de horas-extras.

O trabalho em Livramento de Nossa Senhora apresenta grande plasticidade, porque o trabalhador ora encontra-se ocupado na labuta no campo, nos galpões e packing houses ora se transformam em moto-taxistas, trabalhadores da construção civil, marceneiros, instrutores de academia, empregadas domésticas, padeiros, entre tantas outras ocupações. Nessa perspectiva, a relação campo-cidade deve ser repensada, pois o trabalhador assalariado do agronegócio da manga não pode ser genericamente classificado como rural, tampouco como urbano. Essa realidade não pode ser compreendida se a pluralidade que envolve estes sujeitos não for posta sob o crivo de uma crítica severa e radical. Para Thomaz Júnior (2005THOMAZ JÚNIOR, A.. Se camponês, se operário! Limites e desafios para a compreensão da classe trabalhadora no Brasil. In: Geografia e trabalho no século XXI. Presidente Prudente: Centelha, 2005., p. 11) “[...] essa complexa trama de relações requer para ser compreendida na sua totalidade, que promovamos a transgressão das fronteiras que limitam as diversas faces que a compõem (por exemplo, se no campo, se na cidade)”.

A maioria dos trabalhadores da produção de manga não tem os direitos trabalhistas respeitados, pois não possui registro em carteira (Figura 3), com predominância dos contratos informais. Como não há nenhuma garantia legal, os trabalhadores sofrem forte controle dos empregadores, sendo constante a rotatividade dos trabalhadores entre os galpões. Essa flexibilidade é utilizada pelo dono de galpão como uma medida para evitar possíveis ações judiciais trabalhistas, tendo em vista que os trabalhadores não ficam mais que uma safra trabalhando fixo em um mesmo galpão. Durante as pesquisas de campo muitos trabalhadores mencionaram que um dos aspectos negativos do trabalho na produção de manga é a falta de carteira assinada. Embora seja muito comum adolescentes trabalhando na produção de manga, não há por parte do poder público local ações efetivas no sentido de coibir essa prática entre os menores. Em relação ao desrespeito aos direitos trabalhistas não há conhecimento sobre ações do Ministério Público no município no sentido de obrigar os empregadores a regularizar a situação dos trabalhadores. Quando a comercialização da fruta com o mercado externo estava em alta, os trabalhadores das packing houses recebiam melhores salários, e na maioria dos casos, tinham registro em carteira devido às exigências de certificação (Selo EURAPG.A.P).

Figura 3
Trabalhadores da produção de manga com carteira assinada. Livramento de Nossa Senhora (BA)

A questão posta para discussão é: qual o tipo de emprego está sendo gerado pelo agronegócio da manga? Há por outra opção? A realidade não é simples de ser analisada porque atualmente o município é dependente dos postos temporários de trabalho gerados durante o período de safra, já que não existem, na cidade, outras atividades capazes de assimilar o contingente de desempregados ou subempregados que buscam no agronegócio da manga uma oportunidade de trabalho. Mas, a produção de manga assimila parte dos desempregados ou subempregados apenas por um período entre quatro e seis meses, pois trata-se de uma lavoura que exige um número reduzido de mão de obra na maior parte do ano, tendo em vista que os tratos culturais são, em sua maioria, mecanizados, como pulverização, roçagem, aplicação de fertilizantes, restando apenas atividades de curta duração e que demandam pouca mão de obra.

No decorrer dos últimos anos, de acordo com os trabalhadores entrevistados, algumas mudanças vêm ocorrendo na produção de manga. A primeira delas é que a demanda por mão de obra vem se reduzindo a cada ano e o valor pago pela diária é mantido o mesmo desde 2008, não acompanhando os índices de inflação, fato que reduz o poder de compra do trabalhador. Com a figura do agenciador “gato”, os trabalhadores da periferia da cidade passaram a enfrentar forte concorrência com os camponeses.

Considerando a realidade vivenciada pelos camponeses e trabalhadores da produção de manga em Livramento de Nossa Senhora (BA), faz-se necessário pensar as contradições e processos que envolvem a implantação do Projeto de Irrigação no Vale do Rio Brumado naquele município, de modo a trazer para o debate as formas de apropriação e uso dos perímetros irrigados. Assim, para além do desenvolvimento econômico, há que se refletir sobre os desdobramentos da Política de Irrigação implementada no Nordeste semiárido para a classe trabalhadora, visto que essa região vem passando por transformações espaciais significativas em função da expansão do agronegócio baseado na fruticultura irrigada. Os benefícios decorrentes das ações do Estado voltadas para modernizar o Semiárido brasileiro têm contribuído, sobremodo, para que camponeses caatingueiros e trabalhadores da terra sejam expulsos de seus espaços de morada e de trabalho.

Não nos colocamos contrários ao desenvolvimento e ao progresso no campo e na cidade. O que contestamos é a forma e os objetivos que fundamentam as ações desencadeadas pelo Estado quando se pensa o campo, as populações que nele vivem e as suas tradições e práticas culturais. Se por um lado há todo um esforço por parte do discurso hegemônico no sentido de fortalecer as bases do agronegócio, por outro lado, a agricultura camponesa fica à margem das políticas públicas, pois, segundo o constructo ideológico, trata-se de algo insustentável, inviável e prejudicial ao desenvolvimento do país. Contradizendo o discurso do Estado e do capital, a agricultura camponesa é a responsável por aproximadamente 80% de todos os alimentos produzidos e consumidos internamente no Brasil, revelando assim, uma agricultura dinâmica, eficiente e altamente geradora de postos de trabalho. Ao contrário do que se busca construir no imaginário social a agricultura camponesa, mesmo ocupando uma área menor e recebendo pouco apoio por parte das políticas públicas demonstra todo o seu potencial produtivo. Outra vantagem da agricultura camponesa é o fato desta produzir produtos mais saudáveis, em função da pouca utilização de agrotóxicos, sendo que em alguns casos não há o uso de nenhum tipo de insumos químicos.

Em Livramento de Nossa Senhora (BA) a realidade não destoa do cenário nacional, onde permanece uma agricultura camponesa robusta, dinâmica e diversificada, aspecto que pode ser verificado com uma visita à feira livre local, cuja variedade de produtos advindos das lavouras camponesas confirma a sua importância social e coloca em evidência a necessidade de valorização desta, principalmente na esfera governamental. Ao analisar a produção camponesa há que se considerar alguns elementos tais como a propriedade da terra, o trabalho familiar e os meios de produção porque a partir destes componentes pode-se angariar informações sobre sua configuração atual, inclusive a inserção no mundo-mercadoria, no momento em que o camponês passa a lançar mão dos insumos químicos e de empréstimos financeiros para auxiliar na manutenção da terra de trabalho. A produção de mandioca, milho, feijão, banana, batata, melancia, além da horticultura e pecuária credenciam a agricultura como um importante setor da economia local porque aumenta a oferta de produtos e contribui para manter o preço acessível. Por último, cabe um adendo na análise da realidade do campo em Livramento de Nossa Senhora, no sentido de ressaltar as contradições inerentes à produção de manga no Perímetro Irrigado do Rio Brumado em função da apropriação da terra e da água pelo capital para atender às demandas do mercado externo ao passo que a agricultura responsável por abastecer internamente é obrigada a deslocar-se para terras de pior qualidade, com ou sem disponibilidade de água para irrigação e distante dos locais de comercialização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A política de desenvolvimento territorial executada com foco na criação dos projetos de irrigação não conseguiu ultrapassar o simples processo de amenização das desigualdades sócio-espaciais, pois, embora alguns espaços tenham sido transformados em função dos progressos técnicos e inovações tecnológicas (as cidades-polo de desenvolvimento agrícola, por exemplo), não houve redistribuição de renda e da terra, acesso à água e, tampouco, tais transformações aconteceram em sintonia com os valores e necessidades dos camponeses.

Por estarem fundamentadas no incentivo ao agronegócio, as ações do Estado produzem efeito inverso porque criam “territórios modernos”, nos quais o acesso a terra e a água são restritos. Essa realidade torna-se um obstáculo para a maioria dos camponeses, que diante à mercantilização/privatização disfarçada dos recursos hídricos e da concentração da terra, acabam forçados a migrarem para as periferias urbanas ou para outros estados, onde passam a vender a sua força de trabalho, sendo que em outras situações, tornam-se mão de obra nos perímetros irrigados.

Ao se debruçar sobre a realidade dos camponeses e trabalhadores do agronegócio da manga em Livramento de Nossa Senhora (BA), foi possível sair do plano do “olhar superficial” para o aprofundamento do conhecimento em relação a questões que têm sido colocadas como a solução dos problemas para acabar com as desigualdades sociais no Nordeste semiárido e modernizar o campo. Estas ações, desencadeadas pelo Estado e pelo capital financeiro, assumem o caráter “civilizatório” porque a elas são atribuídas funções e resultados que, na verdade, não atendem as necessidades das populações que teoricamente deveriam ser beneficiadas.

A realidade vivenciada pelos camponeses e trabalhadores do agronegócio da manga evidencia a precarização das relações de trabalho no campo e na cidade, em suas mais diversificadas formas (contratação, subordinação, terceirização, part time), revelando que a fruticultura irrigada praticada nos moldes do agronegócio tem colocado para esses sujeitos situações aviltantes de exploração. Nesse sentido, há que se repensar as formas de uso e exploração das terras semiáridas, visto que cada vez mais o capital tem ocasionando processos de desterritorialização de camponeses e trabalhadores da terra, empurrando-os para as periferias das cidades, onde passam a vender a sua força de trabalho nos grandes perímetros irrigados, como se verifica em Livramento de Nossa Senhora (BA).

À guisa de considerações finais quer-se reforçar a importância e dinamicidade da produção camponesa desenvolvida nas bordas do Perímetro Irrigado do Rio Brumado, que mesmo ocupando uma faixa de terra inquestionavelmente menor que a lavoura de manga, tem oportunizado a reprodução do campesinato, colocando em evidencia a disputa por território entre campesinato e agronegócio. Essas disputas territoriais são também disputas entre projetos de mundo antagônicos, cujas bases político-ideológicas constituem elementos centrais para compreender a geografia que vai se desenhando no campo brasileiro nesse início de século XXI, em sua essência desigual e contraditória. Mesmo sem apoio financeiro e ocupando pouca terra a agricultura camponesa tem mostrado seu potencial, fato que expõe de modo emblemático o caráter contraditório do processo de modernização da agricultura em Livramento de Nossa Senhora. Por outro lado, nos oferece elementos para analisar as estratégias de reprodução do modo de vida camponês, de suas práticas socioculturais, constituindo uma alternativa ao modelo agrário/agrícola planejado pelo Estado a serviço do sistema mundo moderno-colonial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    jan-apr 2014

Histórico

  • Recebido
    26 Fev 2012
  • Aceito
    10 Set 2013
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