Resumo
O fluxo de repertórios simbólicos presente não somente pelo deslocamento de pessoas, mas também de signos (textos, sons e imagens), é fundamental para a compreensão sociológica das experiências negras nas sociedades modernas. Enquanto estéticas em movimento, as musicalidades negras, por sua vez, são encaradas como um elemento central da cultura política forjada pelas experiências afro-diaspóricas. Neste artigo, busca-se demonstrar que a música caipira também pode ser vista como parte do mosaico das modernidades negras instituídas no Brasil. Isso porque, além de ser protagonizada, em muitos casos, por artistas negros, há uma parte da música caipira que constituiu uma estética racializada, a qual configurou memórias e narrativas acerca da negritude de parte da população sertaneja. Através da música caipira, ruralidades negras eram recriadas e reinventadas durante os processos de modernização vivenciados pela sociedade brasileira.
Palavras-chave:
música caipira; musicalidades negras; ruralidades negras
Abstract
The flow of symbolic repertoires we see not only in the displacement of people, but also of signs (texts, sounds and images), is fundamental to the sociological understanding of black experiences in modern societies. As aesthetics in movement, black musicalities, in turn, are seen as a central element of the political culture forged by Afro-diasporic experiences. In this article, we seek to demonstrate that country music can also be seen as part of the mosaic of black modernities established in Brazil. This is because, in addition to being performed in many cases by black artists, there is a part of country music that constituted a racialized aesthetic, which configured memories and narratives about the blackness of part of the country population. Through country music, black ruralities were recreated and reinvented during the modernization processes experienced by Brazilian society.
Keywords:
Brazilian country music; black musicalities; black ruralities
1. Introdução
Sobre Pardinhos e Afro-caipiras, documentário de 2022 dirigido por Daniel Fagundes, aborda o processo através do qual foi instituída uma imagem embranquecida do universo sertanejo brasileiro (YouTube, 2023). Por trás de caricaturas da população rural, presente em personagens como Jeca Tatu, o bandeirante e, recentemente, o agroboy, estaria o apagamento das matrizes culturais afro-indígenas e, consequentemente, o branqueamento da cultura caipira. O trabalho de construção simbólica do sertanejo branco foi empreendido em diversas produções culturais, como a literatura, a propaganda, o cinema e a teledramaturgia. O setor musical, contudo, ganhou destaque nesse processo. A música sertaneja, cuja configuração acompanha o desenvolvimento da indústria cultural brasileira, atravessou um profundo processo de embranquecimento da sua estética, especialmente a partir dos anos 1980.
Antes desse período, todavia, parte desse gênero musical constituiu, através da presença de diversos músicos negros, um espaço de afirmação da população afro-sertaneja. O campo da música, na verdade, sempre carregou narrativas interessadas na construção de identidades racializadas. Para além das tentativas de embranquecimento cultural, músicos negros, por seu turno, construíram e reproduziram imagens positivas de si mesmos e da população negra de um modo geral. Instituíram, por assim dizer, uma modernidade negra, ou seja, um conjunto de narrativas e visões de mundo que surge a partir das experiências racializadas constituintes da sociedade moderna. Não à toa a música é conceituada como um elemento central da cultura política diaspórica (Gilroy, 2001; Azevedo, 2021).
Neste artigo, busca-se demonstrar que a música caipira também pode ser vista como parte do mosaico das modernidades negras forjadas no Brasil. Isso porque, além de ser protagonizada, em muitos casos, por artistas negros, há uma parte da música caipira que constituiu uma estética racializada, a qual configurou memórias e narrativas acerca da negritude de parte da população sertaneja. Para tanto, primeiro será apresentada uma breve discussão acerca das ideias de embranquecimento cultural e modernidades negras. Posteriormente, buscar-se-á identificar o que se convencionou intitular de música caipira. Por fim, buscaremos identificar quais são os elementos presentes nas musicalidades caipiras que a tornam uma janela para compreensão das experiências negras ao longo dos processos de modernização vivenciados pela sociedade brasileira.
2. Embranquecimento cultural e modernidades negras
João Baptista de Lacerda, então diretor do Museu Nacional, foi um dos enviados brasileiros para o Congresso das Raças realizado em Londres no ano de 1911. Na sua apresentação, ancorada em diagramas formulados a partir de estudos do chamado darwinismo racial, ele projetou a existência de um Brasil totalmente branco para um futuro não tão distante. A fim de ilustrar seu pensamento, expôs a tela “A redenção de Cã”, pintada pelo espanhol Modesto Brocos em 1895. De acordo com Lacerda, as populações negra, indígena e mestiça desapareceriam do território brasileiro, prevalecendo a raça branca. Tal apresentação sintetizou o desejo de embranquecimento do país, expresso em falas, ações e comportamentos de nossas elites.
Durante a virada do século XIX e o início do século XX, o surgimento, em diversas partes do Brasil, de projetos ligados ao pensamento eugenista fez com que a proposta de embranquecimento se institucionalizasse em política de Estado. Estabeleceu-se uma nítida associação entre modernização (seja ela econômica, política e/ou cultural) e “branqueamento”. Para se modernizar, o país precisava embranquecer. “Branco já não simbolizava mais exclusivamente valores morais-religiosos nem só o status de liberdade: agora a cor branca seria também projetada na idéia de progresso” (Hofbauer, 2003, p. 79-80). As primeiras medidas adotadas foram as políticas imigratórias, voltadas exclusivamente para a atração europeus, empreendidas em algumas regiões do país. Isso sem falar da proibição da imigração africana a partir de 1890.
O embranquecimento, todavia, não poderia ser apenas físico. A ideia de branqueamento também influenciou diretamente a modernização do campo cultural brasileiro. Após proibir, logo depois da abolição da escravidão, a manifestação de práticas culturais consideradas de origem africana, como o samba e a capoeira, o Estado brasileiro, após 1930, quando ocorre a ascensão da ideia de mestiçagem como elemento central da identidade nacional, elegeu essas mesmas atividades como “símbolos nacionais”. A mestiçagem, todavia, era percebida, assim como tentou demonstrar João Baptista Lacerda, como uma etapa transitória dentro de um processo de contínuo de branqueamento1.
Abdias Nascimento (2016), intelectual e ativista do Movimento Negro, chamou de “embranquecimento cultural” a ausência de representatividade e de representações positivas das pessoas negras nos variados setores artísticos – literatura, pintura, dramaturgia, música etc.
Além dos órgãos do poder – o governo, as leis, o capital, as forças armadas, a polícia – as classes dominantes brancas têm à sua disposição poderosos elementos de controle social e cultural: o sistema educativo, as várias formas de comunicação de massas – a imprensa, o rádio, a televisão – a produção literária. Todos esses instrumentos estão a serviço dos interesses das classes no poder e são usados para destruir o negro como pessoa e como criador e condutor de uma cultura própria (Nascimento, 2016, p. 112).
Conforme a indústria cultural foi se desenvolvendo, mais a ausência de pessoas negras vai se consolidando no campo cultural. O embranquecimento de personagens e conteúdos aconteceu em diversos setores artísticos, especialmente na música – casos do samba e da MPB, por exemplo. Esse fenômeno também ocorreu na música sertaneja. Desde as décadas de 1980 e 1990, a modernização desse gênero musical se apoiou na branquitude para se valorizar esteticamente no mercado musical2. Com o sertanejo se modernizando e movimentando muito dinheiro, os artistas desse gênero tinham sua imagem bem mais exposta: eram CDs, DVDs, videoclipes, participações em programa de TV, propagandas, revistas e, atualmente, a internet e as mídias digitais. Ao longo da história do capitalismo, o desenvolvimento das tecnologias comunicacionais serviu, em várias situações, para alimentar o racismo, uma vez que estas estavam ancoradas na estética dominante (Sovik, 2009). Sendo assim, quanto mais a industrial cultural se apoiava no visual, maior era sua tendência de exclusão de pessoas negras. Dentro do gênero sertanejo, é notável o desaparecimento paulatino dos músicos negros após a década de 1980. A modernização desse estilo musical, ao se distanciar da sua versão “caipira”, foi marcada por um embranquecimento da sua estética, especialmente se pensarmos como essa nova estética acompanha os projetos de modernização encabeçados pelo agronegócio (Palma, 2021).
Nas palavras de Nascimento (2016), o embranquecimento cultural seria uma estratégia visando o próprio genocídio da população negra. A exclusão cultural da população negra adquire, nesse sentido, o mesmo estatuto da violência física, pois, sem seus reportórios culturais, determinado grupo se torna incapaz de se reproduzir coletivamente.
Ao analisar o embranquecimento da cultura como estratégia de genocídio [...] Abdias Nascimento indica que a apropriação cultural está longe de ser uma questão banal, uma vez que também pode estar a serviço dos mecanismos de opressão e das políticas de morte. A apropriação cultural é um mecanismo de opressão por meio do qual um grupo dominante se apodera de uma cultura inferiorizada, esvaziando de significados suas produções, costumes, tradições e demais elementos. [...] Portanto, escamotear os traços negros e indígenas das tradições culturais brasileiras é o mesmo que roubar a humanidade desses povos e impulsionar seu genocídio. É uma violência, um crime (William, 2020, p. 47).
Todavia, para além dessa perspectiva macroestrutural, deve-se levar em conta também as ações e mecanismos através dos quais os afro-brasileiros também reagiram a esse processo de branqueamento racial e cultural. Afinal, a racialização dos corpos negros não foi algo recebido por eles de maneira passiva. Suas reações adquiriram diversos contornos e múltiplos conteúdos em diferentes contextos. Antonio Sérgio Guimarães (2021) caracteriza essa via de mão dupla com o conceito de formação racial.
Essa noção engloba tanto o processo de racialização dos afrodescendentes no Brasil, isto é, a massificação de pessoas com diversas identidades sociais na noção biologizante de raça, quanto a ressignificação política que os racializados fizeram do termo racista original – negro – como modo de identidade política para reorganizar a revolta, a luta pela igualdade e a construção de um novo imaginário coletivo. Nesse último registro, como modo de autoidentificação coletiva, é que falamos de formação raciala (Guimarães, 2021, p. 17).
O campo cultural, por sua vez, parece ser um fundador de encruzilhadas, uma vez que permite múltiplas possibilidades de expressão. Enquanto campo de conflitos, constituído a partir de disputas pela legitimidade das narrativas que lhe dão sentido, ele permite afirmações e negações. No Brasil, se foi chave para a disseminação do discurso da mestiçagem e reproduziu falas racistas, nele também foram construídas perspectivas antirracistas. Para a população negra, a cultura quase sempre foi um lócus de construção de direitos. O direito ao batuque, à festa e ao candomblé sempre foram reivindicações contra as dominações impostas pelo racismo e a escravidão. A cultura artística-musical-religiosa produziu valores e imagens para a autoafirmação da população negra. O campo cultural, nesse sentido, não foi simplesmente diversão ou entretenimento, mas um espaço político (Azevedo, 2021, p. 11).
Paul Gilroy (2001) tem sido, através do emprego da categoria “Atlântico Negro”, um dos principais pensadores contemporâneos interessados em entender o papel da cultura na formação das comunidades negras modernas. O autor utiliza tal conceito para enfatizar que a ideia de modernidade, tão cara ao pensamento sociológico, é incompleta se não é levada em conta a herança racializada deixada pela escravidão africana. Para ele, é a experiência comum de subalternização, ou seja, o racismo enquanto legado colonial, que fundamenta identidade e cultura negras nas sociedades modernas.
Raça e racismo são produtos do intercâmbio e do fluxo internacional de pessoas, de mercadorias e de ideias, o que engloba, necessariamente uma dimensão afro-diaspórica. Assim, o que chamamos de modernidade não se esgota na racionalidade iluminista europeia, no Estado impessoal e nas trocas mercantis; a modernidade é composta pelo tráfico, pela escravidão, pelo colonialismo, pelas ideias racistas, mas também pelas práticas de resistência e pelas ideias antirracistas formuladas por intelectuais negros e indígenas. A compreensão do mundo contemporâneo está ligada à compreensão da diáspora africana, ou seja, do modo como que a África se espalhou pelo mundo (Almeida, 2019, p. 103-104).
Gilroy (2001) entende a experiência da população negra como uma contra narrativa da modernidade, a qual seria compreensível somente através da noção de diáspora e suas consequentes narrativas de perda, exílio e deslocamento. Dito em outras palavras, o racismo, enquanto fenômeno transnacional herdado da escravidão colonial, produziu sujeitos coletivos que resistiram a essa subalternização e, ao mesmo tempo, também construíram versões racializadas de suas experiências, instituindo, assim, identidades e culturas propriamente negras.
Em seu livro, Gilroy (2001) dedica um capítulo especificamente à música afro-americana, com destaque para a obra de Jimmy Hendrix e para o movimento Hip-Hop. Sem negar as trocas com outros estilos e outras matrizes culturais, ele aborda como instrumentos, ritmos, corporalidades e narrativas foram significadas em um trabalho de construção da “cultura negra” (em oposição às culturas hegemônicas), a qual, por sua vez, foi responsável por contribuir no processo político de estruturação de uma identidade negra. Segundo ele, a cultura negra produz e reproduz narrativas alternativas ao longo da história colonial e moderna.
Neste trabalho, utilizaremos o conceito de modernidade negra para tentar entender como parte da música caipira mobilizou um repertório racializado.
A noção de modernidade negra foi a que utilizei para enfeixar tal transição [o modo como homens e mulheres passaram a se identificar como negros], inspirada obviamente na ‘contracultura da modernidade’ de Paul Gilroy – a de subalternos sociais racializados para sujeitos que se autodefinem e ressignificam para si e para outros o que é ser negro. [...] Modernidade aqui deve ser entendida no seu sentido literário de renovação estética e de representação do mundo social. A modernidade negra começa como uma revolução estética na música, na literatura e nas artes plásticas, mas também, concomitantemente, na representação de si e na construção de um ideal político (Guimarães, 2021, p. 15).
As modernidades negras criaram modos de reconhecimento coletivo, integrando, ao menos simbolicamente, a população negra a partir de suas vivências subalternizadas. Nesse sentido, o fluxo de repertórios culturais ocasionado não somente pelo deslocamento de pessoas, mas também de signos (textos, sons e imagens), é fundamental para a compreensão sociológica das experiências negras nas sociedades modernas (Guerreiro, 2010, p. 8). Talvez uma análise da música caipira possa abrir mais uma janela para se pensar essas questões. Antes, contudo, devemos abordar as possibilidades de entendimento dessa última a partir da história da música sertaneja.
3. Afinal, o que é a música caipira?
É consenso que, até a década de 1930, o termo “música sertaneja” era empregado para designar qualquer manifestação musical de origem rural ou interiorana. A partir desse período, entretanto, com o início da formação de uma indústria cultural e fonográfica no país, os gêneros musicais começam a adquirir contornos e definições mais precisos. Somente a partir do momento que o samba é institucionalizado como ritmo nacional, assim como o interior do país passa a regionalizar-se (Luiz Gonzaga, por exemplo, afirmará o baião como gênero tipicamente “nordestino”), é que a música sertaneja passa a ser identificada com o centro-sul do país (Alonso, 2015). É considerado o início da música sertaneja, enquanto gênero musical moderno, o ano de 1929, quando Cornélio Pires gravou aquele que é considerado o primeiro LP desse gênero musical (Alonso, 2015; Nepomuceno, 1999). Ainda nos 1930, surgiram nomes importantes, que foram fundamentais para a consolidação da música sertaneja, como Alvarenga & Ranchinho, João Pacífico, Caçula & Mariano e Torres & Florêncio.
O surgimento da música sertaneja, por sua vez, esteve associado à gradual formação de uma identidade interiorana em estados como Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso. Foi nas décadas de 1940, em especial na de 1950, que ocorreu a ascensão de diversas duplas que viriam a se tornar verdadeiros clássicos desse estilo. São elas Tonico & Tinoco, Tião Carreiro & Pardinho, Liu & Léo, Jacó & Jacozinho e Cascatinha & Inhana. É certo que eles encontraram um grande facilitador para o sucesso: a difusão do rádio entre as camadas populares, algo notável nessa época. Com exceção de Cascatinha & Inhana, os quais priorizavam o romantismo em suas canções, tais duplas, mesmo com um repertório heterogêneo, ficaram marcadas por reproduzir, em suas opções estéticas, imagens de um sertão que começava a se desmanchar perante o processo de modernização da sociedade brasileira.
A partir da década de 1970, começaram a surgir tensões dentro da indústria da música sertaneja. O acesso a repertórios musicais estrangeiros, cada vez mais frequente ao longo dessa época, incomodou os defensores de uma visão mais purista, centrada no predomínio da viola caipira. Além do pop norte-americano, outros ritmos latino-americanos, como guaranias, rancheiros e boleros, passaram a ser introduzidos em canções sertanejas por duplas como Leo Canhoto & Robertinho, Milionário & José Rico e Pedro Bento & Zé da Estrada. Sendo assim, novas sonoridades, assim como novos instrumentos musicais, passaram a integrar esse gênero musical. Até mesmo o sucesso internacional dos filmes de faroeste, os chamados Westerns, tornou a estética Cowboy uma grande influência entre esses cantores. É a partir desse momento que uma divisão começa a ser instalada dentro da música sertaneja. Segundo os defensores das versões mais tradicionais, a música sertaneja estava deixando de ser aquilo que sempre foi e se tornando outro gênero musical. Já para os defensores dessa modernização, o sertanejo estava apenas evoluindo de acordo com o tempo; era preciso abandonar a estética “caipira” pois a própria sociedade brasileira estava se modernizando. Assim se estabelecia a divisão entre “caipiras” e “sertanejos”.
Considerada a “diva da tradição”, o trabalho de Inezita Barroso foi fundamental na criação de uma identidade para a música caipira. Enquanto cantora, apresentadora e escritora, ela conseguiu moldar uma narrativa de pureza em relação às expressões artísticas vinculadas às regiões rurais do país. Inezita sempre defendia a “pureza” da música do campo, em detrimento do processo de invasão estrangeira que, segundo ela, degenerava a “autenticidade” da música caipira nacional. Por outro lado, mesmo diante das críticas empenhadas pelos defensores do “purismo” na música rural, várias duplas deixaram de lado a composição clássica, centrada na viola e no violão. Elas acabaram alcançando ouvintes não somente no interior do Brasil, mas também nas periferias de algumas das maiores cidades, especialmente São Paulo, Belo Horizonte e Goiânia. A modernização da música sertaneja, nesse sentido, está ligada também ao processo de modernização da sociedade brasileira, que se tornara industrial e urbana ao longo do terceiro quartel do século XX. A tentativa de modernizar a música rural era uma necessidade sentida por aqueles artistas mais jovens, que já vivenciavam outras experiências culturais e, também, de ruralidade. Eles esbarravam no próprio preconceito construído ao longo dos anos em torno das populações rurais, enxergadas como atrasadas por boa parte dos agentes da nossa modernização.
Essa divisão aumenta ainda mais a partir dos anos 1980 e 1990 com a ascensão do intitulado “sertanejo romântico”, encabeçado por duplas como Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo e Zezé di Camargo & Luciano. Boa parte da intelectualidade brasileira contribuiu fortemente para o estabelecimento da separação entre o “caipira” e o “sertanejo”. Para eles, o primeiro representava a “pureza” e a “autenticidade” das populações rurais, enquanto os modernos sertanejos seriam uma tentativa de imposição, por parte da indústria cultural, de um estilo artificial. Essa é a posição dos sociólogos José de Souza Martins (1975) e Waldenyr Caldas (1977). Entre os defensores da música caipira, os quais avaliavam o sertanejo pós-1970 como deturpadores da primeira, podemos citar Inezita Barroso, Rolando Boldrin e os jornalistas Hamilton Ribeiro (2015) e Rosa Nepomuceno (1999). Para esses dois últimos, a música caipira seria uma das espécies (entre muitas) de música sertaneja, sendo esta última uma denominação genérica para qualquer música que retrate o “sertão”. Somaram-se a eles artistas que tentaram, a partir da década de 1980, estabelecer um contra movimento a essa tendência modernizadora, atribuindo uma feição intelectualizada à música caipira, como são os casos de cantores que migraram da MPB, sobretudo Renato Teixeira e Almir Sater, e do ex-Jovem Guarda Sérgio Reis, o qual passou a regravar clássicos do gênero sertanejo. Aos poucos, foi se consolidando esse discurso essencialista, o qual separava o “caipira raiz” do “sertanejo modernizado”3.
Demarca-se aqui que esse pensamento catalisado nos anos 70 foi essencial para a construção, delimitação e distinção de campos culturais diferenciados na música rural. Pensando através das categorias de Bourdieu, a música caipira foi sendo ao mesmo tempo “inventada” enquanto projeto estético e campo cultural ao mesmo tempo que criava e delimitava sua oposição, os sertanejos. Em diálogo dinâmico de autonomia relativa, foram sendo gestados campos gradualmente opostos (Alonso, 2017, p. 450).
Além de Alonso (2015, 2017), há pesquisas recentes (França, 2021; Campos e Almeida, 2018; Oliveira, 2009), ancoradas em novas teorias sobre a circulação dos bens culturais, que contestam essa visão segundo a qual o sertanejo contemporâneo representa apenas um projeto de alienação da indústria cultural. Sem deixar de levar em conta a lógica mercadológica presente na estruturação do campo musical, elas afirmam ser necessária uma abordagem menos determinista para entender como esse gênero musical “[...] mobiliza as intimidades, as emoções e as interações de milhões de pessoas cotidianamente” (França, 2021, p. 309). Se olharmos para como os sujeitos que consomem esse gênero musical imprimem significados e se relacionam com ele, percebe-se que, mesmo se tecnificando e se midiatizando, o sertanejo ainda guardaria uma relação com os valores e sentimentos da população. Seria possível, nesse caso, pensar também nas continuidades presentes nesse gênero musical, tratando “música caipira” e “música sertaneja” não como dois objetos estanques. Conforme afirma Elizete Ignácio dos Santos (2005, p. 104), [...] “a ‘autenticidade’ não [pode ser encarada] como algo em si mesma, mas como um recurso discursivo dos grupos envolvidos, que está em constante reformulação”.
Neste artigo, trataremos de encarar a música caipira como um subgênero da música sertaneja. Seu período predominante foi entre 1930 e 1970, embora até mesmo nos dias de hoje seja possível encontrar duplas intituladas caipiras. A sonoridade básica da música caipira, por sua vez, é extraída do dueto viola e violão, com uma dupla cantando num intervalo de terça, normalmente em registro tenor. Ao afirmar isso, há que se levar em contar que essa visão purista raramente corresponde à carreira completa de um artista. Tião Carreiro & Pardinho e Tonico & Tinoco, por exemplo, mesmo sendo considerados grandes expoentes da música caipira, também utilizaram outros instrumentos, assim como flertaram com outras sonoridades, em diversos LPs. Mesmo não sendo monotemática, a música caipira tem como tema principal de suas canções as lembranças e reminiscências da vida rural frente à intensa urbanização ocorrida no Brasil durante esse período. Portanto, ao empregarmos o termo “música caipira”, há de se ter consciência que ele reproduz uma identidade estético-musical marcada pela combinação de certos elementos, porém, sem deixar de entender que, em certas circunstâncias, ela também simplifica uma história muito mais complexa. Hoje em dia, expressões como “sertanejo raiz” e “moda de viola” são encaradas como sinônimo de “música caipira”. A sua transição para o “sertanejo moderno” marca, conforme já mencionado, além de um fenômeno de modernização instrumental e tecnológica, uma renovação estética na qual se percebe o apagamento físico e simbólico dos personagens negros (Palma, 2021). Neste artigo, o objetivo específico é analisar como parte da música caipira, especialmente aquela composta por músicos negros, disseminou representações racializadas do sertão e dos afro-sertanejos.
4. Música caipira e afro-religiosidades
Delimitou-se aqui o universo da música caipira exatamente porque, além das características que já lhe foram atribuídas, argumenta-se que ela é, também, uma expressão musical importante para se visualizar a cultura afro-diaspórica no Brasil. Isso porque, além de ser protagonizada, em muitos casos, por artistas negros, há uma parte da música caipira que constituiu uma estética racializada, a qual configurou narrativas e imagens acerca da negritude de parte da população sertaneja brasileira.
Sem dúvida, a dupla caipira que mais conferiu destaque a temática afro em sua obra foi Tião Carreiro & Pardinho. Eles foram parceiros, entre voltas e separações, de meados da década de 1950 até fins da década de 1980. Entre os mais de 50 LPs gravados pela dupla, podemos selecionar um repertório que cristaliza uma visão racializada sobre o sertão, especialmente no que diz respeito ao retrato do universo afro-religioso. São os casos das canções “Segredo da Chave”, “Pagode do Pai Tomé”, “Sete flechas”, “Arapó”, “Abrindo caminho”, “A Majestade O Pagode” e “Pretinho Aleijado”. Em todas elas, o enredo das canções se passa em torno de personagens e ações que rementem aos referencias espirituais da umbanda. Toda a simbologia dessa religião pode ser encontrada nessas canções através da menção a entidades, guias, espaços, rituais e, inclusive, por meio do ritmo e da sonoridade.
Preto véio saiu da mata/ Vei aqui pra trabalhar/Preto véio saiu da mata/Vei aqui pra trabalhar/O que Deus faz desse mundo/Ninguém pode desmanchar/O que Deus faz desse mundo/Ninguém pode desmanchar/Calunga está trabalhando/Junto com o pai carreiro/Calunga está trabalhando/Junto com o pai carreiro/Fazendo serviço limpo/No centro deste terreiro/Fazendo serviço limpo/No centro deste terreiro/Destranca e abre caminho/Ninguém pode mais trancar/Destranca e abre caminho/Ninguém pode mais trancar4.
Essas canções remontam a um universo afro-religioso compartilhado em diversas áreas rurais na história do Brasil. A simbologia em torno do personagem “Preto Velho” é representativa nesse sentido. Em uma quantidade significativa de músicas gravadas por Tião Careiro, a imagem de um trabalhador negro, já de certa idade, é veiculada. “Preto Velho”, inclusive, é o nome de uma das principais composições de Tião Carreiro (em conjunto com Lourival dos Santos, um dos seus principais parceiros e um dos maiores compositores de música caipira, e Jesus Belmiro). Tal canção, presente no álbum Navalha da Carne, lançado em 1982, era tocada na abertura de shows e também em programas de TV.
Perguntei ao preto velho: por que chora, meu herói?/ Preto velho respondeu: é meu coração que dói/ Eu já fui bom candeeiro, fui carreiro e fui peão/Já derrubei muito mato, e já lavrei muito chão/Com carinho carreguei os filhos do meu patrão/Em troca do que eu fiz, só recebi ingratidão/Sempre chamei de senhor, quem me tratou a chicote/Livrei o patrão de cobra na hora de dar o bote/Eu sempre fui a madeira e o patrão foi o serrote.
Sofri mais do que boi velho com a canga no cangote/Da terra eu tirei o ouro e o patrão fez seu anel/Mas agora estou velho e meu patrão mais cruel/Está me mandando embora vou viver de del em del/O que me resta é esperar a recompensa do céu.
A letra dessa toada expressa o sentimento de decepção de um trabalhador rural negro em relação ao seu patrão. Há a possibilidade, bastante plausível, de “Preto Velho” fazer referência a uma entidade muito presente nas religiões de matriz africana, especialmente na umbanda. Os Pretos Velhos são entidades que se apresentam sob o arquétipo de velhos que foram escravos, tendo o interesse por contar histórias da escravidão. Exatamente como apresentado na canção, as narrativas dos Preto Velhos centram-se nos sofrimentos e desventuras desses tempos, criando, assim, uma memória de experiência comum para a população negra a partir da subalternização verificada na condição de escravo. O ritmo lento da melodia, em forma de toada, acompanha a simbologia presente no personagem: história de sofrimento; lentidão nos movimentos (os Pretos velhos são, geralmente, representados pelo uso de bengala, metonímia da fragilidade de seus corpos devido à velhice); a paciência advinda da sabedoria adquirida com o passar do tempo. Todavia, mesmo que ainda não personificado nessas entidades, as histórias de “Pretos/as Velhos/as” são comuns no universo cultural das populações sertanejas. Desde os tempos de escravidão, eram os/as negros/as mais velhos/as que detinham o poder da cura nas comunidades de trabalhadores. Devido à sua sabedoria, eles/elas sempre eram consultados pelos novos antes de algum tomada de decisão ou para explicação de algum acontecimento.
Comumente, esses Pretos Velhos recebiam a alcunha de “pai”. Pai João, por exemplo, foi a caricatura dos Pretos Velhos em diversos segmentos da cultura popular do século XX (Abreu, 2004). “Pai João”, inclusive, é o nome de uma canção composta pelo já citado Zé Carreiro e por Xanduzinho. Ela foi lançada, primeiramente, ainda em disco 78 rotações, em 1959, quando Zé Carreiro fazia dupla com Pardinho. Posteriormente, em um álbum de 1979, “Golpe de Mestre”, Tião Carreiro, ao lado de Pardinho, também gravou a canção. Ela narra a história do personagem que dá nome à música, um antigo carreiro de boi, destacado como “destemido e querido do seu patrão”5.
Cantada por violeiros negros crescidos em regiões rurais que presenciaram a escravidão negra praticamente até a abolição (casos dos interioranos Zé Carreiro, Tião Carreiro e Pardinho), a figura de Pai João, “destemido carreiro e querido do patrão”, pode ser entendida a partir da experiência daqueles libertos e descendentes de escravos que permaneceram nas áreas rurais ao longo da primeira metade do século XX. As comunidades quilombolas não podem ser enxergadas como único modelo de experiência de vida das populações negras que permaneceram nas áreas rurais após o fim do escravismo no país. Vários ex-escravos, inclusive, permaneceram trabalhando para as famílias de antigos senhores, estabelecendo relações entre duas ou três gerações familiares. A permanência desses vínculos não pode, todavia, ser examinada sob o binômio submissão-privilégio. As hierarquias sociais passavam por um tenso processo de renegociação ao longo desse período, indicando diferentes modos de se lidar com a sujeição (Palma, 2021). Havia toda uma economia simbólica, herdada dos tempos de escravidão e remodelada posteriormente, por trás das relações de dependência e favor mantidas entre fazendeiros e trabalhadores negros (Palma; Truzzi, 2018; Garcia, 1988). O sentimento de injustiça exteriorizado pelos Preto Velhos dessas canções expressa as desigualdades raciais presentes em diversas localidades rurais nas quais o poder de mando do fazendeiro era ainda quase absoluto.
Transitando entre a música e a religião em diversas manifestações culturais, o personagem Preto Velho, ao estruturar lembranças sobre a vida no cativeiro e no pós-abolição, acabou transformando-se em um dos principais personagens da memória coletiva da população negra. Mesmo que pautadas por estereótipos, as narrativas sobre os Pretos Velhos cantadas na obra de Tião Carreiro, ao tornar herói um personagem antes humilhado e desprezado, acabam por subverter, no plano textual, certas posições socialmente estruturadas. Agora enquanto memória, o velho carreiro de boi tem o poder de curar e proteger, ou seja, de agir no mundo que anteriormente somente o violentou. Além disso, uma vez transformadas em memória coletiva, suas histórias podem servir como base afirmativa contra o racismo. Ao acionar a imagem do Preto Velho, está se racializando a população sertaneja de forma positiva; o que ocorre, mesmo de maneira indireta, é a reivindicação de uma especificidade, advinda de uma subalternidade vivenciada a partir do pertencimento racial, no que diz respeito às múltiplas trajetórias da população sertaneja.
Além de canções já citadas, como “Segredo da chave” e “Pagode do Pai Tomás”, o personagem Preto Velho aparece ainda em outra moda de Tião Carreiro, dessa vez em uma composição dele próprio em conjunto, novamente, com Lourival dos Santos e Jesus Belmiro, ou seja, o mesmo trio de compositores de “Preto Velho”. Trata-se da música “Candieiro da Fazenda”, lançada em 1980 no LP Homem até debaixo d’água, no qual Tião Carreiro faz dupla com Paraíso. Aqui, o “Pai João” aparece como um personagem coadjuvante. A narrativa da canção se passa em torno da desilusão amorosa de um candieiro (um auxiliar de carreiro de boi), o qual não consegue se casar com a filha do patrão, sua grande paixão. Pai João, nesse caso, é, mais uma vez, um carreiro de boi. Percebam a constante associação, presente nessas músicas, entre a imagem de um negro velho e as ocupações ligadas à montaria a cavalo e à lida com gado. Tião Carreiro e Zé Carreiro cresceram em fazendas paulistas e, como os próprios nomes já dizem, podem até ter desempenhado essa função. Com certeza, ouviram muitas histórias de Preto Velho. Conforme já mencionado, durante o pós-abolição, essas tarefas eram, em fazendas ou pequenas propriedades, geralmente realizadas por homens negros. Esse tipo de ocupação formatou trajetórias de vida entre a população negra sertaneja ao longo do século XX.
Outros nomes da música caipira gravaram músicas com menção direta aos Pretos Velhos. O Trio Parada Dura, outra formação muito conhecida na história da música sertaneja, gravou ao menos três músicas sobre essa entidade, com menção direta a seus poderes espirituais. Em 2007, Pedro Bento & Zé da Estrada, contemporâneos de Tião Carreiro & Pardinho e do Trio Parada Dura, gravaram “Preto Velho Sebastião”, canção composta por Ademar Braga e o próprio Pedro Bento. Pedro Bento & Zé da Estrada ainda gravaram “A visão de um Preto Velho”, composição de Caetano Erba e Paraíso.
Em 1977, Carreirinho lançou, em parceria com sua então esposa Zita Carreiro, um LP intitulado Amor e Felicidade. Duas músicas desse álbum fazem referência ao Preto-Velho. Trata-se de “Filho da Umbanda” e “Preto Velho”. A primeira, na qual nota-se, além da viola e do violão, o som de atabaques e uma introdução com direito à imitação da fala de um espírito de Preto Velho, aborda a “descida” da entidade em um terreiro de umbanda. Já “Preto Velho” narra, mais uma vez, a experiência social, já conhecida em outras canções, desse personagem: a vida injusta de um carreiro de boi, que trabalhou arduamente a vida toda sem recompensa nesse plano espiritual. Em 2011, foi lançada uma coletânea intitulada Macumba no Sertão (viola na macumba), a qual, além de algumas músicas de Tião Carreiro & Pardinho que já foram aqui analisadas, apresenta outros nomes da música caipira interpretando canções relacionadas à temática abordada neste trabalho. São nomes como Zico & Zeca, Leôncio & Leonel e o Trio Parada Dura. Além de Tião Carreiro, vários outros músicos caipiras, portanto, produziram narrativas encantadas sobre o sertão.
5. Música caipira e a crítica ao racismo
O primeiro negro a se destacar na música sertaneja, ainda na década de 1930, foi João Pacífico. Nascido em 1905, no município paulista de Cordeirópolis, ele era neto de escravos e trabalhou muito tempo como assistente de cozinha na Cia Paulista de Estradas de Ferro. Formou com o descendente de espanhóis Raul Torres uma dupla histórica na música caipira. Juntos, eles foram responsáveis por compor clássicos como “Cabloca Tereza” e “Pingo d’Água”. João Pacífico é considerado o criador da “toada histórica”, uma forma de se contar história através da música. Ainda com Raul Torres, lançou, em 1937, “Chico Mulato”, toada regravada posteriormente por diversas duplas e eleita por especialistas a melhor moda caipira de todos os tempos (Ribeiro, 2015, p. 54).
Raul Torres, em outra parceria que fez história na música caipira, ainda cantou junto a Florêncio. Torres era natural de Botucatu. Filho de imigrantes espanhóis, cresceu “[...] assistindo aos cateretês e cururus dos brancos e indo às congadas e batuque dos negros” (Nepomuceno, 1999, p. 266). É dele a composição de “Mula Baia”, canção que narra os dramas de Negro Plácido, um homem de posses que, devido à sua coragem e destreza, consegue salvar toda a sua tropa de um afogamento. “Coisa de herói do sertão, com esta novidade: era um negro rico, coisa rara na época” (Ribeiro, 2015, p. 138).
Conforme mencionado anteriormente, vários descendentes de escravos, seja no Sul, Sudeste, Centro-Oeste e até mesmo no Nordeste, ainda permaneceram, no pós-abolição, com algum tipo de vínculo de trabalho com grandes fazendeiros locais. Embora a luta por direito e por melhores condições de vida seja uma constante na experiência negra durante esse período, os grandes proprietários também fizeram questão de preservar a desigualdade advinda do escravismo, tentando estabelecer limites para a cidadania negra (Albuquerque, 2009; Fraga Filho, 2006). Desde os tempos de escravidão, negros e negras estabeleceram vínculos paternalistas com seus senhores. Após o fim da escravidão, em um contexto de promessa de liberdade, muitos reafirmaram esses laços. Contudo, como pode-se perceber em canções como “Preto Velho” e “Pai João”, não foram raros os casos em que, após uma vida toda de trabalho e assistência a famílias de fazendeiros, eles/elas se sentiram desrespeitados e/ou desvalorizados.
Além das canções já citadas, tais sentimentos são retratados em músicas como “Preto de Alma Branca”, composta por Teddy Vieira e Lauripe Pedroso. A letra também aborda as injustiças contra um velho trabalhador negro, “o peão mais antigo da fazenda”, o qual, mesmo demitido pelo filho do antigo patrão após ter chorado durante o enterro desse último, ainda morre para salvar, em um ato corajoso, a filha do fazendeiro. Embora empregando a expressão hoje considerada racista (“preto de alma branca”), pois coloca a branquitude como tendo o monopólio das qualidades positivas, a canção acaba elevando o personagem do velho trabalhador negro a uma espécie de mártir. Essa moda foi gravada pela primeira vez em 1948 pela dupla Mineiro & Manduzinho. Posteriormente, não conseguimos saber exatamente quando, ela foi regravada por Tião Carreiro & Pardinho.
Não somente em relação direta ao trabalho a população negra era discriminada. A música “Terra Roxa” relata como a desigualdade racial estruturava o cotidiano até mesmo daqueles poucos negros que conseguiam ser bem-sucedidos. Composta por Teddy Vieira e gravada por Tião Carreiro & Pardinho em 1978 como música título de um LP, a canção descreve a parada, em restaurante, de “um granfino num carro de luxo”. Na ocasião, ele queria trocar uma nota e esnoba um “preto” que estava almoçando nesse estabelecimento, classificando-o, para o dono do restaurante, como um “pobre coitado”. No decorrer da história, o “granfino” fica sabendo que o tal “preto” era, na verdade, um grande fazendeiro. Em “Preto Inocente”, verifica-se mais uma crítica ao preconceito racial. A letra parece tentar, ao retratar uma injustiça contra um homem negro, erroneamente acusado de um crime, desconstruir o estereótipo do “preto perigoso”. Composta por Teddy Viera, Campeão e Bento Palmiro, ela foi gravada por Tião Carreiro & Pardinho no LP Casinha da Serra, de 1963.
Ao mesmo tempo que cantaram críticas aos estereótipos raciais, também trataram de afirmar a negritude através da exaltação de personagens negros. É o caso canção “Negrinho Parafuso”, a qual narra a trajetória de Antonio Candido, um famoso cantador de cururu da região de Piracicaba, falecido em 1973. Tião Carreiro compôs essa moda em conjunto com Nhô Chico, antigo parceiro de Parafuso, e a lançou em 1983, no álbum intitulado No som da viola. Além disso, também podemos citar a constante presença de personagens negros protagonizando as histórias cantadas por Tião Carreiro & Pardinho. Fora as já citadas, podemos destacar “Boiada Cuiabana”, música na qual um dos integrantes da tropa chama-se “João Negrão”, e “A derrota do Boi Palácio”, que conta como Gumercindo, “um mulato destemido”, conseguiu montar no boi mais arisco do estado. De um modo geral, pode-se afirmar que tais narrativas colocam os negros em lugares sociais diferentes daqueles fixados pelo racismo. De uma forma afirmativa, reproduzem personagens negros como trabalhadores bem-sucedidos, músicos talentosos e peões corajosos. Sem dúvida, esse tipo de percepção tem a ver com a própria experiência de homem negro vivenciada por Tião Carreiro6.
A década de 1970 ainda foi um período de surgimento de muitas duplas negras ligadas à música sertaneja/caipira. Podemos listar Pena Branca & Xavantinho, Irmãs Barboza, André & Andrade, Irmãs Freitas, Zé Matão & Matãozinho, Durval & Davi e João Mulato & Douradinho. Também surgiram formações interraciais, como Mococa & Moraci (posteriormente Paraíso), Vadico & Vidoco (os quais eram conhecidos como a dupla “café com leite”), Galvan & Galvãozinho e João Mineiro & Marciano. No entanto, a composição de letras abordando a temática racial parece diminuir consideravelmente. Podemos destacar aqui “O Grande Milagre”, de composição de Miltinho Rodrigues e gravada por Mococa & Moraci em 1973, que traça uma narrativa religiosa sobre o fim do passado escravista. No mesmo ano, foi lançada “A Pérola Negra”, música que deu nome ao segundo álbum da cantora mineira Carmen Silva, que viria a ficar reconhecida nacionalmente pelo nome da canção. Na capa do LP, há uma ilustração do rosto da cantora na qual ela aparece com um penteado Black Power. João Mulato & Douradinho lançaram, em 1986, “Preto Doutor”. Essa canção narra a estória de um homem negro, doutor, que salva, por meio de uma transfusão de sangue, a mulher que um dia o desprezou. Moreno & Moreninho gravaram, ainda na década de 1970, “13 de maio”, música cuja letra é pautada por uma narrativa centrada nas ações da Princesa Isabel, ou seja, a versão oficial da história da abolição naqueles tempos. E não podemos esquecer de “Que terreiro é esse?” e “Congo”, músicas gravadas por Pena Branca & Xavantinho relacionadas à umbanda. Por fim, o Trio Parada Dura ainda gravou, em 1981, a música “Homem de Cor”7, que trata do racismo nas relações amorosas8.
Conforme tentou-se demonstrar, a população rural negra foi constituída através de múltiplas experiências e trajetórias e, mesmo com nuances e ambivalências, também contribuiu ativamente na construção de uma identidade negra a partir da sua vivência em processos de subalternização racializados. Os relatos de conflitos raciais remetem, nesse sentido, a uma racialização das vidas no sertão. A música caipira, com a circulação de histórias de peões, carreiros, carroceiros e capatazes, transformou-se num depositário de memória de experiências sertanejas distintas daquelas vivenciadas nos inúmeros quilombos espalhados pelo país. É possível, nesse sentido, fazer uma aproximação da música caipira com o Blues norte-americano, gênero musical também de origem rural, constituído praticamente no mesmo período histórico e responsável por dramatizar a negritude em um país marcado pela escravidão.
Essa estética racializada, por sua vez, ganha importância especial se lembrarmos que a maioria dessas canções foi gravada durante o regime militar, período de maior propagação da ideologia da democracia racial por parte do Estado brasileiro. A institucionalização de uma identidade nacional mestiça, a qual se supunha integradora, teria, na verdade, apagado a contribuição negra na formação nacional e, concomitantemente, encoberto o racismo através do qual a sociedade brasileira se reproduziu. Valorizar e enaltecer a negritude tornou-se, ao longo da ditadura civil-militar, uma forma de dividir o país e quebrar nossa suposta “harmonia racial”. Entidades, encontros e reuniões que visavam promover a “cultura negra”, às vezes sem nem mesmo contar como uma conotação política explícita, tornaram-se alvo de perseguições (Pires, 2018, p. 1059-1060). Frente ao discurso nacionalista apagador das diferenças, presente nas políticas modernizadoras da ditadura civil-militar, certos repertórios da música caipira funcionaram como “[...] um mapa multicêntrico [...] sugerindo as imagens negras como centro da história contada através do ritmo, harmonia, palavra poética e política. As memórias musicais que daí emergem implodem fronteiras geoculturais, questionando as narrativas do Estado Nação” (Azevedo, 2021, p. 12).
A modernização autoritária imposta pela ditadura civil-militar sempre construiu seus Outros. O sertão foi um de deles, muitas vezes sendo enxergado como alegoria do atraso. O “sertão negro”, aquele das histórias de pretos-velhos, caboclos, feiticeiros, peões, macumbas e capatazes, encaixa-se naquilo que Boaventura de Sousa Santos (2011) denominou de “experiências desperdiçadas” pela modernização autoritária, a qual desprezou e inferiorizou todos os saberes que não estavam dentro de uma definição restrita de ciência. A música caipira, ao abordar as religiosidades afro-brasileiras e as injustiças raciais em um período de intensa urbanização do país, acabou, portanto, produzindo contranarrativas a projetos autoritários de modernização, que encaravam o rural simplesmente como um espaço a ser modernizado. As narrativas acerca de um sertão encantado, presentes em diversas canções, constituem alternativas que escapam da lógica racionalizadora e rementem a experiências sociais específicas9.
Na música caipira, ao contrário do que supunham as ambições do regime militar, pudemos conhecer o sertão não como espaço vazio a ser ocupado, construído e investido pelo progresso, mas onde se passam dramas e epopeias construídos por certas sociabilidades e vivenciados por certos personagens. Em especial, sociabilidades e personagens negros. Mesmo tratando-se de ficção, suas músicas funcionaram como disseminadores simbólicos de uma determinada memória coletiva que remete à experiência comum de parcela da população negra – aquela que vivia em regiões sertanejas e não estava necessariamente integrada em comunidades herdeiras de quilombos.
Preservar a memória negra é lutar contra a dupla morte – física e simbólica. A prática social do esquecimento é um exercício de poder. Negar o direto de um grupo à constituição de uma memória coletiva própria é contribuir com a eliminação simbólica do mesmo. Isso é ainda mais complicado quando se trata de povos cuja transmissão de sabedoria acontece pela oralidade. É o caso da população rural negra brasileira em meados do século XX, ainda em pior situação, no que diz respeito ao acesso à cultura letrada, do que negros e negras residentes em espaços urbanos. Ao levar a religiosidade afro para a indústria fonográfica e, mais ainda, para a memória afetiva de milhões de pessoas, a música caipira pode ser nomeada como produção das modernidades negras.
[A]s musicalidades negras modernas revelaram ao mundo uma estética específica, hidratada por um conjunto de valores culturais herdados do circuito África/América/Brasil; bem como deixaram um legado político de resistência cultural à máquina escravista e ao racismo contemporâneo.
[...] Mesmo nas tramas da indústria cultural, as artes negras e em particular a música, se transformaram no texto mais poderoso de afirmação da memória, autorepresentação e narrativas históricas.
[...] o disco, no contexto da cultura de massa, se transformou no meio em outro meio de diálogo entre as diásporas negras das Américas. Com o disco os músicos puderam preservar valores, saberes e fazeres; refazer memórias; recompor projetos. Através dele, uma rede multidirecional e giratória de informações rítmicas, melódicas, culturais e políticas se constitui no mundo contemporâneo (Azevedo, 2021, p. 10-12).
A música caipira, com origem na década de 1930, integrou em seus quadros uma quantidade significativa de artistas de origem afro. Ela também cantou epopeias que, mesmo por vezes exageradamente dramáticas, contribuíram para retratar as trajetórias de famílias negras de origem rural. Conforme afirmou Araújo (2014), a música caipira compõe uma espécie de “trilha sonora” dos brasileiros que vivenciaram o processo de modernização/urbanização do país, especialmente no que diz respeito à experiência social de milhões de pessoas que migraram, ao longo desse período, das áreas rurais para as cidades. Os sertões narrados em suas canções moldaram a memória afetiva desse segmento, mas não somente apresentando a população camponesa como homogênea. Assim como relatado, através de uma estética racializada, a música caipira construiu e veiculou imagens e representações das experiências negras rurais. A música sempre foi um depositário de saberes muito importante para aquelas populações praticamente sem acesso à escrita – como os/as negros/as que migram para as cidades ao longo do século XX. Até então, sua sabedoria ancestral era transmitida quase que exclusivamente pela oralidade. A indústria fonográfica centrada na música caipira parece, nesse sentido, ter sido de extrema importância na (re)transmissão de histórias e personagens de um sertão negro, sendo uma espécie de materialização dessas memórias (Pollak, 1989, p. 12).
Para a população negra que ainda permanecia em áreas rurais do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a possibilidade de proletarização nas periferias dos centros urbanos, a partir sobretudo da metade do século XX, acentuava a incerteza estrutural presente em uma trajetória familiar marcada pelos processos de modernização. A migração para a cidade se coloca, até certo ponto, como uma continuidade, para a população negra, da diáspora, já que traz todas as consequências de mais uma experiência de deslocamento. Com a modernização, negros e negras do sertão se depararam, novamente, com a encruzilhada da reinvenção, aquela que é constituinte da realidade diaspórica. Imposta pela necessidade de deslocamento, a reinvenção de si passa, nesse sentido, pela reinvenção do território enquanto lugar de pertencimento. O deslocamento, portanto, jamais é somente físico, mas também existencial. E, se a música caipira era uma fonte de memórias, lembramos que, no nível individual, a memória é indissociável da organização social da vida (Pollak, 1989, p. 14). Sendo assim, a música caipira contribuiu, através de sua estética, na construção de memórias que, muito provavelmente, formaram um quadro interpretativo na compreensão dos fatos/eventos/experiências do presente. Memórias de um tempo camponês serviam como referência simbólica, nesse sentido, para significar a experiência urbana da proletarização. No caso da população negra, como visto, tais memórias podem ter ajudado a identificar seu lugar específico nos processos de modernização.
Refletir sobre a música caipira é, portanto, uma janela para se pensar acerca da logica socioespacial da urbanização brasileira e sua relação com determinados processos de racialização. A formação das periferias das grandes cidades, com seus múltiplos processos de exclusão e inferiorização, não é uma realidade estritamente urbana, mas agrega ações de modernização que envolvem também o rural. Notadamente, os “expulsos” do campo. Se hoje é comum interpretar as realidades periféricas a partir da lógica da racialização, ou seja, entender a dinâmica desses territórios a partir de estratégias racistas e antirracistas, a música caipira nos faz lembrar que a origem desse fluxo também é marcada pela racialização – o sertão que migra já é negro. É necessário, nesse sentido, capturar os movimentos socioespaciais das modernidades negras frente aos projetos nacionais de modernização. Através de repertórios da música caipira, as ruralidades negras eram recriadas e reinventadas também nos espaços urbanos em transformação.
6. Considerações finais
Se os terreiros onde as afro-religiões são praticadas podem ser considerados como “espaços de memória” da experiência negra no Brasil, o mesmo pode-se afirmar de parte das músicas de Tião Carreiro, por exemplo. Sua obra musical parece ser um documento acerca das memórias negras sertanejas, especialmente no que diz respeito às afro-religiosidades. Recentemente, três importantes pesquisadores sobre o tema lançaram uma Enciclopédia Negra (Gomes; Lauriano; Schwarcz, 2021), livro que revisita a vida de mais de 550 personalidades negras que foram destaque em suas respectivas áreas de atuação, mas cuja importância de suas obras foi minimizada, ou até mesmo invisibilizada, pelo racismo. No que diz respeito ao campo musical, são abordados diversos nomes, como Antonio Candeia Filho, Clementina de Jesus, Chiquinha Gonzaga, Heitor dos Prazeres, Ivone Lara, Paulo Portela, Pinxinguinha, Tias Baianas, Tia Ciata, Zé Kéti, Wilson Simonal, Itamar Assunção, Donga, Cartola e Manuel Tranquilino Bastos. Não há nenhuma menção, no entanto, a personagens como João Pacífico, Tião Carreiro & Pardinho, Zé Carreirrinho, Bandico, Pena Branca & Xavantinho, João Mulato, Zé Mulato & Cassiano, Cascatinha & Inhana, Durval & Davi, dentre vários outros músicos negros que contribuíram para a formação e consolidação da música caipira e, além disso, discutiram a negritude em suas obras. A música caipira, portanto, parece não ter recebido, até o momento, quase nenhuma atenção quanto ao seu pertencimento ao mosaico das modernidades negras.
Abreu (2018) relata que a ascensão de músicos negros no pós-abolição foi um fenômeno presente em diversas partes do continente americano. O jazz norte-americano, o calipso no caribe inglês e o samba brasileiro seriam exemplos. A música caipira, consolidada ainda na primeira metade do século XX, também abriu espaço para cancioneiros negros. Obviamente, eles dividiram esse espaço com muitas duplas brancas, sendo o seu principal objetivo o retrato, a partir de múltiplas narrativas, das memórias da vida no sertão. Argumentamos, todavia, que determinados cantores caipiras transmitiram, ao longo de suas obras, estéticas racializadas do sertão, as quais contribuíram para caracterizar a experiência negra no universo rural – experiência essa geralmente diluída nas figuras do sertanejo ou do caipira. Esses saberes musicais, embora contenham algumas nuances e ambivalências, não podem ser deixados de lado nos processos de mediação para a construção das modernidades negras.
-
1
Sobre uma crítica à institucionalização da mestiçagem como ideologia racial brasileira, ler Kabengele Munanga (1999).
-
2
Para uma análise mais detalhada do processo de embranquecimento da música sertaneja, consultar Palma (2021).
-
3
Para saber mais sobre essa distinção entre música sertaneja e caipira, consultar as obras de Gustavo Alonso (2015, 2017).
-
4
Pagode do Pai Tomé: “Pai Tomé meu protetor aumentou a força minha/Quem pra mim puxou espada se matou com a bainha [...] Compraram espingarda nova, deram banho de guiné/Mandaram benzer o cartucho, mas eu tenho Pai Tomé/Me atiraram pelas costa, nem assim pode acertar/Amanhã vai ser o enterro de quem não soube atirar”. Arapó: Entrei na roda de Jongo/Negro “véio” me falou/Eu tinha um laço de embira/Quando eu era laçador/Eu fui amansar uma tropa/Só de burro pulador/Quem levou laço de couro/Foi só laço que estourou/Meu laço era de embira/Meu laço não rebentou, ara po, ara po/Ara po, ara po/Ara po, ara po/É ponto de nego “véio”/De Jongueiro cantador”. A majestade O Pagode: “Meu pagode está tinindo no salão e no terreiro/Tá na boca do caboclo tá no pé do batuqueiro”.
-
5
Assim como “Preto Velho”, “Pai João” também consta na lista das 150 maiores modas caipiras de todos os tempos (Ribeiro, 2015, p. 130).
-
6
Segundo a sua filha, Tião Carreiro sofreu com o racismo até mesmo dentro da própria família da esposa (YouTube, 2023).
-
7
Aqui é bom salientar que há um recorte de gênero importante na música caipira. Quase sempre, a visão reportada é exclusivamente do homem negro e suas angústias no trabalho ou fora dele. Estamos analisando, portanto, a reprodução de negritudes masculinas. Em algumas canções, percebe-se até mesmo um discurso machista sendo reproduzido.
-
8
Marcos Queiroz (2021a, 2021b) analisou a presença de personagens negros em músicas como “Menino da Porteira” (“o menino de rosto trigueiro”), “A majestade o Sabiá” (“quero adentrar nas matas/ onde Oxossi é o deus”) e “Rancho Fundo” (“pobre moreno”).
-
9
É bom deixar claro que diversos músicos caipiras, inclusive Tião Carreiro, foram apoiadores, pelo menos em determinado momento, do regime militar. O que está em discussão aqui diz respeito à capacidade de mobilização de uma estética negra para se representar o sertão e a população sertaneja. Nesse ponto, é correto afirmar que alguns deles construíram uma contranarrativa às políticas implantadas desse contexto.
-
Fonte de financiamento:
Nenhuma.
-
Aprovação do Comitê de Ética:
Não se aplica.
-
Disponibilidade de Dados:
Não se aplica.
Referências
-
ABREU, Martha. Outras histórias de Pai João: conflitos raciais, protesto escravo e irreverência sexual na poesia popular (1880-1950). Afro-Ásia, v. 31, n. 31, p. 235-276, 2004. DOI: http://doi.org/10.9771/aa.v0i31.21076.
» https://doi.org/DOI: http://doi.org/10.9771/aa.v0i31.21076 - ABREU, Martha. Canções escravas. In: SCHWARCZ, Lilia; GOMES, Flávio (ed.). Dicionário da Escravidão e Liberdade São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 130-136.
- ALBUQUERQUE, Wlamyra. O jogo da dissimulação: abolição e cidadania negra no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
- ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural São Paulo: Pólen, 2019.
- ALONSO, Gustavo. Cowboys do asfalto: música sertaneja e modernização brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.
-
ALONSO, Gustavo. Os Vandrés do sertão: música sertaneja, ufanismo e reconstruções da memória na redemocratização. Estudos Ibero-Americanos, v. 43, n. 2, p. 458-471, 2017. DOI: http://doi.org/10.15448/1980-864X.2017.2.25062.
» https://doi.org/DOI: http://doi.org/10.15448/1980-864X.2017.2.25062 - ARAÚJO, Lucas. Tensões e ajustes entre tradição e modernidade nas definições de padrões da música sertaneja entre os anos 50 e 70 2014. Tese (Doutorado em História) – Universidade Estadual Paulista, Franca, 2014.
- AZEVEDO, Magno Hamilton. Ritmos negros: música, arte e cultura na diáspora negra. São Paulo: Editora Alameda, 2021.
- CALDAS, Waldenyr. Acorde na aurora: música sertaneja e indústria cultural. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1977.
- CAMPOS E ALMEIDA, Adrielly. A história da música sertaneja contada pelo Fantástico: uma análise do Bem Sertanejo. 2018. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2018.
- FRAGA FILHO, Walter. Encruzilhadas da liberdade: história de escravos e libertos na Bahia (1870-1910). Campinas: Editora da Unicamp, 2006.
- FRANÇA, Matheus Gonçalves. Sofrendo, cantando, chorando, bebendo: um estudo antropológico entre a música sertaneja a banda sinaloense. 2021. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2021.
- GARCIA, Afrânio. Libertos e sujeitos: sobre a transição para trabalhadores livres do Nordeste. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 3, n. 7, p. 5-41, 1988.
- GILROY, Paul. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: UCAM, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2001.
- GOMES, Flávio dos Santos; LAURIANO, Jaime; SCHWARCZ, Lilia Mortiz. Enciclopédia Negra São Paulo: Companhia das Letras, 2021.
- GUERREIRO, Goli. Terceira diáspora: culturas negras no mundo Atlântico. Salvador: Editora Corrupio, 2010.
- GUIMARÃES, Antônio Sergio. Modernidades negras: a formação racial brasileira (1930). São Paulo: Editora 34, 2021.
- HOFBAUER, Andreas. O conceito de ‘raça’ e o ideário do ‘branqueamento’ no século XIX: bases ideológicas do racismo brasileiro. Revista Teoria & Pesquisa, v. 1, n. 42-43, p. 63-110, 2003.
- MARTINS, José de Souza. Música sertaneja: a dissimulação na linguagem dos humilhados. In: MARTINS, José de Souza (ed.). Capitalismo e tradicionalismo São Paulo: Pioneira, 1975. p. 103-161.
- MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade negra. Petrópolis: Vozes, 1999.
- NASCIMENTO, Abdias. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. São Paulo: Perspectivas, 2016.
- NEPOMUCENO, Rosa. Música caipira: da roça ao rodeio. São Paulo: Editora 34, 1999.
- OLIVEIRA, Allan de Paula. Miguilim foi pra cidade ser cantor: uma antropologia da música sertaneja. 2009. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009.
- PALMA, Rogerio. Racismo e liberdade: relações inter-raciais e a construção da (sub)cidadania negra. São Paulo: Alameda Editorial, 2021.
-
PALMA, Rogerio; TRUZZI, Oswaldo. A dependência reconstruída: a trajetória do escravo Felício no Oeste Paulista (1847-1920). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 34, n. 99, p. 1-20, 2018. DOI: http://doi.org/10.1590/349908/2019.
» https://doi.org/DOI: http://doi.org/10.1590/349908/2019 -
PIRES, Thula Rafaela. Estruturas intocadas: racismo e ditadura militar no Rio de Janeiro. Revista Direito & Práxis, v. 9, n. 2, p. 1054-1079, 2018. DOI: http://doi.org/10.1590/2179-8966/2018/33900.
» https://doi.org/DOI: http://doi.org/10.1590/2179-8966/2018/33900 - POLLAK, Michael. Memória, esquecimento e silêncio. Estudos Históricos, v. 2, n. 3, p. 3-15, 1989.
-
QUEIROZ, Marcos. Sertanejo, hegemonia e modernidade. Revista Continente: seção Ensaio, Recife, PE. fev. 2021a. Disponível em: https://revistacontinente.com.br/ed icoes/242/sertanejo--hegemonia-e-modernidade. Acesso em: 15 mar. 2022.
» https://revistacontinente.com.br/ed -
QUEIROZ, Marcos. Pobre moreno, que era grande, hoje é pequeno: música sertaneja e o enigma racial brasileiro. Revista Medium, ago. 2021b. Disponível em: https://medium.com/ zumbido/pobre-moreno-que-era-grande-hoje-%C3%A9-pequenof09d284f72ba. Acesso em: 17 mar. 2022.
» https://medium.com/ - RIBEIRO, Hamilton. Música caipira: as 270 maiores modas. Santos: Realejo, 2015.
- SANTOS, Elizete Ignácio. Música caipira e música sertaneja classificações e discursos sobre autenticidades na perspectiva de críticos e artista 2005. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005.
- SANTOS, Boaventura de Sousa Santos. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo: Cortêz, 2011.
- SOVIK, L. Aqui ninguém é branco Rio de Janeiro: Aeroplano, 2009.
- WILLIAM, Rodney. Apropriação cultural São Paulo: Editora Jandaíra, 2020.
-
YOUTUBE. Sobre pardinhos e afro-caipiras 2023. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rbwf_nniE5c Acesso em: 28 ago. 2023.
» https://www.youtube.com/watch?v=rbwf_nniE5c
Editado por
-
Editor:
Julio Souto Salom.
Disponibilidade de dados
Não se aplica.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Set 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
-
Recebido
28 Ago 2023 -
Aceito
10 Ago 2024
