Resumo
Este artigo propõe uma reflexão teórica sobre a viabilidade de integrar as abordagens de E.P. Thompson e da perspectiva decolonial nos estudos sobre mulheres rurais. Embora ambas as abordagens sejam amplamente discutidas nas ciências humanas e sociais, sua articulação para investigar especificamente as experiências das mulheres rurais ainda é incomum. Este exercício analítico baseia-se nas obras de Thompson, assim como nos intelectuais decoloniais Catherine Walsh, Edgardo Lander, Walter Mignolo, Aníbal Quijano e nas feministas decoloniais Rita Segato, Ochy Curiel e Yuderkys Espinosa Miñoso, que exploram a decolonialidade sob a perspectiva das mulheres latino-americanas. Argumenta-se que a “história vista de baixo”, especialmente pelos conceitos de “lógica histórica” e “experiência” de Thompson, pode ser articulada com a construção de conhecimento “de baixo para cima”, defendida pela teoria decolonial. Através de noções como “decolonialidade”, “desobediência epistêmica” e “interculturalidade”, a teoria decolonial oferece um aparato conceitual que complementa a visão histórica de Thompson. Essa articulação favorece a compreensão das complexas interações entre sexo, raça/etnia, classe e colonialismo nas vivências das mulheres rurais em contextos coloniais e pós-coloniais, posicionando-as como produtoras de conhecimento e não meros objetos de estudo.
Palavras-chave:
decolonialidade; desobediência epistêmica; experiência; feminismo; mulheres rurais
Abstract
This article proposes a theoretical reflection on the feasibility of integrating the approaches of E.P. Thompson and the decolonial perspective in studies on rural women. Although both approaches are widely discussed in the humanities and social sciences, their articulation to specifically investigate the experiences of rural women is still uncommon. This analytical exercise draws on the works of Thompson, as well as decolonial intellectuals Catherine Walsh, Edgardo Lander, Walter Mignolo, Aníbal Quijano and decolonial feminists Rita Segato, Ochy Curiel and Yuderkys Espinosa Miñoso, who explore decoloniality from the perspective of Latin American women. We argue that the notion of “history from below”, especially through Thompson's concepts of “historical logic” and “experience”, can be articulated with the “bottom-up” construction of knowledge advocated by decolonial theory. Through notions such as “decoloniality”, “epistemic disobedience” and “interculturality”, decolonial theory offers a conceptual apparatus that complements Thompson's historical vision. This articulation favors an understanding of the complex interactions between gender, race/ethnicity, class and colonialism in the experiences of rural women in colonial and post-colonial contexts, positioning them as producers of knowledge and not mere objects of study.
Keywords:
decoloniality; epistemic disobedience; experience; feminism; rural women
1. Introdução
Este artigo propõe uma reflexão teórica sobre a viabilidade de integrar as abordagens teórico-metodológicas de E. P. Thompson com a perspectiva decolonial nos estudos relacionados às mulheres rurais. Em vez de oferecer uma análise exaustiva de todos os conceitos envolvidos ou uma avaliação crítica detalhada da teoria de Thompson e da teoria decolonial, nosso objetivo é explorar as possibilidades de diálogo entre a “história vista de baixo”, baseada nos conceitos de “lógica histórica” e “experiência” de Thompson, e a produção de conhecimento “de baixo para cima”, defendida pela perspectiva decolonial por meio dos conceitos de “decolonialidade”, “desobediência epistêmica” e “interculturalidade”.
Embora as categorias conceituais de Thompson, como a de “experiência”, já tenham sido amplamente aplicadas em estudos sobre movimentos sociais e mulheres rurais no Brasil, como apontado por Gohn (2002) e Silva (2012a), a interlocução entre a abordagem thompsoniana e a perspectiva decolonial ainda é pouco explorada, especialmente no contexto dos estudos sobre mulheres rurais. Esta lacuna evidencia a necessidade de promover uma articulação mais crítica entre esses dois paradigmas, buscando ampliar a compreensão das dinâmicas históricas e sociais que moldam as vidas das mulheres em contextos rurais e pós-coloniais.
A articulação entre o pensamento de um historiador marxista europeu, como Thompson, e as teorias feministas decoloniais, que desafiam as bases epistemológicas eurocêntricas, levanta questões cruciais sobre a pertinência e adequação dessas categorias teóricas para a análise de realidades tão distintas quanto as das mulheres rurais no Brasil contemporâneo. Nosso objetivo, neste estudo, é explorar esses questionamentos e investigar em que medida as noções de “lógica histórica” e “experiência” podem ser adaptadas para dialogar com as práticas e saberes dessas mulheres, sem perder de vista as críticas decoloniais à hegemonia do pensamento europeu.
Ao adotar esse percurso teórico, entendemos que a perspectiva decolonial, com seu foco na produção de conhecimento a partir de epistemologias subalternas, oferece uma base fértil para revisar e expandir os conceitos thompsonianos. Essa abordagem, sobretudo no campo do feminismo decolonial, sublinha a necessidade de repensar as estruturas de opressão em termos de sexo, raça, classe e colonialidade. Autoras como Espinosa Miñoso (2020) têm contribuído para esse debate, ao destacar a importância de conectar as lutas feministas com os movimentos comunitários e a descolonização, o que é particularmente relevante para o estudo de mulheres rurais.
Além de refletir sobre as implicações teóricas, este artigo propõe um percurso metodológico que visa orientar futuras investigações empíricas com base nas experiências desta pesquisa de campo. Pretendemos demonstrar como a combinação entre as abordagens teórico-metodológicas aqui discutidas pode ser aplicada no planejamento da pesquisa, nas metodologias de campo e nas práticas de entrevista, sempre com foco na agência das mulheres rurais. No entanto, optamos por não detalhar os métodos e técnicas empregados, já que nosso foco está nas possibilidades teóricas de diálogo entre Thompson e a teoria decolonial.
Com o intuito de demonstrar que a abordagem teórico-metodológica defendida neste artigo é passível de aplicação prática, apresentamos brevemente alguns aspectos da pesquisa empírica realizada durante o curso de mestrado em Sociologia na Universidade Federal de Alagoas. Esse estudo teve como objeto central a organização de mulheres rurais em coletivos autônomos, buscando responder se, e de que forma, essa organização é capaz de resistir à estrutura patriarcal em suas comunidades. A pesquisa foi conduzida entre 2021 e 2022 com mulheres rurais integrantes de movimentos comunitários no Alto Sertão de Alagoas, onde adotamos uma abordagem decolonial para compreendê-las como sujeitas ativas de suas histórias e lutas.
O recorte geográfico da pesquisa, centrado em um povoado rural no Alto Sertão de Alagoas, foi escolhido com base na relação de confiança com a líder comunitária local. Além disso, a organização das atividades de campo foi coordenada por essa líder, cujo papel foi essencial para a inserção no campo. Com base em 20 entrevistas individuais e duas rodas de conversa – com a participação de 23 e 45 mulheres, respectivamente –, a metodologia buscou incorporar as vozes dessas mulheres como centrais no processo de construção do conhecimento. Nesse contexto, observamos que a articulação entre a “história vista de baixo” e a produção de conhecimento “de baixo para cima” mostrou-se particularmente produtiva para compreender as dinâmicas sociais que emergiram nas entrevistas.
Por fim, este artigo visa destacar a relevância de adotar uma perspectiva teórico-metodológica que reconheça as mulheres rurais como sujeitas de conhecimento, em vez de simples objetos de pesquisa. A seleção dos referenciais teóricos, que inclui obras clássicas de E. P. Thompson, como A miséria da teoria ou um planetário de erros e Senhores e Caçadores, além de autores-chave da teoria decolonial e do feminismo decolonial, como Mignolo, Quijano, Segato e Espinosa Miñoso, reflete nosso compromisso em construir uma abordagem interdisciplinar. Tanto Thompson quanto os teóricos decoloniais avançam na integração entre História, Sociologia e Antropologia, rompendo fronteiras e abrindo caminho para novas articulações entre gênero, classe, raça e colonialidade.
Na sequência, exploraremos mais detalhadamente a construção do conhecimento “a partir de baixo”, analisando as contribuições de Thompson e os princípios da decolonialidade para discutir como essas categorias podem ser apropriadas no estudo das mulheres rurais.
2. Tecendo o conhecimento a partir de baixo
Neste artigo, buscamos refletir sobre a possibilidade de articulação entre as abordagens teórico-metodológicas de E. P. Thompson e a decolonialidade nos estudos que envolvem mulheres rurais. Para isso, analisaremos quais foram as contribuições de Thompson, evidenciando a “lógica histórica” e a “experiência”, e as dos teóricos da decolonialidade, especificamente no que se refere à “decolonialidade do saber”, à “desobediência epistêmica” e à “interculturalidade”.
Para entender como Thompson dialoga com abordagens decoloniais, primeiro é necessário revisar suas contribuições. Edward Palmer Thompson (1924-1993) foi um renomado historiador inglês cujo trabalho foi essencialmente direcionado à análise histórica da classe trabalhadora da Inglaterra. Em suas obras, Thompson expressou o desejo de resgatar os indivíduos excluídos da narrativa histórica dominante, criticando as atitudes de superioridade e condescendência frequentemente associadas à posteridade. Ao enfatizar a importância de entender a experiência vivida pelos membros marginalizados da sociedade, Thompson empregou uma abordagem que ele próprio descreveu como aterrissar de paraquedas em um território desconhecido e partir “[...] da experiência dos humildes moradores da floresta” (Thompson, 1997, p. 17) para analisar a estrutura social britânica “a partir de baixo” (Thompson, 1997, p. 17). Assim, solidificou-se a perspectiva conhecida como “história vista de baixo”.
A abordagem conhecida como “história vista de baixo” tem exercido significativa influência no âmbito dos estudos históricos desde a década de 1960. Em contraposição à tendência predominante na produção acadêmica e científica, que historicamente privilegiou a análise das elites e das classes dominantes, a “história vista de baixo” propõe uma visão que reconhece homens e mulheres como agentes históricos, em vez de meros objetos de estudo.
No livro A miséria da teoria, Thompson (1981) critica o estruturalismo de Althusser por negligenciar o papel dos sujeitos na configuração histórica. Ao mesmo tempo, ele introduz os conceitos de “lógica histórica” e “experiência”. É por meio da categoria da “experiência” que a perspectiva da “história vista de baixo” começa a se desenvolver. Nesse contexto, Thompson define a “experiência” como “[...] a resposta mental e emocional, seja de um indivíduo ou de um grupo social, a muitos acontecimentos interrelacionados ou a muitas repetições do mesmo tipo de acontecimento” (Thompson, 1981, p. 15). As experiências são, portanto, geradas na vida material dos indivíduos e experimentadas não só como ideias, mas como sentimentos, que também se ligam à cultura. É na “experiência” que homens e mulheres se tornam sujeitos (Thompson, 1981).
Assim, de acordo com Thompson (1981, p. 16), a noção de experiência transcende a mera produção de “senso comum”. Em desacordo com intelectuais que subestimam formas de conhecimento não originadas no ambiente acadêmico, o autor argumenta que a “experiência é válida e efetiva”, ainda que possua limites. Como seres dotados de agência, homens e mulheres comuns têm a capacidade de refletir sobre eventos e manifestar-se por meio de ações, sentimentos, símbolos, linguagens e rituais. A experiência, portanto, é constituída no próprio devir do ser social e da consciência social.
Conforme destacado por Gohn (2002), Thompson reexamina a categoria da experiência histórica e cultural das pessoas no arcabouço analítico do materialismo histórico. Ao adotar uma abordagem teórico-metodológica fundamentada na agência, o autor não apenas reconhece as experiências individuais como meras formulações de ideias, mas também as interpreta como expressões de sentimentos, valores e consciência. A noção de experiência transcende a mera categoria de análise do pesquisador, sendo entendida como práxis que envolve tanto a reflexão individual quanto coletiva.
Thompson (1981) sustenta a premissa de que a construção do conhecimento passa pela inevitável relação entre teoria e empiria, introduzindo o conceito de “dialética do conhecimento histórico”. Dessa forma, um conceito demonstra sua validade ao dialogar com evidências empíricas. O conhecimento emerge, então, do diálogo entre o pensamento teórico e as evidências históricas; o autor insiste que a relação entre o conhecimento e o objeto só pode ser compreendida como uma relação de diálogo e não de um em função do outro (Thompson, 1981).
Dessa maneira, emergimos à noção de “lógica histórica”, que o autor concebe como uma “lógica característica adequada ao material do historiador” (Thompson, 1981, p. 48), não podendo ser enquadrada e nem submetida aos mesmos critérios de disciplinas fundamentadas na lógica analítica. A “lógica histórica” é indispensável devido à sua capacidade de se ajustar aos fenômenos históricos, os quais são inerentemente dinâmicos e, por vezes, contraditórios. O autor ressalta que os termos de análise devem acompanhar as flutuações dos eventos históricos, pois as questões pertinentes à investigação se transformam acompanhando as mudanças pelas quais passam o objeto de estudo (Thompson, 1981).
Assim, a “lógica histórica” e a noção de “experiência” introduzidas por Thompson dialogam diretamente com a crítica decolonial, que também busca compreender e valorizar as experiências dos marginalizados. Isso se reflete em particular nos estudos das mulheres rurais. Ao adotarmos a perspectiva da “história vista de baixo”, conforme proposto por Thompson, priorizamos análises que têm como base as experiências e vivências das camadas sociais marginalizadas. No entanto, é a partir do aporte da teoria decolonial – e seus debates sobre decolonialidade, desobediência epistêmica e interculturalidade – que nós, desde Abya Yala1, passamos a escrever e reescrever a nossa história ancorada nas análises “a partir de baixo”.
A partir dessa premissa de valorização das experiências dos marginalizados, é possível estabelecer um diálogo com a perspectiva decolonial. Um exemplo central disso é o projeto de Modernidade/Colonialidade/Decolonialidade (MCD), formado por intelectuais latino-americanos no final dos anos 1990, que também busca questionar as estruturas de poder e conhecimento através de uma ótica descolonizadora. Entre os principais teóricos, destacam-se Aníbal Quijano (Peru), Edgardo Lander (Venezuela), Catherine Walsh (Equador) e Walter Mignolo (Argentina), cujos trabalhos são referenciados neste estudo (Bao; Lima, 2017). Duas categorias foram essenciais nos estudos do MCD, a “diferença colonial” de Mignolo e a “colonialidade” de Quijano. Essas categorias evidenciam como o eurocentrismo permeia as estruturas de poder e de conhecimento na modernidade.
Conforme enfatizado por Quijano (2005, p. 5), “[...] como parte do novo padrão de poder mundial, a Europa também concentrou sob sua hegemonia o controle de todas as formas de controle da subjetividade, da cultura, e em especial do conhecimento, da produção do conhecimento”. O processo de colonialidade suprimiu a produção de conhecimento dos povos colonizados, impondo-lhes a assimilação cultural dos colonizadores. Essa dinâmica implicou a colonização do pensamento, estabelecendo uma dicotomia entre a Europa e o “resto do mundo”, caracterizada pela dualidade entre racional/irracional, civilizado/primitivo, científico/mítico. Como resultado, emergiu uma “[...] conformação colonial do mundo entre ocidental ou europeu (concebido como o moderno, o avançado) e os ‘Outros’, o restante dos povos e culturas do planeta” (Lander, 2005, p. 3). Essa construção de dualidades fundamentou a ideia de que apenas o conhecimento produzido pela Europa era legítimo, enquanto os outros saberes eram considerados inferiores. Essa perspectiva, que se tornou dominante ao subjugar outras formas de conhecimento, é conhecida como eurocentrismo, sendo inseparável da colonialidade do poder (Quijano, 2005).
Para Dussel, a modernidade apresenta um conceito racional de emancipação, ao qual reconhecemos e nos inserimos, entretanto, simultaneamente desenvolve um mito irracional que justifica a violência genocida (Mignolo, 2010). A partir desse ponto, Mignolo (2010) argumenta a favor da descolonização do conhecimento e do ser, em vez de simplesmente buscar a emancipação. No livro Filosofia da libertação, Dussel optou por usar o termo “libertação” em vez de “emancipação”, alinhando-se com os movimentos sociais de “libertação nacional”. “Libertação” engloba dois projetos distintos, porém interrelacionados: a descolonização política e econômica e a descolonização epistemológica. A noção de libertação nos processos políticos tornou-se entrelaçada com os processos de libertação epistêmica e sua radicalização na ideia de desprendimento epistêmico. Assim, o uso de “emancipação” em vez de “libertação” tenderia a destacar que emancipação e libertação/descolonização são dois tipos de projetos situados em diferentes contextos geopolíticos (Mignolo, 2010).
Conforme delineado por Mignolo (2010), o pensamento hegemônico, conhecido como pensamento único ou monocultura da mente, é representado pelo paradigma ocidental, ou ocidentalismo, em seu conjunto. Para superar a lógica da colonialidade, enraizada nesse pensamento único, é imperativo estabelecer uma epistemologia fronteiriça como uma alternativa à modernidade. Nesse sentido, o desprendimento conceitual e teórico emerge como um caminho essencial para a libertação e descolonização. A decolonialidade se configura, assim, como um amplo projeto de libertação/descolonização que engloba tanto os colonizados quanto os colonizadores, desafiando as éticas e políticas do conhecimento estabelecidas. “As teorias críticas descoloniais emergem das ruínas das linguagens das categorias de pensamento e das subjetividades”, rejeitadas pela retórica da modernidade e pela perpetuação da lógica da colonialidade (Mignolo, 2010, p. 27, tradução nossa).
A decolonialidade significa a superação de uma visão da vida humana que não dependa da imposição de um ideal de sociedade sobre os diferentes, como faz a modernidade/colonialidade. Nesse contexto, a descolonização da mente implica mudar os termos e não só o conteúdo da conversa (Mignolo, 2010). O autor denomina esse processo de desprendimento, que constitui o ponto de partida para práticas e concepções relacionadas à economia, política, ética, filosofia, tecnologia e organização social, nas quais o progresso e o crescimento econômico não estejam acima do bem-estar das pessoas. O desprendimento requer uma reconfiguração epistemológica, caracterizada pelo que ele denomina de geo e corpo-política do conhecimento e do entendimento, entendidas como epistemologias da exterioridade e das fronteiras (Mignolo, 2010). Para Bao e Lima:
A perspectiva decolonial pretende dialogar com o pensamento eurocêntrico movendo-se para além da crítica de suas fronteiras internas, confrontando-o (também) a partir de sua exterioridade. Para isso, retoma contribuições originais de pensadores(as) latino-americanos que servem de fundamentos para a expressão teórica e prática de nossas especificidades históricas. A intenção não é construir um novo paradigma, ou um novo universalismo; antes, construir um referencial dialógico que permita o duplo movimento de indicar os limites do ocidentalismo e possibilidades de expansão do conhecimento humano.
O projeto da interculturalidade é justamente uma iniciativa nesse sentido: proporcionar a decolonialidade nas relações sociais por meio do diálogo entre a heterogeneidade humana em todas as suas esferas (Bao; Lima, 2017, p. 31).
A “interculturalidade” pode ser abordada por três perspectivas distintas. Primeiramente, a perspectiva relacional considera o contato e a troca entre diferentes culturas, podendo ocorrer em contextos de igualdade ou desigualdade. Entretanto, essa abordagem pode negligenciar ou minimizar os conflitos e as dinâmicas de poder e dominação presentes nessas interações. Em seguida, a perspectiva funcional, de cunho liberal, busca promover a convivência e a tolerância em um sistema já estabelecido, sem questioná-lo. Por fim, a terceira perspectiva, denominada “interculturalidade crítica”, não se concentra na diversidade ou nas diferenças em si, mas nos problemas estruturais relacionados ao colonialismo e ao racismo, com vínculos diretos ao sistema capitalista. A “interculturalidade crítica” questiona a lógica do capitalismo e propõe a construção de outro ordenamento social (Walsh, 2012).
A “interculturalidade crítica” não busca se alinhar funcionalmente ao sistema estabelecido, mas, pelo contrário, procura questioná-lo de forma direta. Ela emerge como uma iniciativa construída “de baixo para cima”, representando um apelo de e para as pessoas historicamente submetidas e subalternizadas, bem como aos seus aliados e aos setores engajados na luta por uma reformulação social e descolonização, visando à construção de novos paradigmas sociais (Walsh, 2012). Nesse sentido, a “interculturalidade crítica” não centraliza sua preocupação na diversidade étnico-cultural e nem busca sua integração em um sistema capitalista preexistente. Em vez disso, busca examinar as diferenças moldadas pelo sistema de poder colonial, o qual permeia todas as esferas da vida, inclusive a produção do conhecimento. É por essa razão que essa abordagem de interculturalidade ainda não foi concretizada na prática (Walsh, 2012).
Conforme apontado por Walsh (2012), a “interculturalidade crítica” busca intervir na matriz da colonialidade, também referida como “colonialidade do poder” por Quijano (2005), constituindo-se assim como um projeto decolonial. Nesse contexto, há uma preocupação em lidar com a subalternização ontológica e epistemológico-cognitiva, assim como a subordinação do conhecimento dos sujeitos racializados. Simultaneamente, a “interculturalidade crítica” também se dedica a reconhecer e valorizar “[...] os seres e saberes de resistência, insurgência e oposição, os que persistem apesar da desumanização e subordinação” (Walsh, 2012, p. 66, tradução nossa).
A adoção de uma epistemologia decolonial, que possibilita a elaboração de um conhecimento fundado em perspectivas marginalizadas, “a partir de baixo”, é viável quando efetuamos uma mudança paradigmática, redefinindo “os objetos de pesquisa” como sujeitos. Aqui, a conexão com as ideias de Thompson torna-se clara: ao valorizar a experiência dos marginalizados, possibilita-se um diálogo que reconhece os grupos historicamente subalternizados e subordinados pela colonialidade como sujeitos conscientes, dotados de experiência e capacidade de ação.
Por fim, essas duas abordagens – a valorização da experiência no trabalho de Thompson e o questionamento das estruturas coloniais na decolonialidade – podem ser integradas para análises voltadas aos estudos das mulheres rurais. Ao adotar uma perspectiva que simultaneamente reconhece as experiências das mulheres enquanto sujeitas históricas e questiona as dinâmicas de poder impostas pela colonialidade, abre-se um espaço de convergência entre essas correntes teóricas. Em seguida, exploraremos como essas teorias podem dialogar com as feministas decoloniais, identificando os pontos de conflito e convergência para uma análise mais ampla e profunda da realidade dessas mulheres no contexto rural.
3. O feminismo decolonial entrelaçando as experiências das mulheres rurais
A análise das abordagens teórico-metodológicas nos estudos sobre mulheres rurais exige uma compreensão fundamental: não estamos apenas examinando essas mulheres, mas colaborando com elas, reconhecendo-as como agentes ativos no processo de pesquisa. Em vez de tratá-las como objetos de estudo, reconhecemos suas perspectivas e experiências como essenciais para a construção do saber. Dessa forma, é crucial adotar uma abordagem feminista e decolonial, que valorize a produção de conhecimento a partir de baixo, ou seja, a partir das vivências e narrativas das próprias mulheres rurais (Martins, 2004, Curiel, 2019).
Ao refletir sobre a produção acadêmica a partir do Sul global, torna-se necessário romper com a ideia de que somos meros receptores e aplicadores de conceitos do Norte global. A superação dessa mentalidade eurocêntrica é crucial para um conhecimento livre do controle epistemológico colonial (Walsh, 2012, Segato, 2013). Com isso, propomos uma análise que valorize as experiências das mulheres rurais como fontes legítimas de saber, rompendo com tradições que as invisibilizam.
Esse processo de ruptura epistemológica se alinha ao feminismo decolonial, cuja origem remonta às contribuições de Maria Lugones (2008), que expandiu as análises de Quijano (2005) sobre a colonialidade do poder. Espinosa Miñoso ressalta que o feminismo decolonial dialoga com diversas perspectivas e com o que vem sendo produzido tanto por “[...] pensadoras, intelectuais, ativistas e lutadoras, feministas ou não, de ascendência africana, indígena, mestiça popular, campesina, imigrantes racializadas, bem como as acadêmicas brancas comprometidas com subalternidade na América Latina e no mundo” (Espinosa Miñoso, 2020, p. 8).
Curiel (2020) argumenta que as feministas racializadas desempenham um papel crucial ao preencher lacunas deixadas por autores que discutiram a colonialidade sem considerar as dimensões de sexo e sexualidade, como Mignolo, Quijano e Dussel. Ela observa que “[...] um dos problemas que se mantém em torno do tema do pós-colonial é a tensão que existe entre a produção teórica, puramente acadêmica, e o que é gerado a partir dos movimentos sociais que é posteriormente convertido em teoria” (Curiel, 2020, p. 243).
Embora haja avanços, a produção acadêmica sobre os subalternizados ainda tem sido caracterizada por uma elitização, inacessibilidade e perpetuação de estruturas patriarcais, relegando os conhecimentos das mulheres comuns a uma posição de inadequação à academia. Muitas pesquisas rotuladas como decoloniais simplesmente utilizam mulheres subalternizadas como “matéria-prima”, tratando-as como uma espécie de “outra da outra”, o que não corresponde a uma abordagem feminista, crítica e verdadeiramente decolonial (Curiel, 2019). Dessa forma, é fundamental adotar uma compreensão abrangente das complexas dinâmicas de relações e subordinações que afetam aqueles considerados como “outros”, reconhecendo as nuances da colonialidade do poder e do saber para que se alcance uma efetiva descolonização (Curiel, 2020). Como ressalta a autora, devemos nos perguntar até que ponto continuamos a reproduzir a colonialidade do poder quando utilizamos raça, classe e sexualidade apenas como categorias analíticas, sem conectar essas realidades à ordem mundial capitalista moderna-colonial (Curiel, 2019).
Como mencionado anteriormente, o foco deste artigo é analisar as possibilidades de diálogo teórico entre Thompson e a teoria decolonial. Por essa razão, não nos aprofundamos na pesquisa empírica com as mulheres rurais sertanejas, já que seria inviável incorporar aquela análise sem extrapolar os limites deste trabalho. Contudo, julgamos pertinente destacar alguns aspectos dessa investigação para ilustrar a aplicação prática da abordagem teórico-metodológica aqui defendida. Vale ressaltar que, à época, essa construção teórica ainda não estava totalmente consolidada; ou seja, embora tivéssemos a intenção de conduzir o estudo a partir de uma perspectiva decolonial e materialista histórica, ele se desenvolveu simultaneamente ao processo de elaboração do percurso metodológico em parceria com as participantes.
Desde o início da nossa pesquisa com mulheres rurais, priorizamos a escuta ativa para compreender suas realidades e formas de resistência. Percebemos que a abordagem feminista decolonial, combinada com o materialismo histórico, era a mais adequada para analisar suas experiências de vida, observando sua práxis e as formas de resistência em suas vidas materiais (Thompson, 1981, Leite, 2020). A escolha dessa abordagem revelou-se crucial. A adoção do termo “mulheres rurais”, em vez de “mulheres do campo”, “camponesas” ou “agricultoras”, foi uma decisão tomada pelas próprias participantes. Durante o trabalho de campo, constatou-se que essa autodefinição como “mulher rural” “[...] decorre diretamente da luta dos movimentos sociais rurais por direitos, pelo reconhecimento das mulheres rurais como trabalhadoras e, ainda, pelo pertencimento a um território, a zona rural, entendida como um espaço de encontro com a natureza e de comunhão com a terra” (Albuquerque, 2023, p. 42).
Conduzir uma análise de baixo para cima não é simples. Com frequência, deparamos com a falta de registros oficiais disponíveis para nossa investigação. Os textos e documentos, em sua maioria, foram e continuam sendo redigidos por colonizadores ou pelas elites dominantes locais, o que resulta em uma escassez de material confiável sobre os grupos historicamente subjugados e marginalizados. Portanto, estudar mulheres é fazer uma forma de arqueologia que busca “tornar visível o invisível”, procurando aquilo “[...] que se teima em esconder e esquecer” (Souza-Lobo, 2021, p. 223).
O fato de a história oficial ter sido geralmente escrita no masculino levou as mulheres a serem ocultadas dessa narrativa. Portanto, é necessário adotar uma abordagem que não apenas desafie essa invisibilidade, mas também questione a hegemonia dessa única narrativa considerada como a verdadeira, buscando reconstituí-la e reinterpretá-la sob uma nova ótica (Silva, 2012a). Dessa forma, a metodologia desenvolvida foca no protagonismo das mulheres rurais, em suas experiências de vida, nas suas histórias, relatos e análises, bem como as opressões que as atravessam. O que fazemos aqui é também um “[...] pensar desde o fazer. Dessa maneira, conjuga-se uma experiência do conhecer fazendo, de produzir conhecimento que articula teoria e prática” (Curiel, 2019, p. 48).
A inserção no cotidiano das mulheres permitiu uma observação direta de suas dinâmicas de vida e trabalho, abrangendo desde as tarefas domésticas até suas atividades produtivas. A participação ativa da líder comunitária nos movimentos sociais e sua liderança local enriqueceram nossa compreensão da articulação entre as esferas comunitária, política e econômica. A adoção de uma abordagem decolonial exige reconhecer as opressões imbricadas produzidas pelo sistema colonial moderno (Curiel, 2019). Há, portanto, outra lógica epistemológica, que desafia o pensamento de que se chega ao mundo a partir do conhecimento para entender que “[...] se chega ao conhecimento a partir do mundo – o que aponta a uma epistemologia, pedagogia e razão decoloniais” (Walsh, 2012, p. 70, tradução nossa).
Diante dessas premissas, cabe perguntar: até que ponto é possível integrar perspectivas teóricas de contextos distintos, como a “história vista de baixo” de Thompson e a decolonialidade? Embora existam conflitos entre as abordagens, ambas compartilham o compromisso com a valorização das experiências dos grupos marginalizados. A abordagem thompsoniana, ancorada no materialismo histórico-dialético, e a decolonialidade, que desafia o eurocentrismo, oferecem reflexões críticas sobre as estruturas de poder (Thompson, 1981, Curiel, 2020).
É inegável que existam pontos de conflito entre as teorias em análise. O trabalho de Thompson destaca a história da classe trabalhadora na Inglaterra, oferecendo uma crítica à “história vista pelos de cima”. Por outro lado, os estudos decoloniais focam nas sociedades do Sul global, com uma perspectiva que desafia o eurocentrismo. Enquanto a “lógica histórica” de Thompson enfatiza a classe como uma formação social e cultural, a decolonialidade examina o impacto do colonialismo nas culturas e identidades das populações colonizadas. O feminismo decolonial, por sua vez, expande essa reflexão ao abordar os efeitos específicos dessas questões sobre as mulheres.
A abordagem thompsoniana adota um rigor teórico-metodológico ancorado no materialismo histórico-dialético, enquanto a “decolonialidade do saber” propõe uma epistemologia que desafia as estruturas eurocêntricas do conhecimento, valorizando saberes locais e subalternos, concentrando-se na descolonização do conhecimento e no questionamento das hierarquias epistemológicas. As feministas decoloniais avançam ainda mais: elas defendem que os saberes das mulheres do Sul global, especialmente das mais vulnerabilizadas, devem ser considerados e valorizados.
Embora a epistemologia decolonial critique as concepções eurocêntricas de conhecimento e questione as hierarquias de poder embutidas nas formas de produção desse conhecimento, isso não implica um abandono do fazer científico. Thompson (1981), ao nos incentivar a interrogar as evidências a partir de nossas experiências e valores, permite uma extensão dessa reflexão à produção científica que emerge do movimento decolonial e, mais recentemente, da teoria feminista decolonial. O feminismo decolonial é também uma forma de interrogação valorada e permeada por diversas preocupações que não foram consideradas por teóricos como Thompson – insensível às relações de gênero quando da análise da formação da classe operária inglesa, quando poderia ter pensando uma “experiência de gênero”, tendo em vista que a classe trabalhadora foi constituída em uma sociedade já marcada pelas estruturas de poder do sexismo (Saffioti, 1992, 2003) –, ou até mesmo de teóricos pós-coloniais e descoloniais homens, como Fanon, Césaire e os latino-americanos Mignolo, Quijano e Dussel, que deixaram de lado as categorias de sexo e sexualidade em suas análises (Curiel, 2020).
Segundo Thompson (1981), é essencial reconhecer a existência de diferentes formas de conhecimento além do acadêmico. Fora da academia, a produção de conhecimento sempre existiu e pode desafiar o pensamento estabelecido. Impor que todos os conhecimentos tenham a academia como ponto de partida e considerá-los superiores a todos os outros tipos de produção de conhecimento é o que Thompson chama de “imperialismo acadêmico” (Thompson, 1981, p. 18).
Questionar a premissa de que o conhecimento é exclusivamente gerado por acadêmicos – e criticar os conceitos de racionalidade associados ao conhecimento especializado que tendem a menosprezar práticas, agentes e saberes exteriores àquela racionalidade dominante – não significa rejeitar a racionalidade, mas sim revelar suas inclinações coloniais e imperialistas. Questiona-se, portanto, sua posição única e a suposta universalidade do conhecimento científico nas ciências sociais, as quais falham em abarcar a diversidade e a complexidade das experiências sociais, bem como as alternativas epistemológicas não hegemônicas que delas emergem (Walsh, 2010).
Thompson (1981) nos lembra que, ao reconstruir processos históricos, o pesquisador deve, tanto quanto possível, controlar seus valores, mas também pode contribuir com sua avaliação. Ele reintroduz a ideia de “diálogo” ao destacar que o desenvolvimento do conhecimento ocorre tanto na teoria quanto na prática, por meio de uma “lógica histórica” que deve estar presente em cada confronto empírico (Thompson, 1981). Assim, acreditamos que é possível romper com a colonialidade do saber, apropriando-nos de conceitos e categorias que, como defende Thompson (1981), são flexíveis e oferecem mais expectativas do que regras. Dessa forma, embora existam conflitos entre as abordagens teórico-metodológicas, há também convergências importantes.
Tanto a “lógica histórica” quanto a “interculturalidade crítica” buscam dar voz às perspectivas dos grupos marginalizados, reconhecendo o silenciamento imposto pelas narrativas dominantes. Ambas analisam as condições sociais e culturais que moldam as experiências, seja da classe trabalhadora, seja dos povos colonizados. A “decolonialidade do saber” se concentra especialmente na contextualização histórica da colonização e descolonização, enquanto Thompson se atém às formações sociais da classe. São abordagens que reconhecem que o conhecimento e as experiências são moldados por contextos históricos específicos e pela experiência dos sujeitos sociais – homens e mulheres de carne e osso.
Embora aplicadas em contextos distintos, a “lógica histórica”, a “interculturalidade” e a “decolonialidade do saber” convergem na análise crítica das estruturas de poder, enfocando as experiências das populações marginalizadas e buscando narrativas que surgem “de baixo”. Para Thompson, a construção de uma consciência crítica entre as classes trabalhadoras em relação às estruturas de poder e à exploração é fundamental. De maneira similar, a “desobediência epistêmica” da decolonialidade propõe uma conscientização crítica sobre as hierarquias de conhecimento, enfatizando a necessidade de desafiar os sistemas de opressão colonial.
Ambas as abordagens visam contestar o status quo e as normas estabelecidas, questionando narrativas históricas que negligenciam as experiências das classes trabalhadoras, assim como desafiando narrativas hegemônicas que marginalizam conhecimentos e perspectivas não ocidentais. Portanto, tanto a abordagem teórico-metodológica de Thompson quanto a decolonial se fundamentam em uma análise crítica das estruturas de poder. No contexto do feminismo decolonial, essa análise se expande para incluir não apenas o capitalismo e o colonialismo, mas também o patriarcado e o racismo, sublinhando as interconexões entre esses sistemas de opressão.
Por fim, uma “convergência fundamental” – como apontam Bao e Lima (2017, p. 41) – reside no fato de que “tanto a interculturalidade como a lógica histórica são práxis, exigem a prática e negam a teoria como prioridade disciplinar”. Müller e Moraes (2008) destacam que Thompson valoriza a práxis envolvendo experiências e valores comunitários da classe trabalhadora. Da mesma forma, as narrativas das mulheres rurais buscam reapropriar suas histórias para forjar consciência e resistência (Silva, 2012b, Souza-Lobo, 2021).
Espinosa Miñoso (2020, p. 4) observa que o feminismo decolonial “[...] recupera correntes críticas anteriores, como o feminismo negro, o feminismo de cor, o feminismo pós-colonial, mas também o feminismo materialista francês e o feminismo pós-estruturalista”. Isso pode ser observado com Curiel e Falquet (2014), que participaram do esforço coletivo de traduzir para o espanhol, transformando em livro, textos de três feministas materialistas francesas – Colette Guillaumin, Paola Tabet e Nicole-Claude Mathieu –, considerando a importância de suas análises e críticas para a teoria feminista. Ou seja, as feministas decoloniais não descartam simplesmente o que foi produzido no Norte global, mas utilizam algumas de suas categorias críticas e analíticas para construir o debate adequado à realidade do Sul.
Curiel (2019) afirma que reconhecer e legitimar os saberes subalternizados, a partir das experiências vividas, e problematizar as condições de produção de conhecimento fazem parte de um “desenganche epistemológico”, que implica “[...] desvelar as formas, maneiras, estratégias, discursos que definem certos grupos sociais como ‘outros’ e ‘outras’ a partir de lugares de poder e dominação” (Curiel, 2019, p. 47). Dessa forma, é possível propor novas categorias ou até mesmo reelaborar conceitos não hegemônicos a partir de categorias ocidentais já existentes, permitindo outras possibilidades de interpretações:
Trata-se de identificar conceitos, categorias, teorias que surgem a partir de experiências subalternizadas, que são geralmente produzidas coletivamente, que têm a possibilidade de generalizar sem universalizar, de explicar diferentes realidades para romper o imaginário de que esses conhecimentos são locais, individuais e sem possibilidade de serem comunicados (Curiel, 2019, p. 46).
Ao considerar que “[...] o conceito de experiência thompsoniano remete à ação do sujeito, inserido em relações sociais determinadas, que podem ser relações de classes, ou outras, embora não explicitadas pelo autor, como relações de gênero e raça/etnia” (Silva, 2012a, p. 133), e que “[...] as categorias teóricas devem ser utilizadas como meios heurísticos no processo de conhecimento e não como verdades acabadas e eternas” (Martins, 2006, p. 121), podemos argumentar que as próprias categorias de Thompson estão sujeitas a revisão e adaptação (Martins, 2006). Assim, a partir da perspectiva de Thompson, é possível aprofundar a análise das experiências e resistências das mulheres rurais envolvidas na pesquisa, pois a investigação ocorre “[...] em sua vida material, em suas relações determinadas, em sua experiência dessas relações, e em sua autoconsciência dessa experiência” (Thompson, 1981, p. 111).
Essa perspectiva thompsoniana dialoga diretamente com os princípios da decolonialidade e do feminismo decolonial, que também destacam a importância das experiências vividas e das formas de conhecimento que surgem “de baixo”. Nos campos empíricos da nossa pesquisa, conduzida com e por mulheres rurais, o princípio de colocar as experiências das sujeitas no centro materializou-se na forma como o estudo foi estruturado. O percurso metodológico foi desenvolvido em parceria com as mulheres, enquanto caminhávamos junto a elas para encontrar as melhores técnicas de campo.
Antes de formularmos os roteiros das entrevistas, realizamos um campo exploratório inicial, no qual as participantes manifestaram interesse em determinados temas e pudemos esclarecer sobre a pesquisa, explicando cada etapa e seus objetivos. Acompanhamos o dia a dia das mulheres, conversamos com elas e ouvimos suas histórias, individualmente e em grupos, observando os tópicos que mais surgiam nas conversas e que elas gostariam de discutir – por exemplo, o acesso à água, o problema da seca e a dificuldade de geração de renda – o que levou à inclusão, no roteiro de entrevistas e no trabalho final, de temas não previstos inicialmente, como a seca. As entrevistas foram então realizadas de acordo com a disponibilidade das participantes, nos locais por elas escolhidos, e abordaram os temas que elas mesmas julgavam mais relevantes. Esse processo respeitou o ritmo estabelecido por elas, sempre com o suporte da líder comunitária, que desempenhou papel central na mediação entre as pesquisadoras e a comunidade.
Embora o tema da pesquisa estivesse previamente delineado, foram as mulheres rurais que levantaram as questões mais significativas durante os primeiros contatos, orientando as discussões e apontando as direções mais pertinentes para o nosso diálogo entre teoria e empiria. A aplicação de um questionário biográfico estava prevista para o segundo momento de campo, mas foi abandonada após percebermos que as perguntas objetivas e o desvio de atenção para o papel engessavam a conversa. Assim, decidimos realizar entrevistas individuais e coletivas – que chamamos de rodas de conversa – momentos em que foi possível um diálogo mais livre e dialógico.
Esse processo é uma manifestação concreta do compromisso com a valorização das vozes subalternizadas, em consonância com a abordagem teórico-metodológica de Thompson e da decolonialidade, que reconhecem a importância de se ouvir e respeitar as experiências dos sujeitos sociais. O ato de escutar, essencial em metodologias que envolvem entrevistas, foi fundamental para acessar a riqueza de experiências das mulheres rurais. As rodas de conversa, apesar do momento caótico de falas sobrepostas, garantiram uma partilha sincera sobre violências, políticas públicas, saúde, coletivos e criação dos filhos – principalmente com a intervenção da líder comunitária, que encorajava as participantes mais tímidas. A escuta sensível e a troca dialógica permitiram não apenas a coleta de dados, mas também uma compreensão mais profunda das dinâmicas sociopolíticas e culturais nas quais essas mulheres estão inseridas.
Epistemologicamente, o processo de construção dessas interpretações configurou-se quase como uma coautoria entre pesquisadoras e interlocutoras. Porém, nossas interpretações não se confundiram simplesmente com os relatos das participantes, mas tomaram-nos como ponto de partida para a produção de uma análise sociológica alicerçada no referencial teórico. Durante a análise dos dados, a participação da líder comunitária foi essencial para validar as interpretações. Realizamos diversos contatos via WhatsApp para assegurar que as percepções da comunidade estivessem em conformidade com as interpretações feitas pelas pesquisadoras. Ao final do estudo, o material produzido foi compartilhado com as participantes por meio da líder comunitária, que também participou da apresentação dos resultados à comunidade acadêmica em videoconferência, reforçando seu papel ativo na construção do conhecimento.
Por fim, esse estudo empírico constatou que a organização de mulheres rurais em coletivos autônomos no Alto Sertão de Alagoas é capaz de opor resistência às estruturas patriarcais de suas comunidades e está, gradualmente, buscando novas formas comunitárias de viver com dignidade, evidenciando que as organizações de mulheres rurais no sertão alagoano atuam como agentes de transformação social.
Este processo de construção colaborativa de conhecimento ressalta a importância de ver as mulheres rurais não como objetos de estudo, mas como agentes ativos. A abordagem feminista decolonial, assim como a perspectiva de Thompson, demanda que os sujeitos subalternizados sejam integrados de maneira significativa no processo de pesquisa. No caso das mulheres rurais, essa integração só é possível quando se reconhece e valoriza suas práticas, experiências e saberes (Scherer-Warren, 2010).
Portanto, as abordagens decolonial e thompsoniana, quando combinadas com metodologias que visam entender a agência, o pensamento e a ação das mulheres, contribuem para situá-las no centro de suas próprias narrativas históricas. É uma abordagem que privilegia “[...] um pensar desde, entre e com, em vez de um estudo sobre” (Walsh, 2010, tradução nossa, grifo da autora), integrando as perspectivas teóricas e empíricas em uma relação dialógica com os sujeitos da pesquisa.
4. Considerações finais
O objetivo deste artigo consistiu em examinar a viabilidade de combinar a abordagem teórico-metodológica de E. P. Thompson com a abordagem teórico-metodológica decolonial nos estudos que envolvem mulheres rurais. Para isso, realizamos uma breve revisão sobre Thompson e os estudos decoloniais; analisamos aspectos da teoria thompsoniana, como a “lógica histórica” e a “experiência”, assim como elementos da teoria decolonial relacionados à produção do conhecimento, como a “decolonialidade do saber”, a “desobediência epistêmica” e a “interculturalidade”; examinamos as reflexões das feministas decoloniais; e, por último, refletimos sobre as aplicações destes conceitos e teorias para as mulheres rurais.
Embora Thompson, como historiador europeu, não tenha se debruçado sobre questões decoloniais devido ao contexto imperialista em que estava inserido, e, da mesma forma, os teóricos decoloniais não tenham abordado a fundo as questões de gênero e sexualidade em suas análises iniciais, isso não impede a combinação produtiva dessas perspectivas. Nosso argumento central é que as teorias de Thompson e da decolonialidade podem ser utilizadas de forma complementar, reconhecendo suas limitações, mas também suas potências para repensar a produção do conhecimento “a partir de baixo”, especialmente quando se trata da experiência das mulheres em contextos rurais, coloniais e pós-coloniais.
A partir dessa combinação, sugerimos que a abordagem teórico-metodológica de Thompson pode ser adaptada e articulada com a teoria decolonial para contemplar as preocupações do feminismo decolonial. Em particular, a noção de “experiência”, central em Thompson, revela-se uma ferramenta analítica poderosa para investigar as interações entre sexo, raça, classe e colonialismo nas vidas das mulheres rurais. Ao articular as categorias de Thompson com a decolonialidade, conseguimos uma análise mais rica e complexa das realidades vividas por essas mulheres, situando suas resistências e agências no centro da construção do conhecimento.
A pesquisa empírica realizada com mulheres rurais foi essencial para testar a aplicação dessa combinação teórica. A maneira como as participantes conduziram as entrevistas, levantando questões relevantes e direcionando o ritmo e o foco das discussões, demonstrou a importância de uma metodologia que não apenas as reconheça como sujeitas, mas que as integre ativamente no processo de construção do conhecimento. Esse envolvimento direto reforçou a relevância da articulação entre Thompson e a decolonialidade, possibilitando uma análise das dinâmicas locais que valoriza tanto suas experiências quanto seus saberes, alinhada às demandas do feminismo decolonial.
Apesar das contribuições apresentadas, reconhecemos algumas limitações que podem ser exploradas em estudos futuros. Entre elas, destacamos o debate sobre a presença da teoria marxiana na teoria decolonial e suas críticas ao marxismo, a análise do materialismo histórico-dialético que estrutura a teoria de Thompson e sua crítica desde uma perspectiva decolonial, além do papel dos estudos culturais e da questão da “agência” e como são compreendidos em ambas as abordagens. Esses aspectos requerem maior aprofundamento teórico e empírico, especialmente nos estudos sobre mulheres rurais. Concluímos que este artigo oferece uma contribuição original ao explorar o potencial de articular duas tradições teóricas que, apesar de suas diferenças, podem se complementar, proporcionando novas lentes para compreender as complexas interações entre sexo, raça, classe e colonialismo nas experiências das mulheres rurais.
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Nome adotado para a territorialidade do continente americano por movimentos articulados de povos originários da América Latina. Representa a busca pela autodesignação, em oposição à definição eurocêntrica (Cabnal, 2010, Espinosa Miñoso, 2020).
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Fonte de financiamento:
Andréa Maria Leite Albuquerque CAPES (88887.838538/2023-00).
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Aprovação do Comitê de Ética:
Nada a declarar.
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Disponibilidade de Dados:
Os dados de pesquisa estão disponíveis apenas mediante solicitação.
Referências
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Editado por
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Editor:
Ana Rodrigues Cavalcanti Alves (UFBA, Brasil).
Disponibilidade de dados
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
15 Set 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
16 Abr 2024 -
Aceito
09 Jun 2025
