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Tabagismo em uma escola de enfermagem do sul do Brasil

Smoking in a nursing school in southern Brazil

Tabaquismo en una escuela de enfermería al sur del Brasil

Resumos

Estudo transversal que teve por objetivo identificar a prevalência de tabagismo entre docentes, discentes e técnicos administrativos de uma escola de enfermagem do sul do Brasil. A coleta de dados ocorreu em 2009, por meio de questionários específicos para fumantes, ex-fumantes e não-fumantes e analisados pelo Statistical Package for the Social Science. A amostra foi constituída de 426 sujeitos, 21 (5%) fumantes, 26 (6,1%) ex-fumantes e 376 (88,9%) não-fumantes, representando 77,5% da população estudada. A prevalência de fumantes está entre os técnicos administrativos, 8 (38,1%); de ex-fumantes entre os professores, 9 (34,6%); e de não-fumantes entre os alunos, 317 (83,6%), com diferença estatisticamente significativa (p<0,001). A maioria dos fumantes tem baixa escolaridade e dependência à nicotina muito baixa (0-2 pontos). O conhecimento da prevalência de tabagismo na instituição favorece a realização de intervenções que visem à prevenção e cessação da prática tabágica neste ambiente de saúde e ensino.

Tabagismo; Prevalência; Enfermagem; Estudantes de enfermagem


This cross-sectional study aimed at identifying the prevalence of smoking among students, professors, and administrative technical staff in a nursing school in southern Brazil. The data was collected in 2009 through specific questionnaires given to smokers, ex-smokers, and nonsmokers. The sample constituted of 426 subjects, 21 (5%) smokers, 26 (6.1%) ex-smokers and 376 (88.9%) nonsmokers, which represented 77.5% of the studied population. The prevalence of smokers is among the administrative technical staff, 8 (38.1%); of ex-smokers among professors, 9 (34.6%); and nonsmokers among students, 317 (83.6%), with significant statistical difference (p<0,001). The majority of smokers have lower formal educational levels and very low nicotine dependence (0-2 points). The knowledge of the prevalence of smoking in the institution favors intervention that seeks to prevent and cease the practice of smoking tobacco in health and educational environment.

Smoking; Prevalence; Nursing; Nursing students


Es un estudio transversal con el objetivo de identificar la prevalencia de fumadores entre los profesores, estudiantes y personal administrativo de una escuela de enfermería en el sur de Brasil. Los datos se recolectaron en 2009, a través de cuestionarios específicos para los fumadores, ex fumadores y no fumadores y se analizaron mediante paquete estadístico para las Ciencias Sociales. La muestra consistió de 426 sujetos, 21 (5%) fumadores, 26 (6,1%) ex fumadores y 376 (88,9%) no fumadores, lo que representa el 77,5% de la población estudiada. La prevalencia de fumadores se encuentra entre el personal administrativo, 8 (38,1%); de los ex fumadores entre los profesores, 9 (34,6%); y no fumadores entre los estudiantes, 317 (83,6%), diferencia estadísticamente significativa (p <0,001). La mayoría de los fumadores tienen poca educación y muy baja dependencia a la nicotina (0-2 puntos). El conocimiento de la prevalencia del tabaquismo en la institución favorece el uso de intervenciones dirigidas a la prevención y el cese de la práctica de fumar en este ambiente de salud y educación.

Tabaquismo; Prevalencia; Enfermería; Estudiantes de enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Tabagismo em uma escola de enfermagem do sul do Brasil

Smoking in a nursing school in southern Brazil

Tabaquismo en una escuela de enfermería al sur del Brasil

Isabel Cristina EcherI; Ana Paula Almeida CorrêaII; Stephani Amanda Lukasewicz FerreiraIII; Amália de Fátima LucenaIV

IDoutora em Clínica Médica. Professora do Departamento de Assistência e Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Chefe do

Serviço de Enfermagem Cirúrgica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: iecher@hcpa.ufrgs.br

IIAcadêmica da Escola de Enfermagem da UFRGS. Bolsista assistencial do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: anacorrea@hotmail.com IIIAcadêmica da Escola de Enfermagem da UFRGS. Bolsista de Iniciação Científica/UFRGS. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: stephani.luka@gmail.com

IVDoutora em Enfermagem. Professora do Departamento de Enfermagem Médico-cirúrgico da Escola de Enfermagem da UFRGS, Assistente do Serviço de Enfermagem Cirúrgica do HCPA.

Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: afatimalucena@gmail.com

Correspondência Correspondência: Isabel Cristina Echer Rua São Luis, 700, apt 504 90620-170 - Porto Alegre, RS, Brasil E-mail: iecher@hcpa.ufrgs.br

RESUMO

Estudo transversal que teve por objetivo identificar a prevalência de tabagismo entre docentes, discentes e técnicos administrativos de uma escola de enfermagem do sul do Brasil. A coleta de dados ocorreu em 2009, por meio de questionários específicos para fumantes, ex-fumantes e não-fumantes e analisados pelo Statistical Package for the Social Science. A amostra foi constituída de 426 sujeitos, 21 (5%) fumantes, 26 (6,1%) ex-fumantes e 376 (88,9%) não-fumantes, representando 77,5% da população estudada. A prevalência de fumantes está entre os técnicos administrativos, 8 (38,1%); de ex-fumantes entre os professores, 9 (34,6%); e de não-fumantes entre os alunos, 317 (83,6%), com diferença estatisticamente significativa (p<0,001). A maioria dos fumantes tem baixa escolaridade e dependência à nicotina muito baixa (0-2 pontos). O conhecimento da prevalência de tabagismo na instituição favorece a realização de intervenções que visem à prevenção e cessação da prática tabágica neste ambiente de saúde e ensino.

Descritores: Tabagismo. Prevalência. Enfermagem. Estudantes de enfermagem.

ABSTRACT

This cross-sectional study aimed at identifying the prevalence of smoking among students, professors, and administrative technical staff in a nursing school in southern Brazil. The data was collected in 2009 through specific questionnaires given to smokers, ex-smokers, and nonsmokers. The sample constituted of 426 subjects, 21 (5%) smokers, 26 (6.1%) ex-smokers and 376 (88.9%) nonsmokers, which represented 77.5% of the studied population. The prevalence of smokers is among the administrative technical staff, 8 (38.1%); of ex-smokers among professors, 9 (34.6%); and nonsmokers among students, 317 (83.6%), with significant statistical difference (p<0,001). The majority of smokers have lower formal educational levels and very low nicotine dependence (0-2 points). The knowledge of the prevalence of smoking in the institution favors intervention that seeks to prevent and cease the practice of smoking tobacco in health and educational environment.

Descriptors: Smoking. Prevalence. Nursing. Nursing students.

RESUMEN

Es un estudio transversal con el objetivo de identificar la prevalencia de fumadores entre los profesores, estudiantes y personal administrativo de una escuela de enfermería en el sur de Brasil. Los datos se recolectaron en 2009, a través de cuestionarios específicos para los fumadores, ex fumadores y no fumadores y se analizaron mediante paquete estadístico para las Ciencias Sociales. La muestra consistió de 426 sujetos, 21 (5%) fumadores, 26 (6,1%) ex fumadores y 376 (88,9%) no fumadores, lo que representa el 77,5% de la población estudiada. La prevalencia de fumadores se encuentra entre el personal administrativo, 8 (38,1%); de los ex fumadores entre los profesores, 9 (34,6%); y no fumadores entre los estudiantes, 317 (83,6%), diferencia estadísticamente significativa (p <0,001). La mayoría de los fumadores tienen poca educación y muy baja dependencia a la nicotina (0-2 puntos). El conocimiento de la prevalencia del tabaquismo en la institución favorece el uso de intervenciones dirigidas a la prevención y el cese de la práctica de fumar en este ambiente de salud y educación.

Descriptores: Tabaquismo. Prevalencia. Enfermería. Estudiantes de enfermería.

INTRODUÇÃO

No mundo vêm ocorrendo mobilizações para a redução do tabagismo, no entanto, este continua sendo um grave problema de saúde pública, que compromete o estado físico e mental das pessoas.1

O tabaco é um agente causador de importantes problemas relacionados à saúde, o que constitui um desafio não só para os serviços de saúde, mas também para o desenvolvimento econômico, social, educacional e ambiental.2

Pesquisas mostram prevalência de um terço de fumantes na população adulta mundial e o número anual de mortes associado ao uso do tabaco é de 4,9 milhões, correspondendo a 10 mil mortes por dia.3 Estima-se que se a tendência permanecer a mesma em 2020 o tabagismo será responsável por 10 milhões de mortes por ano no mundo, com uma proporção de uma para cada seis pessoas, devido aos altos índices de morbimortalidade por câncer, doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e respiratórias.4-6

No Brasil, em 2008, 17,5% da população de 15 anos ou mais de idade eram usuários de produtos derivados de tabaco, o que correspondia a 25 milhões de pessoas. Regionalmente, o maior percentual de usuários estava no Sul (19,0%) e os menores no Sudeste e Centro-Oeste (16,9% em cada região). Em todas as regiões, o percentual de homens usuários era maior que o de mulheres.7

O cigarro contém cerca de 4.700 substâncias, entre elas a nicotina, o monóxido de carbono, o alcatrão, os agrotóxicos e as substâncias radioativas. A nicotina causa dependência e potencializa os efeitos negativos dos componentes da fumaça do cigarro aumentando o risco para cânceres, hipertensão arterial sistêmica, infarto do miocárdio, acidentes vasculares cerebrais, bronquite crônica, enfisema e úlcera gástrica, entre outras doenças.8

A Lei nº 9.294, de 1996, proíbe o uso de qualquer produto derivado do tabaco em recinto coletivo privado ou público, com exceção de locais destinados a essa finalidade. A Portaria Interministerial nº 1.498, de 2002, recomenda às instituições de saúde e de ensino implantarem programas de ambientes livres da exposição tabágica.9

Estudo mostra que os profissionais da saúde e em formação vivenciam inquietações em relação ao tabagismo, visto que possuem conhecimento sobre os malefícios do uso do tabaco e as consequências da exposição passiva à fumaça.1 Assim, considerando as repercussões de ser tabagista para a saúde e para a sociedade, este estudo teve como objetivo identificar a prevalência e as principais características de docentes, discentes e técnicos administrativos de uma escola de enfermagem do sul do Brasil, em relação ao tabagismo.

Considerando-se a relevância deste importante problema de saúde pública há necessidade de investigações que aprofundem a temática neste campo de atuação da enfermagem. Com essa finalidade, o estudo apresenta como benefício a possibilidade de conhecer a prevalência de tabagismo na instituição, com vistas a promover ações futuras que venham em prol da cessação do tabaco na escola de enfermagem, assim como conscientizar a sua comunidade acerca da responsabilidade social e profissional sobre questões que envolvem o fumo.

MATERIAL E MÉTODO

Estudo transversal realizado com a comunidade de uma escola de enfermagem do sul do Brasil, em 2009, a qual possui 450 discentes, entre graduação e pós-graduação, 75 docentes e 25 técnicos administrativos. Visando estimular a participação dos sujeitos no estudo, inicialmente, foram divulgados os objetivos da pesquisa junto a esta comunidade.

Toda a população do estudo (550) foi convidada a participar, sendo que a amostra foi composta por todos os que concordaram em preencher o questionário da pesquisa.

A coleta de dados ocorreu no período de março a dezembro de 2009. Foi realizada pelos pesquisadores, por meio de três questionários elaborados pelos mesmos, de acordo com o caráter tabágico da amostra; um para não-fumantes, um para ex-fumantes (neste estudo, o termo ex-fumantes refere-se aos fumantes em abstinência.) e um para fumantes. Para a escolha do questionário a ser aplicado se considerou não-fumante a pessoa que nunca fumou e/ou que apenas experimentou o fumo, mas não se tornou fumante, ex-fumante a pessoa que já fumou regularmente e não fuma mais, há seis meses; e fumante, a pessoa que fuma regularmente um ou mais cigarros por dia.

A coleta ocorreu em salas de aula com os discentes, em reuniões de departamento com os docentes e nas secretarias com os técnicos administrativos. Foi explicado o objetivo da pesquisa e a forma de classificação para aplicação dos questionários, de acordo com a condição tabágica atual de cada sujeito, que respondeu apenas um questionário. Depois colocou-o em um envelope fechado e sem identificação. O questionário continha perguntas sobre aspectos sóciodemográficos, características em relação ao tabagismo, grau de dependência à nicotina e presença ou não de doenças associadas ao tabagismo.

Os dados foram analisados pela estatística descritiva, com o auxílio do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 16. Foram aplicados Teste Qui-Quadrado de Pearson, Teste Exato de Fisher e Teste de Mann-Whitney. Toda associação e diferença com p valor < 0,05 foi considerada estatisticamente significativa. Os percentuais apresentados baseiam-se nas respostas válidas, uma vez que algumas questões dos questionários não foram preenchidas.

Para o grupo de fumantes, a dependência à nicotina foi avaliada por meio da Escala de Fargeström10, a qual classifica a dependência dos fumantes de acordo com as seguintes pontuações: 0-2 pontos = dependência muito baixa; 3-4 pontos = dependência baixa; 5 pontos = dependência média; 6-7 pontos = dependência elevada e 8-10 pontos = dependência muito elevada.

O projeto do estudo foi aprovado pela Comissão de Pesquisa da instituição sob nº 2007976, em conformidade à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. A devolução dos questionários preenchidos formalizou o consentimento informado do sujeito em participar do estudo. Foi garantido o anonimato, o uso das informações exclusivamente para fins de pesquisa e o direito de desistir de participar do estudo a qualquer momento.

RESULTADOS

Participaram do estudo 426 sujeitos, destes, 344 eram discentes, 59 docentes e 23 técnicos administrativos, o que representa 77,5% do total da população estudada, ficando distribuído da seguinte forma: 76,4% dos discentes, 76% dos discentes e 92% dos técnicos administrativos.

Os grupos de fumantes, ex-fumantes e não-fumantes foram caracterizados e analisados em relação aos aspectos sócioeconômicos e clínicos (Tabela 1).

Entre os participantes, 367 (86,8%) eram do sexo feminino, 21 (5%) eram fumantes, 26 (6,1%) ex-fumantes e 376 (88,9%) não-fumantes. Não se evidenciou diferença estatisticamente significativa na associação entre o sexo e os diferentes grupos, assim como na associação com a cor.

Quando se comparou a idade em relação aos grupos de fumantes, ex-fumantes e não-fumantes, observou-se diferença estatisticamente significativa (p=0,006), com prevalência de não-fumantes, 295 (77,8%), com idade entre 16 e 30 anos e de ex-fumantes, 11 (42,3%), acima dos 41 anos.

Houve também diferença estatisticamente significativa (p=0,003) entre o grupo de ex-fumantes associado a renda familiar, em que a maioria deles, 17 (65,4%), encontrava-se em famílias com renda acima de nove salários mínimos.

A prevalência de fumantes, conforme a função exercida, está entre os técnicos administrativos com oito (38,1%); dos ex-fumantes, entre os professores, com nove (34,6%); e dos não-fumantes, entre os alunos, com 317 (83,6%), com diferença estatisticamente significativa (p<0,001).

Ocorreu significância estatística na associação dos grupos com o nível de instrução (p<0,001), com prevalência de fumantes 5 (23,8%) entre os sujeitos que possuem até o ensino médio e de ex-fumantes 12 (46,2%) entre os que possuem pós-graduação.

Entre os alunos de graduação e pós graduação não ocorreu diferença estatisticamente significativa em relação aos grupos de fumantes, ex-fumantes e não-fumantes e o período do curso que se encontravam (p=0,097). Da mesma forma, quanto à variável possuir ou não doença associada ao tabagismo (p=0,087).

Cinquenta por cento dos fumantes convivem em suas residências com tabagistas, já 302 (80,1%) dos não-fumantes e 20 (76,9%) dos ex-fumantes não convivem com fumantes (p=0,006).

Os grupos de fumantes e ex-fumantes foram caracterizados e analisados em relação ao inicio do fumo, quantidade de cigarros consumidos e grau de dependência à nicotina (Tabela 2).

Na associação entre idade de início do fumo e o grupo de fumantes e ex-fumantes não houve diferença estatisticamente significativa (p=0,731), assim como também não se encontrou significância quanto ao número de cigarros consumidos diariamente (p=0,728). A média do tempo de uso do fumo, em anos, foi de 12,56 ± 10,507 para os ex-fumantes e 12,78 ± 12,706 para os fumantes.

A dependência à nicotina foi analisada, por meio da Escala de Fargeström, no grupo de fumantes e no de ex-fumantes. Não houve associação estatisticamente significativa entre estes grupos e o grau de dependência (p=0,142). Todavia, destaca-se que o maior percentual dos fumantes e ex-fumantes apresenta dependência a nicotina muito baixa (0-2 pontos) e que a dependência muito elevada (8-10 pontos) obteve o menor percentual.

DISCUSSÃO

A prevalência de fumantes na amostra estudada está entre os técnicos administrativos e de ex-fumantes entre os professores. O predomínio do sexo feminino na amostra estudada se deve ao fato da enfermagem ser um curso predominantemente constituído por mulheres. Resultados semelhantes foram encontrados em estudos realizados em universidades brasileiras, tanto entre acadêmicos de diferentes cursos1, como entre estudantes da área da saúde11, nos quais se observou predominância de 80% de não-fumantes. Acredita-se que estar em um ambiente de ensino à saúde é um fator que contribui para o fato do indivíduo não ser fumante, visto que o local possui restrições ao uso do tabaco e a maioria das pessoas que convivem nesse ambiente detém conhecimento sobre os malefícios do cigarro à saúde e os benefícios de não fumar.

A maioria dos sujeitos declarou-se branca (85%). A associação não significativa (p=0,934) mostrou que a cor não é fator influenciável para ser ou não tabagista. Estudo realizado entre universitários da Faculdade de Medicina na Região Sul, também obteve resultados semelhantes.11

O estudo evidenciou que ser ex-fumante está associado a uma renda familiar acima de nove salários mínimos (p=0,003), entretanto, não se identificou as possíveis correlações entre o aumento de renda e cessação do tabagismo. Acredita-se que pessoas com mais recursos financeiros têm mais acesso a métodos terapêuticos e/ou informações para o tratamento de cessação do tabagismo. Estudo de coorte realizado em Pelotas/RS apontou que a baixa renda está associada ao risco aumentado de tabagismo.12

Menor nível de instrução foi significativo para ser fumante (p<0,001) e, os ex-fumantes, na sua maioria, possuíam a graduação completa. Estes dados vão ao encontro de pesquisas que revelam que os anos de educação formal influenciam na menor probabilidade de tornar-se fumante.13 O maior nível de instrução pode estar associado a uma maior conscientização das pessoas em não se tornarem fumantes, bem como da necessidade de cessação do tabagismo. É importante considerar que nesse estudo a maioria dos sujeitos pesquisados possuem formação ou trabalham em ambiente da área da saúde e, portanto, infere-se que possuem maior acesso a informações sobre os malefícios do cigarro, o que pode facilitar a decisão em não fumar ou parar de fumar.

Os não-fumantes estão mais presentes entre os alunos, os ex-fumantes entre os professores e os fumantes entre os técnicos administrativos. Este dado pode ser comparado, de certa forma, com o que foi descrito por estudo que aponta maior prevalência de tabagistas entre os profissionais da área humana em relação aos profissionais de formação biológica.14,15 Estes resultados de pesquisa podem indicar que, de alguma forma, os profissionais ou os estudantes da área da saúde estão mais protegidos de tornarem-se tabagistas do que os outros. Este dado, também, pode estar relacionado aos anos de estudo e/ou às leis de restrição ao consumo do tabaco, uma vez que professores e alunos do local estudado não podem fumar em sala de aula, enquanto os técnicos administrativos podem sair de seu ambiente de trabalho para fumar, em área destinada a essa finalidade, com maior facilidade, e também, ao fato dos professores terem mais idade e, portanto, iniciaram o comportamento tabágico em uma época em que era permitido o fumo em sala de aula.

Atualmente, com as leis de restrição ao fumo, o tabagista depara-se com a dificuldade de conciliar o uso do tabaco com as exigências da vida profissional e social, o que contribui para a mudança de comportamento em relação ao ato de fumar. Associado a isto existe o desconforto de não ter um local apropriado para fumar ou não poder fumar, o que tem levado as pessoas a refletirem sobre o seu comportamento tabágico.

É preciso salientar que houve uma mudança na forma como a sociedade passou a ver o hábito de fumar, pois se no passado era visto como charme, sinônimo de afirmação e hábito social, o mesmo passa a ser reconhecido atualmente como um ato incorreto e indesejado, gerador de desconfortos e doenças aos fumantes16 e às pessoas ao seu entorno.

Neste contexto, é importante lembrar que hoje existe uma política de conscientização nacional em relação aos danos causados pelo consumo do cigarro, o que tem ocorrido por meio das ilustrações com situações de doenças relacionadas ao tabaco estampadas nos maços de cigarros, pelas propagandas nos meios de comunicação advertindo sobre os riscos do fumo e da exposição passiva à fumaça do cigarro e pelas campanhas mundiais e nacionais para incen-tivar a prevenção do uso do tabaco e sua cessação.

Em relação a doenças associadas ao uso do tabaco, 80% dos sujeitos afirmaram não ter doenças. Na comparação entre os grupos os fumantes, são os que apresentam um percentual maior de doenças. Isto vai ao encontro de estudos que comprovam que o tabagismo apresenta importante fator de risco para desenvolvimento de doenças crônicas.17 No entanto, considerando-se que esta variável associada aos diferentes grupos não foi estatisticamente significativa, pode-se relacionar este fato ao elevado índice de jovens nesta comunidade que ainda não desenvolveram doenças associadas ao tabaco.

A maioria das pessoas que não fumam afirma não conviver com fumantes, enquanto aqueles que fumam, convivem. Este resultado é diferente do encontrado em estudo realizado na Universidade de Brasília, em que a maioria dos alunos não-fumantes convive com fumantes.18 Consensos internacionais e nacionais mostram que a exposição à fumaça do cigarro causa as mesmas doenças que o tabagismo, entretanto, esse fato não é geralmente reconhecido pela população.8 Apesar da não significância (p=0,006) encontrada em nosso estudo, pode-se deduzir que conviver com tabagistas é um dos fatores de risco para se tornar fumante, ao passo que o não conviver indica um fator protetor.

A idade do início do tabagismo ocorreu antes dos 20 anos entre os fumantes e ex-fumantes estudados. Dados encontrados na literatura revelam que o início do uso do tabaco se dá na adolescência, dos 15 aos 20 anos.11,18-19 Acredita-se que a curiosidade, a vulnerabilidade e a influência de pessoas e da mídia são fatores importantes para que os adolescentes comecem a fumar.

O número de cigarros consumidos foi em torno de meia carteira/dia, o que corresponde a 10 cigarros/dia, e similar entre os fumantes e ex-fumantes, o que é considerado um padrão de consumo baixo.8

Da mesma forma, obteve-se um grau de dependência à nicotina muito baixo na maioria destes dois grupos, o que foi descrito de maneira semelhante em estudo realizado com universitários que encontrou graus de dependência nicotínica muito baixo e baixo.20 O que é de grande importância neste dado é o fato de que se sabe que quanto menor o grau de dependência à nicotina mais fácil o processo de cessação do tabagismo e menos intensos os desconfortos, como os sintomas da síndrome de abstinência. Embora a diferença estatística não seja significativa, o que se atribui ao tamanho amostral, observa-se que os que conseguiram parar de fumar eram menos dependentes à nicotina.

Estes fatos podem ser usados pelos profissionais como argumentos e estímulos à motivação dos que ainda fumam visando auxiliá-los a pararem de fumar, uma vez que os ex-fumantes que possuem uma história de consumo de cigarros/dia e uma dependência à nicotina semelhantes conseguiram. Diversos estudos também apontam que a média de consumo de fumantes é de meia carteira/dia1,11,20 e que a dificuldade na cessação do tabagismo é maior quanto maior a dependência.21

Outra variável estudada foi o tempo em anos de uso do fumo para fumantes e ex-fumantes, onde a média ficou em torno de 12 anos para os dois grupos. Estudo realizado na região sul do Brasil mostrou que o tempo médio de uso do fumo foi de 23,5 anos.19

Este estudo apresenta algumas limitações, uma delas foi o modo de coleta dos dados, realizado por um questionário respondido pelo próprio participante, o que deu a ele a condição de informar o que desejava, o que lembrava e como entendia a questão. Isto pode, por exemplo, ter contribuído para uma taxa de fumantes subestimada, uma vez que esta condição não foi confirmada por meio de mensurações biológicas.

CONCLUSÃO

A prevalência entre os alunos foi de não-fumantes, entre os professores, de ex-fumantes, e entre os técnicos administrativos de fumantes. Na amostra estudada houve predomínio de mulheres jovens, estudantes, com renda familiar de cinco a oito salários mínimos, que não convivem com fumantes e não possuem doenças associadas ao tabagismo.

Os resultados do estudo permitem conhecer o perfil dos discentes, docentes e técnicos administrativos em relação ao tabagismo, o que é indispensável para propor a implantação de medidas e intervenções que visem prevenir e reduzir a exposição tabágica, neste ambiente de saúde e ensino. Acredita-se que buscar recursos para expandir as redes para prevenção e tratamento de dependentes, em seu local de trabalho, deve ser uma estratégia a ser conquistada, visto os benefícios de um ambiente livre do tabaco.

Recebido: 25 de junho de 2010

Aprovação: 15 de dezembro de 2010

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  • Correspondência:

    Isabel Cristina Echer
    Rua São Luis, 700, apt 504
    90620-170 - Porto Alegre, RS, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 2011

    Histórico

    • Aceito
      15 Dez 2010
    • Recebido
      25 Jun 2010
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