Acessibilidade / Reportar erro

GESTÃO DA SAÚDE: O USO DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E O COMPARTILHAMENTO DE CONHECIMENTO PARA A TOMADA DE DECISÃO1 1 Texto extraído da tese - O uso dos sistemas de informação como ferramenta para a tomada de decisão pela gestão da saúde em municípios do sul da Bahia, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da Universidade de São Paulo (USP), em 2014. Edital 005/2009 Ação Novas Fronteiras da CAPES/MEC.

RESUMO:

Estudo teve como objetivo analisar o uso dos Sistemas de Informação em Saúde no processo de tomada de decisão pela gestão em municípios do sul da Bahia, Brasil. Utilizou-se abordagem qualitativa, os sujeitos foram 16 secretários de saúde. Dados coletados através de entrevista e submetidos à técnica de análise de conteúdo; adotou-se o referencial da Gestão do Conhecimento. Os gestores ainda são neófitos no uso dos Sistemas de Informação em Saúde; há envolvimento de atores na decisão, porém em alguns casos não há efetiva participação social; ocorre pouca qualificação em Sistema de Informação em Saúde; gestões implementam inovação, embora incipiente; há dificuldade quando da implantação de sistema novo e acesso à internet. Conclui-se que a utilização dos Sistemas de Informação em Saúde como substrato para a produção do conhecimento ainda não atinge todo o seu potencial, sugere-se que a gestão promova o fortalecimento de uma cultura informacional e busque construir um conhecimento inscrito em saberes de distintos atores para a decisão.

DESCRITORES:
Sistemas de informação; Gestão em saúde; Tomada de decisões; Gestão do conhecimento

ABSTRACT:

This study aimed to analyze the use of Health Information Systems in the decision-making process by the management from cities located in Southern Bahia, Brazil. A qualitative approach was employed; subjects were 16 secretaries of health. Data were collected through interviews and subject to the content analysis technique; Knowledge Management was used as the theoretical framework. The managers are still beginners in the use of Health Information Systems; several actors are involved in the decision; there is low qualification in Health Information Systems; managements implement innovation, even if incipiently; difficulties happen when a new system is established and because of internet access. It was concluded that Health Information Systems' use to support knowledge production has not reached yet its full potential; it is suggested that management should promote the strengthening of the information culture and should seek to construct knowledge based on the expertise of different actors for the decision.

DESCRIPTORS:
Information systems; Health management; Decision-making; Knowledge management

RESUMEN

El estudio tuvo como objetivo analizar el uso de los Sistemas de Información en Salud en el proceso de toma de decisión por la gestión en municipios del sur de Bahia, Brasil. Se utilizó aproximación cualitativa. Los sujetos fueron 16 secretarios de salud. Datos recolectados a través de entrevista, sometidos a la técnica de análisis de contenido y el referencial de Gestión del Conocimiento. Los gestores aún son principiantes en el uso de los Sistemas de Información en Salud, hay implicación de actores en la decisión, sin embargo en algunos casos no hay efectiva participación social; ocurre poca calificación en Sistemas de Información en Salud; gestión implementan innovación, aunque incipiente; hay dificultad cuando de la implantación de sistema nuevo y acceso a la internet. Se concluye que la utilización de los Sistemas de Información en Salud como sustrato para la producción del conocimiento aún no alcanza todo su potencial, sugiere que la gestión promueva el fortalecimiento de una cultura informacional y construye un conocimiento inscrito en saberes de distinguidos actores para la decisión.

DESCRIPTORES:
Sistemas de información; Gestión en salud; Toma de decisiones; Gestión del conocimiento

INTRODUÇÃO

A gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) é um processo pelo qual equipes gestoras (sujeitos) tomam decisões na implementação da Política de Saúde.11. Tamaki EM, Tanaka OY, Felisberto E, Alves CKA, Drumond Junior M, Bezerra LCA, et al. Metodologia de construção de um painel de indicadores para o monitoramento e a avaliação da gestão do SUS. Cienc Saude Colet [Internet]. 2012 [cited 2014 Dec 30]; 17(4):. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n4/v17n4a07.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n4/v17n4...
Os bancos de dados e Sistemas de Informação em Saúde (SIS) constituem ferramentas importantes para o planejamento e a avaliação das políticas de saúde, assim como dos serviços, redes e sistemas de saúde.22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

No Brasil, diversos SIS federais foram instituídos antes mesmo da implantação do SUS e os seus objetivos estavam voltados para os governos federal e/ou estadual. Os municípios assumiam o papel de coletores de dados e, frequentemente, ocorria a subutilização das informações. Assim, eles permaneciam alijados do processo de elaboração dos planejamentos, dispondo de pouca ou nenhuma experiência/autonomia para a formulação de políticas e para a tomada de decisão.33. Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...

A partir da Norma Operacional Básica do SUS de 1996 (NOB/SUS 01/96) cresceu a responsabilidade dos municípios na assunção do seu papel decisório nas ações em seu território. O cumprimento desse novo papel aumentou a necessidade de produção de informações confiáveis e disponíveis de maneira mais célere para subsidiar o trabalho de profissionais e gestores.33. Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...
Nesta direção, diversos SIS foram implementados pelo Ministério da Saúde e a sua utilização é obrigatória em todos os estados e municípios.

A informação proporciona um novo ponto de vista para interpretação de eventos ou fenômenos, o que dá visibilidade e significados antes invisíveis. Desse modo, a informação é um meio ou material necessário para extrair e construir o conhecimento.44. Nonaka I, Takeuchi H. Criação de conhecimento na empresa. 7ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Campus; 1997. Os dados, em contraste, podem ser caracterizados como uma propriedade das coisas. O conhecimento é uma propriedade de agentes, predispondo-os a agir em determinadas circunstâncias.55. United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão II - Gestão do Conhecimento em Organizações Governamentais e Programas, 2014. [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93043.pdf
http://workspace.unpan.org/sites/Interne...

O referencial teórico-conceitual da Gestão do Conhecimento (GC) foi usado neste estudo, pois agrega valor ao objeto e ao mesmo tempo apoia a ancoragem das discussões do tema abordado. A GC constitui um conjunto integrado de ações que visam identificar, capturar, gerenciar e compartilhar todo o ativo de informações de uma organização. Estas informações podem estar sob a forma de banco de dados, documentos impressos e outros meios, articulando pessoas, conteúdos e comunicação a fim de organizar a expertise da instituição para as decisões. Ela baseia-se em aprendizagem compartilhada, colaboração e a partilha de conhecimento e envolve não apenas a produção de informação, mas também a comunicação de informações com base em ou derivada de análise dos dados para aqueles que precisam trabalhar com eles.44. Nonaka I, Takeuchi H. Criação de conhecimento na empresa. 7ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Campus; 1997.,66. Davenport TH, Prusak L. Working knowledge: how organizations manage what they know. Boston: Harvard Business School, 1998.-77. Molina J. Not missing the train of history! Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2014 Fev; [cited 2015 May 15]; 48 (1). Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000100001
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342014...

Ademais, vive-se em uma época histórica de desenvolvimento tecnológico sem precedentes, o que faz a sociedade atual ser reconhecida como a do conhecimento e da tecnologia.88. Lorenzetti J, Trindade LL, Pires DEP, Ramos FRS. Technology, technological innovation and health: a necessary reflection. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2012 Abr-Jun [cited 2014 Oct 21]; 21(2):432-9. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072012000200023&lng=en&nrm=iso&tlng=en
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
O conhecimento tem sido visto como um dos mais importantes recursos de uma organização, por ser capaz de tornar as ações, no plano organizacional e individual, mais inteligentes, eficientes e eficazes. Isso estimula a elaboração de produtos e serviços inovadores e excelentes.99. Rocha ESB, Nagliate P, Furlan CEB, Kerson Rocha Jr, Trevizan MA, Mendes IAC. Gestão do conhecimento na saúde: revisão sistemática de literatura. Rev Latino-am Enfermagem [Internet]. 2012 [cited 2014 Oct 21]; 20(2):[09 telas]. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n2/pt_24.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n2/pt_2...

Assim, o objetivo do estudo foi analisar o uso dos SIS no processo de tomada de decisão pela gestão da saúde de municípios do sul da Bahia, Brasil.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada no Estado da Bahia, composto por 417 municípios, distribuídos em 28 regiões de saúde. O sul do estado contempla quatro regiões. O estudo foi realizado em 16 municípios do sul da Bahia, sendo a sede a cidade de Itabuna.

Na estrutura organizacional de uma Secretaria da Saúde, geralmente, os(as) Secretários(as) Municipais de Saúde são nomeados como cargos comissionados e frequentemente, são profissionais da área de saúde. Os critérios para inclusão dos participantes no estudo foi o de exercer a função/cargo de gestor municipal da saúde (secretário ou secretária) em um dos 21 municípios da região de saúde Itabuna.

Com vistas ao atendimento dos critérios de inclusão, permaneceu um total de 16 gestores. Utilizou-se como técnica de coleta de dados a entrevista semi-estruturada, aplicadas no período de setembro de 2013 a maio de 2014. Foram eliminados os participantes que após três tentativas de agendamento não se dispuseram a conceder entrevista.

Dos 16 participantes, nove já haviam atuado como secretários municipais de saúde no mesmo ou em outros municípios; cinco já haviam trabalhado como cogestores de saúde, ou seja, assumiram tarefas em conjunto com o(a) secretário(a) através do compartilhamento de responsabilidades e decisões no nível central da Secretaria da Saúde, desempenhando ações relacionadas à efetivação dos planejamentos, elaboração de projetos, supervisão, avaliação, monitoramento, dentre outras. Apenas dois não tinham experiências anteriores na área de gestão. Dentre os 16 participantes, dez eram enfermeiros.

Para a análise dos dados, optou-se pela técnica de análise de conteúdo, o tema foi utilizado como unidade de registro. Construíram-se categorias empíricas que foram modificadas ao longo da análise num processo dinâmico de confronto constante entre empiria e teoria e, finalmente, elas deram origem a um grande tema que conduziu a três subtemas.

Este estudo foi desenvolvido em observância à Resolução nº 466 de dezembro/2012 do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/USP e obteve aprovação de acordo com o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 12431113.0.0000.5393 de abril/2013.

Tendo em vista a garantia do anonimato dos participantes, utilizaou-se numerais arábicos que revelam a ordem de participação deles por ocasião da coleta de dados, ou seja, Gestor 1 (G1), Gestor 2 (G2), Gestor 3 (G3) e assim sucessivamente.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Tema - Práticas da Gestão: suas interlocuções com os SIS e o uso do conhecimento para a tomada de decisão

Subtema - O olhar dos gestores sobre si, sobre a produção de informações e o envolvimento de distintos atores na decisão

Os gestores da saúde com suas diversas agendas e diante da complexidade da área, têm se confrontado no seu cotidiano com diversos desafios, dentre eles o uso das informações como recursos primordiais para o desenvolvimento do conhecimento para a tomada de decisão.

Os recortes a seguir sinalizam que há gestores que reconhecem suas limitações e não utilizam todo o potencial dos SIS.

Sobre os SIS, não, não estou usando tudo não, porque é muita coisa para usar, porque tem muita coisa pra ser feita (G5).

O que a gente utiliza de SIS ainda é muito pouco. [...] eu sempre costumo falar que é uma ferramenta a nosso favor, mas a gente ainda não sabe fazer o uso devido. A gente ainda não utiliza de tudo que eles dispõem (G2).

A expectativa é de que a informação funcione como ferramenta para orientar a tomada de decisão e a produção de conhecimentos válidos. Informações de diferentes naturezas e de diferentes fontes seriam o substrato por excelência desses processos.22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

Os seguintes trechos apresentados demonstram o envolvimento e participação de diversos atores na tomada de decisão.

A maioria das decisões é de acordo com a necessidade do momento, porque a gente tem muito a participação popular, não só através dos conselhos, tem uma rádio comunitária que as pessoas comentam muita coisa, a gente vê as necessidade, muitos vereadores e entidades atuantes, a gente faz convênio com as igrejas evangélicas, parcerias, a comunidade participa muito (G12).

[...] o Conselho Municipal de Saúde é muito participativo. Eles foram até convidados para uma reunião na próxima semana dos conselhos da região e nosso Conselho Municipal de Saúde foi escolhido para fazer uma apresentação do êxito que tem o conselho quando é participativo e atuante. [...] muitas tomadas de decisões a gente espera também a decisão do conselho, mesmo que não seja obrigatório (G1).

O modelo de informação e decisão em saúde precisa ser repensado no sentido da valorização das várias dimensões do ser humano, bem como por meio de uma política de informação e informática em saúde que a complemente e proporcione o suporte adequado ao processo decisório. Além disso, é necessário discutir as melhores formas de apreensão da informação pelos gestores, visando decisões estratégicas.1010. Cavalcante RB, Kerr MMP. Política Nacional de Informação e Informática em Saúde: avanços e limites atuais. Perspectivas em Gestão & Conhecimento 2011; 1:106-19.

Não são os conhecimentos e julgamentos que constituem a decisão, mas que a subsidiem no sentido, principalmente, de desacomodar o pensamento vigente. Além disso, o conhecimento deve partir do cotidiano que pretende explicar, híbrido de saberes locais e construído de forma significativa pela rede de atores envolvidos nesses problemas.22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

Em contraponto, há outros gestores que assinalam o papel cartorial do Conselho Municipal de Saúde (CMS), que é acessado apenas para aprovação de projetos.

Olha pra lhe ser sincero, com relação ao Conselho Municipal de Saúde, a gente leva as decisões já tomadas aqui na secretaria para aprovação desse conselho, então é dessa forma. Normalmente, a gente não discute essas coisas antes, infelizmente é assim. Não toma essas decisões em conjunto (G15).

Conselho é mais para implantação de programas. [...] quando a gente implantou teve que pedir a aprovação do Conselho, então geralmente a gente usa para essa finalidade, para aprovação (G11).

A participação cartorial do CMS demonstrada no estudo ser marcada por uma dura realidade que se conforma como contrária às diretrizes e à defesa do SUS, visto que os canais institucionais de participação, enquanto espaço de decisão e de negociação, devem ser garantidos. Deste modo, torna-se necessária uma agenda concreta da gestão da saúde que deflagre processos de incentivo à participação social. O empoderamento a partir de informações de saúde para a apropriação crítica pelos diversos atores é essencial para a construção do conhecimento e consequentemente para a formulação de estratégias de enfrentamento dos problemas e para nortear a tomada de decisão.

No espaço amplo da gestão da informação e do conhecimento é fundamental a criação de inteligentes coletivos, que possibilitem o desenvolvimento colaborativo de competências nas diversas categorias profissionais envolvidas com a informação e com o conhecimento. Os inteligentes coletivos se constituem em espaços simultaneamente dinâmicos e potenciais, considerando-se que o conhecer se apresenta como qualitativamente superior ao informar-se, mas, ao mesmo tempo, apresenta-se como base daquele.1111. Souza ED, Dias EJW, Nassif ME. A gestão da informação e do conhecimento na ciência da informação: perspectivas teóricas e práticas organizacionais. Inf & Soc: Est [Internet]. 2011 [cited 2013 Feb 3]; 21(1):55-70. Available from: http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ies/a rticle/view/4039/5598
http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ie...

A gestão da saúde ainda está ancorada em métodos e estratégias tradicionais, desse modo, a construção de novas formas de gerir na área, alicerçada na participação e práticas interdisciplinares, onde trabalhadores e usuários atuem como sujeitos ativos, permanecem como desafio.1212. Lorenzetti J, Lanzoni G, Assuiti LF, Pires DE, Ramos FR. Health management in Brazil: dialogue with public and private managers. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2014 [cited 2014 Aug 30]; 23(2):417-25. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000200417&lng=en&nrm=iso&tlng=en
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...

Em estudo realizado em uma regional de saúde do Distrito Federal, os gestores relataram acreditar que a equipe e os usuários desejam um gestor sensível quando um problema surge, que saiba ouvir aqueles que o cercam. O gestor não atua sozinho: precisa do suporte da equipe multiprofissional para atingir os objetivos.1313. Silva M, Rodrigues V, Alves E. Gestão dos serviços de saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) em uma regional de saúde do Distrito Federal (SES-DF): uma visão do gestor relacionada ao preparo para a função. Gestão e Saúde. 2013 Set; 4(3):843-60.

Diversos gestores confirmam que discutem com a sua equipe cogestora para tomar uma decisão.

[...] se for questões de vigilância epidemiológica, por exemplo, eu já tomo a decisão junto com a coordenadora da vigilância epidemiológica, eu utilizo das coordenações, da atenção básica e outras coordenações que a gente tem no município. São essas pessoas que realmente me ajudam no sentido de tomar decisões (G15).

Então nós usamos praticamente todos os nossos diretores daqui, diretor de planejamento, mas todos os outros setores dependendo do problema da demanda, a gente utiliza todos, vigilância à saúde, média e alta complexidade, atenção básica (G14).

A tomada de decisão é uma responsabilidade e uma competência formal do gestor que, além das informações obtidas, utiliza o conhecimento pessoal que possui (referências técnicas, políticas, institucionais, sociais, culturais, entre outras) e a percepção que tem do problema, forma uma convicção e toma uma decisão, mobilizando recursos necessários.1414. Tanaka, OY, Tamaki, EM. O papel da avaliação para a tomada de decisão na gestão de serviços de saúde. Cienc Saude Colet. 2012; 17(4):821-8.

Alguns gestores explicam que um diferencial da sua gestão para a tomada de decisão é a sua experiência acumulada. Isso confirma o perfil deles, visto que apenas dois não possuem experiência na área da gestão.

[...] a experiência é um fator que ajuda qualquer pessoa, pelo fato de que eu estive na secretaria em alguns momentos, é a quarta vez que retorno à secretaria. Então isso aí confere um pouco mais de habilidade, apesar de que cada gestão são momentos diferentes, mas já lhe dá um pouco de tranquilidade (G2).

Eu acho que eu tenho algumas qualidades, primeiro essa experiência de já ter passado por vários órgãos nas três esferas de governo (G14).

O conhecimento diz respeito às crenças e compromissos que ocorrem em função de uma atitude, perspectiva ou intenção específica e, portanto, está relacionado à ação em um determinado contexto.44. Nonaka I, Takeuchi H. Criação de conhecimento na empresa. 7ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Campus; 1997. O conjunto de dados pode mesmo provocar diferentes respostas de diferentes pessoas. Em momentos distintos, o mesmo conjunto de dados revisados pela mesma pessoa poderia resultar na tomada de decisão com diferentes respostas ou ações.5 O conhecimento pode assumir várias conformações a partir de distintos olhares dos atores envolvidos sob diversas perspectivas e interesses.

Uma fragilidade importante apontada pelos gestores é a falta ou o número reduzido de qualificações para a utilização dos SIS, embora alguns tenham sido qualificados quando atuaram como profissionais.

Eu tive que aprender no dia a dia, na prática. Fui aprendendo mesmo no sistema, olhando, perguntando, aos digitadores. Eu acho que os grandes problemas na questão de saúde em si são as qualificações, fica a desejar (G12).

Treinamento em SIS eu já participei na época que eu estava na assessoria, eu participava muito desses treinamentos [...] o que a gente não sabe fazer, a gente não pode cobrar (G6).

Olhe só, o que está tendo dificuldade até agora nesse programa que foi implantado, o e-SUS. [...] a maior dificuldade é porque ainda não teve uma capacitação [...] (G10).

Não, como gestora nunca fui qualificada, só quando era enfermeira da Estratégia Saúde da Família (ESF), sabia tudo do SIAB [Sistema de Informação da Atenção Básica] (G8).

Estudo realizado em cidades gaúchas de pequeno porte evidenciou que muitos municípios reforçaram a necessidade de qualificação de pessoal e a de treinamento da equipe no sentido de analisar os dados coletados e alimentar os sistemas.33. Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...

Em outro estudo realizado com gestores do SUS, destacou-se como uma das principais fragilidades o despreparo dos profissionais para o exercício das tarefas de administração e lentidão na incorporação de novas tecnologias de informação. No Brasil, ainda prevalece a cultura de que qualquer profissional sabe gerir e que a administração se aprende na prática.1212. Lorenzetti J, Lanzoni G, Assuiti LF, Pires DE, Ramos FR. Health management in Brazil: dialogue with public and private managers. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2014 [cited 2014 Aug 30]; 23(2):417-25. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000200417&lng=en&nrm=iso&tlng=en
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...

A enfermagem é a única das profissões da saúde que inclui no currículo de graduação a disciplina de administração, envolvendo atividades práticas.12 A maior parte da amostra do nosso estudo constitui-se de enfermeiros, portanto, pode-se esperar que esses sujeitos possuem ao menos alguma aproximação com o campo teórico e prático da administração.

Espera-se que haja a formação de capacidades de uso da informação efetivamente no âmbito local, em maior escala (especializações, aperfeiçoamentos) com o desenvolvimento de habilidades que proporcionem o domínio de técnicas e tecnologias, mas também fortaleçam localmente competências para o uso criativo e inovador das informações.22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

Os recortes abaixo demonstram a existência de duas realidades: gestores que percebem a importância dos SIS e que visualizam o potencial desses sistemas, e outros que entendem que a análise dos dados deve acontecer a partir de outras esferas de gestão.

É muito importante, o uso dos SIS, dentre vários fatores eu acho mais importante é a rapidez com que você busca as informações pra que você tome as decisões necessárias (G14).

Eu acho muito importante a utilização [...]. Esse sistema de informações é bom para ter conhecimento da situação do município, qual o índice, se atingiu alguma meta ou não. Então, é muito importante quando o Ministério da Saúde e a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) disponibilizam esses dados no site deles, isso facilita muito o nosso trabalho para gente ter uma orientação, uma visão ampla da realidade da saúde (G11).

Na prática é bastante comum que, mesmo que as pessoas compreendam e apreendam novos conhecimentos, elas ainda hesitam em colocá-lo em uso por uma variedade de razões. As pessoas resistirão a qualquer inovação que possa obrigá-las a abandonar a sua pretensa zona de conforto, isto é, a abdicar daquilo que acreditam em favor do novo. A resistência à mudança é poderosa, mesmo em face de evidências objetivas que uma determinada mudança faz sentido.1515. United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão III - Processo de Gestão do Conhecimento: perspectivas Centradas na Linha de Pessoas e no Conhecimento; 2014. [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93044.pdf

Alguns secretários afirmam que delegam as ações de lidar com os SIS para os digitadores.

Porque, geralmente, município pequeno a gente nunca tem tempo, aí deixa então o responsável por todos os sistemas, um rapaz que trabalha comigo há muitos anos (G10).

[...] É preciso que esses sistemas sejam mais simplificados e que dê capacitação para os técnicos que estão envolvidos nessa questão da informação, os técnicos da Central de Processamento de Dados. Eu nem incluiria o gestor, porque o gestor está num contexto geral (G15).

Embora a competência informacional corresponda a uma competência específica relacionada à habilidade de lidar com informação, esta não se restringe aos profissionais da informação.1111. Souza ED, Dias EJW, Nassif ME. A gestão da informação e do conhecimento na ciência da informação: perspectivas teóricas e práticas organizacionais. Inf & Soc: Est [Internet]. 2011 [cited 2013 Feb 3]; 21(1):55-70. Available from: http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ies/a rticle/view/4039/5598
http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ie...

Subtema 2 - O cotidiano da gestão da saúde: desdobramentos e possibilidades para o uso dos SIS

Em que pese alguns obstáculos para o uso dos SIS pela gestão e o controle social, a produção de conhecimento a partir das informações podem representar uma ponte dialógica entre as políticas de saúde, o planejamento e a tomada de decisão fundamentada pela possibilidade de materialização dos princípios constitucionais da equidade e integralidade em ações efetivas na prática cotidiana do SUS.

Um entrevistado fez referência ao grande número de SIS presentes na gestão: [...] é assim, são muitos programas para se alimentar, então eu acho assim, no meu ponto de vista que poderia ficar em um ou dois, três SIS (G11).

Há uma grande variedade de informações e conhecimento o que torna uma tarefa desafiadora para sua captura, armazenamento, recuperação e uso no setor público.1616. Misra DC. Ten Guiding Principles for Knowledge Management in E-government in Developing Countries. In: First International Conference on Knowledge Management for Productivity and Competitiveness, 2007 Jan 11-12; New Delhi (IN): National Productivity Council; 2007. O grande volume de dados pode ser amigo do gerenciamento de dados, mas é inimigo da GC, simplesmente porque é necessário filtrar o volume para encontrar o conhecimento desejado.1717. United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão V - Foco em Tecnologia da Informação aplicada à Gestão do Conhecimento e Tecnologias para a Gestão do Conhecimento nas Organizações Governamentais; 2014 [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93046.pdf
http://workspace.unpan.org/sites/Interne...
A vantagem sustentável que uma organização tem é aquilo que ela efetivamente conhece/sabe, a sua eficiência para usar o que sabe e a prontidão com que ela adquire e usa novos conhecimentos.66. Davenport TH, Prusak L. Working knowledge: how organizations manage what they know. Boston: Harvard Business School, 1998.

Os destaques a seguir apontam que alguns municípios têm procurado implementar a inovação, ainda que de forma incipiente para facilitar as práticas da gestão.

[...] a gente criou uma planilha para dar conta de controle de entrada e saída de material, para o almoxarifado. A gente está implantando um sistema que seja mais complexo, mas através do Excel, que não deixa de ser um sistema de informação para tentar resolver (G3).

Agora eu contratei uma empresa [...] O que a empresa vai fazer? Você digita o SIAB na unidade e ele estará interligado em rede (G12).

Eu preciso urgente conseguir garantir a contratação de uma pessoa formada na área de comunicação pra me ajudar com a publicidade desses dados, não para propaganda, mas pra envolver a comunidade na gestão (G3).

Os secretários salientam que há um déficit na estrutura e em alguns recursos para que os SIS possam funcionar adequadamente.

Nós temos poucos computadores, poucos digitadores, poucas pessoas trabalhando no sistema, entendeu? Então esse sistema poderia estar servindo bem mais à gente, se tivesse uma estrutura (G14).

A gente hoje está tentando melhorar a parte de informática no município, eu acho que a gente vai conseguir melhorar quando todas as unidades, principalmente os enfermeiros tiverem o acesso melhor. Hoje tem algumas unidades no município com computador e internet, mas eu quero ter todas funcionando [...] (G6).

A falta de computadores foi apontada como problema para utilização dos SIS por apenas 10% dos participantes de uma pesquisa,33. Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...
o que indica possivelmente maior facilidade no acesso a insumos de informática. Naquela realidade, o acesso à internet, por sua vez, apresentava-se disseminado, porém frágil. Esse resultado nos revela uma desigualdade entre a realidade dos municípios da região o sul e do nordeste brasileiro.

Subtema 3 - A relevância das tecnologias de informação aplicadas à gestão da saúde

GC é muito mais do que tecnologia, é a utilização eficaz e eficiente da tecnologia como parte integrante do sistema de GC. O uso das modernas tecnologias da informação e comunicação (TICs) permite coletar, sistematizar, estruturar, armazenar, combinar, distribuir e fornecer informações valiosas.1717. United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão V - Foco em Tecnologia da Informação aplicada à Gestão do Conhecimento e Tecnologias para a Gestão do Conhecimento nas Organizações Governamentais; 2014 [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93046.pdf
http://workspace.unpan.org/sites/Interne...

Os bancos de dados dos SIS configuram-se como conhecimento explícito que tem o potencial de se transformar em tácito (subjetivo). Dessa forma, o conhecimento pode ser pensado como uma via de mão dupla que pode migrar de tácito para explícito e vice-versa.1717. United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão V - Foco em Tecnologia da Informação aplicada à Gestão do Conhecimento e Tecnologias para a Gestão do Conhecimento nas Organizações Governamentais; 2014 [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93046.pdf
http://workspace.unpan.org/sites/Interne...

Mesmo atualmente, com as diversas inovações existentes para a disponibilização de dados em bases locais on-line (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - DATASUS, sites das Secretarias Estaduais da Saúde, Sistema do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - de Recuperação Automática de Dados - SIDRA -, entre outros), as demandas dos gestores e usuários de todas as esferas de governo não são inteiramente respondidas, no que se refere ao planejamento, ao monitoramento, à avaliação, dentre outros.22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

Os gestores afirmaram que são vários os SIS utilizados na sua prática cotidiana, e, dentre eles, destacaram o SIAB, o Sistema de Monitoramento de Obras (SISMOB):

Geralmente eu utilizo o relatório mensal do SIAB (G10).

Utilizo muito o SISMOB. Essa parte de cadastro de construção de unidades, reformas, ampliações fica comigo (G13).

Por ocasião da coleta de dados os municípios em estudo passavam por uma transição do SIAB para o novo Sistema de Informação em Saúde da Atenção Básica (SISAB). Esta mudança foi feita através do software e-SUS AB que foi concebido pelo Departamento da Atenção Básica do Ministério da Saúde, a fim de aprimorar a qualidade e garantir maior detalhamento da informação. Busca-se, assim, integrar diversos sistemas de informação existentes na atenção básica, dentre outras melhorias. Ressalta-se que havia por parte dos gestores participantes uma expectativa e ao mesmo tempo um sentimento de apreensão que ocorrem frequentemente quando da implantação de um novo sistema.

Alguns gestores sinalizam a dificuldade quando ocorre a implantação de um sistema novo.

O ano passado houve uma orientação de passar a fazer o SI-PNI de imunização do sistema web, [...] um sistema novo, na região não tinha ainda município implantado e se nós poderíamos servir como piloto. Nós fizemos essa proposição que estávamos dispostos. Tempos depois no sistema o nosso índice de vacina estava quase zerado. Por um problema no sistema, nós quase seríamos prejudicados, estávamos pra fechar o pacto dos indicadores e nós estávamos com quase todas as vacinas com zero por cento (G1).

Eu espero que o e-SUS dê certo, mas pra ele dar certo vai depender de vários fatores. Primeiro, o e-SUS vai contemplar vários desses sistemas. Então, é uma coisa que a gente sempre sonhou, porque diminui aquela questão de papéis, burocracia. Espero que dê certo. Mas, eu já fiquei meio decepcionada com o pessoal da própria SESAB, responsável pelo e-SUS [...] ainda há muita dúvida, esse é o grande problema (G12).

Um dos obstáculos enfrentado pelos municípios é o acesso à internet, visto que os SIS precisam ser enviados a outras esferas, há necessidade de baixar versões novas, e alguns SIS são digitados on-line. Os fragmentos das entrevistas ressaltam isso.

[...] nós compramos notebook para zona rural, e aí a enfermeira faz conectividade em outros locais, ela traz o notebook e envia os dados. Na zona rural não tem internet, a banda larga não chegou aqui (G16).

O fato de não ser informatizado, a saúde não está em rede então isso dificulta, por exemplo, a ESF tem acesso? Não, não tem. Para ter esse acesso tem que vir aqui no centro de saúde para utilizar o computador, o que agora talvez vá facilitar um pouco, porque vai ser instalados computadores nas unidades, tanto pra o sistema de telessaúde, quanto para o sistema de imunização que vai ter que informatizar. Então, a gente acha que com isso já vai ser um avanço (G2).

[...] Dificuldade nós temos muitas a começar pelo acesso à internet, aqui não funciona com banda larga, é lenta a internet. Então, essa dificuldade é gritante em toda a região, principalmente, nos municípios do interior (G15).

A nossa dificuldade aqui é internet. A internet aqui é lenta [...] (G9).

O Governo Federal, através do Programa Nacional de Banda Larga nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), pretende levar a internet banda larga para as UBS dos municípios. Isso resultará em maior qualidade e agilidade no atendimento, garantia e segurança no processo de transmissão de dados dos SIS, acesso a informações em tempo real e conhecimento.1818. Ministério da Saúde (BR). Diretoria de Atenção Básica. Plano Nacional de Banda Larga [Internet]. 2014 [cited 2014 Dec 28]. Available from: http://dab.saude.gov.br/portaldab/esus.php?conteudo=conectividade
http://dab.saude.gov.br/portaldab/esus.p...

Constata-se que há diversos obstáculos para que os SIS possam ser utilizados de maneira efetiva: falta de padronização dos procedimentos de obtenção e tratamento dos dados em saúde; dificuldade de conectividade dos serviços de saúde à internet banda larga; insuficiência de estratégias de financiamento no campo da informação e informática; deficiência de qualificação profissional nesse tema, dentre outras. Diante deste contexto, o Executivo Federal foi levado a formular uma nova política, na tentativa de suprir essas lacunas da gestão do SUS.1919. Ministério da Saúde (BR). Política de Informação e Informática em Saúde. Brasília (DF): Comitê de Informação e Informática em Saúde; 2012.

Os gestores apontaram os indicadores comumente usados por eles a partir dos SIS e algumas decisões a serem tomadas:

campanha de vacina, tem que ver a meta da taxa de cobertura vacinal, a gente conversa com cada agente: você tem quantas crianças em sua microárea? Ele vai listar quais são essas crianças, aí tem que fazer a busca ativa, quem ainda vai fazer essa vacina?(G5).

O SINAN [Sistema de Informação de Agravos de Notificações] que é o de notificação, nós vimos que tínhamos um número exorbitante de notificação de doença sexualmente transmissível. Quando nós começamos a trabalhar com mais afinco na questão da doença sexualmente transmissível, trabalhando mais nas escolas e na comunidade com atividades educativas, o índice caiu (G1).

Diferentemente dos resultados do nosso estudo, em investigação realizada33. Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...
a utilização dos SIS para a construção dos indicadores valorizados pelos gestores foi baixa, e menos de 5% das secretarias municipais estavam plenamente satisfeitas em relação às informações fornecidas pelos SIS.

Os dados apresentados são, em geral, brutos, não gerando dados estatísticos e informações que possam, em seu conjunto, produzir evidências para a tomada de decisão local. Servem tampouco para potencializar os processos de construção de sentidos para as decisões e para as intervenções necessárias. Por exemplo, apesar do próprio Censo Demográfico, realizado pelo IBGE, considerar em seus setores censitários, microáreas que, correspondem muitas vezes as mesmas microáreas definidas pela ESF, a equipe de profissionais e mesmo o gestor municipal os ignora (ou porque não o conhece ou por absoluta falta de integração entre os dados).22. Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...

Há gestores que chamaram atenção sobre a possibilidade da (in)fidedignidade dos dados aportados por alguns sistemas:

a depender de qual é o sistema de informação, alguns são confiáveis, já outros [...]. É uma cobrança nossa aqui de que a coordenação sempre esteja avaliando esses dados para eles serem o máximo possível verdadeiro, próximo à realidade (G6).

O digitador também se ele quiser fazer as alterações para mais ou para menos, ele tem todo esse poder na mão. Acho que a infidedignidade pode estar aí. [...], pois ele pode falar: 'não, isso aqui está muito ruim, vamos atingir essa meta aqui', ele pode fazer essa alteração. Tem que ser uma pessoa muito responsável, para se trabalhar em sistema de informação você tem ter que pessoas comprometidas (G7).

SIS frágeis são desafios constantes para todas as esferas da gestão, pois o desempenho dos sistemas de saúde não pode ser adequadamente avaliado ou monitorado quando os dados se apresentam incompletos, imprecisos ou inoportunos.2020. Mutale W, Chintu N, Amoroso C, Awoonor-Williams K, Phillips J, Baynes, et al. Improving health information systems for decision making across five sub-Saharan African countries: Implementation strategies from the African Health Initiative. BMC Health Services Research. 2013; 13 Suppl 2: 1-12.

As TICs per si dificilmente criam o conhecimento ou garantem a sua geração. Elas podem, entretanto, favorecer a agilidade e a disseminação da informação, sobretudo no campo da produção da saúde onde conhecimento em si é um bem público e quanto mais se compartilha, mais ele tende a aumentar a sua potência.

Na administração pública brasileira, a GC está sendo implementada com vistas à maximização da cidadania, do bem-estar social, da transparência, para a eficácia na aplicação de recursos públicos, dentre outros. Desse modo, a GC, por ser transversal, está em consonância com as diretrizes do SUS, pois favorece a visibilidade das informações, incrementando a participação e o controle social.77. Molina J. Not missing the train of history! Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2014 Fev; [cited 2015 May 15]; 48 (1). Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000100001
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342014...

Assim, a GC agregará valor a outras ferramentas existentes contribuindo com a superação dos desafios que se apresentam à gestão da saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo destacou que a utilização dos SIS ainda não atinge todo o seu potencial, pois é usado de maneira incipiente pela gestão da saúde para o processo decisório. Em geral, eles usam e compartilham dados e informações, porém, percebem-se os desafios a serem enfrentados no uso da informação como substrato para a produção do conhecimento e decisão.

No cenário do estudo configuram-se duas realidades contraditórias: em uma há envolvimento de diversos atores e participação popular na tomada de decisão e em outra se apresenta o papel cartorial do conselho de saúde, que é acessado apenas para aprovação de projetos. Neste contexto, a gestão necessita envolver os distintos sujeitos no uso e compartilhamento do conhecimento. A efetiva participação, sobretudo dos conselhos, nas decisões agrega contribuições e visões de acordo com cada contexto e realidade, promove um processo representativo de diálogo, de forma legítima e inclusiva.

A relevância dos SIS foi enfatizada. Os sistemas são vistos como ferramentas para o planejamento, para a tomada de decisão e para a gestão da saúde de um modo geral. Contudo, uma fragilidade importante que chamou atenção no estudo foi o número reduzido de qualificações para a utilização dos SIS e dificuldade de acesso à Internet. Mesmo diante de obstáculos, alguns gestores têm procurado implementar a inovação, mesmo que de forma incipiente para facilitar o compartilhamento de informações e melhorar as práticas da gestão.

Esta pesquisa não se propôs a criar/construir um modelo de GC específico para a gestão da saúde, mas fornecer pistas que possam ser aprofundadas em outras investigações. A GC foi discutida no estudo como contribuição teórica a fim de iluminar o processo de utilização e compartilhamento da informação e do conhecimento para o processo decisório.

Não há uma fórmula que leve a se efetivar a utilização dos SIS para a tomada de decisão pelos gestores da saúde. Sugere-se, porém, que a gestão promova o fortalecimento de uma cultura informacional nas secretarias municipais e fomente um ambiente organizacional que consolide o uso da informação para a construção do conhecimento e o seu compartilhamento para subsidiar o processo decisório. Não se trata de uma lógica linear e normativa, assim este estudo oferta elementos que possam servir de reflexão e discussão de possibilidades, de outras formas de condução da utilização dos SIS para a construção de uma gestão implicada com aperfeiçoamento do SUS.

REFERENCES

  • 1
    Tamaki EM, Tanaka OY, Felisberto E, Alves CKA, Drumond Junior M, Bezerra LCA, et al. Metodologia de construção de um painel de indicadores para o monitoramento e a avaliação da gestão do SUS. Cienc Saude Colet [Internet]. 2012 [cited 2014 Dec 30]; 17(4):. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n4/v17n4a07.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n4/v17n4a07.pdf
  • 2
    Ferla AA, Cecim RB, Alba RD. Information, education and health care work: Beyond evidence, collective intelligence. RECIIS - Rev Eletr Com Inf Inov Saude [Internet]. 2012 Ago [cited 2014 Oct 03]; 6(2): http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303, Sup.
    » http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/477/pdf_303
  • 3
    Vidor AC, Fisher PD, Bordin R. Utilização dos sistemas de informação em saúde em municípios gaúchos de pequeno porte. Rev Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2014 Oct 03]; 45(1):24-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011000100003
  • 4
    Nonaka I, Takeuchi H. Criação de conhecimento na empresa. 7ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Campus; 1997.
  • 5
    United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão II - Gestão do Conhecimento em Organizações Governamentais e Programas, 2014. [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93043.pdf
    » http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93043.pdf
  • 6
    Davenport TH, Prusak L. Working knowledge: how organizations manage what they know. Boston: Harvard Business School, 1998.
  • 7
    Molina J. Not missing the train of history! Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2014 Fev; [cited 2015 May 15]; 48 (1). Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000100001
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000100001
  • 8
    Lorenzetti J, Trindade LL, Pires DEP, Ramos FRS. Technology, technological innovation and health: a necessary reflection. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2012 Abr-Jun [cited 2014 Oct 21]; 21(2):432-9. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072012000200023&lng=en&nrm=iso&tlng=en
    » http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072012000200023&lng=en&nrm=iso&tlng=en
  • 9
    Rocha ESB, Nagliate P, Furlan CEB, Kerson Rocha Jr, Trevizan MA, Mendes IAC. Gestão do conhecimento na saúde: revisão sistemática de literatura. Rev Latino-am Enfermagem [Internet]. 2012 [cited 2014 Oct 21]; 20(2):[09 telas]. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n2/pt_24.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n2/pt_24.pdf
  • 10
    Cavalcante RB, Kerr MMP. Política Nacional de Informação e Informática em Saúde: avanços e limites atuais. Perspectivas em Gestão & Conhecimento 2011; 1:106-19.
  • 11
    Souza ED, Dias EJW, Nassif ME. A gestão da informação e do conhecimento na ciência da informação: perspectivas teóricas e práticas organizacionais. Inf & Soc: Est [Internet]. 2011 [cited 2013 Feb 3]; 21(1):55-70. Available from: http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ies/a rticle/view/4039/5598
    » http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ies/a rticle/view/4039/5598
  • 12
    Lorenzetti J, Lanzoni G, Assuiti LF, Pires DE, Ramos FR. Health management in Brazil: dialogue with public and private managers. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2014 [cited 2014 Aug 30]; 23(2):417-25. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000200417&lng=en&nrm=iso&tlng=en
    » http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000200417&lng=en&nrm=iso&tlng=en
  • 13
    Silva M, Rodrigues V, Alves E. Gestão dos serviços de saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) em uma regional de saúde do Distrito Federal (SES-DF): uma visão do gestor relacionada ao preparo para a função. Gestão e Saúde. 2013 Set; 4(3):843-60.
  • 14
    Tanaka, OY, Tamaki, EM. O papel da avaliação para a tomada de decisão na gestão de serviços de saúde. Cienc Saude Colet. 2012; 17(4):821-8.
  • 15
    United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão III - Processo de Gestão do Conhecimento: perspectivas Centradas na Linha de Pessoas e no Conhecimento; 2014. [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93044.pdf
  • 16
    Misra DC. Ten Guiding Principles for Knowledge Management in E-government in Developing Countries. In: First International Conference on Knowledge Management for Productivity and Competitiveness, 2007 Jan 11-12; New Delhi (IN): National Productivity Council; 2007.
  • 17
    United Nations Public Administration Network (UNPAN). Featured Learning Materials, Gestão do Conhecimento na Organização Governamental. Sessão V - Foco em Tecnologia da Informação aplicada à Gestão do Conhecimento e Tecnologias para a Gestão do Conhecimento nas Organizações Governamentais; 2014 [cited 2014 Aug 30]. Available from: http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93046.pdf
    » http://workspace.unpan.org/sites/Internet/Documents/UNPAN93046.pdf
  • 18
    Ministério da Saúde (BR). Diretoria de Atenção Básica. Plano Nacional de Banda Larga [Internet]. 2014 [cited 2014 Dec 28]. Available from: http://dab.saude.gov.br/portaldab/esus.php?conteudo=conectividade
    » http://dab.saude.gov.br/portaldab/esus.php?conteudo=conectividade
  • 19
    Ministério da Saúde (BR). Política de Informação e Informática em Saúde. Brasília (DF): Comitê de Informação e Informática em Saúde; 2012.
  • 20
    Mutale W, Chintu N, Amoroso C, Awoonor-Williams K, Phillips J, Baynes, et al. Improving health information systems for decision making across five sub-Saharan African countries: Implementation strategies from the African Health Initiative. BMC Health Services Research. 2013; 13 Suppl 2: 1-12.
  • 1
    Texto extraído da tese - O uso dos sistemas de informação como ferramenta para a tomada de decisão pela gestão da saúde em municípios do sul da Bahia, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da Universidade de São Paulo (USP), em 2014. Edital 005/2009 Ação Novas Fronteiras da CAPES/MEC.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2015
  • Aceito
    27 Nov 2015
Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós Graduação em Enfermagem Campus Universitário Trindade, 88040-970 Florianópolis - Santa Catarina - Brasil, Tel.: (55 48) 3721-4915 / (55 48) 3721-9043 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: textoecontexto@contato.ufsc.br